sexta-feira, setembro 30, 2022

Cinéfilo, o cóio da esquerda

 Hoje no Público, um certo António Roma Torres ( que não conheço nem fui ver ao Google para não influenciar o que vou escrever a seguir) faz um panegírico acerca de uma revista de cinema, artes e espectáculos em geral que começou a publicar uma segunda série ( a primeira acabara nos anos trinta) de uma revista chamada Cinéfilo, semanal, saída com data de 4 de Outubro de 1973 e acerca da qual já escrevi aqui no outro dia a propósito do fenómeno Godard. 


Como se lê, o autor evoca a nostalgia de ler, no nº 36 da revista, prestes a findar outra vez, um artigo que o mencionava como autor de apontamentos sobre o cinema português de antanho e da actualidade de então, a que o Cinéfilo dava uma atenção particular, pois dois dos seus realizadores eram directores da revista ( Fernando Lopes e António-Pedro Vasconcelos).

O artigo é o seguinte, tirado do referido número da revista, que aliás indica estar disponível online, mas só em anúncio, até agora:




Que importância é que isto tem? Pouca ou nenhuma a não ser para se verificar mais uma vez o predomínio da esquerda no panorama cultural nacional, da época e de agora. 

Curiosamente no escrito de agora, ART diz que o curto percurso da revista ( de Outubro de 1973 a Junho de 74) "é a prova de um tempo em que não houve imprensa livre", mas nem dá conta que afinal a revista acabou quando tal impedimento já não o deveria ser...

Em segundo lugar na evocação aparece um nome- Mário Castrim- como referência da crítica de televisão a quem o Cinéfilo deu importância e voz. Porquê? Simplesmente porque era um crítico comunista ( e católico...) que regularmente escrevia no Diário de Lisboa as suas anotações críticas sobre programas de televisão onde aproveitava para instilar um ideologia difusa contra o status quo vigente, sem contudo dizer ao que vinha. Era segredo e clandestino.

Devo confessar que na época apreciava muito o estilo de Mário Castrim, que me parecia um MEC avant la lettre no estilo, com apontamentos de um humor sarcástico e inovador. 

Apesar de Mário Castrim escrever no jornal desde  meados dos anos sessenta, só em 1972 dei pela sua escrita, numa crónica que até recortei, do Diário de Lisboa de 10 de Outubro de 1972:


Outras crónicas viriam como esta de 2 de Julho de 1973, num estilo quase de novo-jornalismo narrativo:

É verdade: adorava este estilo de escrita pelo que foi uma alegria quando vi no quiosque este número da revista, com data de final desse ano:








Quando li isto há quase 50 anos, ainda no início de uma adolescência tardia, já precedida de um estádio temporário de adultez, tinha o eco das crónicas que tinha lido no DL e as respostas pareciam-me cifradas, de algum modo. Mesmo quando o entrevistado citava alguns intelectuais que tinham ido à televisão e que sendo "homens das esquerdas" o deixaram ficar mal, emparelhados com os "homens das direitas" que aliás não nomeou. E "ficou muito por dizer". 
Não obstante era este tipo de entrevistas que mostravam uma realidade nacional em que a esquerda, mesmo comunista, se queixava do panorama cultural e de espectáculo, incluindo televisivo e que em breve, dali a alguns meses, iria mudar. 
Quando mudou lembrei-me de tudo isto e do papel prenunciador deste tipo de intervenção. A Censura não lhes permitia serem explícitos mas ficava tudo dito e pouco por dizer, apesar das queixas.

Quando se evoca a Cinéfilo, como o faz agora António Roma Torres ( que não sei quem seja, repito, mas vou já saber quando terminar a escrita...) é preciso ter isto em conta: a esquerda comunista e socialista de esquerda, então subterrânea e entregue a uma(s) dúzia(s) de intelectuais,  tomaram o poder em 25 de Abril de 1974 e mudaram o paradigma que eles mesmos já tinham imposto nos media, como eram estes. 
Os da "situação" eram tão anquilosados e retrógrados que acabaram, sem saudade para ninguém. E nunca mais se refizeram da tareia ideológica que apanharam, até hoje, o que é uma tragédia nacional. Quem lhes herdou o espólio parece até ter vergonha deles, traindo essa memória, como o apóstolo Pedro em relação Jesus. E não devia, claro está. 

Assim temos isto, estes artigos esparsos e estas homenagens enviesadas pela falta de isenção ideológica, como se a cultura fosse apenas isto e estes os seus representantes legítimos e legitimários. Os herdeiros...



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