terça-feira, janeiro 17, 2017
Uma vergonha de Estado, por causa de um juiz do STJ
Observador:
O Tribunal Europeu dos Direitos do Homem (TEDH )condenou o Estado português num caso que envolvia um texto escrito por José Manuel Fernandes (atual Publisher do Observador), em 2006, quando era diretor do Público. Esse texto, A estratégia da aranha, uma crítica ao discurso de tomada de posse como presidente do Supremo Tribunal de Justiça, de Noronha do Nascimento, foi considerado difamatório pelos tribunais portugueses, que condenaram o jornalista a pagar uma indemnização de 60 mil euros àquele juiz.
O texto em causa e pelo qual José Manuel Fernandes foi condenado nos tribunais portugueses a pagar uma indemnização ao juiz Noronha Nascimento ( o que considerou, juntamente com o PGR Pinto Monteiro que não havia indícios criminais contra José Sócrates, em 2009, relativamente a um crime de atentado ao Estado de Direito e mandou destruir as escutas indiciadoras):
Noronha de Nascimento, o homem que vai presidir ao Supremo, representa a face sombria da nossa justiça
Querem um símbolo, um expoente, um sinónimo, dos males da justiça portuguesa? É fácil: basta citar o nome da Noronha de Nascimento e tudo o que de mal se pensa sobre corporativismo, conservadorismo, atavismo, manipulação, jogos de sombras e de influências, vem-nos imediatamente à cabeça.
O juiz - porque é de um juiz de que se trata - é um homem tão inteligente como maquiavélico. Anos a fio, primeiro na Associação Sindical dos Juízes, depois no Conselho Superior da Magistratura, por fim no Supremo Tribunal de Justiça, esta figura de que a maioria dos portugueses nunca ouviu falar foi tecendo uma teia de ligações, de promiscuidades, de favores e de empenhos (há um nome mais feio, mas evito-o) que lhe assegurou que ontem conseguisse espetar na sua melena algo desgrenhada a pena de pavão que lhe faltava: ser presidente do Supremo Tribunal de Justiça. O lugar pouco vale (quem, entre os leitores, sabe dizer quem é o actual presidente daquele tribunal, formalmente a terceira figura do Estado?). Dá umas prebendas, porventura algumas mordomias, acrescenta uns galões, mas pouco poder efectivo tem.
O problema, contudo, reside neste ponto: tem, ou terá? Os senhores juízes, que aqui há uns tempos se empenharam na disputa com o Tribunal Constitucional para saber quem era hierarquicamente mais importante (ganharam os do Supremo a cadeira do protocolo, deram aos do Constitucional a consolação de terem ao seu dispor um automóvel topo de gama...), nem sequer são muito respeitados. Por sua culpa, pois sabe-se que alguns passam pela cadeira do Supremo apenas uns meses e para engordar a sua reforma. O presidente daquele agigantado colégio de reverendíssimos juízes pouco poder tem tido, só que Noronha de Nascimento apresentou-se aos eleitores - ou seja, aos seus pares, aos que ajudou a subir até ao lugar onde um dia o elegeriam - com uma espécie de programa que arrepia os cabelos do mais pacato cidadão.
O homem não fez a coisa por pouco: ao mesmo tempo que vestiu a pele do sindicalista (pediu que lhe aumentassem o salário e que dessem menos trabalhos aos juízes...), pôs a sobrecasaca de subversor do regime (ao querer sentar-se no Conselho de Estado) e acrescentou o lustroso (pela quantidade de sebo acumulado) chapéu do "resistente" às reformas no sector da justiça.
Se era aconselhável que um presidente do Supremo Tribunal desse mais atenção a Montesquieu e ao princípio da separação de poderes do que à cartilha da CGTP, Noronha de Nascimento fez exactamente o contrário. Reivindicou como um metalúrgico capaz de ser fixado para a posteridade numa pintura do "realismo socialista" e, esquecendo-se de que é juiz e representante máximo do "terceiro poder", o judicial, pediu assento à mesa do "primeiro poder", o executivo. É certo que o poder do Conselho de Estado é tão inócuo como o penacho de ser presidente do Supremo Tribunal, só que a reivindicação contém em si duas perversidades. A primeira é ser sinal de que Noronha de Nascimento se preocupa mais com o seu protagonismo público do que com os problema da justiça. A segunda, bem mais grave, é que o homem se disponibiliza para ser o rosto de uma fronda dos juízes contra as decisões reformistas do poder político, neste momento objecto de um consenso alargado entre o partido do Governo e a principal força da oposição.
É tão patético que daria para rir, não estivéssemos em Portugal e não entendêssemos como funcionam as estratégias das aranhas. O homem, creio sem receio de me enganar, é tão inteligente e habilidoso como é perigoso. Até porque tem já um adversário assumido: o novo procurador-geral da República, Pinto Monteiro, um dos raros que tiveram a coragem de lhe fazer frente.
A vergonha que recai agora sobre o tribunal que condenou aquele jornalista dá maior ênfase à vergonha que consistiu ter no STJ um juiz como Noronha Nascimento pelos motivos aqui apontados.
Porém,numa coisa se enganou JMF no seu artigo de 29.9.2006 no Público: Noronha não era forçosamente inimigo de Pinto Monteiro e que este lhe faria frente. Eram, aliás, do mesmo naipe e bastou o Face Oculta para o comprovar. Na festa de lançamento do livro de José Sócrates sobre a tortura, relativamente ao qual existem fundadíssimas dúvidas de que tenha sido autor exclusivo, estavam lá os dois...
