sábado, janeiro 28, 2017

Entrevista de Daniel Oliveira ao i: um compêndio de oportunismo

 Dani, o vermelhinho, reciclou a vidinha na social-democracia. Escreve no Expresso e fala na SIC. Por mês, entram-lhe no bolsinho para aí, sei lá,  uns dez mil euros, não?

Pois isso fará toda a diferença. E a prova é que estão aqui todos os cambiantes que fazem de alguém um canalha político. A escola está aqui toda nestas frases de circunstância.

 Daqui:

"Para mim, a solução – e aí discordo de muita gente do PCP e do Bloco –, eu acredito na reconstrução do espaço à esquerda que tem como polo central a social-democracia. Penso, aliás, que foi essa plataforma que Bernie Sanders conseguiu oferecer, um núcleo duro social-democrata com uma série de sectores radicais que apostaram nessa candidatura. Não digo que tem de ser sempre em torno dos partidos socialistas, mas de respostas sociais-democratas – isso dependerá de país para país. Infelizmente, acho que o Syriza perdeu esta batalha. Acho que António Costa conseguiu perceber isso a tempo, ao contrário do que aconteceu em Espanha, onde os socialistas perdem pé para o Podemos.
Em quem votaria hoje?
Hoje votaria no BE. Tenho muitas críticas ao Bloco, mas acho que teve um papel positivo ao ajudar a construir esta solução. Não fez mais que o PCP, mas eu tenho muitas divergências ideológicas com o PCP. Tenho divergências em matérias de política interna, como se organiza e de política internacional. Estou bastante satisfeito até com a gestão do Partido Socialista. A razão por que votaria no BE e não no PS é que acredito que a solução mais à esquerda para este país exige que isto seja uma solução partilhada. Não quereria ver o PS com maioria absoluta porque acredito que mesmo que António Costa quisesse seguir outra política, não conseguiria, porque as suas alianças seriam outras, e seriam exclusivamente internas e não externas. E isso, historicamente, deu mau resultado. Há coisas que ainda me incomodam no Bloco deste ponto de vista: do ponto de vista estratégico, é muito mais frágil que o PCP, continua a ser um partido com pouca estratégia e muita tática, e com pouco rumo. E neste sentido não se percebe o que procuram sem ser a curto prazo. Não preciso de amanhãs que cantam como o PCP, mas gostava que isso fosse mais claro no Bloco. Nos momentos mais difíceis da geringonça, vejo o PCP mais firme no percurso que decidiu fazer do que o Bloco: demasiadas vezes, o Bloco distrai-se com o seu próprio fogo-de-artifício, e não é tempo para isso. Vivemos um tempo de muita urgência. Mesmo que isso implique alguma cedência. Portugal é hoje um oásis de normalidade no mundo. Aqui ainda se pode discutir em padrões normais, não estamos a discutir o mais elementar dos direitos humanos, e isso vale tanto que todos os partidos têm de estar à altura deste facto. Devem pensar todos 20 vezes antes de colocarem em causa uma solução que, enquanto os partidos não se desentenderem, tem claro apoio maioritário. Até porque as pessoas têm consciência disso. Há, apesar de tudo, um ar diferente do que se respira no resto do mundo. Às vezes não sinto que os três partidos valorizem esta solução, que é acarinhada pelos eleitores.

(...)

 Pegando num caso da actualidade, como vê o caso José Sócrates?
Vejo como?
Acho que inicialmente não acreditava muito na possível culpabilidade do antigo primeiro-ministro. Hoje tem a mesma impressão?
A questão nunca se pôs assim para mim. Eu nunca coloquei a questão assim e as pessoas tendem a não compreender isto. Há uma coisa de que eu tenho muito receio...
É não acreditar na justiça portuguesa?
É mais do que isso. É qualquer tentativa de ultrapassar a frustração política que sentimos encontrando nos tribunais o que não resolvemos na política. Tenho uma resistência à partida que choca com a vontade que tenho de que os nossos interesses e os do Estado sejam defendidos dos corruptos e de pessoas que o utilizam para seu benefício próprio.
Receia uma judicialização da política?
Não quero uma República dos juízes. Não confio mais em juízes que em políticos. Confio menos até, porque nos políticos eu voto, e nos juízes não. O político, se for mau, eu arranjo maneira de me livrar dele, como nos vimos livres do José Sócrates, e dos juízes não. A segunda coisa a que eu me oponho é a aliança tática entre os jornais tabloides e a justiça, que eu acho que é perigosíssima para a democracia, a utilização dos tabloides para se fazer na praça pública o que não se consegue nos tribunais. Estas são as minhas duas resistências. Sobre o processo em concreto, não sei mais do que a maioria das pessoas. Eu não tinha, e isso distingue-me de muitas pessoas, nenhuma convicção especial sobre José Sócrates: nunca votei nele, nunca o apoiei. Não tinha nenhuma convicção sobre a sua honestidade pessoal; hoje tenho algumas e nem dependem do resultado em tribunal de coisas de que ele possa ser acusado criminalmente. Há coisas que eu sei, porque o próprio confirmou, sobre uma dependência económica em relação a uma pessoa que não têm justificação possível. Não há nenhuma justificação legítima. Ao contrário de outras pessoas honestas que apoiaram Sócrates, compreendo que essas pessoas se considerem traídas; eu não me considero porque nunca tive essa posição em relação a ele.
Chegou a almoçar com ele?
Várias vezes. Mas também almocei com Marcelo Rebelo de Sousa e, como é natural, conheço muitos políticos. Conheço quase todos os políticos que estão no activo. Conversei várias vezes com José Sócrates, nunca sobre estes temas, sempre sobre política. É uma figura que eu continuo a considerar curiosa.
Porquê?
Há um lado trágico e excessivo da figura que a torna curiosa do ponto de vista romanesco. É uma figura, no que tenha de odioso e extraordinário, densa. Há qualquer coisa tão excessiva em José Sócrates, nos seus defeitos e nas suas qualidades – muitas estão relacionadas. Ninguém põe em causa que Sócrates era um combatente temível e extraordinário, e isso vem do seu excesso. Desse ponto de vista, ele é uma figura interessante. Há outras que, nesta perspectiva, visto de fora, considero muito interessantes: Paulo Portas, com densidade intelectual e até como personagem. A razão por que eu nunca tive qualquer interesse em Passos Coelho e Cavaco Silva é que eles eram figuras desinteressantes e sem nenhuma densidade. São bonecos de coisas previsíveis, sem qualquer interesse. Há muitos anos escrevi que, depois de Cunhal e Soares, só havia duas figuras políticas intelectualmente extraordinárias na política portuguesa: Francisco Louçã e Paulo Portas.