Imagens do Correio da Manhã de Sábado e Domingo.
Na última Sexta-Feira, o procurador-geral da República, foi ao Parlamento, responder a perguntas da Comissão de Orçamento e Finanças, por causa do escândalo BPN.
Em suma e com substância relevante, disse que o Ministério Público não está preparado nem especializado, para lidar com crimes económicos e financeiros. Assim mesmo, sem peias. E acrescentou que o sucesso no combate à criminalidade económica tem sido relativamente pouco. E mais ainda: o MP precisa de ter a humildade de reconhecer que precisa de ajuda. De quem? Das entidades que percebem um pouco mais do assunto: Banco de Portugal, Inspecção- Geral de Finanças, entre outras.
Eduardo Dâmaso, director-adjunto do Correio da Manhã, no Domingo, escrevia na sua crónica de Dia a Dia que o MP anda há duas décadas com este problema. Desde Cunha Rodrigues, como PGR, que o MP tem que pedir ao Governo a colaboração de inspectores da IGF ou ao BdP a investigação de crimes económicos de certa natureza.
No mesmo dia, Domingo, António Cluny do MP, declara muito simplesmente ao mesmo jornal que "A Justiça não está preparada para punir os poderosos". E ainda mais: "A Justiça não temn meios suficientes para dar uma resposta eficaz aos crimes económicos e de corrupção". Melhor: " A Justiça não foi pensada para punir os poderosos, mas para outro fim."
Estes factos, que já são proclamados publicamente, aparentemente sem qualquer reverberação de escândalo, são vergonhosos para uma democracia que se preze e só por si, deveriam fazer soar todas as campainhas do alarme público, por causa da ausência de garantias de uma investigação criminal competente e autónoma como a própria Constituição refere. Pois bem. Estes factos e afirmações de quem sabe, por estar por dentro dos problemas, teve quase zero referências na imprensa escrita do dia seguinte, tirando o Correio da Manhã ( o Público, pela mão de Ana Brito, nem cheirou o assunto, para além do habitual rodriguinho de factos desconexos). Teve mesmo zero referências, nos semanários de Sábado, o Sol e o Expresso, certamente já com as manchetes prontas para as impressoras replicarem e o assunto não dava para parar rotativas.
O Expresso, deu conta de um epifenómeno que obviamente, tem tudo a ver com o assunto: a própria CGD que já não merece a confiança dos estrangeiros, para empréstimos avultados. O Sol, refere o possível âmbito criminal do caso BPP. Estes jornais, olham para a floresta de enganos, nestes assuntos e escolhem as árvores a abater. O resto, afigura-se-lhes como um palácio para um qualquer boy.
E no entanto, o problema vem de há muito tempo, como Eduardo Dâmaso refere. Mais propriamente, vem desde o final dos anos oitenta, com a introdução do Direito Comunitário e os novos impostos de IRS, IRC. IVA e regras de cobrança e ainda do direito bancário e da bolsa surgido com as privatizações e o mercado bolsista.
Todas as questões jurídicas que foram surgindo, específicas desse sector importantíssimo para a economia de qualquer país, ficaram de algum modo à margem dos curricula normais dos cursos de Direito.
As matérias que lidam directamente com o mercado de capitais, bolsista, do direito bancário e especificamente económicas, não eram e não são ensinadas devidamente a estudantes do curso de Direito. Ao acabarem os respectivos cursos, ingressam no CEJ, onde frequentam outro curso de um ano ou dois, para se inteirarem dos aspectos, outra vez teóricos e também práticos das profissões forenses ligadas à magistratura. Nenhum juiz ou magistrado do MP, saiu do CEJ, com conhecimentos suficientes para lidar com os assuntos em causa, como reconhece e avisa o actual PGR, Pinto Monteiro. Por isso, a falta de preparação teórica e prática é notória, grave e de consequências à vista de quem souber ver.
