Os jornais de hoje ( menos o Público que não liga a fait-divers, como o do desmentido da PGR a uma notícia publicada) escrevem sobre um "caso polémico" e de interesse relativo: "Proença de Carvalho revela que Marante foi viciada em cocaína por Rangel", titula o Correio da Manhã, desenvolvendo o assunto nestas duas páginas:
A notícia alimentada nestas duas páginas reveste interesse a vários níveis, como agora se diz. O primeiro quanto à novidade em si, do lançamento de um livro biográfico acerca de uma jornalista tragicamente desaparecida no vórtice de uma tragédia pessoal ligada a uma doença psicológica.
O segundo devido ao teor da revelação sobre o consume de uma droga proibida, cocaína, revelado por uma figura pública da praça, Proença de Carvalho e que era amigo íntimo da desdita. O terceiro pela revelação associada a que tal consumo de cocaína atingiria pelo menos o marido notável e também já falecido.
O quarto e por último a indicação dos amigos do peito da desdita e que conviviam com a mesma: Fernanda Câncio, José Sócrates, entre outros, como seja a cabeleireira Marina Cruz que lamenta a revelação acerca do mau hábito da amiga falecida.
O comentário à notícia insere-se por isso já aqui: deverá um jornal revelar assim um pormenor da vida privada de uma figura pública, como seja o abuso no consumo de drogas ilícitas? A dita cabeleireira diz que tal "mancha a imagem de qualquer um", mormente de uma pessoa falecida.
Sendo verdade, a verdade pode libertar e por isso a mancha é muito, mas muito relativa porque pode destinar-se também a permitir uma compreensão da desdita que atingiu a referida jornalista. Não será uma revelação cruel, nesse sentido, mas sim uma explicação bem humana para a tragédia pessoal e que por isso não contém a virtualidade de manchar a imagem.
Por outro lado a questão pode e deve colocar-se noutros termos: deverá um jornal revelar esses vícios privados de figuras públicas que se apresentam como cheias de virtudes e moralmente impolutas?
É esta a questão fulcral do assunto.
Se por acaso uma figura pública de grande relevo nacional, com grande poder de influência na gestão da coisa pública que afecta os demais cidadãos for um viciado em cocaína ou pelo menos um consumidor ocasional mas habitual, deverá um jornal revelar tal coisa, como o fez Proença de Carvalho à autora da biografia?
É essa a questão. Por mim, a resposta é sim, inequivocamente. E esperar pela reacção química. O assunto nesse caso extravasa a simples vida pessoal e privada e passa a ser de interesse público conhecê-lo, ainda que tal não seja relevante em modo penal. O consumo de drogas foi despenalizado há uns anos, transformado em ilícito administrativo punido com coimas, como se fosse uma contravenção estradal.
Porém, o seu efeito imediato na opinião pública, em casos que tais, será inevitavelmente o de "manchar a imagem". E se a mesma já estiver irremediavelmente manchada?