A jornalistas Inês Serra Lopes, num exercício algo espúrio, divide um artigo no i de hoje, num bloco de opinião e outro noticioso. Não seria preciso porque a opinião da jornalista exala quase sempre das notícias, mas o que ISL escreve a título opinativo merece uma reflexão.
ISL acha que os procuradores do Freeport cometeram uma injustiça irreparável ao lançar "suspeitas que nem aqueles procuradores nem outros poderão apagar em definitivo. A investigação criminal serve para dissipar suspeitas. Não para as criar. Ora, com ou sem intenção, os procuradores terminaram a investigação lançando sobre José Sócrates uma suspeita- que os autos não justificam e os seus direitos não deveriam permitir."
Mais uma vez, ISL labora num equívoco ao escrever isto. E grave porque lança sobre magistrados outra suspeita: a de prevaricação. E labora num equívoco por uma razão comezinha: as suspeitas que aparecem sobre o primeiro-ministro, então ajudante no governo de A. Guterres não foram lançadas pelos procuradores, não foram adensadas no despacho final e nem foram sequer ponderadas nesse despacho de modo diverso do que resulta dos autos e que um assistente constituído - José António Cerejo- tem dado conta no Público ( teme-se no entanto, que já lhe tenham cortado a colecta, no jornal).
As suspeitas que incidiram sobre o primeiro-ministro foram aventadas pelas notícias de jornais, num estilo bem próximo do que o Independente que ISL dirigiu, fazia semanalmente, para se manter à tona da água das vendas e da sobrevivência económica. Portanto, com um interesse em apimentar ou colorir certas notícias puxadas em determinado sentido interpretativo, em modo criativo numa excrescência de novo jornalismo adulterado. ISL conseguia de facto imprimir nessa altura ao jornal que dirigia esse pathos celerado e que no tempo de Portas e MEC assustavam políticos semanalmente e rendiam leitores a um ritmo assustador para o Expresso. Por exemplo, no caso Sara Pina, ISL excedeu-se neste jornalismo de pacotilha. Mas há outros, muitos outros infelizmente, anteriores, como o caso da manta da TAP de Deus Pinheiro. Para verificar certas ignomínias semanais e de suspeitas sempre em riste basta percorrer as capas do tal jornal para verifica este jornalismo adulterado. E são estes jornalistas quem depois vêm acusar magistrados de lançar suspeitas em despachos finais onde apreciam factos de onde as mesmas podem necessariamente resultar, até sem interpretação criativa.
Portanto, também neste caso, os procuradores o que fizeram foi outra coisa que ISL e outros não entendem muito bem e como se lhes aparenta um caso susceptível de lançar chamas sobre a reputação de magistrados, aparecem agora como pirómanos em estio seco.
Os procuradores fizeram constar do despacho final o resumo das suas investigações o que é perfeitamente natural, legítimo e desejável face à necessidade de transparência da Justiça. Nada mais e nada menos. Se tal resumo alargado permite a formulação de suspeitas sobre alguém que não foi acusado, nada de admirar porque os factos elencados nos autos ( e não necessariamente no despacho final) assim o permitem como o referido J.A. Cerejo tão bem tem exemplificado.
As circunstâncias que impediram uma investigação eficaz podem ficar de fora de um despacho final mas se porventura constituem elas mesmas um modo de avaliar a investigação e as dificuldades inerentes, só é de louvar que se tenham exposto para todos verificarem as limitações da lei processual em certos casos concretos. Se as cartas rogatórias não foram respondidas, se alguns elementos de prova não foram apreciados por ilegalidade imanente e se algumas diligências ficaram por cumprir devido a prazos peremptórios ou de naturesa incerta nada melhor do que dar conta disso mesmo num despacho final para que todos possam ler, assinado por magistrados o resultado final de uma investigação.
Se deficiências houver nessa tarefa, melhor ainda para quem se viu acusado injustamente. Poderá sempre diligenciar em termos processuais para que lhe seja aplicada justiça.
Um processo penal serve para uma coisa essencial e que não é necessariamente a de declarar a inocência deste ou daquele. Serve para encontrar o responsável pela prática de um facto criminoso e só esse responsável. Ora, no caso, foi encontrado o responsável pela prática do crime de corrupção? Não foi. E não havia suspeitas de tal? Havia e sólidas. E porque não foi? A resposta está no despacho e é assim mesmo que deve ser, mesmo que alguns magistrados discordem e tenham exprimido publicamente essa discordância, alguns com a elegância do próprio PGR que nunca deveria ter ficado surpreendido com o teor do mesmo.
