Para entender bem como Portugal é pequeno e se conquistam consciências críticas, ou até se entra em redutos do inimigo de classe, talvez seja útil transcrever um pequeno texto da
Visão de 5.12.2008, que dava conta do "
retrato do poder em Portugal":
"Baptista-Bastos, de quem Dias Loureiro foi testemunha abonatória, num processo em que o queixoso era Alberto João Jardim, é outro dos seus amigos: «Detestava-o e disse-lho quando o conheci. Até lhe falei no rosto sombrio que ostentava, o que lhe conferia um ar sinistro.»
BB ouvira-o, numa manhã de sábado, na rádio: «Ele possuía uma ampla informação política, económica, social e cultural do País. E desenvolveu as suas ideias, associando-as com uma forte componente social-democrata, à maneira, por exemplo, de Willy Brandt e de Olof Palme.»
Vai daí, BB escreveu um artigo sobre isso e Dias Loureiro telefonou-lhe de Nova Iorque. Depois disso, foram-se encontrando, entre almoços e uísques, por vezes com Duarte Lima a juntar-se-lhes. Conheceu um Dias Loureiro que «se interessava por livros, pintura e música. E, sobretudo, por pessoas. Ajudou, desinteressadamente, muitas pessoas, entre as quais alguns nossos camaradas de Imprensa, que, neste momento, o ignoram ignobilmente», observa."
O percurso meteórico de
Dias Loureiro, desde as oficiosas no tribunal de Coimbra, ainda nos anos oitenta, até aos ofícios e despachos nos ministérios de Cavaco Silva, poderia ser contado pelo próprio em autobiografia, de proveito e exemplo.
Enquanto tal não sucede, há aspectos da vida pública do mesmo que estão ao dispor das pesquisas nos suportes habituais, mediáticos.
Há factos indesmentíveis: Dias Loureiro apareceu, desde 1996, ligado, por grande amizade, a autênticos crápulas, para não dizer criminosos de alto coturno e do piorio que pode haver à face da Terra: traficantes de armas (El Assir) ; assassinos confessos (o marroquino Basri, o Alcachofra ) e personagens de recorte mais que duvidoso, de enumeração escusada porque atingível à distância de um clic na Net.
Como tal percurso se afigura extraordinário para o cidadão comum e paradigma de um certo tipo de figura pública da política, com paralelo apenas noutra figura de relevo que por coincidência se irmanou com o mesmo- Jorge Coelho- talvez se torne interessante percorrer os elementos de facto, para perceber os factos elementares de uma certa prática política portuguesa, que o Cavaquismo contemporizou e apoiou. Sem arrependimento. E o soarismo de Macau e o decorrente socialismo de gaveta, popularizaram, até aos dias de hoje, sem interregno digno de um Estado decente.
O período fulcral para entender este fenómeno, para Dias Loureiro, situa-se já nos anos noventa, particularmente, de 1995-96, com a saída do último governo de Cavaco Silva, onde tinha sido ministro da Administração Interna e a entrada num escritório de advogados, de Mister D.
Este
"pequeno Maquiavel à moda do Minho", como em tempos e imprudentemente, foi apelidado por um proscrito da televisão que aquele então dirigia, é aliás, um dos elementos para compreensão do fenómeno da nossa política dos últimos trinta anos. Porque esteve sempre presente em tudo o que era importante e conhece os nomes todos que importam.
Nota-se, nessa política de sucessivos governos de vários partidos, uma ausência de separação nítida e ética, entre quem governa e quem é governado, no nível mais elevado do Executivo, após as funções políticas.
Essa promiscuidade, de amizades pessoais, políticas e de interesses, por diversas vezes assinalada, fica exaurida até ao último suspiro de desejável separação ética, entre o Estado, as suas funções específicas de governo e as actividades de alguns Privados .
Promiscuidade notória, sempre que algum notável sai de um governo, para integrar conselhos de administração de empresas de grande dimensão. Alguns, sem qualquer preparação específica para a função, a não ser a adquirida no exercício governativo que obviamente não é uma escola de gestão. Promiscuidade que dificilmente é sindicável, por ausência de leis reguladoras e principalmente, de princípios éticos enraizados nos costumes políticos e sociais. Uma promiscuidade, tornada natural, razoável, por vezes até desejável, pelos próprios interessados.
E sem sombra de pecado confessável. Todos se consideram acima de qualquer suspeita maliciosa e todos se consideram como os epítomes da competência ética e política. Nunca, em Portugal, alguém ousou questionar a decência ética de tais movimentações, a não ser em casos bem contados e sem consequências ( precisamente Jorge Coelho e Ferreira do Amaral, outro imprescindível).
No que respeita a Mr D. , essa figura central da vida política portuguesa, do Centro desta democracia , pode ser uma das chaves para a compreensão da ascensão meteórica de Dias Loureiro, e ainda de todo o Centro da vida política portuguesa, com amplos nomes em destaque nos mais variados cargos, empresas e iniciativas.