No decurso dos anos, durante os anos noventa, as questões foram surgindo, sempre cada vez mais complexas e relacionadas com alguns processos mediáticos, como por exemplo o caso Moderna. Sempre que foi necessário analisar facturas, contratos, documentos contabilísticos e operações bancárias e bolsistas, o MP recorreu a entidades externas, do próprio Estado é certo, quando não foram essas mesmas entidades externas quem lhes enviaram as denúncias concretas sobre a criminalidade económico-financeira,de maior repercussão.
Foi isso que sucedeu nos últimos anos do século XX, com uma então prestigiada Inspecção-Geral de Finanças, onde trabalhavam verdadeiros especialistas e com reputada independência relativamente ao poder político. Este poder, ao longo dos anos, apercebeu-se, logicamente do fenómeno e tratou, como não podia deixar de ser, de colocar lá os seus peões de brega, para tudo continuar como dantes, do lado do sectarismo: é dos nossos, é para proteger; é dos deles, é para dizimar. A coisa está assim, agora. E não vai mudar, logicamente.
Durante alguns anos, a PGR de Cunha Rodrigues, depois de alertar para o fenómeno, conseguiu uma aberta: foi criado o NAT, o núcleo de apoio técnico, com pessoas especializadas e que davam apoio nessa área, a todos os magistrados do país que dele necessitassem. O primeiro responsável, foi, curiosamente, o procurador Daniel Sanches, agora na berlinda por causa do BPN.
Geralmente, tudo o que metia contabilidades e facturas, mais negócios bancários pelo caminho , sendo quase chinês para os magistrados, sejam eles juízes, sejam do MP, era tarefa do NAT. E depois, foi o que se viu e vê: os apoios escassos, os especialistas a rarear ou por mero voluntarimso e o NAT desnaturado, quase desde o início. O poder político, não quer que o incomodem e alguns acomodam-se bem com isso.
Como é que esta questão, importante e essencial, se poderia resolver?
Há um modo imediato e que poderia dar os seus frutos daqui a algum tempo: pagar ou patrocinar a formação especializada a magistrados que assim o pretendessem e mostrassem capacidade para assumirem responsabilidades, nessa área. O DCIAP e os DIAPS precisam disso como de ar para respirar a autonomia que deviam ter e lhes é garantida constitucionalmente. E não têm.
Em Coimbra, de alguns anos a esta parte, existe um curso de pós-graduação, em Direito Bancário, da Bolsa e Seguros. O curso com a duração de um um ano, funciona no seio da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, animado por uma associação privada sem fins lucrativos, onde se inscrevem todos os anos, 40 interessados que pagam boas propinas ( 1650 euros, com inscrição), certamente para benefício e prestígio da Faculdade.
Os professores, pouco mais de uma dúzia e de Direito, são alguns catedráticos, como Mota de Campos, Lopes Porto e Calvão da Silva, o mentor principal. O curso, percorre todas as matérias com interesse e com a finalidade suficientes para se evitarem no futuro próximo, declarações como as acima mostradas.
Parece-me no entanto, óbvio que esta sugestão, não só não encontrará qualquer eco, seja no MP, seja na Judicial, como o assunto será adiado mais uma vez, o tempo suficiente, para no ano que vem e a seguir também, o tema possa servir de mote para declarações ainda mais negras dos responsáveis pela Justiça.
Seria muito difícil arranjar 1600 euros para pagar o curso a cada um dos magistrados que assim o desejassem, como seria ainda mais difícil arranjar tempo e oportunidade para a frequência: o curso é ao fim de semana, de Outubro a Junho.
Sendo assim, estamos em pleno domínio dos magistrados diletantes, a pedir ajuda e batatinhas aos políticos do Executivo e das instituições que dirigem, ao sabor das suas agendas profissionais e do seu tempo de trabalho.
Querem um exemplo disto mesmo? O caso que envolve o ex-professor de José Sócrates, na Independente , António Morais. O processo está nos tribunais, pendente.
Todos os jornalistas interessados no assunto, deveriam consultar os autos, já em fase de julgamento, para verem e darem a conhecer como se investiga a criminalidade económica em Portugal.
