sábado, setembro 29, 2018

"Calhou-me a mim", também da outra vez


Postal de 10.8.2017:



O que esta notícia escondida nas páginas interiores da Sábado mostra é o seguinte: seis meses antes do assalto a Tancos, uma denúncia concreta, considerada credível pela PJ, dava conta da iminência de um assalto às instalações militares. A PJ actuou e o MºPº também. Um JIC do Porto entendeu que não era competente para dar seguimento e chutou para o canto de Leiria, sem perceber a importância do assunto e principalmente sem dar conta de que o processo carecia de despacho urgente e que lhe era exigível ( esta informação vem na revista no sentido de em Leiria o processo já ser urgente, o que pressupõe que no Porto já o seria, mas pode não ter sido o caso).

Enfim, em Leiria, outra manifestação de incompetência judicial: o JIC respectivo mandou para o TCIC de Lisboa e este agora está provido com dois juizes. Um é Carlos Alexandre que evidentemente nunca teria feito o que o outro, Ivo Rosa,  acabou por fazer: indeferir o pedido do MºPº, inviabilizando eventualmente o sucesso da operação preventiva e provavelmente permitindo o assalto que assim se efectuou em modo que talvez não sucedesse se tivesse sido possível ouvir em tempo real os preparativos do mesmo...
Agora, diz a notícia, que o dito juiz já defere tudo...mas Inês é morta e só resta esperar que aprenda. Mas duvida-se muito, perante os exemplos concretos que têm vindo a lume.



A escolha aleatória do juiz "calhou-me a mim"...

Ontem decorreu a escolha de um juiz de instrução, num universo de dois, para titular do processo Marquês nessa fase processual.

O Observador publicou imagens do sorteio e por azar o programa informático no famigerado Citius falhou mais que uma vez até acertar no nome do juiz a quem calhou: "calhou-me a mim", disse o mesmo na hora e é assim que vai passar a ser conhecido, aqui.

A pergunta que se deve colocar a propósito dessa gaffe informática é saber se foi mesmo  isso e outra a juzante: se fosse escolhido o outro juiz que estava na lista e o programa desse erro repetido, o que diriam e fariam aqueles que se congratularam imediatamente com o sorteio do juiz "calhou-me a mim"?

A propósito do assunto um comentador ( Mário Figueiredo) do blog Blasfémias colocou este comentário esclarecedor num postal de Cristina Miranda:

(1)
Ao que me foi dado apurar, os erros foram três erros de comunicação e não erros de sistema. Uma vez que o programa precisa de gerar um nome e comunicar tal nome em tempo real para um qualquer servidor do Ministério, é perfeitamente aceitável que o sistema se recuse a revelar o nome sorteado se não existir possibilidades de comunicar com o servidor e obrigue a novo sorteio para evitar que essa informação pudesse ficar armazenada no computador local e ser alvo de tampering antes de ser enviada para o servidor. É preciso lembrar que o sistema não foi concebido para ter pessoas na sala a validarem o resultado visualmente. É um sistema machine-to-machine (M2M) pelo que é a ausência de comunicação e não de validação visual, que determina se é necessário novo sorteio. Mesmo se o nome estiver a ser gerado no servidor.

(2)
A ideia que informáticos são chamados a alterarem ou configurarem um programa do ministério da justiça para selecção de um juiz tem graves problemas de concepção. Em primeiro lugar, teorias da conspiração sofrem sempre da dificuldade em explicarem como se consegue esconder um acto que necessariamente tem de ser do conhecimento de inúmeras pessoas. Em segundo lugar, estas teorias giram sempre à volta do facto que impossível provar uma negação, pelo que são desonestas e devem ser liminarmente descartadas, Em terceiro lugar, no caso em concreto, isso implica a existência de um software que é mission-critical e domain-critical, que no entanto é fácil de alterar ou configurar parâmetros com elevado nível de segurança. Software esse que tem passado por vários governos de diferentes cores partidárias sem que ninguém dissesse nada.
(3)
É sempre possível que tenha havido marosca. Podemos até desconfiar que houve marosca. Afinal vivemos num período de vida no nosso país em que a confiança nas instituições do estado é praticamente inexistente. Podemos inclusivamente agradecer ao ao actual Presidente da República por ainda na semana passada ter dado mais uma machadada nessa confiança. Mas atropelarmos o que de melhor temos sobre a esquerda — que é a procura constante da verdade, a observância escrupulosa das regras básicas da dialéctica, e a justiça e bondade dos nosso princípios — por uma verborreia conspiratória é que não.
(4)
Existem outros temas que se podem abordar neste imenso e triste circo que foi a semana passada, sem para isso nos esquecermos de quem somos e o que defendemos:

— Os computadores são incapazes de gerar números aleatórios. Todos os algoritmos existentes (incluindo os melhores usados nos casinos) são deterministas e é sempre possível, com muita ou pouca dificuldade dependendo do conhecimento que se tem do algoritmo adivinhar o próximo resultado ou recriar um resultado anterior. É por esta razão que os algoritmos geradores de números aleatórios nos computadores são chamados de pseudo-random number generators, ou PRNGs. A natureza e importância de um acto desta natureza em que está inclusivamente em causa a liberdade ou prisão de um cidadão não poderia nunca ser determinada por um computador. Isto é uma aberração! Ainda para mais quando dois papelinhos num chapéu fazem o trabalho de forma exemplar e puramente aleatória. Aliás não tenho dúvida alguma que os advogados dos arguidos teriam tentado impugnar esta decisão do computador caso ela tivesse sido contrária aos seus interesses. Ainda para mais depois dos tais erros de comunicação.

— Correr um PRNG é um sorteio opaco, não transparente. Mas que parvoice do Ministério tentar vir dizer o contrário! Não existe nenhuma razão técnica para não se usarem papelinhos como hoje se faz ainda no totalmente informatizado mundo do futebol internacional e onde milhões de euros estão em jogo. O Ministério da Justiça não pode argumentar que lá porque tem jornalistas no local a olhar para um computador correr um programa que não podem ver ou investigar o código-fonte que existe aqui alguma transparência. Para todos os efeitos, o processo foi precisamente o mesmo de se ter feito a coisa à porta fechada.




