sábado, maio 14, 2022

Exile on Main Street, os Rolling Stones há 50 anos

 Ao ler este pequeno artigo sobre o disco duplo dos Rolling Stones, Exile on Main Street, publicado em Maio de 1972, fiquei a pensar como é uma desgraça ler algo que se sente ser tudo copiado, ou seja, ter sido escrito por outros, antes e de modo original. 

Não leio no artigo nada que se sinta ser pessoal, experimentado na audição do disco ou vivido com a sua descoberta e vertido como opinião pessoal. Antes se detecta uma espécie de relato histórico, neste caso de um disco de música rock em que as fontes de conhecimento são completamente alheias, algumas delas apócrifas, ainda por cima. Uma das informações, aliás, pode nem ser verdadeira e induzir em erro quem ler. É a que se refere às escapadelas furtivas da então companheira de Keith Richards que teria aproveitado as sonecas  deste para se enrolar com o cantor Mick Jagger, traindo aquele. A historieta de coscuvilhice foi aliás mencionada pelo próprio Keith Richards na sua biografia, Life, de 2010, mas referida a um tempo anterior, durante as filmagens de Performance e portanto não nesta altura. Enfim, vale o que vale, quase nada e a própria, antes de morrer em 2017 já tinha desmentido tal facto. 

Pode escrever-se daquele modo, sim, mas mostrando onde se foi buscar a informação e até a opinião, mas nem isso sucede porque o artigo aparece como sendo de veia original e destinado a ilustrar eventuais interessados quando se baseia em informação recolhida em sítios não identificados e alheios e que podem muito bem ser plagiados que não se queixam. 

De resto para que serve falar de um disco de rock, neste caso dos Rolling Stones, do longínquo ano de 1972, a propósito da efeméride redonda dos 50 anos? 

Uma razão pode ser, evidentemente, a de que tal disco foi importante para a música popular, nesse ano e vindouros, o que aliás é muito duvidoso, mas aceita-se. Outra pode ser uma variação disso: o disco marcou uma época e uma geração e tornou-se de algum modo mítico, nesse contexto. 

É essa a minha perspectiva e por isso apetece-me escrever sobre o mesmo e o contexto que o rodeou na altura, para lembrar como foi. 

Depois da publicação, no ano anterior, do lp Sticky Fingers, acompanhado da nova iconografia do grupo, de língua bem estendida e músicas para ouvir na jukebox, o novo disco foi outro estouro mediático. 

Era duplo e tinha uma capa ainda mais intrigante que o anterior, com uma colagem de pequenas fotos a preto e branco, com imagens circenses e as letras do título e nome do grupo inscritas como um carimbo, tal como o anterior, embora neste caso manuscritas a tinta rosada.

Uma imagem de um disco destes, num escaparate de discoteca nota-se e sobressaía, nessa altura:

Imagem do lp em versão original americana e inglesa ( esta, à direita,  mais escurecida pelo mesmo tempo) e duas edições em cd; a primeira de 1994,  de origem americana, "rematrizada" por Bob Ludwig e apresentada com réplica da capa original, incluindo os 12 postais em folio e a outra de 2010, de origem alemã, em digipack desdobrável e da Promotone/Polydor.

Por outro lado o disco, à semelhança do anterior, foi publicitado e acompanhado de pequenos posteres que me lembro de guardar; um deles com este aspecto intrigante e reproduzindo uma das fotos da capa. Durante algum tempo ficou colado com fita cola, na parte de dentro da porta do quarto. O original estragou-se por causa disso,  mas esta cópia serve para mostrar:


Quanto à música era do mesmo género do anterior, pouco ou nada acrescentava, mas com os Rolling Stones sempre fora assim, a partir do final dos sessenta e até antes segundo o crítico da Rock &Folk, Philippe Paringaux, um dos directores da revista. 

 Num artigo especial de recensão, com várias páginas, analisando canção a canção e publicado logo na edição de Junho de 1972, os Stones eram...rock e os discos de há dez anos a essa parte eram...rock. E continuariam a ser porque o do ano seguinte- Goat´s Head Soup- é mais do mesmo e ainda assim "i like it", talvez ainda mais do que este e o outro a seguir, de 1974- It´s only rock n roll- é mesmo isso, "but i like it" também:






Por cá a crítica de 1972 resumia-se à Mundo da Canção ( e a um Musicalíssimo que não tenho) e num anúncio de Setembro desse ano trazia o preço: 315$00. Mais que um par de calças Levi´s em bombazine, na mesma altura..



