domingo, janeiro 31, 2016

A pena de Godinho do Face Oculta





O Correio da Manhã foi ao Brasil e falou com Manuel Godinho, o empresário de Ovar que foi condenado no processo Face Oculta em 17 anos de prisão por crimes como o de corrupção.

A notícia destaca o facto de Godinho, que referiu ter sido amigo de Armando Vara durante muitos anos, nunca mais ter falado com o mesmo: " Vara nunca mais de  ligou nem falou comigo". Mas também não está interessado em conviver com o mesmo...  

Essencialmente, a defesa de Godinho assenta no desconhecimento de que o que fez pudesse ser crime. "Se eu soubesse que estava a corromper, não fazia. Mas aquilo para mim era normal".

Em termos jurídicos isso configura uma situação de falta de consciência da ilicitude, por ter actuado em erro.

Artigo 17.º do C. Penal:
Erro sobre a ilicitude
1 - Age sem culpa quem actuar sem consciência da ilicitude do facto, se o erro lhe não for censurável.
2 - Se o erro lhe for censurável, o agente é punido com a pena aplicável ao crime doloso respectivo, a qual pode ser especialmente atenuada.


Porém, como se lê,  esta ausência de conhecimento é punível se este erro lhe for censurável.

Segundo jurisprudência recente (2012) do TRP que irá apreciar o recurso da decisão em causa:

I. Deverá ser punido a título de negligência o agente que desconhece a proibição legal devido a uma falta de informação ou de esclarecimento se, podendo e devendo fazê-lo, se desleixou na recolha de informação.
II. Se, pelo contrário, a ignorância resulta de uma atitude de contrariedade ou de indiferença perante o dever-ser, então há uma deficiência da própria consciência ética do agente que lhe não permite apreender correctamente os valores jurídico-penais e, por isso, deve ser punido a título de dolo.
III. A censurabilidade só é de afastar se e quando se trate de proibições de condutas cuja ilicitude material ainda não esteja devidamente sedimentada na consciência ético-social, quando a concreta questão 'se revele discutível e controvertida
'.

Ou seja, Godinho está tramado e o mais que pode esperar é uma diminuição da pena. De facto, 17 anos para Godinho e 5 anos para A. Vara configura um "erro" sobre a apreciação da ilicitude da conduta de ambos. E tal erro só será desculpável se não foi censurável...
A desproporção entre ambas as penas e a injustiça relativa que assume pode resultar de uma deficiente avaliação da culpa real de ambos e como tal, o TRP pode muito bem refazer a pena de Godinho e aproximá-la da de Vara. ou...vice-versa se tal fosse pedido.

Questuber! Mais um escândalo!