A questão de fundo é saber se Louçã considera Fidel um ditador e por arrastão declarar expressamente se Cuba é uma ditadura. Louçã não dá braço a torcer e tergiversa, o que dá alimento a estas crónicas dos últimos dois dias.
Tal como no caso antigo de Cunhal, estas discussões na imprensa politicamente corrigida partem do pressuposto que os antagonistas estão no mesmo plano de entendimento da realidade política circundante e ideológica. Ora não é o caso.
Louçã é um comunista velho que assumiu roupagem trotskista e que pretende o que sempre almejou: abater a sociedade capitalista, incluindo os seus avatares ideológicos, usos e até costumes. Louçã é um revolucionário de pacotilha escrita, como muitos que pululam por aí disfarçados de democratas com pele da burguesia.
Em 2009, Louçã foi entrevistado por Nuno Rogeiro para a revista Sábado e confessou coisas extraordinárias que merecem sempre ser revisitadas para se conhecer o bicho ideológico que o domina.
Essencialmente disse isto que importa repetir sempre para que as discussões terminem de vez até que Louçã seja desmascarado pelo que é, pelo que representa e pelo que pretende esconder.
"Numa
esquerda socialista. (...) Para nós o socialismo é a rejeição de um
modelo assente na desigualdade social e na exploração, e é ao mesmo
tempo uma rejeição do que foi o modelo da União Soviética ou é o modelo
da China. Não podemos aceitar que um projecto socialista seja menos
democrático que a "democracia burguesa" ou rejeite o sistema
pluripartidário. Não pode haver socialismo com um partido político
único, não pode haver socialismo com uma polícia política, não pode
haver socialismo com censura. O que se passa na China, desse ponto de
vista, é assustador para a esquerda. (...) Agora, a "esquerda
socialista" refere-se mais à história da confrontação, ou de alternativa
ao capitalismo existente. Por isso o socialismo é, para nós, uma
contra-afirmação de um projecto distinto. Mas, nesse sentido, só pode
ser uma estrutura democrática."
O que dizia Louçã em 2005 a este propósito? Isto:
"O
BE é um movimento socialista ( diferenciado da noção social-democrata,
entenda-se-nota minha) e desse ponto de vista pretende uma revolução
profunda na sociedade portuguesa. O socialismo é uma crítica profunda
que pretende substituir o capitalismo por uma forma de democracia
social. A diferença é que o socialismo foi visto, por causa da
experiência soviética, como a estatização de todas as relações sociais. E
isso é inaceitável. Uma é que os meios de produção fundamentais e de
regulação da vida económica sejam democratizados ( atenção que o termo
não tem equivalente semântico no ocidente e significa
colectivização-nota minha) em igualdade de oportunidade pelas pessoas.
Outra é que a arte, a cultura e as escolhas de vida possam ser impostas
por um Estado ( é esta a denúncia mais grave contra as posições
ideológicas do PCP). (...) É preciso partir muita pedra e em Portugal é
difícil. Custa mas temos de o fazer com convicção."
Esperar que Louçã abandone este ideal e defina Cuba e Fidel como símbolos de ditadura é por isso um exercício pueril. Louçã é um adepto de ditadores, dos ferozes e eficazes porque apenas desse modo conseguiria impôr a sua ideologia e praxis coerente. Não há qualquer exemplo no mundo onde tal não tenha acontecido e pensar o contrário é condescender no essencial, o que sucede em Portugal, há várias décadas.
Não obstante, a discussão põe a lume outro fenómeno relacionado: essa condescendência geral que é concedida a estes mostrengos ideológicos que perduram por cá como fósseis de estimação.
Hoje na Sábado aparece uma entrevista com um notável do jornalismo caseiro chamado José Paulo Fafe que sendo filho de embaixador esteve em Cuba no tempo do PREC.
O que diz sobre algumas coisas da vida acaba por explicar aquele fenómeno da condescendência de esquerda que nos afecta de modo severo há dezenas de anos.
Repare-se na congruência exemplar do discurso: o 25 de Abril foi fantástico porque gritou "viva a liberdade!" e esse foi um dia para o qual "foi educado a viver com expectativa"...
Para continuar a usufruir dessa liberdade recuperada cá, foi para Cuba, terra de liberdade lendária sob o regime comunista, em 1975. Segundo o indivíduo que nem atenta na contradição, tal continuou a ser fantástico porque...conheceu um "homem extraordinário, no sentido de diferente". Fidel, claro.
A seguir diz a propósito do sítio onde estava colocado por via paterna: " uma sociedade com regras rígidas, algumas incompreensíveis, para um país fantástico". Está a falar do Portugal de Salazar e Caetano que tanto o incomodava por falta de "Liberdade"? Não, está a falar de...Cuba.
Este indivíduo é um palerma, porque só assim se entende esta incongruência. Por outro lado, foi do PS soarista, mudou entretanto para o PSD e agora sente de vez em quando umas náuseas. Imagino...
Outro que tal é o coleccionador de papel velho, Pacheco Pereira. Hoje na Sábado, também se refere a Cuba, para escrever este género de incongruências patetas que alimentam aquela condescendência permanente.
Cuba, para o Pacheco que chegou a acreditar piamente no modelo ideológico, é o lugar onde havia um Fidel ditador, onde havia "uma polícia política, prisões e execuções, praticamente até à véspera da sua retirada por doença, com o processo do general Ochoa como estertor final".
Não obstante, Salazar era parecido...o que é sempre o objectivo destes objectores da consciência marxista. Salazar é sempre um termo de comparação com horrores que não deveriam merecer tal e relativamente a estes a contextualização histórica e a condescendência é permanente e estúpida.
Percebe-se a ideia: não querem admitir que em idade adulta pretendiam para cá um regime ainda mais odioso que aquele que julgavam ter e contra o qual combatiam e ainda continuam a combater ideologicamente...arre!
Que remédio haverá para estas palermices?