Este assunto foi por aqui debatido, na devida altura. E o conselheiro ufanou-se disso, depois, o que aumenta agora a vergonha.
Espero que José Manuel Fernandes escreva agora sobre o mesmo e o significado desta condenação do Estado português, bem como quanto ganhou o juiz conselheiro em causa nesta acção. Com números.
O Público acrescenta mais e publica o comentário de JMF:
Sobre o valor da indemnização por difamação, a quantia “é extremamente alta em si mesma”, diz o TEDH, e equiparada “ao valor médio da vida” segundo o decidido pelo Supremo Tribunal quando em caso de morte, o que revela para a instância europeia uma “clara intenção punitiva”.
Por ter considerado haver uma violação da Convenção, segundo o artigo 41 do mesmo documento, o queixoso deveria poder reaver a indemnização paga a Noronha Nascimento, mas como foi o PÚBLICO a custeá-la, não foi dado provimento ao pedido do jornalista de uma indemnização de 67 mil euros – correspondente ao que tinha sido sentenciado a pagar por difamação, acrescido de juros. Foi-lhe sim atribuído o direito de receber 9400 euros pelas custas judiciais do processo.
O Estado português pode ainda recorrer, mas cabe ao tribunal europeu decidir se aceita apreciar de novo a questão.
"É uma derrota para a justiça portuguesa, que neste caso não fez nada bem", comenta José Manuel Fernandes. "Noronha do Nascimento utilizou toda a artilharia que tinha à sua disposição - intimidando-me não só a mim como a minha família. E a sentença do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem fala disso".
A atitude de Noronha Nascimento em envolver a mulher do jornalista é uma habilidade saloia de um jurista de quico na crista, como cantava José Afonso: obter a ruína do casal como vingança pessoal. Foi o que o TEDH disse, ao mencionar o carácter punitivo da acção. E isso será inqualificável porque não se limita a tentar obter uma indemnização por danos sofridos, mas a uma punição pelo facto.
Como alias se revela imoral receber 67 mil euros de indemnização paga pelo Público e ficar a rir-se disto tudo.
De resto a culpa desta vergonha não é apenas de Noronha Nascimento mas dos juízes de primeira instância do tribunal Cível de Lisboa e do colectivo da Relação que subscreveu o acórdão que agravou a indemnização.
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
14 comentários:
"Atual" quantos?!
deviam publicar o nome dos juizes que condenaram JNF
O mais grave nem é a condenação do José Manuel Fernandes.
O mais grave é isto:
(Do Observador)
1.
"O TEDH também considerou que, ao envolver solidariamente neste processo a esposa do jornalista, os tribunais portugueses causaram não só dano à sua família, como ao estabelecerem uma “responsabilidade coletiva” relativamente ao artigo em causa, causaram “um sério efeito inibidor do exercício da liberdade de imprensa”."
2.
"O acórdão considera que a decisão dos tribunais portugueses, ao atribuírem uma indemnização num valor equivalente ao valor-padrão estabelecida para as indemnizações por morte, teve um intuito “punitivo”".
Isto foi deliberado.
Da decisão:
"On 13 November 2009 the Lisbon Civil Court found for the plaintiff [Noronha do Nascimento]."
José Manuel Fernandes saiu do Público no final de 2009.
Foi deliberado e o efeito pretendido foi conseguido.
Não deixa de me espantar a quantidade de calhordas que o 44 tinha no bolso. -- JRF
Demorei mais tempo a seleccionar placas de rua em quatro imagens que a comentar… a inteligência artificial anda fugida no "captcha". -- JRF
Inteligência artificial está o joserui a treiná-la, no caso, a identificar placas de rua...
A artificial pode fugir-lhes, já a outra é raro...
Muja, Muja, Muja… para a AI é trivial hoje em dia identificar placas de rua, correcto?
A propósito da conversa dos eucaliptos da outra vez… então o governo vai disponibilizar 18 milhões para melhorar a produtividade do eucalipto? Mais "contratos de investimento de 125 milhões de euros com o grupo Altri"? O petróleo é sempre mais verde se for com subsídios do estado. Este país não tem emenda.
Gostava de ver os liberais de vão de escada e reclamarem de mais esta interferência do estado em negócios privados. Mas o eucalipto é dos bons, é de direita. Repelente. -- JRF
@ Muja
Publixeiro.
Este Observador nem para limpar o rabo. Nem que fosse de papel.
Sim, correcto.
Mas só porque têm infindáveis exemplos como estes que a gente lhes dá indicando onde reconhecer as placas na imagem.
Mas custa menos dar quando parece receber eheheh..
Essa dos eucaliptos glosei-a há bocado, diziam ao PM que é preciso aumentar a produtividade, que rende pouco por área...
Bic,
Publixeiro - ora bem!
A notícia sobre esses tribunais, logo na primeira página, enganou-me.
Fui ver: são tribunais militares. A notícia deveria ser: tribunais militares com juízes próprios e alguns sem curso de Direito.
Ninguém ia ler...
Eu sempre disse que este “baixinho”, Noronha do Nascimento, é um porco, um bandalho. E, como ele, há milhentos na magistratura. Andam em roda solta, sem qualquer controlo nem castigo, impunemente. Por isto, quem quer deles se acha a encarnação do direito e da moral. Uns “filhos da puta”, sem que as suas mãezinhas sejam para aqui chamadas.
Enviar um comentário