O jornalista José Alberto Lemos assina hoje no Público uma crónica que só agora é possível num jornal português de grande circulação.
Escreve sobre uma visita recente que efectuou à Alemanha, a Berlim e a uma prisão da polícia política da ex-RDA, a STASI.
Depois de contar o que viu e mencionar os horrores da tortura física e psicológica que para alguns, (se calhar nem sequer a maioria), se tornam evidentes apenas agora, de há uns pouquíssimos anos a esta parte, remata assim:
" Foi justamente o 25 de Abril e os tempos da ditadura que não me sairam da memória durante a visita à prisão, estabelecendo um paralelismo inevitável entre a Stasi e a PIDE. E aí uma terrível ironia se insinuou: as maiores vítimas da PIDE, os comunistas portugueses, sofreram horrores idênticos às vítimas da STASI, quando lutavam por um projecto político e pela instauração em Portugal de um regime em tudo idêntico ao da ex-RDA. Que, fatalmente, mais tarde ou mais cedo não dispensaria uma qualquer STASI. Um paradoxo? Nem tanto, como o séc. XX demonstrou. Acima de tudo, uma terrível ironia histórica."
Não consta que o jornalista-cronista seja um "reaccionário" de direita, saudosista de Salazar. Não consta que afinal só agora tenha descoberto uma realidade que muitos, mas não tantos como isso, denunciaram logo na altura, nos anos setenta, quando em Portugal se lutava para o tal regime idêntico em tudo ao da ex-RDA.
Não consta ainda que tenha havido muitas pessoas e muito menos no nosso parlamento a dizer publicamente estas coisas, com apreciação maioritária.
O tratamento político que sempre deram ao PCP e agora ao BE, fruto da mesma ideologia e com os mesmos frutos políticos inevitáveis, foi de grande condescendência, não admitindo publica a logicamente a tal "ironia histórica". Pior ainda: o negacionismo continuado do PCP ( e BE) destas realidades históricas e não apenas da propaganda, permanece arreigado na mentalidade dos comunistas portugueses, como se isso fosse apenas uma fantasia e o partido uma vez alcançado o poder pudesse fazer outra coisa senão replicar o modelo ideológico que defende.
Em Portugal, o PCP continua a merecer o crédito alargado das restantes forças políticas como nenhum partido que se reclamasse do salazarismo alguma vez poderia assumir, sem ser imediatamente classificado de extrema-direita, com direito a prisão dos seus membros activos.
É esta a realidade nua e crua portuguesa, actualíssima.
Como se chegou aqui? Propaganda e censura, admitidas intrinsecamente pela inteliggentsia nacional. Precisamente os ingredientes que negam a democracia.
Ainda agora, a denúncia deste evidente paralelismo, é catalogado pelos comunistas e esquerda em geral como sendo de fonte de direita ou até extrema-direita. E não são apenas os comunistas que comungam desta lógica. Muito povo socialista que se quer à esquerda, seja lá isso o que para eles for ( Vital Moreira é o exemplo máximo desta posição ideológica), pensa do mesmo modo e anatematiza da mesma maneira.
A lógica ideológica em Portugal, continua a ser de matriz de esquerda e os media são a guarda avançada. Sempre foram e só desconheço, embora desconfie, que o próprio cronista só agora ao fim de tanto tempo, se deu conta da tal ironia.
O que em si mesmo é outra ironia.