João Abel Manta na galeria Valbom

Republico aqui este postal de 3.5.2018, sobre João Abel Manta, uma vez que leio no Sol de hoje que será inaugurada este Sábado uma exposição na galeria Valbom ( junto à Gulbenkian) sobre a sua obra em cartoons- Manta 90/40.  Se amanhã estiver aberta...talvez espreite.



João Pedro Marques, autor do livro dedicado a João Abel Manta, lançado pelo Público em 2016, na colecção de designers portugueses, escreveu este artigo no Público de hoje sobre o mesmo João Abel Manta.

JAM é um artista comunista cuja obra admiro. É um desenhador de eleição e um dos melhores de sempre, em Portugal.
Os temas são quase sempre o fassismo, Salazar, o antigo regime e o capitalismo que execra particularmente. Não importa porque os desenhos fazem esquecer a temática.

Em 2016, o autor do artigo publicou um pequeno portfolio da obra do artista:


Em 1975, com o aparecimento do primeiro número de O Jornal, em 2 de Maio desse ano, começou a publicação de desenhos e cartoons do artista nas páginas das publicações O Jornal.


Nesse ano  O Jornal publicou um album de recolha de desenhos, caricaturas e cartoons antigos, de João Abel Manta, praticamente desde 1969 até essa data .
A obra está esgotada há muito.



Para perceber até onde chega o sectarismo político-ideológico, aqui irmanado com o génio artístico fica este exemplo de um livro que não tem falta deles. Praticamente cada desenho é uma ode ao sectarismo comunista.


Em 1976 os alemães tomaram em conta a mensagem e os desenhos e publicaram na terra deles este álbum que por cá nem apareceu e que tem na capa um dos mais célebres desenhos de JAM desse tempo:


Em 1978 as mesmas publicações O Jornal lançaram a obra que aquele Pedro Marques agora refere como sendo digna de republicação.

Esta recolha de 1978 é tão sectária quanto a anterior mas igualmente genial nos desenhos.
Vinha originalmente acondicionada num invólucro  de cartão grosso de cor parda  e chama-se Caricaturas Portuguesas dos Anos de Salazar.  Pode ser visto como uma homenagem do vício à virtude...


Paula Teixeira da Cruz também merece elogios

Paula Teixeira da Cruz é entrevistada no SOl  de hoje. A antiga ministra da Justiça, responsável pela nomeação de Joana Marques Vidal, merece também os elogios que a esta justamente foram tecidos.

É uma questão de justiça elementar lembrá-lo, tanto mais que não sendo magistrada conseguiu sê-lo de modo mais efectivo e real que a actual ministra da Justiça, tida como muito séria e competente e cuja inteligência lhe serve para esconder a visceral ligação ao partido a que pertence e a actuação em conformidade.
Paula Teixeira da Cruz não sofre do mesmo mal. E provou-o em diversas ocasiões.


A suspensão das penas de prisão nos crimes sexuais


Espanta-me sempre um pouco quando leio pessoas que respeito escreverem coisas destas com esta leveza de crónica de jornal. Já a mulher- a professora de Direito Penal, Fernanda Palma- o fazia amiúde no mesmo jornal, em tempos que já lá vão e que lamento tenha deixado de fazer.


Rui Pereira sabe o que é e o que significa uma suspensão de execução de uma pena de prisão. Não ignora esta doutrina do professor Figueiredo Dias, adoptada aliás pelo STJ, ainda em 2012:

A suspensão da execução da pena supõe , enquanto medida pedagógica e de reabilitação do condenado , que o tribunal , no momento da condenação , o tribunal esteja em condições de emitir um juízo de prognose favorável , ou seja de que a simples censura do facto e a ameaça da execução da pena( art.º 50.º n.º n.º 1 , do CP) o afastarão da prática , no futuro , da criminalidade , funcionando como prevenção da reincidência , ao qual “ não bastará nunca a consideração ou só da personalidade ou só das circunstâncias do facto , sendo de atender especialmente às condições de vida do agente e à sua conduta anterior e posterior ao facto –CFr. Prof. Figueiredo Dias , in Direito Penal Português –As Consequências Jurídicas do Crime , § 518 .
Portanto, a suspensão da pena não tem a ver com culpa, média ou grave e Rui Pereira atira para aí, ao lado, na crónica acima. Tirado do sítio citado:

Adverte ainda o citado Professor - § 520, p. 344 - que apesar da conclusão do tribunal por um prognóstico favorável - à luz, consequentemente, de considerações exclusivas de prevenção especial de socialização -, a suspensão da execução da prisão não deverá ser decretada se a ela se opuserem «as necessidades de reprovação e prevenção do crime».
Reafirma que «estão aqui em questão não quaisquer considerações de culpa, mas exclusivamente considerações de prevenção geral sob forma de exigências mínimas e irrenunciáveis de defesa do ordenamento jurídico. Só por estas exigências se limita - mas por elas se limita sempre - o valor da socialização em liberdade que ilumina o instituto em causa».
Assim, compreender-se-ia que as críticas ao acórdão tivessem por base essa consideração sobre a prevenção geral e as tais "exigências mínimas e irrenunciáveis de defesa do ordenamento jurídico".

Rui Pereira defende que nos crimes sexuais não deve haver penas suspensas. É um entendimento que respeito se devidamente fundamentado.

Na ausência disso, fica a Rui Pereira o papel de Komentador Geral da República, com a coorte dos que pululam por aí num populismo evidente.

O que me parece ser urgente discutir publicamente, mas não em sede de KGR que já vimos estar infestada pelo pior populismo ambiente acolitado por uma alargado konselho konsultivo de komentadores arreigados a causas e sindicalizados na APAV, é a legitimidade dos tribunais em aplicar justiça nos casos concretos e precisos que lhes são colocados para julgar. E admitir por isso entendimentos diversos sobre as questões propostas, mormente sobre a possibilidade de suspensão de execução de pena em crimes sexuais.

Defender o contrário em crónica de jornal é alinhar nesse mesmo populismo.

