segunda-feira, maio 05, 2014

O ovo da serpente metonímica

A revista francesa Philosophie, deste mês de Maio tem esta capa:


"Existirá um pensamento fascista?", pergunta a revista, com resposta em várias páginas interiores e relacionada com um problema que os franceses enfrentam: a subida eleitoral da extrema-direita, sem subterfúgios ideológicos ou políticos. É mesmo a extrema-direita, assumida como tal que vai de vento em popa eleitoral e assusta os bien-penseurs.

E nós, por cá? Todos bem, não temos o "problema". Desde logo porque nem temos uma extrema-direita que assuma essa característica e seja parte do sistema político vigente. Desde os jornais da Impresa Sic até ao O Militante do PCP, nenhum órgão de informação que se preze dá guarida a ideias "fascistas" ou de "extrema-direita". 
Como tais ideias são o lumpen intelectual, a escumalha do pensamento e o opróbrio dos democratas do chavão são por isso democraticamente censuradas e mantidas no bom recato do olvido.

Os franceses, porém, querem saber mais e aprender sobre as ideias fascistas e outras. E escrevem abertamente sobre as mesmas, com categoria que por cá negligenciamos, porque temos cretinos a dirigir a comunicação social.
Basta-nos ter a "geração mais bem preparada de sempre" e portanto não temos qualquer necessidade de pensar nessas bagatelas ideológicas. Para isso temos os artures baptistas da silva, palafreneiros da cretinice em barda, todos os dias presentes nas impresas sic e ao fim de semana, nos jornais.


Como chegámos aqui, à ausência de debate e aos contentinhos baptistas da silva? A meu ver, através de uma figura de estilo espalhada pela linguagem corrente: a metonímia, ou seja  a alteração do sentido natural dos termos, com modificação da linguagem.

De há quarenta anos a esta parte temos um "fascismo" bem definido numa figura grande estilo: Salazar. Agora até parece que um dos metonímicos do sistema pretende recuperar a figura e substitui-la por outra mais hedionda, Marcello Caetano, que, esse sim, seria o verdadeiro "fascista" .

Temos ainda um regime fascista, por excelência, definido logo nessa altura com todos os ademanes da conveniência ideológica. Qualquer aluno do ensino básico o sabe de cor, designando os nomes dos "fascistas".

O que nos falta? Juízo, claro está. Senso comum do mais simples.  Nem Salazar foi fascista; nem Caetano o seria,  nem o regime de ambos caminhou de fascio na mão.

Quem o disse? O crismador-mor, o intelectual Eduardo Lourenço que em 1976 não tinha dúvidas e até escreveu um livro para o provar:



Passados uns  anos  ( muitos anos porque esta desfiguração leva sempre muito tempo a compor-se em letra de forma)  "pensou melhor" e transfigurou-se no estilo.

Eu escrevi um livrinho com o título “O Fascismo Nunca Existiu”. Tinha um título irónico, numa altura em que efectivamente alguns reflexos do antigo regime começavam a querer voltar à tona de água. Mas hoje, passados tantos anos, penso que esta ironia tem alguns aspectos de verdade. Primeiro, o regime nunca se assumiu como fascista, embora na primeira fase seguisse o modelo mussoliniano. Toda a gente sabe que Salazar tinha o retrato de Mussolini na sua secretária, e que só quando ele entrou na guerra é que o substituiu pelo do Pio XII. De resto, não há grandes parecenças entre um grande histrião político, como era Mussolini, e aquele senhor reservado, professor de Coimbra, que era Salazar. De todos esses ditadores, é o mais difícil de definir. Há algumas coisas escritas sobre ele, como as do embaixador Franco Nogueira, muito centradas na acção diplomática, mas há ainda muito a fazer. O contraste entre a literatura suscitada por Mussolini ou Franco e o que se escreveu sobre Salazar é enorme. Mas é claro que a Espanha de Franco e a Itália de Mussolini tiveram muito mais influência nos acontecimentos da Europa do que Portugal. A principal preocupação de Salazar era a de que não se fizessem ondas, para ele poder governar tranquilamente, à sua maneira. E de algum modo conseguiu.

