terça-feira, março 15, 2011

O estranho caso de um ministro da Justiça socialista

O ministro da Justiça Alberto Martins é casado com uma magistrada do MºPº que trabalha nos tribunais cíveis do Porto.
Há poucos anos, esta magistrada acumulou funções nos juízos onde exerce. Como é timbre nesses casos e frequente em situações similares, pediu o respectivo suplemento remuneratório que deve ser apreciado pelos serviços do Ministério da Justiça, entidade que decide o pagamento e a respectiva proporção, geralmente em fracções reduzidas do vencimento completo.
Neste caso concreto, segundo relatam os jornais Público e DIário de Notícias de hoje, tal sucedeu. O primeiro despacho governamental sobre o assunto, da autoria de um secretário de Estado que foi juiz, foi negativo seguindo o parecer solicitado obrigatoriamente ao MºPº ( PGR) e que muitos entendem ter carácter vinculativo para o departamento governamental que paga. Mesmo não tendo, a justificação para dizer o contrário do parecer deveria ser muito bem explicada e fundamentada.
Ora não foi esse o caso porque a decisão do primeiro secretário de Estado, negativa e seguindo o parecer da PGR, foi sucinta. Como tem acontecido ao longo dos anos, nestes casos, porventura às dezenas.
Resultado: uma acção administativa especial proposta nos tribunais administrativos de primeira instância, neste caso no Porto. É exactamente isto que deve fazer-se quando não há acordo com as decisões administrativas do governo: recorrer aos tribunais.
A acção lá percorreu os trâmites, demorados perante o formalismo processual que temos e a pendência que existe, e eis senão quando, sem se anunciar, aparece uma outra decisão governamental, de um outro secretário de Estado da Justiça ( João Correia, advogado), já em 2010 a dar o dito governamental por não dito e a alterar sem justificação plausível, entendida e aceite pelo MºPº ( PGR): Pague-se o graveto à digna magistrada, desde finais de 2003. Total: mais de 72 mil euros já a tilintar no bolso da beneficiária.
A qual é casada com o ministro da Justiça, o qual delegou eventualmente poderes no seu Secretário de Estado para o acto concreto de despachar este tipo de processos.
Segundo os jornais, ambos não se dão por achados. O primeiro pelos vistos nem reparou na existência de um parecer negativo da PGR e no despacho negativo do seu antecessor. O ministro de nada soube porque a ética republicana, como todos sabem, é a lei e já foi afirmada publicamente pelo próprio.
Nada soube para efeitos de IRS porque só este ano deve declarar. Nada soube sobre o dinheiro ( 72 mil euros dele...) a tilintar no bolso da mulher porque sim, entre marido e mulher não se deve meter a colher. Nada soube da delegação de competências porque é isso mesmo: um problema de competências...
Nada soube do processo de atribuição do suplemento porque um despacho no meio de tantos outros é mais um. Nada soube de antecedentes porque é ministro e as suas ocupações prendem-se mais com denegrir a imagem da magistratura do que estas insignificâncias.
Nada soube de nada e por isso, para saber mais alguma coisa, diz que vai fazer um inquérito.
Talvez seja útil um inquérito. Mas neste caso à sua vergonha ( tinha escrito pouca, mas corrijo para valores imponderáveis) para ver se coincide com a ética republicana, socialista e laica. Jacobina, numa palavra.
PS. O Público, citado aqui, informa que "Alberto Martins admitiu ainda que tinha conhecimento de que a sua mulher tinha posto uma acção em tribunal contra o Ministério, mas não avançou mais pormenores."
Ou seja, o ministro soube que havia uma acção pendente contra o despacho de um Secretário de Estado do seu Ministério. Soube que tal acção teria que ser alvo de decisão que poderia obrigar o seu ministério a pagar, em nome do Estado. Soube afinal que por via da sua mulher era parte interessada nessa acção e que teria vantagem pessoal caso o Estado e o Ministério de que é ministro, perdesse a acção.
Não perdeu mas foi ainda pior: um Secretário nomeado por ele, com delegação de poderes que lhe foi concedida por ele, ( e seria bom saber desde quando o ministro sabia da pendência de tal acção, porque essa delegação de poderes não pode ser considerada sem mais relevo, nesse caso) decidiu em despacho sem fundamento especial, ( é o que se depreende das notícias) que o Estado devia pagar e já, sem esperar pela decisão dos tribunais...
É esta a ética republicana e socialista?
A demissão já tarda. E não deveria demorar as três semanas que o ministro achou adequadas a averiguar o assunto. Três semanas!!! Quando a análise do processo demora quando muito uma hora... e o processo está no seu Ministério!
O que este ministro pretende com estas três semanas é algo muito simples de entender: adiar, adiar. E esperar que o assunto arrefeça e esqueça. É uma ténica já experimentada e com frutos, no caso do mais recente escândalo eleitoral. O tempo passou, o inquérito fez-se, as conclusões foram atabalhoadas e contraditórias e o ministro lá se safou mais uma vez.
Uma vergonha mais? É o que parece.

