quarta-feira, outubro 27, 2010

Um pequeno exemplo, ao cuidado dos jornalistas

Notícia do Público comentada aqui:

O Ministério das Finanças pagou 42 mil euros a um escritório de advogados por um projecto de diploma sobre arbitragem fiscal que, caso fosse promulgado, limitaria a acção da administração fiscal e autonomizaria o contencioso judicial de primeira instância, por pressupor que é difícil melhorar o funcionamento do Fisco ou dos tribunais tributários.

O projecto, que espera a promulgação, está agora a ser alvo de alterações significativas, não se sabendo ainda qual a versão final a ser apresentada pelo executivo.

O Governo justificou esta encomenda por se tratar de um tema de "elevada complexidade técnica e necessidade de trazer ao texto experiência da advocacia em matéria de contencioso tributário". O processo iniciou-se em 2010 com a audição informal de juristas. E a escolha recaiu sobre Gonçalo Leite de Campos, advogado do escritório Sérvulo & Associados e filho de Diogo Leite de Campos, jurista que é actualmente vice-presidente do PSD e um dos defensores públicos da arbitragem.

Repare-se bem na justificação: "por se tratar de um tema de "elevada complexidade técnica e necessidade de trazer ao texto experiência da advocacia em matéria de contencioso tributário".

O Estado-Administração reconhece que não tem ninguém ao seu serviço que seja capaz de legislar sobre a tal "matéria de contencioso tributário." Confessa por escrito que não tem assessores nem departamentos jurídicos capazes nem sequer existem na Assembleia da República pessoas com essa capacidade legislativa pelo que o assunto passa pela entidade que em princípio nem devia legislar mas apenas executar as leis. Para que vale a Constituição que temos e o regime que fizemos e aprovamos, se os papéis básicos e essenciais da democracia se invertem e temos como legisladores correntes em matéria importantíssima para o Estado de Direito, escritórios particulares de advogados que ninguém sufragou e se movem por altos interesses particulares? Que valem os princípios do Estado de Direito perante estes atentados flagrantes?
O Governo há anos que reserva milhões do Orçamento de todos nós, para pagar a estes especialistas que de repente aparecem como os autênticos legisladores.
E por isso, mais esta vez, contratou um suposto especialista de direito tributário. Quem, afinal?
Gonçalo Leite de Campos, filho de Diogo Leite de Campos, professor de Direito em Coimbra e político nas horas vagas, por conta do PSD, para além de comentador ocasional de tv.
Anda de comboio entre Coimbra e Lisboa. Em carruagem de conforto, mas por vezes engana-se e entra na turística.
Gonçalo Leite de Campos é advogado onde? Na firma Sérvulo & Associados. Uma firma que no ano passado se fartou de prestar assessoria remunerada a preço de ouro, ao governo que está e provavelmente com o mesmo fundamento: ausência de capacidade e competências no Estado para as tarefas legislativas básicas.
Como são os verdadeiros legisladores é legítimo que nos interroguemos sobre quem são, onde vivem, quanto ganham e conheçamos as suas declarações de rendimentos que devem apresentar no tribunal Constitucional, como os políticos o fazem.
Gonçalo Leite de Campos é assim o legislador programado para um diploma fundamental que mexe com a essência do direito tributário, mesmo na vertente substantiva. Todo o fundo da questão se prende com mais uma desjudicialização dessa matéria, que pelos vistos o Governo reconhece ser irreformável. Segundo o Público, "Na base do projecto estão vícios de funcionamento da DGCI e dos tribunais, assumidos oficialmente." Tal e qual. E por isso, os caça-vícios são as grandes firmas de advogados. Que se dedicam a troco de verbas orçamentadas, em números milionários, a legislar por causa desses viciosos. Já foi igual no caso do direito de contratação pública, com um código vindo da mesma firma, a Sérvulo & Associados. Por isso mesmo, se calhar, não há regulador para fiscalizar o número, espécie e qualidade dos contratos de adjudicação directa de serviços.
Gonçalo Leite de Campos tem um perfil na Net. É este. Desde há uma dezena de anos anos para cá ( acabou o curso em 96 estagiou até 1999, mas foi logo para a assessoria jurídica de um banco) é advogado. Primeiro de uma firma menor ( Menezes Falcão), mas depois no top da nata da advocacia portuguesa: PLMJ e Sérvulo & Associados, onde em menos de cinco anos se torna sócio principal da firma que legisla para o regime.
É notório que se torna premente conhecer estas pessoas, pessoal e profissionalmente. Imprescindível porque demasiado importantes na democracia frágil que temos. São eles, actualmente, os senhores fo regime. Não são os empresários.
Isto foi sempre assim? Não, de maneira nenhuma. É agora, de alguns anos para cá. De repente desapareceram os auditores jurídicos ( mesmo os que davam pareceres verbais), as comissões de juristas ad hoc, as comissões de especialistas na A.R. e apareceram estas firmas em substituição. Em verdadeiro outsourcing legislativo.
Diogo Leite de Campos pai, é o mesmo que num programa de tv Prós & Contras, há uns tempos largos, se manifestou muito surpreso por se falar em corrupção em Portugal. Assegurou que nunca viu tal coisa, do modo que se fala. Pudera!

7 comentários:

zazie disse...

"por vezes engana-se e entra na turística"

ahahahahahahahahaha

joserui disse...

Bom texto! -- JRF

joserui disse...

(Não que os outros sejam maus) :) -- JRF

JC disse...

E mais ainda, caro José:
Parece que o parecer realizado por ditos "especialistas", pago a peso de ouro, afinal não serviu! Propunha soluções más de mais!

E o Min das Finanças lá teve de por os seus próprios técnicos - que afinal até parece que os tem - a corrigir o parecer que encomendou e pagou!

Está na notícia do Público.

Como s paga esta e outras tantas e tantas despesas sumptuárias?
Reduzindo o salário dos funcionários públicos.
Retirando benefícios fiscais.
Aumentando impostos.
"Partindo a espinha" aos magistrados.

Puta que os pariu!

josé disse...

De gravata verde, careca luzidia e pastinha na mão, dirigia-se certamente para a reunião magna da direcção do PSD. À noite lá estava na tv, sentadinho da mesa...

Este Mota de Campos é um ponto.

Karocha disse...

eheheheheheheheheheh!!!!

Mani Pulite disse...

AI, CRUZES CREDO,CORRUPÇÃO EM PORTUGAL É COISA QUE NUNCA VI NEM EXISTE.VOU JÁ TELEFONAR AO TEIXEIRA ANTES QUE FUJA NO CACILHEIRO PARA MARGARITA PARA ELE ME MANDAR A MALA COM O PAGAMENTO DO PARECER JURÍDICO QUE FIZ POR AJUSTE DIRECTO PROVANDO QUE NÃO HAVENDO CORRUPÇÃO EM PORTUGAL ESSE CRIME DEVIA DEIXAR DE SER UM CRIME.

Megaprocessos...quem os quer?