ADITAMENTO, em 24.12.2008:
Sobre a entrevista de A. Cluny, Alberto Ruço, juiz de direito, produziu um comentário fabuloso, na revista digital InVerbis. Transcrevo integralmente para se ler o que é preciso, e que A. Cluny não consegue transmitir nas suas entrevistas :
Alberto Ruço
1. Parece-me que estamos perante uma boa entrevista, pela informação que transmite.
Pena é que não seja lida e que a grande maioria dos portugueses não perceba o que está em jogo.
2. A justiça não está, efectivamente, preparada para julgar quem tem poder.
Não está porque, tradicionalmente, quem tem poder não é julgado.
Julgado por fazer o quê?
A justiça está preparada para julgar, por exemplo, homicídios ( em regra, são processos simples quando comparados com a sua gravidade), ofensas corporais, roubos, furtos, violações, injúrias, alguma corrupção.
Processos de fácil investigação e cujos julgamentos começam e acabam em um dia, dois ou três.
Para além deste tipo de criminalidade, a justiça já começa a ter dificuldades, provavelmente porque não tem meios, nem legais, nem humanos.
Os poderosos não cometem, pessoalmente, homicídios, ofensas corporais, roubos, furtos... .
Se querem cometer crimes deste tipo, mandam outros sujar as mãos e estes, provavelmente, nem sabem quem são os principais mandantes.
Os poderosos cometem outro tipo de crimes, ligados à economia e à finança; ao grande tráfico de influências, à grande corrupção, ao grande abuso de poder, ao grande roubo ou furto, etc..
3. Quem é que colabora com as autoridades policiais ou com o Ministério Público quando se trata de investigar este tipo de crimes, alguns quase invisíveis?
Quem é que abre a boca?
Quem se arrisca a perder empregos, a estragar a vida, a nunca progredir na carreira, a ver a vida andar para trás?
Para já não falar em perder a vida ou o sossego dele e dos seus.
Por aqui não vamos lá.
Mas se se consegue alguma investigação, fruto de escutas telefónicas, alguma documentação apreendida, do o próprio trabalho dos investigadores que podem eventualmente ser testemunhas dos próprios crimes quando estes ocorrem no decurso da investigação, há ainda que contar com a dificuldade em julgar estas pessoas.
4. Nos julgamentos penais vê-se, com assiduidade, que quem confessa são os desgraçados, ainda que possam ser extremamente violentos; são tidos publicamente como maus e não têm problemas em assumir também, publicamente, que são maus, confessando.
Como é óbvio, quem tem poder tem boa imagem social e elevada auto-estima.
Se por hipótese cometeu um crime, dificilmente confessa o que quer que seja e faz tudo para que a investigação não dê frutos e se for acusado defende-se com unhas e dentes.
É perfeitamente compreensível.
Se puder contar com ajuda da comunicação social tem a vida mais facilitada.
É expectável que uma pessoa destas não coloque obstáculos à investigação e assuma publicamente que é uma mau cidadão, que praticou acções criminosas?
5. O nosso código de processo penal permite que um advogado, na função de defensor do arguido, requeira quase tudo, desde que tenha a mínima ligação com o objecto do processo e possa recorrer de tudo o que indefira os seus requerimentos, quer para o tribunal da Relação, para o Supremo Tribunal e para o Tribunal Constitucional.
Sem que haja qualquer sanção económica, disciplinar ou outra adequada, a aplicar após a conclusão do processo, consoante fosse de justiça, quer para o arguido ou para o advogado, consoante os casos.
Ou seja, pode-se fazer quase tudo, sendo o limite a consciência de cada um.
Ora, isto, tanto pode funcionar bem, como mal, em termos sociais.
6. Depois, temos ainda o problema da formação da convicção do juiz e da sua explanação ( com ou sem júri, é igual).
O que é necessário fazer para provar ou dar como não provado «x» ou «y»; para que um tribunal forme a sua convicção num ou noutro sentido?
Aqui passamo-nos, literalmente, para a face oculta da Lua.
E como não há um método e um conhecimento ou ideia comum do que seja isto da « livre convicção do juiz», então, é simples, vale tudo, mesmo tudo.
