terça-feira, fevereiro 21, 2017

Um MDE tarde demais?

Os jornais de hoje escrevem sobre a fuga de três "cadastrados" perigosos da prisão de Caxias, no passado Sábado; da  recaptura de dois dos fugitivos, chilenos, no Domingo à noite, junto do aeroporto de Barajas, em Madrid e da libertação de um deles por ausência de instrumento legal de captura do mesmo, ou seja, de um mandado de detenção internacional europeu, vulgo MDE.
O CM diz que o MDE chegou atrasado...

Como é que um MDE chega atrasado num tempo de comunicação instantânea?  Mistério que não é esclarecido pelos jornais e que poderia sê-lo. Tiveram o dia de ontem para estudar a questão e pelo telefone e internet poderiam saber a resposta.

Assim, põem a ministra da Justiça na mó de baixo apenas pelo facto, aliás bem merecido, de descurar a segurança das prisões pela diminuição de verbas atinentes a tal.

Mas resta o imediato e que se prende ao tal MDE. O que é e como funciona um MDE? Ninguém se importa em explicar e até existe disponível em Rede um "manual de instruções" que explica tudo muito bem explicadinho.

Contudo, uma consulta ao Google dava logo para entender o mínimo. Será por isso que não explicam, julgando que as pessoas irão informar-se na Rede?

A notícia do CM é que houve um "atraso na emissão do MDE pelas autoridades portuguesas". Houve?A PGR pode dizer, mas duvido que o faça, embora tal fosse exigível e o mínimo a fazer neste caso.

Um MDE emite-se nas seguintes circunstâncias:
 

Artº 2º Lei n.º 65/2003, de 23 de Agosto ( actualizada pela Lei n.º 35/2015, de 04/05):

1 - O mandado de detenção europeu pode ser emitido por factos puníveis, pela lei do Estado membro de emissão, com pena ou medida de segurança privativas da liberdade de duração máxima não inferior a 12 meses ou, quando tiver por finalidade o cumprimento de pena ou de medida de segurança, desde que a sanção aplicada tenha duração não inferior a 4 meses.

2 - Será concedida a entrega da pessoa procurada com base num mandado de detenção europeu, sem controlo da dupla incriminação do facto, sempre que os factos, de acordo com a legislação do Estado membro de emissão, constituam as seguintes infracções, puníveis no Estado membro de emissão com pena ou medida de segurança privativas de liberdade de duração máxima não inferior a três anos:

a) Participação numa organização criminosa; (…)

s) Roubo organizado ou à mão armada;


Para além disso emite-se um MDE pela seguinte forma:
Artº 3º

1 - O mandado de detenção europeu contém as seguintes informações, apresentadas em conformidade com o formulário em anexo:

a) Identidade e nacionalidade da pessoa procurada;

b) Nome, endereço, número de telefone e de fax e endereço de correio electrónico da autoridade judiciária de emissão;

c) Indicação da existência de uma sentença com força executiva, de um mandado de detenção ou de qualquer outra decisão judicial com a mesma força executiva nos casos previstos nos artigos 1.º e 2.º;

d) Natureza e qualificação jurídica da infracção, tendo, nomeadamente, em conta o disposto no artigo 2.º;

e) Descrição das circunstâncias em que a infracção foi cometida, incluindo o momento, o lugar e o grau de participação na infracção da pessoa procurada;

f) Pena proferida, caso se trate de uma sentença transitada em julgado, ou a medida da pena prevista pela lei do Estado membro de emissão para essa infracção;

g) Na medida do possível, as outras consequências da infracção.

2 - O mandado de detenção deve ser traduzido numa das línguas oficiais do Estado membro de execução ou noutra língua oficial das instituições das Comunidades Europeias aceite por este Estado, mediante declaração depositada junto do Secretariado-Geral do Conselho.

E como se transmite a Espanha, neste caso, ou outro país, o MDE?
Artigo 5.º

Regras de transmissão do mandado de detenção europeu          

1 - A transmissão do mandado de detenção europeu pode ter lugar através do sistema de telecomunicações de segurança da rede judiciária europeia.

