quarta-feira, dezembro 10, 2008

A ética na magistratura

Da revista InVerbis, citando o Diário de Notícias:

Os procuradores do Ministério Público deveriam apresentar uma declaração de Interesses junto do Conselho Superior do MP, de forma a que este possa detectar e corrigir eventuais situações de conflito entre magistrados e processos concretos. Esta proposta vai ser levada pela dlrecç.io do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público (SMMP) ao congresso, que decorre este fim-de-semana.
Em entrevista ao DN (edição de amanhã) , António Cluny, presidente do SMMP revelou que a proposta surge na sequência da aprovação do "Compromisso ético" por parte dos juízes, mas com algumas diferenças:
"Comungamos das preocupações dos juízes. Mas não das soluções. Entendemos que os magistrados não se querem quimicamente puros. Quando Isso aconteceu, houve péssimos resultados. Devemos preservar a liberdade de associação mas, por outro lado, entendemos que deve haver uma separação de Interesses em relação a todo o tipo de associações." Desde recreativas a maçónicas? "De recreativas a todo o tipo. Aos magistrados não basta ser, é preciso parecer. E Importante que a transparência seja um factor fundamental", declarou António Cluny.

Há cerca de dez anos, por altura do V Congresso do MP, o então PGR, dizia publicamente:
De resto, numa magistratura, o primeiro e melhor controlo é sempre a
auto-vigilância jurídica e deontológica, a humildade activa, a capacidade de reflectir sobre a diferença e os contrários, a serenidade de quem decide sem preconceito, temeridade ou temor, à vista de autoridade delegada pelo povo.
Uma magistratura democraticamente calibrada é, pois, a que se
auto-limita pelo saber, pela deontologia e pela consciência.

A questão sempre debatida da independência de consciência e da isenção nas atitudes e acção, neste caso penal, continua a depender muito das pessoas, individualmente consideradas. Mais do que a lei que configura as balizas e limites para essa acção, num princípio de legalidade e objectividade que se entendem como simbolicamente perfeitos.
Assim, nos magistrados do MP, à semelhança dos juízes, mas com intensidade menos evidente, a essência prende-se com a parecença.
Cluny fala em declaração de interesses. Políticos, também? Partidários? Uma declaração concreta?
Estou para ver, quantos magistrados temos, politizados, ao ponto de apoiarem activamente um candidato à presidência da República, depois de se saber o que se sabia.
A principal declaração de interesses que no MP importa reter, é a que se prende com as dos titulares dos altos cargos na hierarquia: os directores do DCIAP; DIAP, PGD´s e "equipas especiais".
Mas não adianta recolher a informação acerca das preferências politico-partidárias. Mais importante que isso, é saber como, porquê e por quem ( quem indicou concretamente), foram escolhidos efectivamente, para o lugar que ocupam e o que pensam sobre certos e determinados assuntos.
Quando vemos e lemos a opinião, legítima e pessoal, de magistrados, juízes em tribunais superiores, sobre determinados assuntos, relativos a processos mediátgicos, temos que ponderar porque dizem o que dizem e o que significa o que dizem. Se juiz de tribunal superior se pronuncia sobre o caso Casa Pia, em modo que denota preferência pelos arguidos, em detrimento das vítimas, torna-se essencial perceber por que tal acontece. Pela simples razão de que nesse caso, como noutros, a neutralidade e a isenção deixou de existir. Logo, legitimando a inquirição sobre os seus conhecimentos, amizades e idiosssincrasias. Pela razão, também compreensível que no lugar que ocupa profissionalmente, pode tocar-lhe um poder de decisão sobre o caso ou aspectos particulares do caso.
E isso, naturalmente, é, na maior parte das vezes, insindicável. E indesejável, porventura, sob pena de cairmos em processos de intenção, caças a bruxas e outras manigâncias de âmbito escusado e perverso.
Como se resolve então, esse problema? Por exemplo, como é que resolve o facto de admitir que os magistrados possam pertencer a lojas maçónicas que lhes exigem segredo de pertença, fidelidade fraternal, etc. etc. apenas com uma simples declaração de interesses que forçosamente tem de ser falsa ( e sem qualquer consequência para isso) ?
Cluny que o diga, porque a solução que apresenta é curta de efeitos.
PS. Postal corrigido, porque escrito à pressa.

5 comentários:

Karocha disse...

Ética José?

Eles sabem o que isso é!

portolaw disse...

josé,

exponha as suas ideias no congresso

josé disse...

Se o Pena fosse e falasse e se pudesse falar a seguir, talvez. Tinha uma pequena hipótese de poder ser ouvido.

Mas já é tarde: as inscrições já fecharam.

portolaw disse...

José,

estamos num ponto em que os problemas da sua magistratura são indissociáveis dos da judicial e dos da advocacia.
Aliás, a fonte destes problemas surge nos poderes fácticos deste país, políticos ou não, e não podemos ver nenhuma alteração nas relações de força dentro destas profissões que não tenha algo a ver com pequenas ou grandes alterações nas outras, ditadas por sabe-se lá que mão invisível...como si dizia nas novelas televisivas - seguem-se cenas dos próximos capítulos...

josé disse...

caro portolaw:

As mãos invisíveis, estão demasiado à mostra. Basta querer vê-las a mexer. O que se torna um pouco mais difícil, porém, são as que se movem por cordelinhos, manipulados por outras mãos, na penumbra.

Os problemas das magistraturas, não se resolvem com intervenções desgarradas em congressos. E muito menos, com posições a la Medina Carreira, como são as minhas´, sobre isto.

Parafrasenado o que ele disse ontem, na Sic-Notícias, isto já não tem conserto, de acordo com o modelo que gostaria que houvesse.

Mas não estamos assim tão mal, em efeitos perversos. Os juízes, particularmente os da primeira instância ( precisamente aqueles que um certo Paulo P acha que não fazem a Justiça que lhe convém), ainda mantém uma certa postura como os de Berlim, no tempo do moleiro de Ptsdam.

A prova reside precisamente no congresso que fizeram onde deram provas disso mesmo, pelo menos na proclamação pública de princípios e valores. Isso é muito positivo.

Quanto ao MP, não posso ter a mesma opinião.
O MP está a definhar na capacidade de intervenção assertiva nos valores a defender e comuns.

Talvez seja pela tendência a costurar nos processos e a fazer remendinhos, em vez de rasgar o pano quando é preciso.

A investigação criminal pelo MP, é um mito.

O exemplo concreto? A investigação à licenciatura de Sócrates.

Nessa altura, perdi todas as ilusões de independência real e efectiva desta magistratura em relação aos poderes fácticos.

Por isso, podem cantar as loas que quiserem, nos congressos, à autonomia e à independência e tal que não acredito.

Por outra razão ainda: as pessoas que estão à frente dos departamentos do MP, incluindo a PGD, são pessoas politizadas. Repare que digo politizadas e não politicamente comprometidas, mas a fronteira por vezes não é nítida. E isso acontece precisamente em casos de fronteira.

Esse, para mim, é o principal problema do MP, actualmente.

Acha que alguém vai ao Congresso dizer isto?

Acha que tem algum sentido ir ao Congresso e não dizer isto?