Isto é, como não sabemos do que estamos a falar, tudo é prova; qualquer palavra, discrepância, contradição é explorada até à exaustão; pode-se requerer qualquer coisa, sob pena de choverem protestos, quer na sala de audiências, quer à saída do tribunal, quer na imprensa, acusando o juiz de ser parcial, de estar contra o arguido, de já ter tomado a decisão e por aí fora.
Choverem mais requerimentos e recursos.
Podem moer-se, sem dó, pudor ou piedade, as testemunhas, as vítimas, os peritos, toda a gente, pois tudo tem de ser permitido, desde que o arguido entenda que tem interesse.
E se alguém quiser descarregar o stress, já sabe que há um destinatário: o juiz, os tribunais, a Justiça, previamente culpados de tudo o que possa correr mal.
7. A forma como a lei de processo permite que o sistema de justiça funcione pode transformar qualquer processo numa casa de horrores para alguns dos intervenientes.
Isto não tem que ser assim; não pode ser assim; há que trabalhar no sentido de dignificar a justiça, porque uma sociedade sem justiça suga a dignidade às pessoas e é muito mau viver numa sociedade de pessoas que não se sentem com dignidade, porque aquelas que sentem que a perderam, também não querem que os outros a tenham, nem lha reconhece! :
Em suma e com substância relevante, disse que o Ministério Público não está preparado nem especializado, para lidar com crimes económicos e financeiros. Assim mesmo, sem peias. E acrescentou que o sucesso no combate à criminalidade económica tem sido relativamente pouco. E mais ainda: o MP precisa de ter a humildade de reconhecer que precisa de ajuda. De quem? Das entidades que percebem um pouco mais do assunto: Banco de Portugal, Inspecção- Geral de Finanças, entre outras.
Eduardo Dâmaso, director-adjunto do Correio da Manhã, no Domingo, escrevia na sua crónica de Dia a Dia que o MP anda há duas décadas com este problema. Desde Cunha Rodrigues, como PGR, que o MP tem que pedir ao Governo a colaboração de inspectores da IGF ou ao BdP a investigação de crimes económicos de certa natureza.
No mesmo dia, Domingo, António Cluny do MP, declara muito simplesmente ao mesmo jornal que "A Justiça não está preparada para punir os poderosos". E ainda mais: "A Justiça não temn meios suficientes para dar uma resposta eficaz aos crimes económicos e de corrupção". Melhor: " A Justiça não foi pensada para punir os poderosos, mas para outro fim."
Estes factos, que já são proclamados publicamente, aparentemente sem qualquer reverberação de escândalo, são vergonhosos para uma democracia que se preze e só por si, deveriam fazer soar todas as campainhas do alarme público, por causa da ausência de garantias de uma investigação criminal competente e autónoma como a própria Constituição refere. Pois bem. Estes factos e afirmações de quem sabe, por estar por dentro dos problemas, teve quase zero referências na imprensa escrita do dia seguinte, tirando o Correio da Manhã ( o Público, pela mão de Ana Brito, nem cheirou o assunto, para além do habitual rodriguinho de factos desconexos). Teve mesmo zero referências, nos semanários de Sábado, o Sol e o Expresso, certamente já com as manchetes prontas para as impressoras replicarem e o assunto não dava para parar rotativas.
O Expresso, deu conta de um epifenómeno que obviamente, tem tudo a ver com o assunto: a própria CGD que já não merece a confiança dos estrangeiros, para empréstimos avultados. O Sol, refere o possível âmbito criminal do caso BPP. Estes jornais, olham para a floresta de enganos, nestes assuntos e escolhem as árvores a abater. O resto, afigura-se-lhes como um palácio para um qualquer boy.
E no entanto, o problema vem de há muito tempo, como Eduardo Dâmaso refere. Mais propriamente, vem desde o final dos anos oitenta, com a introdução do Direito Comunitário e os novos impostos de IRS, IRC. IVA e regras de cobrança e ainda do direito bancário e da bolsa surgido com as privatizações e o mercado bolsista.