Em 5.11.2017 escrevi aqui isto, a propósito de uma entrevista de Figueiredo Dias, uns anos antes. O Mestre do nosso Direito Penal dizia assim em 1997, sobre a legitimação da justiça aplicada pelos juízes:

"O que é que do ponto de vista do Estado de direito legitima o acto, por exemplo, de mandar uma pessoa para a prisão? É um diploma passado pela minha faculdade? Não é. É uma autorização que recebem depois de terem frequentado o CEJ ou um curso de formação de magistrados? Não é.
Será que temos de ir para o modelo de inspiração norte-americana que é de todos os agentes que tem esse poder serem eleitos? Isto, de facto, dá uma legitimação, mas tenho dúvidas que esse seja o melhor caminho. O que não dá de certeza legitimação é o diploma da faculdade de Direito ou a frequência de um curso. Para mim isso é que está ligado à verdadeira crise da Justiça neste fim de milénio. "

Figueiredo Dias não dá a resposta à questão, mas ninguém a deu nestes últimos 18 anos...e isso é que se torna grave porque tal permite o populismo que anda à solta e que seja o Conselho Superior da Magistratura, um órgão administrativo e pejado de ideologia político-partidária a conferir o lamiré da legitimidade aos juízes.


A entrevista em papel do jornal O Diabo de 24 de Junho de 1997 ( quando Rui Pererira era director do SIS...):




E em 12.1.1999 ( continuava Rui Pereira como director do SIS, como bom mação que é):

 


Sobre Rui Pereira e num contexto de substituição do então PGR Souto Moura escrevi aqui isto, em Setembro de 2007:

Do que se fica a saber, em resumo e para o que interessa, é que Abel Pinheiro é amigo do peito de Rui Pereira. Abel Pinheiro, conseguiu o apoio de Sócrates para colocar Rui Pereira, no lugar do PGR Souto Moura, antes de este acabar o mandato, através destas pequenas amizades caseiras com Paulo Portas. Este, como amigo do tal Abel Pinheiro, aparece muito mal neste retrato e pode arrumar as botas de paladino da transparência.

Os três, Sócrates, Pinheiro e Portas, conspiraram para convencer Jorge Sampaio, então PR, a colocar na PGR, Rui Pereira, logo, logo, o que implicaria a demissão de Souto Moura. É isto admissível, em democracia?

Abel Pereira era amigo e peito e da Maçonaria e Rui Pereira na sua crónica no CM deveria colocar essa tarjeta identificadora. Porque é relevante e só por isso.


Em 15 de Fevereiro de 2004 publiquei aqui este postal, sobre o assunto da prisão e da sua função. Ainda hoje se pode ler porque não perdeu actualidade:

O Público de hoje, destaca cinco páginas de escrita sobre as cadeias e fatalmente refere uma palavra e um conceito caro a certas elites: ressocialização!

Perante uma estatística que contabiliza em mais de 50% o número de reincidentes, o incómodo de quem pensa e manda é notório e é assim que deve ser.
Uma tese de doutoramento de Fernando Barbosa, da Fac. de Psicologia da Universidade do Porto, investigou o assunto e o autor propõe soluções, mostra algumas incoerências sistemáticas e apita para quem deve ouvir os recados: “a cadeia não está a cumprir o seu papel ressocializador”.
Indo um pouco mais além, qual Buzz Lightyear, em vista do horizonte deste écran, o copista pergunta:
faz sentido a filosofia ressocializadora do Código Penal actual e que temos há vinte anos?
Se alguma coisa ou alguém, em Portugal, pode simbolizar a ideia de elite, essa coisa é o Código Penal de 1982 e esse alguém, as pessoas que o pensaram e o elaboraram. Quanto ao pensamento, não há mistério: a introdução do diploma diz quem foi e quando foi. Eduardo Correia, de Coimbra, é o seu nome e as ideias são dos anos sessenta. A ideia do Código na parte geral, designa-se como ”correspondendo a uma visão unitária, coerente, marcadamente humanista e em muitos aspectos profundamente inovadora.” Não envergonham ninguém, estes desígnios.
O projecto foi devidamente mastigado e ruminado durante anos de governos e comissões - e disso dá conta essa Introdução.
Não foi mais uma lei experimental lançada às feras dos diários da república que se alimentam de papel como como as locomotivas a carvão: em fornalha intensiva, como tem acontecido nos últimos anos de fona legislativa.
Nos anos oitenta, uma nova Comissão presidida por Figueiredo Dias lançou a obra mestra do nosso direito penal, seguindo os ensinamentos daquele mestre , com ajuda de outros, entre os quais Cunha Rodrigues, personagem incontornável nestas coisas da justiça das últimas décadas.
Quem se der ao trabalho de ler essa Introdução ao Código Penal, há-de reparar que entre “mediações axiológicas”, menções explícitas a votações no Parlamento alemão(!), referências à culpa como medida da pena e a uma prevenção geral e especial, a peregrinação chega à ideia de que os delinquentes devem ser para recuperar!
“ A prevenção especial só pode ganhar sentido e eficácia se houver uma participação real, dialogante e efectiva do delinquente. E esta só se consegue fazendo apelo à sua total autonomia, liberdade e responsabilidade” .
Até para um copista, esta leitura é penosa, mas a verdade é que esta filosofia de vida não se fica por aqui...
“Verifica-se a assunção conscienciosa daquilo a que a nova sociologia do comportamento designa por desdramatização do ritual e obrigam-se as instâncias de execução da pena privativa de liberdade a serem co-responsáveis do êxito ou do fracasso reeducativo ou ressocializador. Pensa-se ser esta uma das formas que mais eficazmente pode levar à reintegração do delinquente na sociedade.”
Mesmo contando com a aparência elíptica deste escrito, com um pequeno esforço interpretativo toda a gente lhe capta a semântica, a sua origem e destino.
E melhor ainda se percebe quando o Prof. Faria Costa, recentemente e sem elipses, disse com um sentido muito chão das realidades que a ideia de ressocialização do Código Penal tinha falhado, provavelmente adivinhando estas investigações e lendo estatísticas recentes.
Antes, já o próprio Figueiredo Dias tinha confessado publicamente a sua ingenuidademadura, a propósito das soluções inovadoras vindas directamente da tecnologia do pensamento alemão. E muito antes também, já tinha amargurado a incompreensão da plebe perante ideias tão avançadas.
E acha o copista que ainda vai amargar mais, designadamente quando a plebe se aperceber duma solução tão engenhosa como perfeita, conseguida por outra Comissão dirigida pela mesma elite e que se pode ler no artigo 355º do Código de Processo Penal.
Em poucas palavrinhas, mandam-se às malvas muitos actos do Inquérito, obrigando a que toda a prova se faça na audiência de julgamento! As consequências, particularmente em processos penais onde a prova assenta em testemunhos, ainda se irão ver de forma mais nítida, agora, nesta vertigem processualística.
Assim, resumindo e na linguagem tradicionalmente campónia, aquela elite coimbrã deu pérolas a... portugueses executivos!
Porém, aqueles dois eméritos professores fazem parte do gotha do Direito de Coimbra que nos impingiu aquelas ideias que agora denunciam como falhadas, com a agravante de atribuírem a desgraça a outros, particularmente os aplicadores dessas brilhantes ideias.
Essa escola de Direito de Coimbra, é uma verdadeira elite no sentido tradicional do termo. É um escol, de grupo reservado e atencioso aos mestres das lentes.
É coerente nos escritos e age em conformidade quando lhes pedem pareceres ou opinião.
Os lentes são um punhado fechado que não larga mão das cadeiras mestras. Não saiem dali, encafuados que estão em gabinetes de tectos altos e janelas que já foram medievais e a bem dizer fazem bem, porque o ambiente, sendo de catacumba, tem bons respiradouros nas bibliotecas. Quem se respalda nos sofás de couro dos corredores, sente o saber fluir dos cartazes que anunciam cursos de pós-graduação, à semelhança das pancartas anunciadoras da última novidade da Colgate-Palmolive num qualquer supermercado de pingo doce.
Aliás, pressente-se que o objectivo marketinesco é o mesmo: vender um produto e isso eles aprenderam depressa!
Os catedráticos em Direito não abundam, em Coimbra ou em qualquer outro lado, por razões misteriosas e já em tempos analisadas por Vasco Pulido Valente, num escrito de Junho de 1989!
Uma frase resume todo um programa elitista...
“A Faculdade , ou seja, de facto, o pequeno grupo que tradicionalmente a explora e dirige, tem um só propósito: o de se perpetuar.”

