sábado, dezembro 05, 2009

As vozes e as nozes


A empresa de sondagens Eurosondagem, S.A. entrevistou telefonicamente cerca de mil pessoas, para um "estudo de opinião" relativo a questões de popularidade e justiça.

A conclusão que pode ler-se acima ( clicando na imagem), é reveladora: a imagem dos magistrados ( juízes e procuradores do MP) anda pelas ruas da amargura e fica atrás dos políticos em prestígio e popularidade.

A maioria dos inquiridos acha que "o combate à corrupção tem meios mas não é eficaz" e nas críticas à lentidão da justiça os magistrados estão empatados com o Governo na responsabilidade pelo fenómeno.

Em resumo: os magistrados são actualmente uma das classes profissionais com imagem mais negativa que pode haver. Abaixo de político.
Como se chegou até aqui? Pode haver várias explicações, mas uma com certeza que tem de ser ponderada: o papel dos media, dos líderes de opinião e da cultura e conhecimento da média dos entrevistados e portanto da capacidade de entendimento e descodificação das mensagens que lhes são transmitidas diariamente sobre " a crise da justiça".

Poderá dizer-se, sem errar gravemente, que os magistrados são uma classe profissional com maior grau de incompetência e desajuste profissional que outra, por exemplo, a dos jornalistas?
Ou a dos médicos e engenheiros? Ou...a política? Não, não pode nem deve. E até digo mais: pudera que essas classes tivessem tanta "classe" profissional. Não custa nada dizer isto, mas está dito, sem temer contraditório.

No mesmo número do Expresso de hoje, várias personalidades adiantam algumas ideias básicas "para mudar a Justiça".

Um antigo conselheiro do tribunal Constitucional, também antigo magistrado do MP, Guilherme Fonseca apresenta um ovo de colombo: filmar os julgamentos ( em vez de gravações apenas de som) para evitar anulações e repetições de prova. Outro, o ubíquo Marinho e Pinto salienta mais uma vez o problema da formação dos magistrados, defendendo um "novo pradigma", porque o actual modelo é quase "medieval
A melhoria da informatização e a introdução de critérios de gestão, bem como a eleição do PGR, seriam outras soluções.

Duas páginas do Expresso para dizer isto parece muito pouco para quem se afoita a apresentar ideias feitas.
Medina Carreira, um dos auscultados, lá consegue sugerir que se crie "um grupo alargado que elabore dentro de um prazo fixo um relatório sobre os problemas que um segundo grupo traduziria em projecto de lei."

Vago? Não. Simplesmente difícil de executar. Nesta matéria, as vozes são muito, mas mesmo muito mais que as nozes.

8 comentários:

Diogo disse...

Ou seja, a justiça está feita deliberadamente para não funcionar (excepto para os pilha-galinhas). Assim sendo, os cidadãos têm todo o direito para avançar com a sua própria justiça.

zazie disse...

A propaganda jornaleira tem muita força.

É um detalhe que passa sempre ao lado, mas é um facto.

Esta propaganda tanto explica a diabolização do MP e juízes como a anormalidade da xenofobia islâmica- em escala maior.

MARIA disse...

Pois a mim, com todo o respeito, parece-me que devia ponderar-se porquê que as pessoas consideram tão mal a justiça.
É dever da justiça explicar-se. Não se limitar a impor-se, cega e muda a todos os motivos de queixa, sem os reflectir, sem buscar compreendê-los.
Coisas na Justiça funcionam mal e a par dos Romanos que ofereciam uma vítima inocente em holocausto à populaça para satisfazer a respectiva necessidade de sangue, tantas vezes são os magistrados que mais próximo estão do que as pessoas esperam de um magistrado , mas pessoalmente mais frágeis, que são alvo de tirocínio pelos seus próprios pares por uma necessidade aparentemente em tudo semelhante à aludida barbarie.
Naturalmente é esta a minha perspectiva, subjectiva e própria de quem não domina e não integra os meandros dos centros de decisão.
É uma opinião, expressão de cidadania e como tal apenas pode ser entendida.
Vejo os sindicatos, por exemplo, virem a público sempre que dessa intervenção retiram visibilidade e prestígio, mas não conheço, aos mesmos, projectos que se preocupem em delimitar a distribuição do número de processos e quantidade de trabalho adstrito a cada magistrado,
desconheço que se procure uniformizar esses critérios de distribuição feitos à medida de quem cordena cada comarca , que se pronunciem sobre a efectiva gestão das necessidades de meios e recursos humanos pelas Comarcas com critérios uniformes, similares no que respeita às condições de trabalho para cada magistrado, etc, etc.
Os magistrados têm por código de conduta e dever ético deontológico não divulgar as dificuldades de trabalho que encontram.
Mas esse é um factor que influencia
o desempenho da justiça e de que maneira.
Tanto quanto não termos as melhores leis e também nada fazermos no sentido de o fazer notar a quem de direito.
Como cidadã subscrevo a ideia de que a justiça tem que ser repensada de forma sistemática, não pontual e casuísticamente e que problemas gerais de fundo devem ser referenciados,enfrentados com humildade e adequação aquilo que se espera deste serviço à comunidade, preocupando-se em organizar e gerir os recursos afectos à justiça de acordo com uma política concertada e dirigida às respectivas necessidades específicas.

