terça-feira, janeiro 22, 2013

O Ministério Público e os poderes de facto das firmas

Crónica de Rui Cardoso ( presidente do Sindicato do MP) no Correio da Manhã de 21 de Janeiro 

«Controlar o Ministério Público
Em entrevista recente, um dos mais poderosos advogados portugueses faz grandes elogios aos juízes, mas ataca o Ministério Público, acusando-o de perseguir pessoas importantes (nomeadamente os seus clientes) com acusações falsas, em vez de se dedicar aos “casos normais da vida” (sic). Apesar de os processos contra “pessoas importantes” continuarem a ser raros nos cerca de 95.000 julgamentos criminais realizados anualmente, há, como se vê, quem queira que acabem mesmo.
No Brasil, está em curso um processo de revisão da Constituição que pretende retirar totalmente ao Ministério Público o poder de realizar investigações criminais e fiscalizar a actividade das polícias, dependentes dos poderes políticos. Se assim já fosse, casos de corrupção ao mais alto nível já julgados e condenados, como o do “mensalão”, não teriam sequer nascido.
Cá, como noutras partes do mundo, o que verdadeiramente interessa a alguns é controlar o Ministério Público. Aos juízes poderão ser dadas todas as condições para que julguem os casos com independência, desde que esses casos sejam apenas contra o “Zé Povinho”.»


Como deixei de ler jornais regularmente não sei quem é o tal advogado de que fala Rui Cardoso. Se souber, publico o nome. Afinal, já sei. É José Manuel Galvão Teles, um dos advogados das firmas do regime que deu uma entrevista à revista Advocatus.
Numa parte da entrevista fala ainda de um assunto premente para as firmas: o segredo de justiça. É um problema para as firmas e aqueles que normalmente elas defendem, os suspeitos excelentíssimos, como os italianos chamavam a uma certa classe de criminosos. Galvão Teles acha que se se escutassem os telefonemas de certos jornalistas e "do Ministério Público" (sic) se descobriria quem viola o malfadado segredo que tão mal faz à reputação de pessoas impolutas e por isso excelentíssimas.  É um problema, de facto. Mas com um acrescento que me atrevo a sugerir: mais depressa se descobriria se se escutassem certos advogados de certas firmas...

O dito advogado faz parte desta firma, a Morais Leitão, Galvão Teles e Soares da Silva  ( MLGTS)que tem ganho muito dinheiro à custa do Estado, em parecerística avulsa. Pode até dizer-se que parte das dívidas que temos, dívida pública, teve mão da firma. Como? Já foi escrito em tempos por aqui, assim:

E já agora, em coda, lembrar o que a "firma" MLGTS  e outras do regime ( as três irmãs) ganharam em desviar a atenção do odioso para as "corporações". Só se refere o que passou em 2008, altura em que " as corporações" andavam contentes com o "keynesianismo" do Estado ( que nunca pagava nada...conforme asseguravam os estudos das firmas). Portanto há um pouco mais de três anos. Se quiserem saber o que aconteceu depois disso...também há números. Mas não há artigos de Rui Patrício sobre o assunto, infelizmente:
"Em 2008, uma batalha jurídica começou com o Supremo Tribunal Administrativo a exigir ao Governo a informação sobre os honorários consumidos com estudos e pareceres realizados por sociedades de advogados. A Sérvulo Correia ganhou 4,26 milhões, a Rui Pena, Arnaut & Associados 549.000, a Morais Leitão, J. Galvão Teles, Soares da Silva & Associados 494.000 e a A. Maria Pereira, Sáragga Leal, Oliveira Martins, Júdice e Associados 418.000: 1/3 dos custos dos ministérios com serviços jurídicos externos. A Sérvulo Correia "serviu", em exclusividade, Paulo Portas, na assessoria jurídica para a Lei de Programação Militar, com a elaboração das peças concursais para a aquisição de material militar, e na defesa do Estado nos recursos apresentados: custou 2,2 milhões. Paulo Portas também contratou os escritórios de Nobre Guedes e Celeste Cardona para assessorias em negócios militares (os radares na Madeira e Açores, aeronaves C-295): 90.000.
A Sérvulo & Associados envolveu-se numa polémica com o TC por causa da auditoria/2008 sobre os consultores contratados pelo Estado, concluindo pela «falta de transparência» e pela ausência de «critérios de adjudicação»: em 489 contratos o Estado pagou 30 milhões, com a Sérvulo a "merecer" 1,6 milhões. O TC veio dizer que o Estado devia realizar concursos públicos ou consultas prévias, em vez de optar pelo ajuste directo. E criticou o novo Código por criar regras específicas para os contratos de consultadoria. A Sérvulo respondeu à altura, dizendo que as directivas comunitárias transpostas excluem os serviços jurídicos do regime geral e reconhecem a sua especificidade. O que indigna quem trabalha com o CCP não é o ajuste directo à SC - pelo que constato todos os dias - é o afastamento de assessores dos gabinetes ministeriais de uma matéria extraordinariamente relevante para o Estado, o que resultou numa "aptidão técnica" especial hoje reconhecida à Sérvulo.
(...)
Nos próximos 3 anos, as despesas com projectos, estudos, pareceres e consultoria vão ficar sujeitas a um limite máximo de 90 milhões, segundo prevê o Programa de Estabilidade e Crescimento. É uma redução de 5,5 milhões face ao OE/2010, em que se inscreveu 95,5 milhões para gastar com outsourcing (verba cativa a 50%, pelo que há 47,7 milhões disponíveis). Nos próximos anos, o Governo pode optar por cativar uma parte das verbas destinadas aos estudos, pareceres e consultoria, obrigando os serviços a justificar e a fundamentar a sua utilização.
O problema é óbvio para quem trabalha com o CCP: o Estado é apenas mais um cliente, as empreiteiras de obras públicas, fornecedores e prestadores também são clientes. E o Estado tem recorrido aos serviços de quem igualmente defende outros clientes. Quando o Estado escolhe quem os seus oponentes escolhem, os conflitos de interesses vir a ser intransponíveis. E, desconhecendo-se que estes existam, é certo que, às vezes, coexiste alguma promiscuidade mal explicada. Os quase 500 artigos do CCP são uma Torre de Babel para quem trabalha com contratos públicos. "
Para quem escreve contra a "corporação" é bom lembrar o que alguns dizem da "firma": 
 Jan Dalhuisen - A percepção que os investidores estrangeiros têm dos advogados portugueses é que estes defendem os interesses uns dos outros à custa dos seus clientes.
A semana passada referi que Portugal permanece uma sociedade bastante fechada. É verdade que certos políticos conseguem, por vezes, ingressar na elite. Os advogados são outro grupo de aspirantes, muito embora, na prática, tal não passe de uma ilusão: a elite não é tão facilmente vencida. Contudo, a persistência nesta ambição resulta num excesso de advogados e no desperdício dos maiores talentos do país. A minha longa experiência no ramo levou-me a concluir que os advogados raramente são uma mais-valia. Podem obter o ressarcimento de danos para algum cliente e, momentaneamente, restabelecer a paz social e o orgulho, mas em geral a actividade dos advogados não gera grandes benefícios globais. Pelo contrário, os advogados representam frequentemente um entrave ao progresso, sendo facilitadores voluntários de práticas que há muito deviam ter sido abandonadas ou que são destrutivas ou simplesmente desonestas. Em Portugal é o que não falta.