Curiosamente, como copista, lembro agora que um dos catedrático da dita cuja é Vital Moreira e nunca se viu um escrito seu, singelo que fosse, sobre o assunto.
Sobra-lhe tempo para descascar o corporativismo de juízes; ferve-lhe o sangue se lhe cheira a sotaina por perto ou em grupo; contudo, sobre esta elite a que pertence e dá corpo, nunca lhe foi detectada a publicação de escrito esclarecedor... particularmente sobre esse fenómeno estatístico da carência de titulares de cátedra em Direito.
Se o lente ler isto, o copista sugere que rebata e adocique afirmação amarga daquele Valente, Pulido, no mesmo artigo e que dizia que

“...os académicos portugueses pretendem, na sua maioria, apenas tomar de assalto uma prateleira do orçamento e arrumar-se e arrumar os parentes e protegidos. O ideal de professor continua a ser o Padrinho e a troca de serviços, curriculares e outros, o principal critério científico.”
Perante o exposto, será o escol de Coimbra uma das poucas elites existentes e resistentes que ainda temos?!
A resposta será tentada numa próxima ocasião.
Adenda copiada

Neste local sereno se poderá encontrar o resume de todas as teses de doutoramento apresentadas à Universidade de Coimbra, desde 1988. Direito tem 32!
Seria interessante conhecer as de Lisboa.

sexta-feira, setembro 28, 2018

O Conselho Consultivo da KGR

O Público de hoje tem o suplemento Inimigo Público, dirigido por um tal Luís Pedro Nunes, dedicado a comemorações. Confesso que não leio o suplemento porque me parece excessivamente circundante e nunca me fez rir. Ou seja é-me inútil.

Hoje, em duas páginas, o director do jornal recolheu os nomes e impressões de um conselho consultivo da Komentadoria Geral da República. Aqui estão os nomes:



São estas pessoas que fixam os parâmetros a seguir pela komentadoria,  em Portugal.
Traço comum: o antifassismo. Outro: são os principais responsáveis pelo jornalismo que interessa pouco aos leitores,  em Portugal. Logo, os responsáveis pela decadência do produto.
Porém, quem os ler, nem um assume sequer uma quota-parte dessa responsabilidade...

E faltam outros que estão num programa da TVI chamado "Governo Sombra". É o João Miguel Tavares, um sabe-tudo; um Pedro Mexia, que tudo parece saber e um Ricardo Araújo Pereira que tudo já soube.  Sabem-na toda. São os entertainers da komentadoria de tv.

Laborinho Lúcio e o redondo vocábulo


                                                                                                                                       A foto é de Pedro Marques/MadreMedia- Sapo.

Laborinho Lúcio que conheço há um pouco mais de trinta anos, essencialmente como pessoa ligada à formação do CEJ e avatares posteriores em instituições judiciárias, é um dos cultores mais aprimorados do que se pode apelidar o redondo vocábulo. A expressão provém de um tema de Zeca Afonso, inserido no álbum de 1973, Venham mais cinco e que termina com o verso "inda o ar educa". 
Um dos temas da entrevista é precisamente a Educação, cujo modelo é comentado pelo entrevistado com uma inspiração que poderia ter saído desse verso. 

Em quase todas as entrevistas, palestras, colóquios e intervenções públicas, Laborinho tem sempre uma história arredondada para contar. 
Desta vez são duas: a dos índios e cobóis da sua infância, na qual lhe era reservado o papel de taberneiro, fugindo ao confronto com os índios "maus" que depois descobriu, enganado, que eram "bons" e a história da escola primária, junto dos Pescadores que eram vizinhos na vila da Nazaré. A escola era alternativa à que lhe seria destinada naturalmente,  pela pertença de classe à pequena burguesia local. Daí o simbolismo simbiótico com a primeira história. Laborinho fica ao lado dos "bons" e que eram na época os "maus", porcos e feios até. 
Estas histórias algo edulcoradas pela memória do tempo, de Laborinho,  têm sempre alguma graça e cativam o ouvinte, inevitavelmente, pelo brilho natural que lhe costuma ser emprestado pelo narrador. 

A mim, no entanto e desde sempre, deixam-me um travo algo amargo no espírito. Sempre me interroguei: porque é que um tipo que sempre me pareceu "fixe" e "porreiro" precisava de narrar assim e  tentar seduzir pelo redondo vocábulo as almas desprevenidas que se deixam fascinar com pouco? 
Haverá uma resposta para tal associada eventualmente  ao fulgor do raciocínio e à rapidíssima facilidade de expressão. Laborinho é um virtuoso nesse estilo. Já era assim no CEJ, continuou nas entrevistas avulsas que foi concedendo e nas palestras em que participa. Na escrita, tal não resulta e Laborinho enredava-se nos textos para tentar explicar ideias simples. Tem um opúsculo inacabado sobre O Direito, o Judiciário e os Tribunais que é um exercício tortuoso de incapacidade expositiva. 
Porém, no manejo falado do redondo vocábulo é um mestre prestidigitador que confunde  palestrantes maçudos e exaspera debitadores de saberes escolásticos.

