quarta-feira, outubro 25, 2017

A violência mediática

 O crime de violência doméstica, no centro da discussão mediática que se gerou após a publicitação do acórdão dos juizes desembargadores do Porto, continua a suscitar komentários nas redacções dos jornais nacionais.
Tais komentários são de confrangedora mediocridade, assentam em ilações apressadas tiradas da leitura enviesada de trechos do acórdão e visam denegrir a pessoa do juiz que relatou a decisão.

O tom geral deste ambiente de bullying mediático-ideológico ( é disto que se trata) é este mostrado no i de hoje que dá o mote geral para a opinião politicamente correcta e seguida de modo acéfalo pelos media e quem neles komenta. Não há uma única opinião divergente ou sequer discussão alargada ao tema em causa porque já reduzido a esta miséria moral desta desgraçada esganiçada, filha de um pirata de extrema-esquerda. Isto mostra bem onde Portugal já chegou e poucos se apercebem.


 O Público de hoje refina o estilo inquisitório e comete o delito de violência mediática contra o juiz em causa, num caso típico de bullying mediático, assim:



Recorde-se que o essencial, no caso concreto, era apenas saber se um crime de violência doméstica, praticado nas condições factuais relatadas no acórdão, merecia outra pena que não a que foi aplicada no tribunal da instância local de Felgueiras. A procuradora do MºPº local recorreu da decisão por entender que a pena era leve e merecia ser efectiva. O procurador do MºPº na Relação do Porto entendeu que a colega da primeira instância não tinha razão.Casos destes existem às dezenas ou centenas nos tribunais superiores, alguns precisamente por causa de assuntos idênticos e ninguém liga porque não é de ligar, sendo normal que tal aconteça. Neste caso, para se tornar singular, apenas bastou algo idiossincrático e aproveitável pela brigada activa do politicamente correcto, acéfalo e panúrgico até mais não.

Ninguém parece ligar a isto e quando ligam é apenas para proferir baboseiras escritas ou ditas, como foi o caso do komentador Miguel Sousa Tavares que de violência doméstica parece perceber a potes e de alcoolismo associado se calhar ainda mais. Talvez o jornalismo luso queira saber porquê, mas duvido, por causa da reverência parola que o assola.

Seja como for, o assunto é a violência doméstica como crime e não apenas o teor das considerações algo infelizes do desembargador ( por permitiram este evitável bullying mediático) que apenas omitiu a palavra "cônjuge" em vez de "mulher", para perorar inutilmente sobre o adultério e a sua carga desculpante no comportamento retorsivo do cônjuge enganado. Quem o critica agora deve entender que afinal o adultério de um dos cônjuges é coisa perfeitamente banal que o outro deve aceitar pacificamente, como corno manso e portanto do senso comum mais elementar.
Apesar da bizarria desta concepção anti-machista, foi isto, no final de contas, que  se transformou na pedra de toque da discussão mediática. Esta  já envolve os bispos nacionais e o presidente do STJ, em declarações também elas infelizes de todo porque acompanhantes de mais este percurso de panurgismo mediático. "Carneiros todos, com carne de obedecer", cantava Fausto em 1970.

Muito mais profícua que esta discussão aleivosa e enviesada seria a ponderação acerca do modo como a nossa lei e jurisprudência trata o fenómeno da violência doméstica, dos maus tratos entre pessoas de um casal e as agressões físicas resultantes.

Quando o juiz desembargador deambula no espaço de um ou dois parágrafos pela história pregressa do adultério enquanto delito entre o casal, ofensivo do dever de lealdade entre os cônjuges apresenta uma súmula histórica subjectiva e picotada da Bíblica e do Código Penal de 1886 ( em vigor até Janeiro de 1983, note-se) no sentido de afirmar uma convicção pessoal e afinal do senso comum mais elementar que agora se quer adulterar: o adultério é um factor lesivo do bem estar entre um casal e já foi valorado de modo muito severo, como se mostra nesses exemplos. Nada mais porque nada mais é possível extrair da decisão tomada. Se pudesse, em coerência o desembargador teria que absolver os arguidos e não o fez, apesar de alguns palermas dos media o terem afirmado.
Ontem já aqui coloquei os artigos do Código Penal anterior ao vigente em que se considerava crime punível com prisão maior, o adultério da mulher. E foi código que vigorou durante muitos anos de democracia...o que significa que os valores de sociedade agora enunciados, até com referência à Constituição, são mutáveis e por vezes de lenta evolução. O que aliás também é do senso comum, mas não desta violência mediática em curso contra decisões lidas de través.