Se ainda assim resultam suspeitas sobre o primeiro-ministro no caso concreto, elas advém, não do despacho em si mesmo, mas do conteúdo dos autos, como o referido J.A. Cerejo tem demonstrado à saciedade. Será preciso repetir isto quantas vezes para que se possa olhar a floresta ultrapassando a árvore da conveniência duvidosa e muitas vezes interesseira?
Em seguida, outro equívoco: a investigação foi mal conduzida, segundo ISL. É pena que não diga logo porquê, ficando a acusação gratuita. Como é grátis o meu comentário também: ISL não percebe do que escreve e por isso devia primeiro estudar e entender minimamente, para escrever com um mínimo de credibilidade nestas matérias. As fontes, mesmo anónimas, não costumam fornecer sabedoria infusa, incluida.
E continua nos equívocos quando invoca a sua moral para assim escrever: diz que defende a verdade e os direitos fundamentais. Quanto a estes nem preciso de lhe lembrar certas capas do antigo Independente ou certos artigos já por aqui comentados recentemente, para lhe dizer que a sua verdade é tão subjectiva que por vezes se torna um abuso de liberdade de imprensa e noutras vezes entra no capítulo dos crimes contra a justiça por violação do respectivo segredo, mesmo que por tal não tenha sido condenada recentemente. Será que o despacho que a acusou também era uma "injustiça irreparável"?
A lógica de que sendo as buscas efectuadas no âmbito do processo, uma verdade, autoriza a que se noticie essa verdade? E as escutas em que o primeiro-ministro interveio e foram consideradas nulas e de nenhum valor, também não são uma verdade factual? E ISL publicá-las-ia se a elas tivesse acesso?
Além disso, a inquirição de dois governantes actuais e de então é apresentada como uma diligência de sentido possível num tempo desejável, porque os procuradores, numa repetição já cansativa de um refrão entoado por apaniguados, "só não tiveram mais tempo porque não o requereram".
Sabe ISL se assim é, de facto? Precisamente para contextualizar essa circunstância foi elaborado o despacho do modo como o foi , mas é preciso saber ler o mesmo para interpretar o que está no processo e -mais uma vez- um assistente como J.A. Cerejo tem vindo a noticiar ( se calhar já com a colecta cortada por jornalistas lídimos e adeptos de uma certa verdade de conveniência).
A verdade pode vir sempre ao de cima, mas há diversas verdades e uma é a que convém a certas pessoas. Por exemplo, os suspeitos. Essa verdade da babugem já foi declarada formalmente: não foram acusados. E por isso, concluem com toda a lógica dos espertos acompanhados por certos Chicos dos jornais: inocentes. É esta a verdade apaparicada por ISL e outros jornalistas? Se for, é altamente suspeita também porque além da babugem está a limpidez da água não inquinada e é preciso saber descobri-la para a beber sem perigo de contaminação.
Por fim, o derradeiro equívoco: o que retoma a tese da cabala tão cara a este poder socialisticamente situado. Desde o primeiro momento em que se soube que o processo Freeport tinha sido iniciado, com suspeitas sobre políticos então governantes do PS, por militantes do PSD que o caso assumiu feição política. É o terreno minado por excelência de quem faz do combate político a razão da sua existência profissional. Vivem disso, para isso e por isso e desse modo, assentam os argumentos nesse campo minado de cabalas e contra-cabalas.
O caso Casa Pia não deixou nenhuma lição para estes jornalistas?
Se um "grupo da Aroeira" teve influência na abertura de um Inquérito é isso que torna suspeita e inquinada toda a investigação' Será tudo falso por isso mesmo e por representar uma maquinação político com óbvios objectivos eleitorais, na época?
Qualquer pessoa minimamente informada e sensata sabe que não. Mas então porque continuam a insistir neste equívoco à semelhança da suspeita que lançam sobre uma Teresa Costa Macedo no caso Casa Pia? É defeito profissional? Feitio?
Todos sabemos, pressentimos, entendemos, intuimos que havia e há suspeitos no Freeport muito para aquém e além do despacho final. Não é pelo facto de o primeiro-ministro não ter sido investigado e ouvido, nas circunstâncias restritivas que o despacho final dá ampla conta, e a meu ver muito bem, que se pode extrair a ilação que essas suspeitas nascem e brotam com fulgor desse despacho. Já existiam nos jornais onde ISL escreve e não foi por isso que se solidificaram.
O que o mesmo faz é outra coisa: mostra que as suspeitas iniciais e que os jornais fizeram amplo eco, suscitado por sonoridades nacionais e estrangeiras bem conhecidas actualmente, não foram dissipadas nem cristalizadas por dificuldades na investigação inerentes à legalidade vigente e às vicissitudes processuais.
Quanto a mim foi só isso e por isso foi muito bem escrito desse modo.