Um bom exemplo disto é o que explica sobre a legitimidade dos juízes e dos tribunais perante a opinião pública e o "povo" em nome do qual se aplica justiça, constitucionalmente. 
Quem ler isto precisa de ler mais que uma vez para perceber o sentido e alcance das expressões.  A alusão ao "populismo" mediático relativamente aos fenómenos judiciários é abordado em  modo redondo e sem ferir arestas. 

Porém, deveria ser necessário ferir susceptibilidades e limar arestas de profissionais que são responsáveis directos pela "justiça espectáculo" e principalmente descortinar a origem do fenómeno e quem dele se aproveita com propósitos turvos. Laborinho nunca entraria por aí, nessa guerra contra os "índios". Prefere ficar na posição de taberneiro, sendo certo que frequentou as escolas de elite que lhe permitiu conhecer as da ralé. 
É exasperante, Laborinho, por vezes...

Sapo:

Existe alguma forma de fiscalizar o trabalho que está a ser feito?

A justiça tem hoje um problema complicado para o qual também é necessário fazer perguntas - aqui não precisam ser muito fortes. Viemos de um tempo em que a justiça era respeitada porque todos confiavam nela por uma questão de fé. Ora a fé, sem estar com isto a fazer qualquer extrapolação para a fé de dimensão religiosa, em política assenta na ignorância, porque através do conhecimento o que se quer é racionalidade. Acontece que a justiça é respeitada porque se acreditava nela. Com o processo democrático, com a discussão pública das questões da justiça, a justiça começou a ser discutida pelo cidadão comum, cujo conhecimento é maior, mas está muito longe de ser o mínimo para poder ter uma racionalidade crítica. O que temos hoje é uma falta de fé em alguns aspectos e uma falta de conhecimento bastante para poder reconstruir a relação de confiança. Isto gera uma intervenção de certos sectores da comunicação social, que é legítima, e que levou àquilo a que se chama a justiça espectáculo ou a justiça dramática, em que, no fundo, se hipervalorizam os casos de justiça junto de uma opinião pública que está em casa sentada no sofá a fazer o lugar do juiz ou do Ministério Público.

E esse é um papel legítimo, ou não?
A justiça tem de aprender a viver com isto, em vez de fazer o discurso do "nós não temos de dar satisfações a ninguém". A justiça tem de perceber que as pessoas estão interessadas, estão empenhadas e têm uma percepção. O que é fundamental é ter a noção de que a percepção da realidade é uma coisa e a realidade é outra. A certa altura tudo passa a acontecer como se nós tivéssemos de responder às tomadas de posição que vêm da percepção junto da opinião pública. Nesta medida é essencial que compreendamos várias regras; por exemplo, uma justiça não é melhor nem pior consoante condena ou absolve. Uma justiça que absolve é tão justa como uma justiça que condena. Não podemos dizer que uma justiça só funciona se condena. Depois, nem sempre as acusações que o Ministério Público formula correspondem a condenações, o que não quer dizer que as acusações tenham sido mal formuladas. Muitas vezes é no momento da acusação que há um conjunto de provas ou de elementos indiciários que são bastantes para fundamentar a acusação, mas o julgamento permitiu juntar elementos novos ou, muitas vezes, reformular uma opinião que se tinha sobre uma determinada realidade e chegar ao julgamento e haver absolvição. Posso dizer que como magistrado do Ministério Público em dois casos pedi em julgamento a absolvição de réus que tinha acusado. Porque com o desenrolar do julgamento surgiram situações que não podiam ter surgido na altura da acusação. Por outro lado, e sei que isto é difícil de aceitar, mas seria intelectualmente desonesto se não o dissesse, a justiça, como a saúde, são actividades de risco, e nem sempre tudo corre bem. Há uma dimensão de erro que faz parte do próprio contrato social. Eu, como cidadão, quando transfiro para os tribunais, para o Estado, o poder de condenar ou de absolver, transfiro também a minha aceitação da margem de erro que pode acontecer. Isso não impede que os cidadãos critiquem a justiça e o modo como ela funciona, ou até denunciem as circunstâncias em que ocorrem eventuais erros. O que não se pode necessariamente fazer é extrapolar daí para colocar questões morais ou éticas sobre o funcionamento da justiça e dividir tudo entre bons e maus. Temos de nos habituar a crescer, a ser mais adultos nesta relação e compreender o espírito, não tendo de estar de acordo e tendo o direito de criticar. Veja o exemplo do tribunal de júri norte-americano, normalmente apresentado como exemplo de erros judiciários: condenações à morte de pessoas que mais tarde se verifica não terem praticado qualquer crime, etc. Nenhum americano põe em causa o tribunal de júri. O tribunal de júri faz parte da sua cultura, é uma instituição e é dos americanos, que não abdicam dela e não a colocam em causa. E, todavia, podíamos desenvolver críticas ao seu funcionamento.
Sabemos que as decisões que se tornam públicas são as mais escabrosas, as mais controversas, embora não deixem de ser reflexo dos juizes que temos. Mas já assisti a vários processos-crime económicos e foi confrangedor ver o Ministério Público. Pergunto-me se a preparação da acusação no Tribunal de Menores ou noutros será semelhante.

