terça-feira, maio 10, 2016

O déficit democrático da discussão das ideias políticas

Em Portugal, a discussão acerca de ideias políticas em largo espectro foi sempre um problema por resolver.

Antes de 25 de Abril de 1974 o assunto ficava arrumado nas prelecções de Marcello Caetano na tv e em artigos de propaganda, como os que resultam dos livros que aqui tenho mostrado acerca dos anos de governo daquele, como por exemplo estas duas páginas do livro sobre o V ano de governo de Marcello Caetano:


Na altura em que Salazar morreu escreveu-se sobre o regime no Século Ilustrado de 1.8.1970




Os conceitos acerca das ideologias adversas ao regime de então eram sumariados e a discussão pública acerca dos mesmos, do marxismo do esquerdismo infantil e de outras correntes de Esquerda era suprimida oficiosamente pela Censura que também impedia a publicação de livros apologéticos ou mesmo críticos.

Logo a seguir ao 25 de Abril de 1974 a falta de informação generalizada sobre tais matérias serviu objectivamente essa esquerda, particularmente a comunista que de tal se aproveitou, desse obscurantismo original, para semear os seus temas, a sua propaganda e infectar a linguagem de modo a incluir na mesma termos até então não usados em comum. Fascismo, reaccionário , imperialismo etc, são termos que apareceram em público depois do dia 25 de Abril de 1974 porque antes eram apenas usados na imprensa clandestina comunista, difundida pelos da seita.

Tal carência aflitiva de informação foi até assumida pelos próprios "capitães de Abril", alguns deles despolitizados nesse sentido e arrebanhados num instante de prec para o seio da esquerda comunista. O caso mais notório é o de Otelo. Em meia dúzia de meses tornou-se um revolucionário que passou da admiração pela Suécia para a idolatria do comunismo cubano.
Como é que isto ocorreu? Como é que isto se processou mediaticamente?

A falta de informação originou situações caricatas como esta apresentada logo em 24 de Maio de 1974 no jornal A Capital:


Em 7 de Junho de 1974 a revista Flama mostrava os primeiros sinais da verdadeira revolução cultural que se seguiu e moldou o nosso passado recente para nos condicionar o futuro que aí vem: o total domínio da esquerda, particularmente a comunista das ideias em trânsito mediático.


Neste contexto, o PCP tinha a primazia de ser o escolhido para o esclarecimento ideológico, em primeiro lugar. Havia por lá um tal Alexandre Manuel que não deixava os créditos em mãos alheias...


A Vida Mundial de 19.12.1974 seguia o mesmo rumo à vitória almejada:


Nessa revista o intelectual António José Saraiva que começou comunista e acabou salazarista tentava explicar as ideias políticas para que lia a revista de esquerda, em Outubro e Novembro de 1974.


Revolução, comunismo e socialismo eram designações de fenómenos novos para a maioria da população. Por essa altura fez muito sucesso um livro que se vendia até nos quiosques:


Porém, o caldo estava entornado desde o início porque a Esquerda, particularmente a comunista tinha o avanço das ideias novas e apelativas que eram desconhecidas de uma maioria.
O PS que obviamente se dizia filiado nessa esquerda contra o "fassism" e vilipendiava o anteiror regime, ganhou as eleições um ano depois, em Abril de 1975.
Mesmo assim quem marcou pontos até Novembro desse ano foi a Esquerda comunista. Em 10 de Outubro de 1975 esta capa da Flama mostrava o ambiente generalizado nas grandes urbes do país:


Estava em marcha acelerada uma tentativa de formação de uma união de esquerda extremista que só agora, quarenta anos depois foi conseguida, na amálgama em que se transformou o BE.

Ao longo destes anos a discussão de ideias políticas foi sempre fraca, débil e com um interesse muito relativizado pela hegemonia que a esquerda entretanto obteve no ambiente político geral.
Nem sequer a verdadeira natureza leninista ou estalinista do PCP foi seriamente discutida, tirando uns franco-atiradores que nunca chegaram à opinião pública dos debates televisivos, ficando por artiguelhos manhosos escondidos nos jornais do costume. O melhor exemplo é o do falecido Eduardo Prado Coelho.

 Por isso uma revista como esta que agora foi publicada em França, por cá seria coisa estranha e inesperada. Ainda hoje.

Sciences Humaines HS nº 21 de Maio-Junho 2016:
 



A Esquerda actual é a melhor aliada deste novo obscurantismo e percebe-se bem porquê: tem medo que vejam que o reizinho vai nu....


Questuber! Mais um escândalo!