Este negócio da construção da linha de alta velocidade Poceirão-Caia, no tempo do governo Sócrates, foi encarado como um investimento público de dimensão demasiado grande para o tempo de crise económica que então se prenunciava e a capacidade financeira que tínhamos. Em 2012 o governo de Passos Coelho suspendeu o projecto, mas na época eram já demasiadas as vozes públicas contra o projecto faraónico, para o tempo em que estávamos.
O tribunal de Contas acabaria por considerar que...
A rede ferroviária de alta velocidade em
Portugal foi cancelada em 2012, mas a factura ascendeu a pelo menos 153
milhões de euros. Segundo uma auditoria publicada hoje pelo Tribunal de
Contas (TdC), ao longo dos 12 anos em que o projecto esteve a ser
elaborado foram gastos 120 milhões de euros em contratação externa e
32,9 milhões de euros em custos de estrutura da RAVE, a empresa pública
criada para levar a cabo o TGV.
Além dos 153 milhões de euros em custos
directos, a factura pode ainda subir: existem três pedidos de
indemnização ao Estado das empresas a quem o projecto foi adjudicado,
cujas petições iniciais ascendem a 29,4 milhões de euros, e o
cancelamento do projecto transferiu para a Parpública contratos de
financiamento de 599 milhões de euros que haviam sido celebrados pelo
consórcio ELOS, que ganhou um dos troços.
Projecto dava "rendas a privados" e iria custar 11,6 mil milhões
O relatório do TdC incide no período
entre 2000, ano de criação da RAVE, e o fim do projecto. A construção da
rede assentava em seis contratos através de Parcerias Público Privadas
(PPP), através dos quais seriam desenvolvidos, em primeiro lugar, três
eixos ferroviários. E várias opções são postas em causa. O total de
encargos para os organismo públicos envolvidos no projecto ascenderiam a
11,6 mil milhões de euros e "os riscos de procura relevantes recairiam
sobre a CP e a REFER, empresas públicas economicamente deficitárias".
Em contrapartida, os pagamentos pela
disponibilidade da infra-estrutura às concessionárias" gozariam de
estabilidade, característica típica das rendas". A incidência do risco
de procura nos pagamentos a efectuar às concessionárias "seria
residual", acrescenta o TdC. Este modelo, segundo o a auditoria, "não
encontrou paralelo nos modelos existentes noutros países, nomeadamente
da Europa".
Outra crítica dos juízes é que,
atendendo à complexidade e à falta de experiência prévia na
implementação de um sistema de transporte inteiramente novo, houve
"algum excesso de optimismo, porquanto seriam de admitir imprevistos
durante todo o processo". Além disso, não foi obtida experiência através
da execução de um só contrato para, posteriormente, abrir novos
processos de contratação. "Tal como noutros sectores, no sector
ferroviário o Estado pretendeu implementar um modelo não testado sem a
utilização do que habitualmente se designa por projecto-piloto", refere a
auditoria.
O projecto foi ainda iniciado sem ser
possível aferir o custo-benefício para Portugal e o Estado não
comprovou, perante o tribunal, a comportabilidade dos encargos que
decorriam do único contrato PPP assinado e ao qual foi recusado o visto
prévio. Em suma: "os estudos preliminares demonstraram que o
investimento na rede ferroviária de alta velocidade não apresentava
viabilidade financeira"
Os protagonistas directos do negócio Elos ( foto Público) . Os escondidos estão agora à vista.
O que o jornal i de hoje conta é matéria já conhecida. O consórcio Elos ganhava a dois carrinhos. Ganhava se fosse construído o troço e ganhava se o não fosse, ficando o risco todo para o Estado. Começaram logo a laborar e facturar.
Por isso mesmo o Estado foi já condenado a pagar 150 milhões de euros ao tal consórcio.
O que a notícia traz de interessante é a circunstância de terem sido os advogados ligados ao consórcio a incluir a cláusula penalizadora em caso de não construção, o que aliás era uma possibilidade bem real, precisamente encarada pelos mesmos como mais uma oportunidade de negócio à sombra do Estado e aparentemente inatacável, face a regras jurídicas que não contemplaram certamente a má-fé destes indivíduos...
Quem foram os juristas que intervieram nestas "negociações" preliminares? Estão aqui os nomes, conhecidos em 2011 e que o i não traz:
O trabalho de assessoria jurídica ao projecto no troço Poceirão-Caia, ganho pelo consórcio Elos, foi desenvolvido por equipas das cinco sociedades de advogados.