Portanto um novo disco dos Stones, em 1972 e a seguir a Sticky Fingers era mesmo um acontecimento cultural musical e foi-o certamente para mim e para muitos, nessa altura.  
A música no entanto era a mesma de sempre e assim ficou durante décadas. Algumas canções tornaram-se clássicos nos concertos do grupo, como Tumbling Dice ou All Down the Line, mas o que eu então- e agora- gostava de ouvir era mais o Sweet Virginia com tintas de country ou a seguinte, Torn and Frayed. Ainda não percebia as letras mas gostava da música e do ritmo e da aura à volta do disco, aliás como sucedia com outros discos desse tempo. 
A música tinha um significado mais completo que hoje porque se ouvia como novidade e era acompanhada pelo que a rodeava. Hoje é apenas a memória do tempo que vivi, como cantava Milton Nascimento na Saudade dos aviões da Panair, do disco Minas de 1975. 
Em 2010 para alimentar essa memória junto de outros que então experimentaram o mesmo, foi republicado o disco, com 10 temas suplementares, para comemorar antecipadamente a efeméride dos trinta anos  e as revistas inglesas e americanas não se fizeram rogadas e voltaram a escrever sobre o disco. 
A mais completa é da Guitar World, americana, de Junho de 2010:









 E também a Uncut inglesa deu uma achega, ajudando a entender o que rodeou a gravação do disco e o que o mesmo significou na época, ajudando à formação do mito, aliás agradável de rememorar:





E até Bill Wyman, um dos membros do grupo publicou um livro em 2002 mostrando como foi, em 1972:





Há mais documentação, da Record Collector, da Rolling Stone e outros e ainda de livros avulsos. mas por hoje chega esta, porque me aborreceu ler aquilo no Observador, sem chama, originalidade ou interesse. É pena.
Em complemento e como ajuda a plagiadores que podem querer dar a entender que ouviram as canções dos Rolling Stones e percebem o seu significado e origem fica aqui um volume de 2016, da autoria de  Philippe Margotin e Jean-Michel Guesdon que em cerca de 700 páginas explicam virtualmente todas as letras das canções do grupo bem como a sua origem e curiosidades acerca das mesmas. 


Como exemplo fica o verbete sobre a canção Sweet Virginia do aludido disco.


E já agora, o som do disco, incluindo o dos cd´s apontados? 

Pois o lp original de 1972 teve a edição inglesa, saída em 12 de Maio de 1972 e a americana, da mesma altura. Qual a melhor? 

Já comparei várias vezes, a dos discos acima mostrados. Influenciado pela opinião de um expert francês, Philippe Manoeuvre, tenho a dizer que a versão americana, na prensagem Monarch é a que se deve ouvir para extrair tudo o que o som do disco pode oferecer. A inglesa fica um pouco atrás no que ao som dos graves diz respeito. Mas apenas um pouco e só com alguma atenção se dá conta. 
Quanto aos cd´s, o melhor é esquecer se quisermos comparar com o som do vinil. A não ser que se arranje uma aparelhagem de alto coturno, do género que a Nagra suíça ou a dCS britânica vendem e que acopladas a amplificadores de igual gabarito possam restituir a fidelidade exigível. Mas para tal é preciso dispor de muitos milhares de euros...ou então arranjar a versão em sacd que aliás não tenho e nunca ouvi mas suspeito que seja muito melhor que o cd normal. 
Não é que o som do cd reproduzido por aparelhagens vulgares não seja bom. É. O problema é que o bom é inimigo do óptimo e para alcançar este, só mesmo com o vinil. De preferência original e prensado pela Monarch com matriz Artisan, americanas. Só este reproduz o ar do tempo e é isso que se torna precioso. 
E quanto a diferenças entre o cd americano de 1994, rematrizado pelo especialista Bob Ludwig e o produzido pelos alemães, em 2010, provavelmente com a mesma origem digital, o som diferencia-se a favor do americano, mais "cheio" e portanto com maior dinâmica, sobressaindo mais os graves. O som alemão é mais anémico. 
Se alguém se der ao trabalho, por curiosidade, em procurar saber o que pensam outros maníacos do som, como de algum modo- hélas!- me considero, pode confirmar tais impressões.
As mesmas questões se podem colocar em relação a um disco parecido no formato, na capa e nas prensagens e respectiva sonoridade: Physical Grafitti, dos Led Zeppelin, também com prensagem americana e inglesa sujeitas a escrutínio apertado. Mas é de 1975 e por isso a data redonda ainda vai demorar um bocado. Veremos então como será, se Deus quiser.

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