Precisamos de compreender que a realidade exterior modificou-se muito. Os tribunais têm de perceber como incorporar essa mudança nas suas atitudes, inclusivamente na construção das suas decisões. Não posso falar e casos concretos, mas nada me impede de dizer que como cidadão muitas vezes também fico um pouco perplexo com determinado tipo de fundamento de decisões. Agora, há um aspecto que julgo importante, e aqui os magistrados teriam de colaborar e, provavelmente, até a formação de magistrados teria de caminhar por aí. Há uma tendência para tornar a administração da justiça, a intervenção do magistrado, num compacto de técnica. Evidentemente que a técnica é decisiva e é fundamental que o magistrado seja competente tecnicamente, mas a competência do magistrado vai muito mais longe. Muitas vezes os magistrados, impecáveis do ponto de vista da aplicação da lei, esquecem que aquela sentença é pública e que o público vai lê-la. E para o público era importante que muita da realidade que não é levada ali lá estivesse, até com uma linguagem menos hermética, para perceber a história no seu todo, caso contrário não compreende a decisão. Talvez valha a pena repensar isto. E talvez valha a pena levar ao fundamento da decisão aquilo que, sabendo que vai ser lido pelo público, é importante que o público compreenda. Julgo que os casos se têm vindo a repetir e que esta é uma questão essencial e que faz parte da comunicação da justiça. Temos um pouco a ideia de que a comunicação da justiça é saber quem é a pessoa que pega no microfone e vai dizer o que se passou. É importante que isso seja feito, mas comunicação, sabe melhor que eu, resulta dos termos usados e da forma como são levados ao conhecimento do cidadão. Nesta matéria penso que temos um grande caminho a percorrer e não nos devemos ficar apenas por dizer que as pessoas não percebem nada disto e não vale a pena dar importância ao que elas dizem. Isto é não compreender a realidade e ficar cada vez mais afastado dos cidadãos.
E sobre a especialização?

A especialização é hoje absolutamente fundamental. Houve um tempo em que eu próprio colocava algumas dúvidas, mas hoje tenho a certeza de que é fundamental, embora entenda que deve ser matizada. A especialização deve existir, mas, de tempos a tempos, com intervalos grandes, é preciso mudar, porque a especialização, mais uma vez, fecha o juiz sobre a técnica. Há, claro, matérias que são essenciais e temos de começar a pensar - isto não é uma crítica ao passado, até porque eu próprio não o fiz enquanto ministro da Justiça - se não fará sentido que em sede de acusação haja assessorias económicas no julgamento. Não podemos partir da ideia de que o magistrado é conhecedor de tudo na dimensão total que estas matérias, cada vez mais sofisticadas, têm. E aqui penso que um especialista faz falta, até enquanto reforço de meios para investigar e desenvolver o processo. Mas percebo que nem tudo pode ser feito de um dia para o outro, conheço bem a diferença que vai entre a facilidade de dizer e a dificuldade de fazer e tenho a obrigação de dar algum benefício da dúvida à dificuldade de fazer porque vivi a prática.

Um exemplo concreto da deficiência informativa resultante da carência de cultura pode ler-se na entrevista.

A jornalista entrevistadora escreve duas vezes a palavra "dissiminado",  proveniente de um verbo inexistente. O erro ortográfico é grave, inadmissível em alguém que escreve em jornal, mesmo virtual.

A Dª Raquel do tempo da primária de Laborinho, mesmo na Escola dos Pescadores nunca teria passado de classe quem desse um erro desse calibre.
E no entanto, erros deste género são recorrentes no jornalismo nacional e revelam a ausência de leituras, de cultura, de formação académica minimamente decente em profissionais do ramo.

Tudo isto se reflecte, depois, em opinião que é vertida nos artigos, nas notícias, etc etc.
As "causas", depois, aparecem por cissiparidade. Quem não sabe, não pode perguntar.

Outro exemplo, desta vez no Observador:

Por piedade e amor à língua portuguesa, que seja possível exterminar quanto antes esta praga do "o quanto antes".

Onde raio é que esta geração aprendeu a escrever? Na Internet?

O processo Marquês agora vai ser isto...

CM de hoje:

O processo "Marquês" ( que a meu ver ficaria bem melhor com o nome Abade Faria, 33, por causa de coisas) vai passar a ser este desfile de incidentes processuais. É nisso que apostam os incríveis advogados de defesa.

Outra perspectiva sobre o mesmo assunto, do mesmo jornal:


ADITAMENTO às 18:00

Observador:

Juiz Ivo Rosa é o juiz que vai decidir se Sócrates deve ser julgado na Operação Marquês.

Há algumas vantagens nisto: acabam os recursos interlocutórios para afastar o juiz Carlos Alexandre  desta fase processual e vai finalmente ficar claro se este juiz Ivo Rosa deve continuar a ser juiz.
Talvez agora o CSM venha a abrir os olhos. Definitivamente.


quinta-feira, setembro 27, 2018

Há 50 anos Marcello Caetano chegava ao poder

Faz hoje 50 anos que Marcello Caetano chegou ao poder Executivo da Nação, como presidente do Conselho de Ministros.

Um dia depois a revista Século Ilustrado mostrava assim como fora, noticiando o estado de saúde de Salazar e a comunicação ao país, no dia 26 de Setembro de 1968, à noite:



Dias depois, a revista Vida Mundial dava um destaque desenvolvido ao novo chefe de Governo:










Uma das pessoas que melhor descreveu os acontecimentos e narrou os factos foi Diogo Freitas do Amaral no seu livro de 1995, de Memórias Políticas.



A revista Sábado de hoje entrevista dois filhos de Marcello Caetano que confirmam plenamente esta versão dos acontecimentos contada por aquele Freitas do Amaral:


A Komentadoria Geral da República está povoada de ajuizadores

Público de hoje, o principal arauto do sexismo ao contrário...

A komentadoria de jornal ( e não só) já proferiu esta acusação, produziu as provas sem defesa audível, julgou em processo sumário e proferiu esta sentença, em acórdeão, arvorando-se em ajuizadores encartados:


No mesmo jornal uma página com estatística desmente o acórdeão mas ainda assim a sentença poderá já ter transitado em julgado para os diversos ajuizadores que pululam o país dos media. Mas noticia a manifestação contra a "justiça machista", assim sem tirar nem pôr.  400 ( Na foto pouco mais de uma dúzia se vêem...) manifestantes em apoio dos ajuizadores da KGR e contra os juízes do tribunal da Relação do Porto, transformados em réus e arguidos sem defesa alguma visível. Condenados literalmente na praça pública das acusações da KGR e no pelourinho dos media. É este o sentido de justiça do populismo da KGR.


Será isto correcto, principalmente com uma frase final atribuída a uma advogada acusadora: "a tendência, diz, é para valorizar a palavra do adulto em detrimento da versão da criança"..?

Tenho ideia que será precisamente o contrário, mas para levar água ao moinho qualquer meio de transporte serve...