Antes dele já um antigo "antifassista" tinha desfigurado o retrato fotomaton e metonímico,  precisamente no Expresso de 23 de Abril de 1989 e atribuiu a Salazar a mais alta condecoração que um cidadão político pode ostentar: a "recta intenção".


Poderá então  saber-se como é que a Mentira metonímica continua a perdurar e a repetir-se nos media das Impresas sic e noutros lados, retomando a velha palavra-mágica que garante pergaminhos democráticos a quem a usa?

É fácil porque foi precisamente quem a criou que a alimenta a esterco ideológico permanente:

"(...) à política de unidade da classe operária como base da unidade antifascista; ao carácter essencial da luta de massas; ao papel determinante da organização; à definição da ideologia de classe como ideologia do Partido, fazendo do PCP um Partido leninista definido com a experiência própria. "

É este o ovo da serpente metonímica que continua a gerar o dialecto putrefacto que aduba as impresas sic e outros lugares do mesmo culto.

15 comentários:

José Domingos disse...

Rolão Preto, tentou fundar um partido de extrema direita em Portugal, e esteve preso, por isso, pela Pide/Dgs. Houve a tentativa de criar, os camisas castanhas, como em Itália, e foram expulsos de Portugal, por isso.
Ainda não percebi, que raio de fascismo, é que existiu em Portugal, talvez alguém de um partido não democrático, tipo pcp, me explique.

Floribundus disse...

depois do 25.iv passei a viver numa ditadura semelhante à da falida e falecida (por implosão) urss

é SOCIAL-FASCISTA o paleio que se se ouve e escreve por parte
das varelas , dos prof drs politólogos, dos boxexas, arménio, estaline da ugt, todos muito seguros de si próprios

os fascistas tipo ximãozinho destruidor do ensino, moreira pai da filha,
mudaram-se para o ps

os outros com raras excepções abrigaram-se debaixo da cama

'nem o pai morre,
nem o povo almoça'

JC disse...

Em 1989, pelos vistos, ainda se podia escrever num jornal de referência como o Expresso um artigo como este do António José Saraiva, a elogiar as virtudes de Salazar...

Agora, passados 40 anos sobre o 25-4, não acredito que tal fosse possível.

Porque é que as coisas, neste domínio, estão a andar para tràs?

Como é que de repente, os Jerónimos, Arménios e restante comandita ganhou tanta força em Portugal?

Como é que antigas figuras conotadas com a direita (Freitas do Amaral, Ferreira Leite, Basílio Horta), aparecem agora, 40 anos depois do 25-4, de braço dado com a esquerda?

Como é que os jornais e as TV's estão cada vez mais esquerdistas?

José disse...

Como? A Mentira da Metonímia. A Força que se tornou Verdade à custa de ser mil vezes repetida.

Já ninguém se atreve a contestar porque se o fizesse nas impresas sic seria despedido/a.

Está a ver a Lourenço a fazer figuras destas?

Anónimo disse...

Os nacional-sindicalistas foram postos na ordem, que isto de haver lugar para dois chefes não podia ser.Uns aderiram ao regime, outros foram á sua vida e outros tornaram-se oposicionistas. O engraçado foi ver o percurso que o líder dos camisas azuis depois tomou, até ao ponto de ser condecorado e tudo. Na volta, se tivesse havido um nazi qualquer que tivesse sido opositor do Salazar ainda tinha sido condecorado também, depois do 25 do quatro. Mas pronto, o regime foi fascista e todos eram fascistas. Nos nossos dias é a mesma coisa, quem não está com a verdade é facho.

Choldra lusitana disse...

Seguindo o raciocínio do pensador de Vence,o filósofo do regime que temos e de seu nome Eduardo Lourenço,a rainha D.a Amélia também teria sido uma notória fascista por ter o retrato do Salazar na sua secretária. Cambada!

João Nobre disse...

Pessoalmente considero que o Estado Novo se pode definir em três fases. Na primeira (1933-1945), houve realmente uma grande aproximação aos fascismos europeus e o regime adoptou uma estética de óbvia influência fascista.

