António Barreto é uma espécie de iluminista da nossa contemporaneidade. Como sociólogo encartado lá fora, nos anos sessenta, já foi ministro da Agricultura de um governo de Mário Soares, no final dos anos setenta do século que passou e encarregado de desfazer uma boa parte da "reforma agrária" comunista. Com isso conquistou a aversão da extrema-esquerda que lhe fez mediaticamente a vida negra em todo o lugar visível nos últimos anos dessa década perdida. Para além dos jornais, os muros e paredes do país falavam por eles, com a palavra de ordem "Barreto para a rua".
Hoje no i "concede" mais uma entrevista para falar do mesmo de sempre: de Portugal e o seu futuro. Desta vez esqueceu-se de lembrar que "Portugar pode desaparecer", como disse há tempos mas entra sempre no mesmo caminho tortuoso das conjecturas sobre o porvir.
Sobre o caso do momento, ou seja, a corrupção de José Sócrates é previsivelmente cauteloso, contrariamente às ideias concretas sobre a corrupção em geral. Neste aspecto não poupa nas palavras: "Evidentemente que gostaria de acrescentar que gostaria de ver algumas pessoas presas". Quando lhe perguntam, logicamente, quais, foge com o rabo à seringa: "não digo nomes, mas são alguns banqueiros, empresários, administradores de empresas, ex-ministros, ex-secretários de Estado, ex- directores-gerais...gostaria de os ver presos".
Assim, tal e qual. Se nos pusermos a imaginar os nomes destas rosas, facilmente encontraríamos Salgado, Bava, Granadeiro, Pinho&Lino, Campos& Cª, etc., mas Barreto não tem a coragem de o dizer.
Porém, nem é essa coragem que lhe falta, o mais grave.
Vejamos, lendo:
Quando o jornal lhe pergunta- "como vê a prisão do ex-primeiro-ministro?" , Barreto responde com a diplomacia bacoca dos que não se querem inscrever: " Estou à espera do julgamento para me pronunciar sobre isso".
Está à espera de quê?! Do julgamento? É juiz de tribunal, porventura? Então o que já se sabe de concreto e definido não chega para se pronunciar sobre aquilo que é do senso comum? Os milhões de que José Sócrates dispôs, supostamente emprestados por um amigo, não lhe suscita o mais leve comentário? A vida que levou depois de sair do governo também não? O pretenso curso por correspondência com o sistema da Sciences Po também não lhe suscita qualquer comentário? O modo como recebia o dinheiro avulso do amigo que supostamente lho emprestava também não? O facto de enquanto governante ter sido responsável pela atribuição de inúmeras empreitadas de obras públicas ao beneficiário que é seu amigo também nada lhe diz?
Se isto nada lhe diz, esperando pelo julgamento e avisando já que " não tenho confiança absolutamente nenhuma em qualquer dos protagonoistas neste assunto" como é que se atreve a dizer que gostaria de ver presos aquelas personagens da mesmíssima farsa que se desenrola perante os olhos de todos?
Como é que relativamente àqueles não tem dúvidas e quanto a este, com a quantidade de pormenores incríveis que já se conhecem, prefere chutar para o canto das dúvidas?
António Barreto é absolutamente inacreditável e perante o que se expõe, uma conclusão se impõe em modo de pergunta: deve alguma coisa ao recluso 44? Não deve? Então não se faça de ingénuo, acenda a luz e comece a ler as letras dos jornais que contam a história desse recluso.
E outra coisa ainda, mais grave: como é que pode gostar da prisão daqueloutros, sem que ao menos indique quais os crimes por que devem ser presos? Vêm no Código Penal? É que tenho imensas dúvidas sobre isso e pedir prisão "a olho" só mesmo para quem não sabe o que está a dizer e fala ao nível do taxista que o transporta.