É evidente que se impõe uma reflexão séria, serena e competente acerca deste fenómeno. Mas não estou a ver os juízes becados a fazê-la. Serão vítimas dos julgamentos e execuções sumárias, sem um ai.
Se julgam que o silêncio não os poderá prejudicar ou beneficiar, como acontece no processo penal, estão bem enganados. As regras processuais da KGR são outras: prescindem de presunção de inocência, de qualquer contraditório e as execuções de sentença sumária são imediatas e bem publicitadas...
A KGR lembra alguma coisa? Sim...os sistemas totalitários. Que lhes falta? O poder de execução material. O moral já o têm. Todo. E sabem disso. Mais: é esta KGR quem aparece depois a rasgar as vestes contra o "populismo" disto e daquilo, vendo argueiros sem topar na trave que os tolhe.

Sob a capa inefável de um direito de crítica pública a decisões judiciais jaz um poder mediático de execução moral, segundo julgamentos sumários. Não é de crítica que se trata mas de sentenças morais condenatórias sobre os tribunais comuns, usando regras de tribunais totalitários.

E tirando alguns idiotas úteis que sempre aparecem nestes julgamentos,  a testemunhar pela KGR, nem se trata de estupidez, mas sim de luta por uma causa: o feminismo radical enroupado em direitos aparentemente inquestionáveis e de civilização progressista contra os "reaccionários".
Este filme já passou em salas grandes e agora é uma reprise.

Esta KGR não tem falta de ajuizadores. Aliás cada vez são em maior número porque não precisam de estudar em qualquer curso especial. Basta saber tudo e serem tudólogos...

ADITAMENTO:

O grupo de pressão APAV, profissionalizado para tal e com ordenados a preceito, "exige" formação aos magistrados:

Para a APAV, “decisões como esta reforçam a necessidade de um maior investimento na formação dos magistrados sobre estas matérias, não tanto no que se refere ao enquadramento legal que baliza o julgamento da causa, mas na análise mais vasta da factualidade em apreciação”.
Impõe-se, segundo um comunicado da associação de apoio à vítima, “a multiplicação de esforços que permitam dotar os julgadores de maior e melhor conhecimento multidisciplinar e, simultaneamente, mitigar alguns mitos e estereótipos sociais e culturais nefastos para uma boa decisão”.
O Tribunal da Relação do Porto recusou, em 27 de junho, um pedido do Ministério Público para transformar em prisão efetiva a pena suspensa decida para os dois homens no tribunal de primeira instância de Vila Nova de Gaia.

Os magistrados e magistradas, coitados e coitadas, não sabem julgar como a APAV exige que se julgue. E por isso está disposta a ensinar aos magistrados e magistradas como se deve julgar.

Portugal chegou a esta miséria!

terça-feira, setembro 25, 2018

O julgamento dos juízes em modo sumário

Dois apontamentos de hoje sobre a decisão da Relação do Porto acerca do crime de abuso sexual.

O primeiro é de um komentador profissionalizado dos media Cofina e que foi da PJ. Geralmente apela a matar e esfolar criminosos sem defesa mediática. Alinha no populismo mais chão e perigoso nos komentários na CMTV. Nesta coluninha de hoje no CM não destoa dessa síndrome  justiceirista.


Este tem mais que se lhe diga porque é jurista e devia saber melhor. Mas não destoa do clamor começado no DN, continuado no Público e Observador e agora replicado a preceito para dar um ar de cruzada contra decisões "brandas" dos tribunais.



O que é que se pode dizer sobre isto que não ofenda ninguém?

Parece-me relativamente simples: ler um acórdeão não é ter sido julgador na Relação. Ter sido julgador na Relação não é ter sido Ministério Público na primeira instância ( o da segunda absteve-se...); ter sido MºPº não é ter sido juiz na primeira instância que julgou; e ter sido juiz nessa instância não é ter sido advogado de defesa dos arguidos ou acusador público ou investigador das polícias e nem sequer testemunha presencial dos factos- que as não houve.

Tudo isso deveria chegar para se ponderar qualquer crítica aos tribunais que têm o dever de aplicar justiça sobre este tipo de casos concretos. Julgar estes assuntos pela rama do parece que foi assim, pode dar asneira grossa e iniquidade a preceito.

Julgar um tribunal apenas pelo teor de um acórdão ou mesmo de partes escolhidas é o mesmo que contribuir para o populismo judiciário que exige penas de prisão ( efectiva, nunca ficam por menos que isso e isso  lhes basta) para tudo o que mexa no campo do abuso sexual. O crime define a pena e a culpa não interessa para nada. E quando aí se chega põe-se em dúvida a capacidade de a analisar, substituindo-a pela idiossincrasia de cada um.

Estranho, não é?

Não seria melhor que nestes casos se confiasse mais no bom senso de quem julga os factos e tem perante si o estendal de prova disponível, melhor que ninguém? E a sensibilidade da imediação com as pessoas que participaram nos factos não será superior à superficialidade de análise de um acórdão?

E as opiniões e decisões jurídicas não merecerão maior acerto e justiça se tomadas por quem tem o dever profissional de o fazer e a experiência pessoal e intransmissível para tal?

Para quê desconfiar sistematicamente da impreparação pessoal ou profissional de quem tem melhor preparação para tal do que aqueles que criticam à vol d´oiseau ou pela rama dos preconceitos e suposições?
É que nem se lhes dá qualquer benefício de dúvida. Este jornaleirismo de causas prescinde disso mesmo.

Evidentemente que isto cheira a cruzada que anda por aí. E ainda mais lamentável é ver o putativo director-geral dos juízes a alinhar no mesmo diapasão populista.  Ainda mais estranho se torna. Parece uma réplica do presidente que temos...

Depois temos cromos desta caderneta a mandar bitaites sobre o que acham. Acham e pronto, está achado.

O Ministério Público em modo sumário

Primeira e última páginas do Público de hoje e o artigo de página dupla:, com o título garrafal que é significante. Nada disto é gratuito ou surge por acaso. Quem faz as capas dos jornais ou evidencia títulos sabe o que quer fazer:







Quem ler estes artigos sem conhecer o que é o Ministério Público, quais são os seus órgãos e competências, o modo como se investigam os crimes e o modo como interagem os magistrados do MºPº nessa investigação, fica a saber e acredita que tudo isso depende directamente da PGR.
Esta informação é de uma pobreza, mediocridade e até ignorância que aflige.

