O partido socialista tem, definitivamente, um problema com a Justiça. Um das propostas mais recentes do "projecto eleitoral" do PS previa a " garantia de protecção e defesa do titular de cargos políticos ou
públicos contra a utilização abusiva de meios judiciais e de mecanismos
de responsabilização como forma de pressão ou condicionamento". Parece que terá sido abandonada mas não é intenção para esquecer porque será represtinada de uma forma ou de outra, num futuro próximo se as circunstâncias eleitorais se proporcionarem.
Tal intenção mereceu esta crónica de Eduardo Dâmaso, do Correio da Manhã:
"António Costa tem-se esforçado por blindar o PS aos efeitos da prisão de
Sócrates. O seu "Projecto de Programa Eleitoral", pelo contrário,
promete uma verdadeira vingança contra a justiça e os jornalistas. É
certo que se trata de um "projecto" mas anuncia intenções legislativas
que são um perigo para a separação de poderes entre política e justiça e
para a liberdade de imprensa.
Na parte específica da justiça
tem dois pontos inteiramente dirigidos à remoção do juiz Carlos
Alexandre do Tribunal Central de Instrução Criminal. Um, anuncia a
possibilidade de distribuir os "actos processuais por tribunais com
menor carga processual, com base em critérios objectivos e transparentes
que satisfaçam as exigências do juiz natural". Se lembrarmos um dos
eixos da defesa de Sócrates, os seus advogados não escreveriam melhor.
Num
outro ponto, anuncia "a institucionalização de um regime de colocações e
de movimentação de magistrados capaz de proporcionar a estabilidade e o
desempenho de funções com o horizonte temporal necessário a uma boa
gestão processual". Traduzindo: Carlos Alexandre tem mesmo de ir ao
próximo concurso para desembargador e não pode continuar na 1ª
instância.
E que dizer da "garantia de protecção e defesa do
titular de cargos políticos ou públicos contra a utilização abusiva de
meios judiciais e de mecanismos de responsabilização como forma de
pressão ou condicionamento"? Se António Costa deixar passar estes e
outros dislates está a atirar ao lixo tudo o que de bom fez enquanto
ministro da Justiça e que não foi pouco."
A relação política do PS com a Justiça é fenómeno antigo, porque foi o próprio Almeida Santos, um dos Sombras da política portuguesa a dizê-lo, recentemente: “Fui fundamentalmente um legislador. Fiz dezenas de leis no próprio Conselho de Ministros, eram aprovadas
logo ali e publicadas. Posso ter a vaidade de ter sido eu um dos
principais artífices. Trazia de Moçambique uma linguagem jurídica e
pediram-me para fazer as leis. Dificilmente terá havido um legislador
que tenha feito tantas leis e tão rapidamente”.
A característica mais vincada do P.S. com a Justiça é a imediata subalternização dos magistrados e até a marginalização dos agentes da justiça sempre que um dos dirigentes do partido seja envolvido nas malhas de uma investigação criminal que coloque em risco o status quo. Nessa altura surge um reflexo instintivo de defesa corporativa do grupo, do partido e do status quo ameaçado, o que é feito sem qualquer pudor ou receio de denúncia democrática da campanha deslegitimadora e atentatória contra o princípio da separação de poderes.
Tal foi denunciado recentemente pela própria ministra da Justiça que afirmou claramente que receia uma limitação da separação de poderes se o PS ganhar as eleições. E que não haja dúvidas que assim sucederá, perante a anomia geral.
Tal sucedeu aquando do escândalo do fax de Macau e é certo e facto notório que a principal vítima escreveu um livro cuja denúncia das manigâncias do poder socialista, particularmente do decano Mário Soares, foram abafadas, até hoje.
O escândalo seguinte, da Casa Pia, ocorreu há cerca de dez anos e implicou profundas alterações na legislação penal. para dar garantias de defesa reforçadas a arguidos excelentíssimos.
Como tais garantias não foram suficientes, foram arranjadas outras, suplementares, em consequência de desenvolvimentos desse processo em que um dos envolvidos, Ferro Rodrigues, actual figura de proa do partido disse explicitamente ao actual líder Costa que se estava a "c. para o segredo de justiça". Nada lhe aconteceu e foi promovido a líder parlamentar.
O caso Freeport foi outro exemplo do despudor socialista perante a instância de controlo da investigação criminal em Portugal, com um PGR afecto aos críticos dessa investigação.
Com o caso Face Oculta assistiu-se a outra sucessão de escândalos envolvendo figuras gradas do P.S. com manifestações de propósitos idênticos de aviltamento dos investigadores judiciários e a novo ímpeto reformista do sistema legal.
As mais recentes condenações de outras figuras gradas do P.S. ainda sem trânsito em julgado e o culminar da investigação ao antigo primeiro-ministro socialista, preso em Évora, representam apenas mais um episódio desta saga que envergonha a democracia portuguesa e não é com o actual líder António Costa que isto vai mudar.
Nenhum outro partido em Portugal se atreve a este comportamento profundamente anti-democrático, sem custos eleitorais, até hoje.
O PS é um Partido Sem vergonha. A razão para tal reside na habituação anómica, na falta de denúncia vigorosa do poder judicial e de quem vendo tal estado de coisas, as aceita sem protestar.A razão profunda foi enunciada por um advogado, Ricardo Sá Fernandes: "o PS é um partido minado pela cultura do favor e da promiscuidade".