Portanto, vejamos em pequeno resumo no que consiste o crime de violência doméstica, tal como tratado hoje na lei e jurisprudência. Não é um crime simples, a lei foi sendo modificada ao longo dos anos mais recentes e a última alteração de vulto é de 2007. 

 O actual crime de violência doméstica enuncia-se assim na lei penal:


 Artigo 152.º
Violência doméstica

1 - Quem, de modo reiterado ou não, infligir maus tratos físicos ou psíquicos, incluindo castigos corporais, privações da liberdade e ofensas sexuais:
a) Ao cônjuge ou ex-cônjuge;
b) A pessoa de outro ou do mesmo sexo com quem o agente mantenha ou tenha mantido uma relação de namoro ou uma relação análoga à dos cônjuges, ainda que sem coabitação;
c) A progenitor de descendente comum em 1.º grau; ou
d) A pessoa particularmente indefesa, nomeadamente em razão da idade, deficiência, doença, gravidez ou dependência económica, que com ele coabite;
é punido com pena de prisão de um a cinco anos, se pena mais grave lhe não couber por força de outra disposição legal.
2 - No caso previsto no número anterior, se o agente praticar o facto contra menor, na presença de menor, no domicílio comum ou no domicílio da vítima é punido com pena de prisão de dois a cinco anos.
3 - Se dos factos previstos no n.º 1 resultar:
a) Ofensa à integridade física grave, o agente é punido com pena de prisão de dois a oito anos;
b) A morte, o agente é punido com pena de prisão de três a dez anos.
4 - Nos casos previstos nos números anteriores, podem ser aplicadas ao arguido as penas acessórias de proibição de contacto com a vítima e de proibição de uso e porte de armas, pelo período de seis meses a cinco anos, e de obrigação de frequência de programas específicos de prevenção da violência doméstica.
5 - A pena acessória de proibição de contacto com a vítima deve incluir o afastamento da residência ou do local de trabalho desta e o seu cumprimento deve ser fiscalizado por meios técnicos de controlo à distância.
6 - Quem for condenado por crime previsto neste artigo pode, atenta a concreta gravidade do facto e a sua conexão com a função exercida pelo agente, ser inibido do exercício do poder paternal, da tutela ou da curatela por um período de um a dez anos.

 Quem consultar o sítio da PGDL de onde retirei o excerto, pode verificar que há muitos acórdãos em que se tenta definir o conceito de violência doméstica, sendo um dos últimos este que se transcreve:

  Ac. TRL de 01.06.2017 Violência doméstica. Prática reiterada. Humilhação pública. I - O crime de violência doméstica, autonomizado pela primeira vez pelo legislador, através da Lei n.º 59/2007, de 04 de Setembro, que alterou o Código Penal, visa proteger, em nossa opinião, não apenas a saúde, seja ela física, psíquica e mental, mas, antes, ao nível do bem jurídico, a integridade pessoal, prevista no artigo 25º da Constituição da República Portuguesa, ligado ? defesa da dignidade da pessoa humana, em todas as suas dimensões, em que se funda o Estado Português.II - Tendo em conta a definição do tipo legal, verifica-se que o crime de violência doméstica não exige a prática reiterada dos actos objectivos previstos no mesmo por parte do agente, mas exige que os mesmos se traduzam na humilhação da vítima ou numa especial desconsideração pela mesma.III - A humilhação pública a existir, resulta dos comportamentos inadequados e anti-sociais que ambos os arguidos demonstram no seu relacionamento conjugal, como, aliás, o comprovam as várias condenações a que foram sujeitos. Os arguidos humilham-se a si próprios ao procederem nos moldes que resultam dos factos provados, inexistindo uma supremacia de um sobre o outro, de modo a poder considerar-se, no caso concreto, que é vítima do referido crime de violência doméstica.IV - Não podendo o crime de violência doméstica ser cometido em reciprocidade por ambos os cônjuges, não nos parece que a circunstância de o arguido, após mais uma discussão na sua residência e troca de palavras junto a um estabelecimento com a arguida, ter ido no encalce desta e se ter aproximado do veículo em que ela se encontrava, possa se traduzir numa sujeição da mesma a humilhação pública ou desonra.


