Artigo na Sábado de hoje de Eduardo Dâmaso:
Artigo neste blog, em 30.1.2012:
A mentora do Código dos Contratos Públicos, aprovado em 2008 e que regula os ajustes directos feitos pelo Estado, é também uma das principais beneficiadas: a sociedade de advogados Sérvulo & Associados já recebeu 7,5 milhões de euros, por 157 contratos de ajustes directos. Muitos são contratos para defender entidades públicas com irregularidades detectadas em ajustes directos, como é o caso da Parque Escolar, que tem um contrato com a Mota Engil que o Tribunal de Contas considera ilegal.
O ano em que o Código dos Contratos Públicos (CCP) foi aprovado acabou por ser dos mais fracos para aquele escritório de advogados, que apenas conseguiu 89 mil euros em ajustes directos durante todo o ano de 2008. Mas 2009 foi um ano “gordo” para os cofres da sociedade liderada por Sérvulo Correia, tendo auferido 3,277 milhões de euros. Os valores baixaram nos anos seguintes, mas ainda assim 2010 permitiu encaixar 1,9 milhões de euros e 2011 outros dois milhões de euros. Em 2012, segundo o portal Base, onde são publicados todos os contratos públicos por ajuste directo, a Sérvulo & Associados já conseguiu 80 mil euros em duas adjudicações.
As áreas da educação, águas, obras públicas e comunicação social são as que mais contratam a sociedade de advogados. Parque Escolar (quatro contratos), RTP (sete contratos), Estradas de Portugal (cinco contratos), Instituto dos Registos e do Notariado (sete contratos) e Gabinete de Estatística e Planeamento da Educação (oito contratos) são os principais clientes.
O contrato mais elevado já obtido por aquele escritório (que não é o único a usufruir dos ajustes directos) foi com o Banco de Portugal (BdP), que pagou 650 mil euros em Fevereiro de 2011 por assessoria jurídica. O fim específico daquela assessoria não é descrito em detalhe, mas o “Diário de Notícias” revelou, em Dezembro, que o serviço se destinava a apoiar o BdP nos processos de contra-ordenação contra a anterior administração do Millennium BCP.
O banco central português é, aliás, um frequente utilizador dos ajustes directos para assessoria jurídica, pois no mesmo ano também contratou a sociedade de advogados do antigo ministro Vasco Vieira de Almeida, pagando-lhe outros 650 mil euros. Ao todo, desde 2009, o Banco de Portugal já gastou dois milhões de euros em serviços jurídicos.
PARQUE ESCOLAR Um dos mais recentes ajustes directos de que Sérvulo Correia é adjudicatário é deste mês e o adjudicante é a Parque Escolar, no valor de 20 mil euros. A sociedade foi contratada para defender a empresa num caso de ajuste directo chumbado pelo Tribunal de Contras (TC). Em causa está o contrato de obras na Escola Secundária Passos Manuel, em Lisboa, executado pela Mota-Engil. O TC chumbou aquele contrato, no valor de 1,1 milhões de euros, considerando-o “nulo”. Entre várias ilegalidades apontadas está o facto de o ajuste directo ter sido feito já depois da obra estar concluída e também por o contrato não ter sido sujeito à fiscalização prévia do TC.
Repare-se: A firma de advogados Sérvulo & Associados, com sede no Chiado, em edifício sumptuoso ( diz-se que o gabinete de Sérvulo Correia, que já foi secretário do PSD, até tem área de mini-golf...) prosperou estes últimos anos de modo impressionante. E só se constituiu em 1999...
Desde quando prosperou esta firma que, à semelhança das três irmãs pareceristicamente siamesas, contrata juristas brilhantes recém saídos de faculdades e a quem pagam em modo mixuruco para fazerem o trabalho técnico? Desde que acabaram as auditorias jurídicas nos ministérios e o Ministério Público foi relegado para instância acessória em matérias de parecerística jurídica.
Quem foi o autor da ideia básica que encheu os cofres das três irmãs que entretanto alargaram a família a outros parentes pobres e afastados, mas que lograram chegar-se à mesa do Orçamento, tipo José Pedro Aguiar Branco e outros?
Durante muitos anos o Ministério Público manteve um carácter de entidade consultiva do poder político, incluindo o legislativo.
Em regime democrático, o Ministério Público, sempre teve como função "representar o Estado". Claro que a discussão acerca do significado da representação só poderia abrir nova brecha conceptual, com Sérvulo Correia ( precisamente) a defender ( ver pág 25 do pdf) no final dos anos noventa, que o MP representa o Estado, em matérias administrativas, em verdadeiro patrocínio judiciário e não em representação orgânica, o que implicaria outra noção de Estado. Percebe-se o ponto onde o mesmo queria chegar...