16 comentários:

Mani Pulite disse...

SERÁ QUE HÁ MAIS ALGUMA COISA A SABER ACERCA DA MULHER QUE ELE NÃO SAIBA?O ÚLTIMO A SABER...OLHE,CONTRATE UM PRIVATE EYE.

maria disse...

Afinal o Pai Natal existe, os bebés vêm de Paris, no bico de uma cegonha, e os membros do governo não usam os respectivos cargos e influência para beneficiar familiares e correlegionários!...

Carlos disse...

Oh sr. ministro, peço a palavra.

E se fosse um inquérito caseirinho,não seria mais rápido e baratinho?

Com a crise em que vivemos, ainda vamos gastar mais €€€ a somar aos 72.000?

ruddion disse...

E o ministro não se demite...
Está disposto a ir à AR prestar esclarecimentos?!
Pelos vistos, existe total independência entre o Ministério e a Secretaria de Estado por ele tutelada.
Só nesta Salgalhada socretina...

Carlos disse...

ruddion...

Para quê demitir-se, num (des)governo cheio de demissionários? estão todos bem agrupados e compactados, agora é só dar-lhes a biqueirada final!

Unknown disse...

Mesmo à luz da ética republicana reduzida à lei, algumas questões se impunha que fossem esclarecidas:
- Tem o MJ competência para dizer o que é acumulação de serviço de juiz ou de MP contra o respectivo Conselho Superior?
- A contestação da acção não está obrigada a, pelo menos, invocar os argumentos do órgão de gestão da magistratura que levaram ao indeferimento? E, senão o fizerem e se adoptar uma contestação "inepta" de quem é a responsabilidade?

josé disse...

Talvez no Parlamento alguém lembre ao ministro Martins a responsabilidade em responder num caso pessoal e de Estado.

Não consta que o Américo Tomás que todos sabem morreu pobre, tenha usufruido de coisas assim.

Kafka disse...

A minha dúvida talvez seja existêncial mas... se o ministro não sabia de nada qual destas é a real situação?
- Dormem na mesma cama ou em camas separadas?
- Dorme com o ministro aos Domingos, com o secretário às 3ª, 5ª e Sab e às 2ª, 4ª e 6ª com o chaufer?

Haverá outra explicação?

Kafka disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Pacheco-Torgal disse...

Mas que vem a ser isto, duvidar da palavra do Ministro, logo alguém que tanto lutou pela democracia ? Isto é inadmissivel eu ponho as mãos no fogo por este Ministro.

P.S - Declaração de interesses. Eu sou Motorista do Ministro, mas isso não tem nada a ver.

Pedro Luna disse...

Sugiro a leitura do seguinte post (o final):

http://geopedrados.blogspot.com/2011/03/milagre-deus-queira-que-me-saia-branco.html

Pacheco-Torgal disse...

O Mário Soares, escreveu no DN que o Pinocrates cometeu erros imperdoáveis e que vai pagar um elevado preço nas próximas eleições. Ora aqui está um Socialista com visão.

JC disse...

"O funcionário que abusar de poderes ou violar deveres inerentes às suas funções, com intenção de obter, para si ou para terceiro, benefício ilegítimo ou causar prejuízo a outra pessoa, é punido com pena de prisão até 3 anos ou com pena de multa."

O comportamento deste Ministro é criminoso.
Cometeu, no mínimo, um crime de abuso de poder.

Não foi o Secretário de Estado João Correia que adivinhou que a mulher do Ministro tinha este assunto nos arquivos do Ministério decidido e encerrado e que resolveu desenterrar!

Foi seguramente o próprio Ministro da Justiça quem lhe soprou isso e lhe disse que deveria pagar à mulher os 72 mil euros.

Acto este que é manifestamente ilegal, pois que este pedido já anteriormente havia sido recusado por quem de direito - o anterior Secretário de Estado João Conde, baseado em parecer da Procuradoria - como o Ministro bem sabia - estamos a falar da mulher dele, porra! não havia de saber?

Assim com sabia - obviamente - que a sua mulher tinha intentado uma acção judicial que estava pendente

Por isso, no mínimo, este Ministro cometeu um crime de abuso de poder.
Que devia ser investigado, imediatamente.

Karocha disse...

http://www.jornaldenegocios.pt/home.php?template=SHOWNEWS_V2&id=473603

josé disse...

JC:

Em defesa do ministro e do seu secretário de Estado devo dizer, para ressalvar dúvidas que os mesmos não se entendiam pessoalmente e por isso não acredito, sinceramente, que tenha havido qualquer conversa.

A questão, neste caso, nem é essa.

Carlos disse...

Dia do cheiro a naftalina na Justiça.

Hoje, é dia de festa, festança, mas sobretudo: MUITA CAGANÇA!