sexta-feira, outubro 15, 2010

Em grande e à francesa

Esta página da revista Marianne desta semana ( 9-15), relata mais uma vez o caso Bettencourt/Woerth/ Sarkozy que assume importância em França, para se tomar o pulso ao poder judicial e ainda à liberdade de imprensa.

Desta vez, a revista publica um relatório médico de 2007, relativo à saúde de M.me Bettencourt e diz respeito a uma ressonância cerebral e no qual se escreve algo que não pode ser mais íntimo, seja para quem for: problemas graves do foro mental.
Este relatório clínico, provavelmente nunca seria publicado por cá, a não ser num qualquer 24 Horas, por causa de assunto que implicasse causa do director de então, tipo problemas de bexiga de um ministro relatados em processo crime que importava acima de tudo desacreditar.

E no entanto, a revista não hesitou em publicar o fac-simile fazendo objectivamente o jogo da filha de M.me Bettencourt que pretende à viva força provar que a mãe não estava no uso pleno das suas faculdades mentais, ao dar a um assistente, fotógrafo de profissão e amigo de muitos anos, milhões e milhões de euros em prendas, como quadros famosos e até uma ilha.

À parte esse fait-divers, o caso continua a representar um assunto de Estado, porque envolve financiamentos partidários ( campanha de Sarkozy em 2007) presumivelmente ilegais em que estará envolvido o ministro Woerth que pretende passar a reforma dos franceses para os...62 anos.
A páginas tantas da revista aparece uma entrevista com o advogado das que denunciaram o caso, a saber o mordomo e o ex-contabilista de Bettencourt.

E que diz tal advogado, Antoine Gillot?
Coisas muito interessantes, até para o nosso sistema institucional e judiciário e aqueles que defendem o modelo francês, como é o caso notório do presidente do STJ, Noronha do Nascimento.
Diz o advogado que há suspeitas de que o procurador encarregado da instrução preliminar do caso e da análise das suas implicações penais não quer, até agora, submeter o processo à apreciação de um juiz de instrução independente.
E esclarece que o procurador em causa, Philippe Courroye, foi nomeado procurador de Nanterre ( contra o parecer do conselho superior da magistratura), por ser amigo de Sarkozy, antigo presidente da câmara local, nos arredores de Paris. E portanto esse procurador não é independente estatutariamente, por força da natureza do cargo, nem tão pouco politicamente.

E não tem papas na língua: "o poder executivo pretende manter um controlo total ( main mise totale) na marcha do processo porque todos percebem muito bem as implicações políticas de vulto do assunto."
Mesmo depois de uma recomendação de outro procurador, imediato superior hierárquico daquele, no sentido de o caso dever ser entregue ao poder de um juiz de instrução, o referido procurador e mesmo o procurador-geral ( a Garde des Seaux, Michèle Alliot Marie) entendem que não e continuam nessa posição irredutível e insindicável seja por quem for.
Perante a pergunta no sentido de se saber se poderia haver um incidente de suspeição sobre o referido procurador Courroye, o advogado Gillot é claro: "é juridicamente impossível porque um incidente de suspeição legítimo só poderia visar a jurisdição de instrução e não o "parquet"" , ou seja, o ministério público francês.

E tem mais: o procurador Courroye fala abertamente aos jornais ( quer dizer, ao Figaro, da situação, uma espécie de Diário de Notícias de lá) sobre o caso.

Portanto, para aqueles que sonham com um sistema de investigação criminal à grande e à francesa, como é o caso do actual presidente do STJ e um ou outro distraído, seria bom meditarem nestes acontecimentos.

Aliás, no caso Face Oculta, nem foi preciso haver um sistema assim. Ou foi? E quem fez, neste caso, a figura de Courroye?

1 comentário:

Mani Pulite disse...

UM JOVEM PINTO DESAPARECIDO COM QUASE 70 ANOS?

O Público activista e relapso