Todas as questões jurídicas que foram surgindo, específicas desse sector importantíssimo para a economia de qualquer país, ficaram de algum modo à margem dos curricula normais dos cursos de Direito.
As matérias que lidam directamente com o mercado de capitais, bolsista, do direito bancário e especificamente económicas, não eram e não são ensinadas devidamente a estudantes do curso de Direito. Ao acabarem os respectivos cursos, ingressam no CEJ, onde frequentam outro curso de um ano ou dois, para se inteirarem dos aspectos, outra vez teóricos e também práticos das profissões forenses ligadas à magistratura. Nenhum juiz ou magistrado do MP, saiu do CEJ, com conhecimentos suficientes para lidar com os assuntos em causa, como reconhece e avisa o actual PGR, Pinto Monteiro. Por isso, a falta de preparação teórica e prática é notória, grave e de consequências à vista de quem souber ver.
No decurso dos anos, durante os anos noventa, as questões foram surgindo, sempre cada vez mais complexas e relacionadas com alguns processos mediáticos, como por exemplo o caso Moderna. Sempre que foi necessário analisar facturas, contratos, documentos contabilísticos e operações bancárias e bolsistas, o MP recorreu a entidades externas, do próprio Estado é certo, quando não foram essas mesmas entidades externas quem lhes enviaram as denúncias concretas sobre a criminalidade económico-financeira,de maior repercussão.
Foi isso que sucedeu nos últimos anos do século XX, com uma então prestigiada Inspecção-Geral de Finanças, onde trabalhavam verdadeiros especialistas e com reputada independência relativamente ao poder político. Este poder, ao longo dos anos, apercebeu-se, logicamente do fenómeno e tratou, como não podia deixar de ser, de colocar lá os seus peões de brega, para tudo continuar como dantes, do lado do sectarismo: é dos nossos, é para proteger; é dos deles, é para dizimar. A coisa está assim, agora. E não vai mudar, logicamente.
Durante alguns anos, a PGR de Cunha Rodrigues, depois de alertar para o fenómeno, conseguiu uma aberta: foi criado o NAT, o núcleo de apoio técnico, com pessoas especializadas e que davam apoio nessa área, a todos os magistrados do país que dele necessitassem. O primeiro responsável, foi, curiosamente, o procurador Daniel Sanches, agora na berlinda por causa do BPN.
Geralmente, tudo o que metia contabilidades e facturas, mais negócios bancários pelo caminho , sendo quase chinês para os magistrados, sejam eles juízes, sejam do MP, era tarefa do NAT. E depois, foi o que se viu e vê: os apoios escassos, os especialistas a rarear ou por mero voluntarimso e o NAT desnaturado, quase desde o início. O poder político, não quer que o incomodem e alguns acomodam-se bem com isso.
Como é que esta questão, importante e essencial, se poderia resolver?
Há um modo imediato e que poderia dar os seus frutos daqui a algum tempo: pagar ou patrocinar a formação especializada a magistrados que assim o pretendessem e mostrassem capacidade para assumirem responsabilidades, nessa área. O DCIAP e os DIAPS precisam disso como de ar para respirar a autonomia que deviam ter e lhes é garantida constitucionalmente. E não têm.
Em Coimbra, de alguns anos a esta parte, existe um curso de pós-graduação, em Direito Bancário, da Bolsa e Seguros. O curso com a duração de um um ano, funciona no seio da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, animado por uma associação privada sem fins lucrativos, onde se inscrevem todos os anos, 40 interessados que pagam boas propinas ( 1650 euros, com inscrição), certamente para benefício e prestígio da Faculdade.
Os professores, pouco mais de uma dúzia e de Direito, são alguns catedráticos, como Mota de Campos, Lopes Porto e Calvão da Silva, o mentor principal. O curso, percorre todas as matérias com interesse e com a finalidade suficientes para se evitarem no futuro próximo, declarações como as acima mostradas.
