sábado, janeiro 17, 2015

O caso de Bragança, o homem que cita

José Bragança de Miranda, professor de universidades, tem um sítio com muitos livros e deixou-se fotografar para o Jornal de Negócios deste fim de semana assim:

Depois diz assim, para ficar bem na foto:


Fala na "judicialização da própria vida" para reforçar uma ideia que tem pés para andar sózinha: a de que há um excesso de regras na sociedade portuguesa. Mas depois mistura a judicialização da vida com a da política e com a ideia de que "quando se procura um culpado só há duas hipóteses. Ou se vai para a religião ( e o confessionário) ou o tribunal ( e a judiciarização geral). É mais um dos efeitos da crise de definição de política".

Não sei se é assim ou não é e parece-me que um citador é um indivíduo que lê e decora, mobilando o espírito com artefactos intelectuais. Bragança é dos tais e cita Hobbes e outros de tal modo que não se sabe o que pensa por si, apresentando um discurso confuso e patafísico. Há muitos assim, em Portugal, e todos grandes citadores.

Sobre o caso concreto cita o juiz Carlos Alexandre para dizer que "ficará em muito maus lençóis se o que tiver para apresentar no final deste processo for nada."

Nada? E o que será o "nada"? Ora venha de lá o Hobbes...

O que resulta deste processo, para já e citando notícias dos jornais é tremendo e fantástico. E cito aqui um pequeno artigo de outro citador do Observador, João Marques Almeida que escrevia anteontem sobre "um antigo PM reconheceu que recebeu envelopes com dinheiro de um amigo, e trata esses "empréstimos" com a maior das naturalidades. Os empréstimos poderiam ter vindo de um amigo sem relações empresariais com o Estado no seu passado. Ou de um amigo com fortuna feita no estrangeiro. Mas não. Foi um amigo que trabalhou numa empresa que ganhou muito dinheiro com contratos públicos durante os últimos governos do PS. Nenhum socialista, nenhum membro do PS, denhum amigo de Sócrates acha isto estranho?" - perguntava o mesmo escriba, acrescentando : " a solidariedade socialista exprime-se através de envelopes com dinheiro? Será um hábito corrente? Ainda não ouvi um único socialista mostrar a mais leve estranheza pelo facto de um antigo PM ter recebido envelopes com dinheiro".  Por acaso até houve um socialista que tal manifestou- Henrique Neto.

Porém, o que importa aqui é citar outra vez Bragança a propósito daquele "nada" jurídico, separado de tudo o que já se sabe.
Em primeiro lugar, quem ficaria em maus lençóis não é o juiz Carlos Alexandre, que no caso é   o juiz de instrução de um inquérito que o Ministério Público dirige. Portanto quem assim ficaria era o Ministério Público em primeiro lugar. Mas...ficaria porquê? Por não se provar o quê? A corrupção?

Ora é aqui que entronca a questão de fundo: a corrupção é,  simplificando e para não citar a lei expressamente, um crime que pressupõe uma entrega ou promessa de entrega de algo que é indevido,  em troca de outra coisa, geralmente um benefício que não deveria ser outorgado desse modo.

Um PM recebe um balúrdio de milhões de um amigo que foi beneficiado por actos admistrativos do seu governo e contratos de ainda mais milhões, sensivelmente na mesma altura em que tal ocorreu.

É preciso mostrar e provar o quê, neste caso? O acto de entrega dos milhões, com um filme em 3D?  Se os tribunais não foram capazes de ver para além da peneira que tapa este sol, não serão capazes de ver nada mais e portanto o problema, citando Hobbes que o citador cita será " o medo [que] é a paixão democrática por excelência" .

Quando ao caso de Bragança e outros parece-me mais uma visão de guião cinematográfico, para citar não sei quem: toda a gente já percebeu o enredo do filme mas todos esperam por saber como é que o vilão será apanhado no final. Se é por bala de prata em duelo ao sol; por explosão no espaço sideral ou confinado ao espaço de umas algemas simbólicas que o manietarão para a vida pública para todo o sempre.

De resto, o citador, de Bragança, deveria ser um dos jurados desse julgamento. Isso para ver se citaria outra vez Hobbes ou se se libertaria desse fardo de homem branco, professor de universidades.

Questuber! Mais um escândalo!