2 - Quando não for possível recorrer ao SIS, a autoridade judiciária de emissão pode recorrer aos serviços da INTERPOL para transmitir o mandado de detenção europeu.

3 - A autoridade judiciária de emissão pode transmitir o mandado de detenção europeu por todo e qualquer meio seguro que permita obter um registo escrito do mesmo, em condições que dêem ao Estado membro a possibilidade de verificar a sua autenticidade.

4 - Todas as dificuldades relacionadas com a transmissão ou a autenticidade de todo e qualquer documento necessário para a execução do mandado de detenção europeu devem ser resolvidas através de contactos directos entre as autoridades judiciárias interessadas ou, se for caso disso, através da intervenção das autoridades centrais dos Estados membros.

5 - Qualquer entidade que receba um mandado de detenção europeu e não seja competente para lhe dar seguimento transmite-o, no mais curto prazo, ao Ministério Público junto do tribunal da relação competente para o processo de execução do mandado de detenção europeu e informa a autoridade judiciária de emissão.


Então o que terá acontecido para o tal "atraso" na comunicação que poderia ser instantânea? Palpita-me o seguinte:
O MDE teria que ser emitido por uma autoridade judiciária. Quem? Se for na fase de Inquérito, como tudo indica, será o magistrado do MºPº. Quem, ao Sábado? Quem estiver de turno a tal serviço, na área da comarca respectiva.

Houve uma fuga de presos em Caxias. Caxias pertence à comarca de Oeiras...
A evasão de presos não está prevista como fundamento de MDE, mas está o roubo organizado, numa organização criminosa.
Quem deveria participar às outras polícias e imediatamente ao MºPº de turno, atento o tipo de presos em causa? As autoridades do EP. Fizeram-no? Talvez parcialmente, às outras polícias, que por seu turno deveriam imediatamente contactar o magistrado de turno e ao mesmo tempo cuidarem da emissão de informação via Sirene ou Sistema de Informações Schengen. Fizeram-no com o cuidado e pressa necessários? Duvido.
O facto da evasão ter ocorrido com aqueles presos preventivos obrigava a tal pressa e cuidado. O E.P. de Caxias fê-lo? Claro, mas pelos vistos várias horas depois, quando descobriram a fuga. A que horas, então?
Segundo o CM de ontem, os reclusos foram vistos pela última vez às 19:00 de Sábado. À noite, portanto. Entre as 19:00 e a 1:00 de Domingo, os reclusos cumpriram o dever de todo o preso: fugir.E ninguém cumpriu o dever oposto: guardar para não fugirem. Agora dizem que é por "falta de meios"...pois, a ministra que explique então.
A informação às polícias foi emitida logo, durante a noite, provavelmente. E ao MºPª, para a tal emissão de MDE? E o magistrado do MºPº, de turno e durante a noite, pode ser incomodado? Pode e deve em casos que tais. Foi? E o que fez? Aliás, o que poderia fazer? Levantar-se e ir para o tribunal emitir o tal MDE que obriga a que mais pessoas participem na sua elaboração?  Há previsão legal para isto? Não...e ao Domingo? Também não...mas terá sido, eventualmente. Falta saber como.

O MDE chegou a Madrid, tarde e a más horas? É preciso saber porquê...tal como saber se a informação via S.I.S ( Schengen) funcionou mal ou se foi sequer emitida.
É a isto que a ministra da Justiça deveria responder no Parlamento. É para isso que lá está...

ADITAMENTO: afinal, um MDE perfeitamente em tempo...

O CM de hoje continua a informar acerca dos factos ocorridos a propósito dos "cadastrados" de Caxias que cumpriram o seu dever de presos e fugiram.

Informa mal ou de modo incompleto e tiveram ontem todo o dia para se inteirarem cabalmente do assunto.



Assim temos como factos indicados,  a hora da ocorrência da evasão: entre as 23:00 e as 0:30, de Sábado para Domingo.

À 1:12 os Serviços Prisionais alertaram o 112 e fizeram muito bem. Assim, as polícias tomaram conhecimento do assunto. Alguém do 112 ( PSP?) deu conhecimento imediato à PJ, ao piquete de turno? É preciso saber e o que foi feito.