Certamente muito por força do que se passou nos últimos 15 anos, principalmente a partir do caso Casa Pia que envolveu um partido político que predomina no espaço político nacional, a opinião pública foi sendo orientada e condicionada por notícias que  tendem a concentrar numa única figura singela a responsabilidade pela instituição que é o MºPº .

Tal aconteceu muito por culpa dos próprios magistrados que não falam, não ouvem e não querem ver o que se passa à sua volta,  como o macaquinho dos cartoons.
Quando os sinos dos media tocam a rebate lá aparece um ou outro comunicado, muito a medo não se sabe bem do quê e porquê, a explicar de forma críptica os factos em causa, os assuntos na berlinda. Geralmente fazem-no mal e de modo insuficiente e acabam por deixar o espaço todo à komentadoria ignara.

Não adiantou nada ser um Cunha Rodrigues ou um Souto Moura, até um Pinto Monteiro ou uma Joana Marques Vidal e esta que agora vai  para lá irá fazer o mesmo de sempre: falar o menos possível com medo de ser acusada de protagonismo, o pior pecado que podem imputar a um magistrado em funções.
Compreende-se: que raio de formação específica tem alguém para comunicar publicamente seja o que for se acabou um curso universitário, ingressou numa escola de magistratura, despachou processos e fez julgamentos e por natureza sempre lhe disseram que tem que ser discreto, reservado, sereno, recatado, contido e mudo, de preferência?
O que vem de trás toca-se para a frente e temos o que temos há anos e anos. Isto não vai mudar porque as pessoas que estão nesses cargos têm medo da sombra e nem o sem vergonha do Pinto Monteiro foi muito diferente, apesar de arrogar-se como um Pinto sem medo de ninguém.
Qual é esse medo, no fim de contas? Simplesmente o de dizer asneiras que lhes descubram a careca das insuficiências ou o de dizerem algo que pode servir para os crucificar por isto e por aquilo que a lei subtil esconde ou permite. É muito mais confortável o silêncio porque quem não fala não corre esses riscos.
Para além do mais, alguns exemplos avulsos servem de aviso, como foi o caso de Souto Moura, ingénuo, a explicar que um tal Cruz não era suspeito quando já tinha um processo em cima, em segredo de justiça.
Cunha Rodrigues, quando saiu de nada lhe valeram as explicações que dera ou as declarações e várias entrevistas ( importantes, ainda hoje) em que esclareceu bem o que significava para ele o MºPº. O PS e o PSD cairam-lhe em cima como osso duro de roer e rilharam-no até ao tutano. Depois disso desapareceu praticamente da ribalta e faz muita, muita falta nos tempos que correm. Mas o MºPº actual, o que está e vai continuar a estar, correu com ele. Acham-no antiquado...

Tudo isto para dizer o quê? Simplesmente que a opinião pública ainda não sabe como funciona o MºPº e o que se escreve e diz nos media tem contribuído para essa desinformação e ignorância.
Provavelmente é propositada tal falta de vontade de esclarecimento uma vez que é muito mais fácil apontar e assestar baterias de críticas a uma pessoa do que a uma instituição. Só que deveria ser essa pessoa, ou seja o/a PGR, a demarcar-se e informar devidamente como são as coisas e como funcionam na realidade.
Não o fazem, não o fizeram, pelos motivos apontados e mais um: uma certa vaidade também e afinal aceitarem um protagonismo que lhes é emprestado, sem concurso próprio.

Perante esta ausência, o espaço vazio é ocupado pela komentadoria e pelo jornalismo que temos, feito de jornalistas formados à pressa, sem conhecimentos sólidos, que aprenderam os fundamentos básicos do funcionamento das instituições sabe-se lá onde e principalmente adquirem o estatuto de arautos de uma certa moralidade ambiente que pode muito bem ser a do populismo mais rasteiro, como se verá a seguir.
O Público é actualmente o exemplo máximo desta komenklatura.

Considero isto uma das maiores desgraças nacionais que se replica noutros sectores, praticamente em todos e que origina depois uma opinião pública mal formada e mal informada que afinal vota em líderes que são os que temos.

A quem é que serve este estado de coisas? A quem não interesse que a justiça funcione bem e a quem convém manipular a realidade quando o pretendem fazer. Estou obviamente a citar os políticos que querem alcançar o poder.
São esses mesmos que dizem que Salazar queria manter o povo num estado de analfabetismo para não perceberem o que se passava. Estes querem manter o povo desinformado para poderem manipular votos.  A desinformação é uma forma de analfabetismo e provavelmente mais perversa que aquela.

Para além disso temos aqueles que percebendo do assunto escrevem em modo críptico para umas dúzias de pessoas que os podem ler e que já sabem o que escreve. É o caso de António Cluny, magistrado do MºPº, em funções no Eurojust, para onde foi ganhar "uma pipa de massa" e por um triz não ia. Aí está um caso concreto em que um/a PGR pode ter influência.

Que escreve Cluny habitualmente no i? Leia-se, na edição de hoje:



Repare-se bem na escrita, propositada para acólitos ou iluminados e que deixam de fora os jornaleiros komentadores que não chegam ao miolo do bestunto:

"o MP não se reduz à figura do PGR e que a autonomia que garante a objectividade da actuação de todos e cada um dos seus magistrados deve reflectir-se, clara e necessariamente, no seu estatuto." 

Nesta pequena frase concentra-se toda a essência e importância do MºPº mas quem a compreende devidamente? Não estes jornalistas komentadores, certamente.

Nela se diz que o actual estatuto do MºPº que está em vias de apreciação pela AR, vindo do Governo, deve consagrar essa autonomia específica e solidificar esse princípio da magistratura. Diz ainda que a figura de uma Joana Marques Vidal, no caso, torna-se relativamente irrelevante para se poder chapar numa primeira página a palermice que o Público colocou. Nem o Correio da Manhã faria pior...porque percebe melhor o que se passa.

Quanto ao komentador João Miguel Tavares, enganou-se na área de profissão: deveria passar a komentar futebol. Sempre é possível ver o que se passa no campo e não confundir a linha de meio campo com o meio campo em linha.

Tudo isto tem outro efeito deletério que é o de transformar em facto político o que nunca o deveria ser. Mas depois de o ser já o é...e com isso contam os que assim organizam o seu poder.

O Público activista e relapso