Na segunda fase (1946-1967), o regime de Salazar abandonou gradualmente a sua influência fascista de forma a poder inserir-se melhor no Mundo das democracias liberais do pós-Segunda Guerra Mundial.

Na terceira fase (1968-1974), o Estado Novo, sob a liderança de Marcello Caetano continuou o seu processo de abertura e aproximação às demcoracias liberais, porém, inúmeros problemas de ordem estrutural e determinados interesses instalados ficaram por resolver e determinaram a queda do regime.

O 25 de Abril foi a prova de que o Estado Novo fracassou como modelo político-económico.

Publiquei:

http://www.historiamaximus.blogspot.pt/2014/05/o-ovo-da-serpente-metonimica.html

Anibal Duarte Corrécio disse...

O Ferraz da Costa que se chegue à frente.


Floribundus disse...

da Net

« ao colocar-se o ovo da serpente de encontro à luz
é possível ver, através da transparência da casca,
a serpente (o monstro) que irá nascer.

Essa expressão popular, o ovo da serpente,
alastrou-se em todo o mundo, e serve como
parâmetro para tudo que, ao nascer, possa a vir
a ser pernicioso e poder causar futuros prejuízos a sociedade »

zazie disse...

O que está a ser gerado. É mais isso.

Anibal Duarte Corrécio disse...

"O 25 de Abril foi a prova de que o Estado Novo fracassou como modelo político-económico."

O 25 de Abril foi o assalto dos comunas, mais tarde os corruptos, ao Estado.

zazie disse...

Desde quando é que o modelo económico do Estado Novo falhou?

Nem pouco mais ou menos. A falta de tino dso abrilistas é que deitou tudo a perder.

muja disse...

Não concordo com essa avaliação que faz José. Já lho tinha dito até.

É mesmo a extrema-direita, assumida como tal que vai de vento em popa eleitoral e assusta os bien-penseurs.

A FN não é extrema-direita. Não é. Extrema-direita é revolucionária e socialmente progressista. Coisas que se não aplicam de todo à FN.

O Casa Pound italiano é-o bem mais, parece-me. Mais não conheço muito, tenho que investigar.

Em França a censura mediática é muito maior que em Portugal, e mais agressiva.

Tenho para mim que as diferenças - as que objectivamente o José aponta - se devem duas ordens de motivos: imigração e quantidade de gente.

Em França há muito mais imigrantes e há o "comunitarismo" que é fonte de inúmeros problemas. Por exemplo, a FN, para além dos franceses "de souche", está a conquistar o voto dos imigrantes porque, como é fácil de ver, os primeiros interessados em estancar a imigração são os imigrantes que já lá estão. Depois, a oligarquia que manda lá incentiva as comunidades e vira-as umas contra as outras apesar da República Francesa não reconhecer comunidades de nenhuma ordem.

Depois há muito mais gente em França. Por um lado, há maior diversidade intelectual, e por outro é mais fácil um partido como a FN, ou mesmo movimentos de menor dimensão, obterem massa crítica para conseguirem não ser ignorados pelos media.

Mas o tom geral antifachista, a linguagem bem-pensante, etc, etc, está lá em muito maior força do que em Portugal. A FN é tão vilipendiada em França como aqui o seria. Provavelmente mais ainda.

muja disse...

Ou seja, com a história da imigração, a esquerdalha - ou seja, os oligarcas que a pagam e mandam nela - criou um pau de dois bicos com que se começa a picar.

Hão-de ser os imigrantes - particularmente os muçulmanos - que hão-de levar os conservadores - a FN - ao poder em França.

Começa a criar-se uma solidariedade entre muçulmanos e católicos, porque os primeiros começam agora a ser alvo da perseguição jacobina que foi e é movida aos segundos.


muja disse...

Em Portugal, o ambiente é muito mais homogéneo e não existem esses problemas. A esquerda (a ladroagem no fundo, porque só há esquerda) continua no paraíso porque ninguém com vontade é ainda capaz de se forçar nos media e agitar as águas.