A seguir, às 8 da manhã o MºPº ( magistrado de turno em Oeiras, certamente) emitiu ou "pediu" , não está suficientemente esclarecido pelo jornal, um MDE visando um dos evadidos, apenas. Porque não emitiu para os três?  É preciso saber, se assim foi. Duvido muito que a informação seja correcta.
Porém, uma coisa é certa: cumpriu o seu dever nesse aspecto. Mas há outro que não se apurou: certificou-se que tinha sido divulgado através do Gabinete Nacional da Interpol algum pedido de cooperação judiciária, mormente para detenção dos foragidos, algures onde fossem encontrados? Eram estrangeiros, dois deles, chilenos, indiciados por furtos graves e organizados, susceptíveis de se porem a mexer para fora do país com a rapidez dos larápios...
É essa a informação mais importante que o jornal deveria saber e pelos vistos nem cheirou.
A PGR diz que fez tudo segundo a lei. E terá sido assim, pelos vistos. Só que a lei não se limita apenas à emissão de MDE para detenção e transmissão dos detidos a Portugal, logo que tal aconteça. E o caso clamava urgência que as polícias conhecem muito bem. O que fez a PJ, se é que foi alertada?
A informação do jornal diz que o MDE- só um- foi solicitado ao tribunal da Relação, ainda no Domingo. Porquê, se seria um Inquérito? Ou então haveria medida de coacção em recurso na Relação e seria essa a autoridade judiciária competente para a emissão? Não sabemos porque o jornal não se inteirou.
De qualquer modo parece que o MºPº funcionou muito bem na presteza da emissão do MDE. Resta saber se falhou na emissão em triplicado...mas há a informação que afinal chegaram a Madrid, logo na Segunda-Feira à tarde dois MDE. Afinal era um ou foram dois? O jornal deixou passar esta e não informa. E esses MDE chegaram muito a tempo e foram muito bem encaminhados. Nisso parece não subsistir dúvida, pelas notícias.

Espero para amanhã para ver se Eduardo Dâmaso tem alguma razão em se apressar a pedir demissões. Às tantas devia começar pela sua própria redacção...não? O título ( Cadeia dá alerta de fuga para 112) é enganador e pretende ridicularizar o que não deve porque fizeram muito bem. A alternativa era telefonarem para o piquete da PJ, mas isso é pedir demasiado a guardas prisionais, se calhar.
As deficiências informativas elencadas e que poderiam e deveriam ser colmatadas não o foram porquê? Não há demissões, também, caro Eduardo Dâmaso?

5 comentários:

Daniel disse...

Totalmente de acordo.
Quanto aos presos, falha no planeamento...se tivessem optado pelo fim de semana que aí vem, tinham mais dois dias de avanço a esta Ralépúbica de Palhaços.

foca disse...

Para lá deste folhetim, não haverá ninguém que explique que a falta de guardas prisionais para rondas é conversa do século XIX?

Estamos na era dos drones, sensores de presença, câmaras inteligentes, e vários outros dispositivos.
Pensar que temos guardas em guaritas a olhar para o infinito à espera que alguém fuja é para lá de parolice e atraso. Em vários cidades do mundo o metropolitano já circula sem maquinista, em breve teremos carros sem condutor (apesar de por cá andarem entretidos com as guerras entre taxistas e condutores da Uber!!).
Acordem para a vida!
Vão ao cinema que pode ser que aprendam alguma coisa.
E deixem lá a mamifrada dos sindicatos que dali não vai sair nada para o futuro

josé disse...

"Estamos na era dos drones, sensores de presença, câmaras inteligentes, e vários outros dispositivos."

Ficção científica para a dona Van Dunen.

mcnuno disse...

... faltou assessoria.

José Domingos disse...

Outro folhetim. Agora são os dez milhões, estranho é não perguntarem a ninguém, onde anda o dinheiro " emprestado " pela CGD. Se calhar não dá jeito, deve ser outra arca encoirada.

O Público activista e relapso