Gostaria de ver respondidas pelos portugueses várias questões sobre a justiça e formar uma ideia do que de facto dela pretendem, mas mais que celeridade, mais que elaboradas decisões, tenho para mim que as pessoas pretendem ver da justiça declarado, atribuído a cada um o seu legítimo direito, sem excesso de formalismo, com igualdade entre todos os cidadãos, com humanidade, pois a justiça tem por dimensão o homem, o ser humano.

E se Magistrados de boa vontade tentam praticá-lo e isso não passa para o público, porquê recusar compreender porquê ?

ORLANDO FIGUEIRA disse...

É preciso que haja memória:

Recordo-me de uns tempos antes de rebentar o caso Casa Pia, ter sido feita uma sondagem onde se podia verificar que a Justiça, apesar dos seus atrasos, tinha uma imagem muito positiva junto da opinião pública.
Entretanto, rebenta a Casa Pia e, desde então, a classe política em geral tem-se preocupado em denegrir a imagem da justiça e verdade seja dita que o tem conseguido, tal é a intoxicação e a mnipulação dos media que mais não são do que critaturas acéfalas e assalariadas do Poder.
E quando me refiro à classe política não é apenas o PS. Será sobretudo este Partido mas há outros, em especial, todos os que estiveram no Poder pq todos eles têm rabos de palha; Isaltinos; Majores; Felgueiras, etc...

Pior que tudo é que, infelizmente, a justiça não pode parecer e ser imparcial... pq, em especial, as cúpulas estão corrompidas e contagiadas pela Nova Ordem Chaveziana...

Josão disse...

O LOBO E O CORDEIRO


Na água limpa de um regato,
matava a sede um cordeiro,
quando, saindo do mato,
veio um lobo carniceiro.

Tinha a barriga vazia,
não comera o dia inteiro.
- Como tu ousas sujar
a água que estou bebendo?
- rosnou o Lobo a antegozar
o almoço. - Fica sabendo
que caro vais me pagar!

- Senhor - falou o Cordeiro -
encareço à Vossa Alteza
que me desculpeis mas acho
que vos enganais: bebendo,
quase dez braças abaixo
de vós, nesta correnteza,
não posso sujar-vos a água.

- Não importa. Guardo mágoa
de ti, que ano passado,
me destrataste, fingido!
- Mas eu nem tinha nascido.
- Pois então foi teu irmão.
- Não tenho irmão, Excelência.
- Chega de argumentação.
Estou perdendo a paciência!
- Não vos zangueis, desculpai!
- Não foi teu irmão? Foi o teu pai
ou senão foi teu avô.
Disse o Lobo carniceiro.
E ao Cordeiro devorou.

Onde a lei não existe, ao que parece,
a razão do mais forte prevalece

Diogo disse...

De qualquer forma, muitos perguntam porque é que um indivíduo que rouba uma motorizada apanha vários anos de cadeia, enquanto, por outro lado, não há um único figurão preso. E todos sabemos que figurões criminosos não faltam. Os juízes só funcionam com pilha-galinhas?

diconvergenciablog disse...

Se os politicos fazem as leis, e os juizes as aplicam de forma automática quaisquer que sejam, são coniventes com o sistema e é natural que o povo os coloque ao mesmo nivel do que os politicos.

josé disse...

O problema da aplicação automática já foi por aqui glosado com um ou outro texto sobre a "criação de direito" pelos juízes e cujo tema foi explorado em tempos ( há mais de vinte anos)por Laborinho Lúcio,m quando dirigia o CEJ.

Diga-se que os juizes não podem fugir muito à letra e espírito da lei, sendo certo que os princípios de aplicação do direito não permiem grandes veleidades, por um motivo prosaico:

Em sede de recurso, generosamente concedido pelas nossa legislação, as decisões de tribunais superiores são muitas vezes divergentes da as instâncias inferiores e isso permite julgar que aplicar o Direito não é tarefa para computadores, mas comporta uma margem de erro assinalável.

Haverá alternativa?

Veja-se por exemplo a decisão do STA conhecida hoje, sobre a co-incineração em Souselas..
O que vão dizer o professor Bonaventura e o professor Vital?

Vão rasgar as vestes outra vez?

Mas...que vestes para quem anda nu há tanto tempo?

O Público activista e relapso