Parece-me no entanto, óbvio que esta sugestão, não só não encontrará qualquer eco, seja no MP, seja na Judicial, como o assunto será adiado mais uma vez, o tempo suficiente, para no ano que vem e a seguir também, o tema possa servir de mote para declarações ainda mais negras dos responsáveis pela Justiça.
Seria muito difícil arranjar 1600 euros para pagar o curso a cada um dos magistrados que assim o desejassem, como seria ainda mais difícil arranjar tempo e oportunidade para a frequência: o curso é ao fim de semana, de Outubro a Junho.
Sendo assim, estamos em pleno domínio dos magistrados diletantes, a pedir ajuda e batatinhas aos políticos do Executivo e das instituições que dirigem, ao sabor das suas agendas profissionais e do seu tempo de trabalho.
Querem um exemplo disto mesmo? O caso que envolve o ex-professor de José Sócrates, na Independente , António Morais. O processo está nos tribunais, pendente.
Todos os jornalistas interessados no assunto, deveriam consultar os autos, já em fase de julgamento, para verem e darem a conhecer como se investiga a criminalidade económica em Portugal.
ADITAMENTO, em 24.12.2008:
Sobre a entrevista de A. Cluny, Alberto Ruço, juiz de direito, produziu um comentário fabuloso, na revista digital InVerbis. Transcrevo integralmente para se ler o que é preciso, e que A. Cluny não consegue transmitir nas suas entrevistas :
Alberto Ruço
1. Parece-me que estamos perante uma boa entrevista, pela informação que transmite.
Pena é que não seja lida e que a grande maioria dos portugueses não perceba o que está em jogo.
2. A justiça não está, efectivamente, preparada para julgar quem tem poder.
Não está porque, tradicionalmente, quem tem poder não é julgado.
Julgado por fazer o quê?
A justiça está preparada para julgar, por exemplo, homicídios ( em regra, são processos simples quando comparados com a sua gravidade), ofensas corporais, roubos, furtos, violações, injúrias, alguma corrupção.
Processos de fácil investigação e cujos julgamentos começam e acabam em um dia, dois ou três.
Para além deste tipo de criminalidade, a justiça já começa a ter dificuldades, provavelmente porque não tem meios, nem legais, nem humanos.
Os poderosos não cometem, pessoalmente, homicídios, ofensas corporais, roubos, furtos... .
Se querem cometer crimes deste tipo, mandam outros sujar as mãos e estes, provavelmente, nem sabem quem são os principais mandantes.
Os poderosos cometem outro tipo de crimes, ligados à economia e à finança; ao grande tráfico de influências, à grande corrupção, ao grande abuso de poder, ao grande roubo ou furto, etc..
3. Quem é que colabora com as autoridades policiais ou com o Ministério Público quando se trata de investigar este tipo de crimes, alguns quase invisíveis?
Quem é que abre a boca?
Quem se arrisca a perder empregos, a estragar a vida, a nunca progredir na carreira, a ver a vida andar para trás?
Para já não falar em perder a vida ou o sossego dele e dos seus.
Por aqui não vamos lá.
Mas se se consegue alguma investigação, fruto de escutas telefónicas, alguma documentação apreendida, do o próprio trabalho dos investigadores que podem eventualmente ser testemunhas dos próprios crimes quando estes ocorrem no decurso da investigação, há ainda que contar com a dificuldade em julgar estas pessoas.
4. Nos julgamentos penais vê-se, com assiduidade, que quem confessa são os desgraçados, ainda que possam ser extremamente violentos; são tidos publicamente como maus e não têm problemas em assumir também, publicamente, que são maus, confessando.
Como é óbvio, quem tem poder tem boa imagem social e elevada auto-estima.
Se por hipótese cometeu um crime, dificilmente confessa o que quer que seja e faz tudo para que a investigação não dê frutos e se for acusado defende-se com unhas e dentes.
É perfeitamente compreensível.
Se puder contar com ajuda da comunicação social tem a vida mais facilitada.
É expectável que uma pessoa destas não coloque obstáculos à investigação e assuma publicamente que é uma mau cidadão, que praticou acções criminosas?
