sábado, abril 01, 2023

Caso Abdul: a loucura presente no establishment nacional

 Há muito tempo que não coloco aqui recortes de crónicas de Alberto Gonçalves, embora as leia regularmente. Escreve muito bem, sob uma perspectiva muito pessoal mas por isso mesmo original. É o suficiente para despertar o interesse. 

Neste caso escreveu algo no Observador, sobre o afegão que matou duas mulheres num centro de acolhimento relacionado com muçulmanos. 

Revela no escrito algo que me impressionou logo que a notícia se divulgou: a urgência mediática em desvalorizar um acto criminoso, gravíssimo, cometido por um estrangeiro vindo do Afeganistão, sem se saber ainda as circunstâncias concretas da actuação e motivação. 

As entidades oficiais encarregadas da investigação criminal saltaram logo a terreiro, investindo abertamente no campo político, espúrio a tais ofícios, ou seja, a PJ que aparece sempre à frente e a substituir um Ministério Público ausente, medroso da própria sombra e medíocre, apesar de ser a entidade que dirige a investigação. Neste como noutros casos, tudo fica a cargo dos funcionários de polícia criminal que efectuam o trabalho de campo, por falta de comparência do Ministério Público e tal parece não incomodar seja quem for. Et pour cause. 

Assim, tivemos desde logo as opiniões mediáticas tangidas pelas entidades oficiais, a começar pelo presidente da República, muito justamente apelidado no artigo como Sua Incontinência. 

Todas num sentido inadmissível porque desprovido de um senso comum que paradoxalmente procuraram transmitir, com o receio atávico de criarem algo que em Portugal dificilmente acontece: pânico social.

Não sei quem disse ou ensinou a estas pessoas que devem actuar assim, mas suspeito que os motivos não são recomendáveis democraticamente. 

Certas entidades oficiais, a começar pelo director da PJ acham-se imbuídas do dever de esclarecer o cidadão, antes de tudo e de todos, ultrapassando as competências que lhes são próprias e substituindo-se a tudo e a todos, acerca do que devem pensar sobre determinados fenómenos criminais. 

Perdem o bom senso que afinal é apanágio do povo em geral que não vai em cantigas de carochinha e criam exactamente o fenómeno oposto: a desconfiança, a suspeita de que afinal algo se esconde para além das "verdades oficiais". 

Tal fenómeno acaba por alimentar precisamente aquilo que as mesmas entidades pretendem evitar que seja alimentado: certas forças que democraticamente não aceitam, apesar de o regime ser gizado para aceitar, como o Chega, porque é disso que se trata com estas manobras estúpidas. 

Estúpidas porque tomam as pessoas em geral por mentecaptas e incapazes de perceber por si mesmas o que se passa e apreender a realidade tal como ela se apresenta e é. Julgam, no seu modo de ver, que as pessoas são crianças...e predispõem-se ao ridículo, a meu ver. Sem necessidade nenhuma, porque ninguém tem o dever de ser uma espécie de paizinho de povos, como alguns já o foram. A democracia não aceita tal noção.

Fazem exactamente o que criticam noutras situações relativamente a outros regimes passados: condicionar a opinião pública em determinado modo. Democraticamente, o que é mais lamentável  porque contraditório. 


 




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A obscenidade do jornalismo televisivo