domingo, dezembro 16, 2012

A pobreza de espírito integral



 Numa das caixas de comentários abaixo, um comentário assinado por Mirza, diz assim para me vituperar:

Há tempos um amigo disse-me para espreitar a portadaloja, que era um caso de escola:
"Tens lá tudo: extrema-direita de província saudosista (nota pessoal: nada contra), catolicismo integralista, magistratura "justiceira" com uma agenda política, cheia de auto-justificações para os excessos, que acha que as regras são para os outros, tudo coisas de fazer lamber os beiços ao Le Pen. E, cereja em cima do bolo, tens o equivalente ao Aguiadois do Expresso, um tal Floribundus que, mal é publicado um post, se precipita a debitar umas raivas."
Pois tenho vindo a observar, a comentar, a apreciar, e sobretudo a confirmar a justeza das apreciações. A descrição é exacta, e é dispensável continuar.

Adoro este tipo de desafios não solicitados mas encomendados pelos preconceitos de quem escreve. 
Descortiquemos:
Em primeiro lugar o que será isso de “extrema-direita de província saudosista” ? Indefinível, inenarrável a um espectador comprometido seja com que ideologia for, passa tal afirmação pela habitual reguada ideológica de uma esquerda sem sentido de orientação e que se define em oposição a fantasmas de um passado que nunca entenderam.
O que é a extrema-direita, no caso concreto que me assiste? Algo assimilável a um Maurras, a um Brasillach ou a um Primo de Rivera? Nem tanto. A Esquerda bem –pensante e dominante não precisa de armas tão pesadas para abater quem não lhe apara o jogo ideológico com cartas marcadas há dezenas de anos, em Portugal.
Basta-lhe tão só apelidar alguém de “fassista” para lograr todos os objectivos incluídos.  Até há alguns anos apelidar alguém de “direita”, mesmo a torto e a direito, tinha o mesmíssimo efeito deletério e dissolvente.  Agora carece de outro qualificativo mais contundente: “extrema”, já serve, se hifenizado a “direita”.
Assim, alguém que recorde o passado não muito distante mas acantonado à “longa noite fascista” e à ditadura e ainda à repressão e também ao analfabetismo e à pobreza e à emigração e à mortalidade infantil elevada é muito naturalmente um indivíduo de “extrema-direita”. Nada mais lhe assenta senão essa fatiota de recorte neo-realista. 
Se ainda por cima tal perigoso extremista se afadiga a tentar demonstrar a singeleza  anacrónica de uma esquerda enquistada em paradigmas fossilizados e protegidos pelo ar do tempo mediático, leva em cima do qualificativo outro ainda mais soturno: “ de província” e redundado de saudosismo. 
O saudosismo de valores vindos do tempo do tal “fascismo” com algumas décadas e já obliterado na memória colectiva, sobrepõe-se como  ideologicamente indigno do  outro saudosismo em que vicejam  e refocilam, vindo das calendas do séc. XIX em que as massas se oporiam à burguesia para vencerem a batalha da luta de classes, em cujo campo abandonado ainda se revêem.
É por mor da antiguidade que o posto do saudosismo esquerdistas tem preponderância sobre os demais, que por isso mesmo são relegados para  o sítio odioso da “província”, lugar de ancestral atraso na evolução ideológica e sítio de atavismos garantidos. 
Depois dessa primeira abordagem epistemológica surge uma outra típica do raciocínio integralmente  jacobino  em corolário de uma esquerda desorientada no tempo e no espaço: “catolicismo integralista”. Defender Bento XVI  com maior simpatia do que João Paulo II, por exemplo, é sinal inequívoco de seguidismo a LeFebvre e em sequência semântica e territorial , a Le Pen. Não há volta a dar: catolicismo integralista é LePen no bolso ideológico, como consequência religiosa inevitável da defesa da missa em latim, paradigma dos integristas  e só falta dar o passo seguinte que por distracção ficou olvidado: fundamentalismo.
Temperados estes ingredientes- extrema-direita integrista, provinciana e saudosista- resta cozinhar a receita caricatural: “magistratura justiceira com uma agenda política”.  “Cheia de justificações para os excessos” .
Esta cereja no bolo aziumado carece de maior atenção porque não tipifica apenas ideologia esquerdista requentada e de laxismo assegurado.
Os esquerdistas acicatados costumam ser, aliás, os principais agentes do desprezo da legalidade sempre que ficam em causa os seus interesses e conveniências. Como se sabe há muito, “ estão a cagar-se” para essas coisas, tipo segredo de justiça, se esta lhes chega ao rabo, por vezes literalmente.
Portanto, o que esta descarga aleivosa pretende dizer não é sério. “magistratura justiceira” não conheço a não ser em países como a Itália em que um punhado de magistrados de fibra e até de esquerda puseram fim a um regime de corrupção com décadas de moratória. 
É  essa pulsão que apelidam de justiceira que esta esquerda fingida pretende capar a todo o custo.  Qualquer veleidade investigatória, dentro da maior legalidade processual, se for contrária aos interesses dessa camarilha específica leva logo troco mediático. Ou porque  é “justiceira”; ou porque é persecutória e dá curso a cabalas  ou porque não respeita princípios tão sagrados quando o segredo de justiça em assuntos de interesse público gritante mas que deveriam ficar sempre escondidos dos eleitores, para que estes nunca viessem a saber o que andam a tramar nas suas costas.
Na ausência de um desses motivos de arremesso específico, o outro toma o seu lugar mediático com uma importância e valor elevados à enésima potência da deslegitimação do poder judicial.  Na falta de todos, entra em vigor o princípio geral do “justicialismo”, das “auto-justificações dos excessos” , dos “princípios que são para os outros”, etc etc.
Tudo isso comporta porém uma excepção: se os visados foram os adversários políticos, aí, já nenhum destes epítetos toma lugar de relevo mediático. Aí, os assuntos passam a ser todos “casos de polícia”, com a polícia a poder fazer o que muito bem entender porque tal se justificará plenamente.
Já chamei a esta gente “farsante”. Acrescento mais um qualificativo: pobres de espírito.

Questuber! Mais um escândalo!