Quando os países têm tal excesso de advogados surgem problemas específicos. Em primeiro lugar, na concorrência pela obtenção de trabalho, até as boas sociedades de advogados se vêem forçadas a aceitar clientes de reputação duvidosa. Não existe ética, só negócio. Em segundo lugar, como a profissão atrai os maiores talentos nacionais, estes conseguem conceber qualquer esquema para proteger clientes que estariam melhor na prisão. Os vigaristas pagam sempre as suas contas, ainda que avultadas, e procuram especificamente a protecção que advém da reputação de uma boa sociedade de advogados. De facto, a única coisa que não podem dar-se ao luxo de perder é o apoio dos seus advogados.
 

7 comentários:

Floribundus disse...

fascismo na nova versão socialista
« tudo pelos políticos,
nada contra os políticos»

porque o novo aldrabão dae dirá política eternamente
« eu não estou aqui para enganar ninguém »

Floribundus disse...

fascismo na nova versão socialista
« tudo pelos políticos,
nada contra os políticos»

porque o novo aldrabão dae dirá política eternamente
« eu não estou aqui para enganar ninguém »

lusitânea disse...

Quanto mais advogados tivermos mais terceiro mundismo teremos...

Kaiser Soze disse...

Concordo com parte e discordo de outra.

Parece-me absolutamente absurdo que se espere que sejam os advogados a fazer justiça; quem tem de tratar disso são os juízes e o MP, coadjuvados, eventualmente, por advogados.
Se não for para defender clientes, sejam quem sejam, não vale a pena a profissão existir e o problema, central, não é o de usar expedientes, o problema central é que os expedientes existam.


Faz-me lembrar o discurso da esquerda contra os lucros das empresas... as empresas existem para ter lucros como os advogados existem para defender clientes, utilizando, uns como outros, os meios de que dispõe.

Quem tem de defender o público em geral são aqueles que estes últimos elegem para o efeito.
Se não o fazem o problema é outro.

(gostei da permanente alusão ao Grisham)

Vivendi disse...

Avisaram-me faz anos para não esperar nada do parlamento pois este é uma coutada dos advogados.

José Domingos disse...

Desculpem lá a pergunta, mas os ministérios, não têm serviços juridicos, com advogados e tudo, e pagos com o dinheiro SAGRADO, do contribuinte? Então!

josé disse...

Então, dantes tinham auditores jurídico que eram do Ministério Público. Ajudavam juridicamente os governantes com pareceres de legalidade. Eram uma espécie de assessores que recebiam como funcionários.

O Cavaco entender que a coisa não funcionava bem porque alguns deles deram-lhe para trás em opções políticas que o mesmo queria tomar.
Guterres seguiu-lhe o exemplo e foi assim que acabaram as auditorias jurídicas que vinham do tempo de Caetano.

Os custos deste novo-riquismo pagámo-lo nós. E os advogados das firmas esfregam as mãos e engordam as contas bancárias.

O Público activista e relapso