Mr. D. é um dos exemplos para a compreensão dos fenómenos politico-sociais, destes últimos trinta anos em Portugal. Com Almeida Santos, Mister A, himself, temos o retrato perfeito do regime que temos. E nem é preciso falar em mais ninguém. Mário Soares, Cavaco Silva e até Sá Carneiro, são apenas os contextos e pretextos para se entender este Portugal contemporâneo, dos últimos trinta anos.
Mr D. filho de algo na AD, director de campanha presidencial de Freitas do Amaral, não sendo do PSD está desde sempre no PSD, em "estudos".
Mr. D. apareceu publicamente, em meados dos anos setenta, vindo das profundezas do Fundão. Foi polícia, magistrado, jornalista do Jornal Novo, na altura de combate activo ao PCP e à Esquerda, ministro da AD de Sá Carneiro, na Propaganda elementar contra o sistema de Esquerda que sempre combateu até certo nível, presidente de comissões de eleições de presidentes e de tudo e mais qualquer coisa que importe nos bastidores, curador de museus, empresário de administração ( até da Mota-Engil), acabando, naturalmente, numa Fundação que tudo deve a Champallimaud.
Prepara-se agora para concorrer novamente a negócios de televisão, depois de ter perdido a corrida, para Balsemão. E a posição, actualmente, é de vantagem competitiva, com a presidência da PT-Multimedia ( até este ano que a coisa, transmutou-se agora, alquimicamente em Zon ).
A PT, a GALP, a EDP e outras que tais, as maiores empresas do país, dependem destes nomes, recorrentes, sempre presentes e de constância aflitiva para o bem comum. Nada de relevante, nestas empresas, acontece fora destes nomes, propostos e intermutáveis.
(A EDP, no negócio de Marrocos, da Plêiade, é parceira com a Redal. Uma EDP, administrada na época por nomes repetidos, como um fugidio cavaquista de nome Luís Filipe Pereira)
Mr. D., advogado do empresário Champallimaud, vindo do período anterior a Abril de 74, (tinha sido advogado na equipa de Slagado Zenha que defendeu António Champallimaud, no caso da herança Sommer), prolongou-se para além dessa experiência de foro, alimentando-se das células estaminais desse cordão umbilical do grande capital, através das privatizações, nos anos noventa, do património que lhe tinha sido nacionalizado em 1975, pela Esquerda comunista, com aplauso dos que meteram o socialismo na gaveta.
Qual o papel de Mr. D. no processo de reprivatização dos bancos e empresas, relativamente ao seu antigo cliente, António Champallimaud?
No caso das privatizações, Mister D. esteve sempre lá e
continua a estar, no centro de tudo e de todos. Numa acção proposta em 1995 ( curiosa data), Mister D. continua a sustentar que o seu cliente Champallimaud, saiu muito prejudicado no negócio com o Estado que lhe nacionalizara as empresas. Apesar do acordo com o Estado, com um governo do PSD de maioria absoluta, e portanto com o Estado-Administração de que fazia parte, afectiva por proximidade partidária, pessoal e ideológica, sustenta agora, desde 1995, que afinal o Estado ( de que chegou a fazer parte como ministro) só dera ao seu cliente privilegiado, um pouco mais de 5% do devido. E por isso, pede o resto, agora e com toda a naturalidade de quem não se recorda do acordo feito. E o resto, são quase 300 milhões de euros, sem contar com juros...
Em tudo o que é importante, desde há trinta anos a esta parte, Mr. D. aparece. Até no caso da Casa Pia ( foi advogado das vítimas,- ó espanto dos espantos!-e afastou.se. Terá sido por ter falado com elas? Ou nem sequer as conhece?).
O
Diário Económico que lhe traçou um perfil, define-o em título como alguém que conhece toda a gente que importa, em Portugal, desde sempre. Um inoxidável, portanto.
Por isso, nada de espantar
que encomie de modo agora tornado ridículo, o mentor do BPP, um sucesso notável no mundo da banca.
Logo, para entender bem o regime que temos e somos, devemos, antes do mais, perceber o poder, influência e oportunidade de aparecimento de pessoas como Mister D. Ou Mister A. Os Duponds improváveis do nosso pobre regime que substitui o período de obscurantismo e fascismo, vindo das catacumbas da repressão.
Mas...então, a democracia, regime supostamente de transparência, alternância partidária e higiene política, pela renovação de nomes,programas e personagens, tem necessidade estrita de pessoas como estes Misters? Serão estes treinadores, os verdadeiros imprescindíveis do regime? Melhor: serão estes, os pilares do Regime?
Aparecem porque não há mais ninguém? Ocupam o vazio democrático? E não haverá o risco grave de conglomeração oligárquica? Só existem estes políticos, em Portugal?
Há alguma alternativa, legalmente possível, a estes fenómenos que todos reconhecem como sendo os avatares do Centro político, em bloco consolidado?
É o que se tentará saber, a seguir.