O Conselho Consultivo do MP tinha e tem como funções emitir pareceres sobre a legalidade designadamente a solicitação do Governo, "acerca da formulação e conteúdo jurídico de projectos de diplomas legislativos e pronunciar-se sobre a legalidade dos contratos em que o Estado seja interessado, quando o seu parecer for exigido por lei ou solicitado pelo governo." Deve ainda informar o governo, acerca de obscuridades, deficiências ou contradições nos textos legais e propor as devidas alterações. "
Para além do Conselho Consultivo, o Ministério Público tinha ainda auditores jurídicos junto dos ministérios ( o antigo vice-PGR, Gomes Dias era auditor jurídico...). Os quais funcionavam mal, por causa dos próprios, mas deviam e podiam ser renovados em proveito da causa pública.
Este papel importante na orgânica democrática foi obliterado. Quando? particularmente, em 2006, por Alberto Costa ( quem, senão essa figura sinistra para a magistratura poderia ter feito isto?) no governo de José Sócrates. Acabou com esses serviços de auditoria de um modo que mereceu um comentário do próprio António Cluny, assim:
"Numa altura de contenção orçamental, a opção parece estranha", comentou ao DN António Cluny, presidente do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público (SMMP) - entidade ontem recebida pelo ministro da justiça Alberto Costa, para abordarem os vários assuntos em reforma no sector, nomeadamente a formação dos futuros magistrados (...). Poderia perguntar-se a razão verdadeira de tal opção política. Em política o que parece é e Alberto Costa era advogado, embora de firma anódina e que não se sabe se alguma vez exerceu a sério a profissão. Como advogado era e é Rogério Alves, da PLMJ e que assim comentou na altura o assunto: "Eu entendo que, como regra, a consulta jurídica e o patrocínio judiciário devem ser garantidos por advogados. E não excluo o Estado, os departamentos do Estado ou outros organismos da administração pública", disse ao DN Rogério Alves, bastonário da Ordem dos Advogados, para quem a extinção das auditorias jurídicas foi "uma boa medida desde que haja outra formas de assessoria", frisou. Também na altura, "vários PGA ouvidos pelo DN, garantem que a medida vai sair cara ao Estado. "
A medida de extinção das auditorias inseria-se num dos objectivos do famigerado PRACE, orientado superiormente por uma tal Maria Manuel Leitão Marques, mulher de Vital Moreira. A seguir a isto o que veio? O Código da Contratação Pública, entrado em vigor em 2008, mas gizado anteriormente. Por quem? Sérvulo & Associados, firma fundada em 1999, voilà!
O último escândalo revelado agora pelo i implica a Sérvulo, por motivos óbvios e simples de entender: foi a firma quem elaborou o código, tornando-se o autêntico legislador e como tal, o intérprete autêntico também será a firma.
Escândalo, isto? Mais que escândalo, um sinal da decadência do regime que apodreceu de há quinze anos a esta parte e há meia dúzia deles começou mesmo a apodrecer pela cabeça, como o peixe.
Mas não se pense que é a única firma beneficiada no âmbito da última cartada do regabofe orçamental de Sócrates. A par da Sérvulo estão também metidos na assessoria jurídica da Parque Escolar, as firmas de Morais Leitão ( de onde saiu Assunção Cristas) e de José Pedro Aguiar Branco.
Na Parque Escolar estão concentrados todos os elementos que podem mostrar às pessoas como é que chegamos ao Estado a que chegamos e entramos em bancarrota. Basta que as pessoas queiram ver. Alguém julga que esta escandaleira e este regabofe cujo caldo de cultura foi preparado pelos governos socialistas e que foi aproveitado por todos os próceres do Bloco Central foi gratuito e por acaso? Alguém julga que isto tem emenda e que as firmas de advogados serão reconduzidas ao seu lugar natural de profissão liberal, sem ligações umbilicais ao Estado-providência que lhes assegura os réditos principais? Alguém julga que isto sucede em algum país da Europa? E porque é que sucede?
As firmas de advogados em Portugal, as do regime entenda-se, tornaram-se autênticas sanguessugas de recursos públicos, eventualmente com prejuízo para os interesses nacionais e com a complacência de certas figuras. Vital Moreira, por exemplo. E o que ainda é pior é a circunstância de se poderem defender com a mais perfeita legalidade que como se sabe, por doutrina de outro ministro socialista da Justiça ( A. Martins) equivale estritamente à ética."
Isto que acima se escreve tem dez anos. É de 2012! O panorama melhorou com o tempo? Segundo Eduardo Dâmaso é o que se pode ver. Adiantou alguma coisa haver alguém a escrever sobre o assunto?!
Mais: falta ainda esclarecer nos tempos mais recentes como é que a própria Secretaria da Presidência da República contratou um certo escritório de advogados num caso que envolve crimes relacionados com o desvio de artigos do museu da presidência...e o presidente da República podia esclarecer, já que fala sobre tudo e muitos pares de botas, sempre que tem um microfone e uma câmara á frente...
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