5. O nosso código de processo penal permite que um advogado, na função de defensor do arguido, requeira quase tudo, desde que tenha a mínima ligação com o objecto do processo e possa recorrer de tudo o que indefira os seus requerimentos, quer para o tribunal da Relação, para o Supremo Tribunal e para o Tribunal Constitucional.
Sem que haja qualquer sanção económica, disciplinar ou outra adequada, a aplicar após a conclusão do processo, consoante fosse de justiça, quer para o arguido ou para o advogado, consoante os casos.
Ou seja, pode-se fazer quase tudo, sendo o limite a consciência de cada um.
Ora, isto, tanto pode funcionar bem, como mal, em termos sociais.
6. Depois, temos ainda o problema da formação da convicção do juiz e da sua explanação ( com ou sem júri, é igual).
O que é necessário fazer para provar ou dar como não provado «x» ou «y»; para que um tribunal forme a sua convicção num ou noutro sentido?
Aqui passamo-nos, literalmente, para a face oculta da Lua.
E como não há um método e um conhecimento ou ideia comum do que seja isto da « livre convicção do juiz», então, é simples, vale tudo, mesmo tudo.
Isto é, como não sabemos do que estamos a falar, tudo é prova; qualquer palavra, discrepância, contradição é explorada até à exaustão; pode-se requerer qualquer coisa, sob pena de choverem protestos, quer na sala de audiências, quer à saída do tribunal, quer na imprensa, acusando o juiz de ser parcial, de estar contra o arguido, de já ter tomado a decisão e por aí fora.
Choverem mais requerimentos e recursos.
Podem moer-se, sem dó, pudor ou piedade, as testemunhas, as vítimas, os peritos, toda a gente, pois tudo tem de ser permitido, desde que o arguido entenda que tem interesse.
E se alguém quiser descarregar o stress, já sabe que há um destinatário: o juiz, os tribunais, a Justiça, previamente culpados de tudo o que possa correr mal.
7. A forma como a lei de processo permite que o sistema de justiça funcione pode transformar qualquer processo numa casa de horrores para alguns dos intervenientes.
Isto não tem que ser assim; não pode ser assim; há que trabalhar no sentido de dignificar a justiça, porque uma sociedade sem justiça suga a dignidade às pessoas e é muito mau viver numa sociedade de pessoas que não se sentem com dignidade, porque aquelas que sentem que a perderam, também não querem que os outros a tenham, nem lha reconhece! :
6 comentários:
Você hoje consegue estar mais zangado que eu, o que é obra José!
Olhe que não...olhe que não.
Isto já é chover no molhado. Inútil. É só para ficar registado, porque depois de alguns meses, esquece.
Democracia para inglês ver.Mas todos muito solidários com África e as américas latinas, onde se sentem como peixe na água...
Feliz Natal e bom Ano Novo
Boa ideia! Vou procurar uma mensagem original.
Caro José:
Desculpe mas desta vez, discordo de si.
Não é necessário ir a Coimbra para fazer uma pós-graduação...
Se calhar, bastaria que o CEJ ministrasse uns cursos com essas matérias em vez de debitar cada vez mais teorias, estando transformado, segundo dizem, numa Faculdade de Direito de 2ª ou 3ª categorias.
Por outro lado, talvez os Sindicatos, em especial o do Mº Pº, em vez de andarem a esbanjar dinheiro, pagando a vinda a Portugal e respectiva estada a pessoas que pouco ou nada de interesse vêm dizer e, por outro lado, em despesas completamente injustificadas e sem qualquer interesse, melhor seria que promovessem esses cursos, GRATUITAMENTE...
Quanto ao NAT, realmente foi criado mas é manifestamenete insuficiente para acudir a tanto escândalo financeiro como o que se vê neste lamaçal.
E, como é óbvio, o poder político não lhe inteessa que haja mais pessoas no NAT nem que a PGR e os tribunais tenham mais meios...
Vá-se lá saber porquê??????
A todos um Santo e Feliz Natal e um Próspero Ano Novo ( mesmo com os politiqueiros que temos e que tão bem nos ( des ) governam ).
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