domingo, janeiro 03, 2016

Um Público sem saída

O jornal Público de hoje apresenta-se com este editorial intitulado "para ler devagar". Fiz o esforço de tentar ler desse modo o jornal de hoje ( que comprei), mas não consegui. Ou seja, o desejo formulado pela edição do jornal, para mim enquanto leitor, não surtiu efeito.

Portanto, a ideia básica do Público que agora sai ao Domingo, expurgado de um caderno ( Revista 2) é tentar o dois em um, integrando no jornal os artigos que seriam da tal revista, com um critério: "textos maiores são seguidos de textos mais pequenos", com uma linha condutora que é a tal ideia de fazer um jornal para "ler devagar".
Por isso, desaparece do jornal aquilo que um filósofo muito lá de casa do Público ( José Gil, insuportável)  apelida de "bugigangas", quer dizer, pequenas notícias,  curiosidades e outra  informação propriamente dita, substituídas por pequenos ensaios de duas páginas sobre "temas".

Os "temas" de hoje : duas páginas sobre "novas ( e velhas) utopias da humanidade", assinado por Ana Cristina Pereira.
Confesso que  lendo o nome da jornalista-ensaista não tive coragem de ler o resto, que aliás são enchidos em balões de textos.
Não tive coragem porque no outro dia ( 30 de Dezembro) comprei o jornal,  fiado num texto de duas páginas assinado pela mesma ( e por Ana Henriques) sobre a violência doméstica. Começa assim, este texto de duas páginas: " Dizer que a violência doméstica é transversal é já um lugar-comum, avisa a socióloga Isabel Dias".
Esta mania de consultar especialistas de matérias específicas para escrever artigos de duas páginas não é apanágio apenas desta jornalista. O que o parece ser é a tendência para a tudologia aprendida sem ser a ler devagar e com o convencimento que é suficiente a consulta de especialistas para escrever sobre qualquer tema que caia na rede.
No caso da violência doméstica o artigo que aliás tive o tempo de ler devagar é confrangedor,  mesmo citando diversos especialistas, no caso a apontada socióloga, uma "psicóloga social", uma "psicóloga forense" e uma citação em bónus de outra doutorada ( são todas doutoradas as citadas especialistas) que ajudam a jornalista-ensaísta a escrever o artigo que diz nada de nada sobre o assunto a não ser uma coisa: a existência de violência entre casais estende-se a toda a gente, sem distinção de grupos e como refere a tal doutorada " cada um bate como pode e foi ensinado".
Esta não aprendeu isto nas teses de doutoramento, mas foi preciso doutorar-se para tal apreender...
O segundo tema do jornal de hoje é sobre o bairro Molenbeek, com as mesmas duas páginas mais duas, assinadas por Sofia Lorena que foi a Bruxelas para escrever sobre o assunto que não me apetece ler,  porque começa assim : " Quando se sai do metro do cruzamento da avenida Léopold II com a Rua Ribaucourt, vêem-se farmácias, floristas, quiosques e cafés".  Pois vêem, certamente. O que seria estranho era ver palhotas ou tendas de beduínos...

Depois mais duas páginas com uma infografia arranjada a preceito sobre "a guerra no centro do mundo". O tema é já tão estafado e sobre o mesmo já foi escrita tanta coisa, principalmente em França que não me apetece ler o artigo de Ana Fonseca Pereira. Sorry. A infografia, aliás, parece-me saída de uma qualquer revista que já li antes sobre o assunto.

 Depois ainda tem mais cinco páginas assinadas por Cláudia Carvalho Silva e Joana Guimarães sobre as "lojas do nosso passado". Não sei qual a idade das jornalistas mas julgo que não terão a suficiente para escrever sobre o "tema" com um mínimo de interesse para mim. Sorry outra vez. Lamento.
Lá mais para a frente aparece um artigo sobre os "africanos de Cabo-Verde". Já não tenho pachorra para ler depressa quanto mais devagar...

Para cerejar este bolo lá aparece o apontamento artsy artsy sobre uma fotógrafa. Nem vejo as fotos com modo de ver porque o fastio obriga-me a passar as páginas depressa, frustrando as expectativas do corpo redactorial.

Em resumo: não suporto este Público. Já nem é um problema que tenha solução, quanto a mim. Não percebem que este jornalismo não presta, apesar de aparecer embrulhado neste celofane pretensioso e deslumbrado, mas pobre de imaginação e ate de ilustração. A escrita assusta-me porque demasiado asséptica e quando tenta deixar de o ser o resultado é uma frustração de um pretenso "novo jornalismo" atroz. 
Estes "temas" costumam ser tratados com outra qualidade e relevo noutras publicações e a questão está relacionada, parece-me,  com quem faz o jornal. Ou seja, os jornalistas. Assim não há saída para o Público.
Encerre-se, liquide-se e quem tiver unhas que toque outra guitarra que esta é de pechisbeque.

Questuber! Mais um escândalo!