O actual código penal, quando foi publicado em Outubro de 1995 não tinha sequer este crime específico catalogado. Tinha o de maus tratos...e que aliás se manteve na redacção actual do Código que acrescentou o de violência doméstica.

 Artigo 152.º
Maus tratos ou sobrecarga de menores, de incapazes ou do cônjuge

1 - Quem, tendo ao seu cuidado, à sua guarda, sob a responsabilidade da sua direcção ou educação, ou como subordinado por relação de trabalho, pessoa menor, incapaz, ou diminuída por razão de idade, doença, deficiência física ou psíquica e:
a) Lhe infligir maus tratos físicos ou psíquicos ou a tratar cruelmente;
b) A empregar em actividades perigosas, desumanas ou proibidas; ou
c) A sobrecarregar com trabalhos excessivos;
é punido com pena de prisão de 1 a 5 anos, se o facto não for punível pelo artigo 144.º
2 - A mesma pena é aplicável a quem infligir ao cônjuge ou a quem com ele conviver em condições análogas às dos cônjuges maus tratos físicos ou psíquicos. O procedimento criminal depende de queixa.
3 - Se dos factos previstos nos números anteriores resultar:
a) Ofensa à integridade física grave, o agente é punido com pena de prisão de 2 a 8 anos;
b) A morte, o agente é punido com pena de prisão de 3 a 10 anos.

Assim, estes escribas de jornal que escrevem isto que se publica a seguir fariam melhor em deixar de ser carneiros panúrgicos e pensarem pela própria cabeça, mas depois de se informarem devidamente. E não embarcarem em correrias tontas por causas politicamente correctas que nem avaliam na devida dimensão e propósito.

Atacar juizes por delito de opinião descontextualizada é muito feio e indigno de jornalistas ou comentadores de ocasião.  Alguns, como Rainho do jornal i, são relapsos, o que agrava a aleivosia.


Ainda mais lamentável é não haver um único magistrado ou académico ou seja quem for que perceba destas matérias e defenda publicamente  o que deve ser defendido: o que o acórdão significa e não o significado que estas alimárias todas lhe andam a emprestar.

Todos se encolhem e alguns até concordam com a violência mediática pelos mesmíssimos motivos: nem leram a decisão mas aceitam pacificamente a opinião de quem a deturpa.

ADITAMENTO:

Afinal nem toda a gente enfileirou na correria mediática dos panurgos de serviço. Ainda há quem tenha senso e o diga em público. Ao contrário da cobardia ambiente, típica de alguma magistratura.

Mas é lamentável, triste e até desolador que a PGR, o CSM e a Ordem dos Advogados tenham vindo a terreiro fazer a tristíssima figura que andam a fazer. É sinal de que os que lá estão são fracos. Muito fracos.

O cúmulo da manipulação já chegou lá fora pela mão dos afadigados leitores de decisões que não existiram mas insistem em proclamar existentes.
Chega-se ao ponto de afirmar que  o Código Penal Português de 1886, citado no acórdão do tribunal da Relação do Porto, foi revogado pelo Código Penal de 1982, revisto pelo Decreto-Lei 48/95, de 15 de março. Assim, o Código Penal de 1886, citado no acórdão, não é fonte de direito português, não podendo ser utilizado pelos tribunais. A sua utilização revela a ineficácia da justiça portuguesa”. 

O Código Penal de 1886 "não é fonte de direito português" e "foi utilizado no acórdão"...não se dizendo se serviu ou não para manter a  decisão da primeira instância, mas indicando implicitamente tal facto falso.



Questuber! Mais um escândalo!