O projecto venceu um prémio europeu, que será oficialmente anunciado no final deste mês. O galardão foi atribuído pela publicação especializada “Euromoney Project Finance Magazine”.
A assessoria foi da responsabilidade da Vieira de Almeida & Associados (VdA), cuja equipa foi liderada pelo sócio Manuel Protásio.
Já o apoio aos bancos, a área de Direito Financeiro, o apoio foi proporcionado pelo escritório Campos Ferreira, Sá Carneiro & Associados (CS Associados)e teve como protagonista o advogado Duarte Brito de Goes.
Bernardo Dinis de Ayala, sócio da Uría Menéndez - Proença de Carvalho (UM-PC) foi o responsável pela assessoria jurídica aos bancos na área de Direito Público. E, por seu turno, Alberto Galhardo Simões, da Miranda, o aconselhamento ao Banco Europeu de Investimento.
Outro dos juristas envolvidos neste projecto foi Pedro Leite Alves, sócios do escritório Jardim, Sampaio, Magalhães e Silva, competindo-lhe a assessoria jurídica à entidade adjudicante, o Estado português.
O montante referente à construção ascende a 1,359 mil milhões de euros, é apontado como o mais significativo investimento público em infra-estruturas realizadas nos últimos anos em Portugal e deverá manter esse estatuto durante os próximos anos.
O troço em causa foi adjudicado pelo consórcio Elos – Ligações de Alta Velocidade, coliderado pela Brisa e pela construtora Soares da Costa.
O consórcio vencedor integra também a Iridium Concesiones de Infraestructuras, do grupo espanhol ACS, Lena, Bento Pedroso, Edifer, Zagope, a norte- amaricana Babcock & Brown Limited, o Millenium BCP e a Caixa Geral de Depósitos.
Comparando este caso que nem é singular porque repetido noutras situações durante o governo de José Sócrates, com o da construção da Ponte Salazar será caso para dizer que as diferenças são abissais, a noção de interesse público não tem comparação e a seriedade dos governantes de então, comparando com as patifarias actuais e as personalidades endemicamente corruptas de hoje, nem se fala. Isto diz mais do actual regime, em comparação com o anterior que muitos discursos antifassistas...
A democracia permitiu o aparecimento destes patifes em série que desgraçaram o país em sucessivas bancarrotas. Portugal tudo aguenta, mesmo esta canalha que continua a governar e até com maiorias confortáveis.
Tirando aqui e ali umas vozes isoladas que teimam em fazer comparações com o passado remoto, temos até um presidente da República que se lembra de destacar a superioridade moral do actual regime, face ao anterior, no caso da ocultação das vítimas de tragédias nacionais.
De facto, se pensasse melhor, veria que a verdadeira ocultação desta tragédia nacional acima exposta é obra dos apaniguados do actual regime, com destaque para os media de que o mesmo presidente da República fez parte integral.
E se isto não é verdade que tenham a coragem de o dizer...e ao mesmo tempo mencionem os advogados acima citados. Estão lá quase todos os do regime actual. O resto está metido nos demais negócios similares.
Como é possível a um povo martirizado por estes patifes, dar a volta a isto?
Por outro lado esta questão traz à luz um assunto que já aflorado noutros sítios e mesmo aqui: será justo julgar José Sócrates, exclusivamente por estas patifarias, como criminoso de delito comum?
Se o for e vier a ser condenado, compreende-se que o mesmo cite um humorista brasileiro dos anos setenta da tv: "cadê os outros"?
Esta questão da Elos é mesmo um dos pontos nevrálgicos do regime podre que tivemos e se Sócrates recebeu luvar por isto e por outras coisas foi porque esta caterva de indivíduos assim quiseram e facilitaram. Tinha José Sócrates o poder exclusivo ou determinante para que este e outros projectos fossem aprovados com o perfil indicado? Duvido. Participou nisto, sem dúvida alguma. Mas...terá sido o seu mentor? Nem por sombras, pelo que a "operação Marquês" se arrisca a caminhar por veredas muito perigosas ao não dar conta deste fenómeno.
E então surge a questão fundamental: quem foi ou quem foram os autores dos crimes económico-financeiros e de responsabilidade política que todos estes casos denotam?
Não está apurado, ainda, e o jornalismo nacional não se esforça muito por isso, porque escolher o alvo Sócrates como único bode expiatório é mais fácil. Mas não o mais justo.
Há juristas metidos nisto e é preciso dizer os nomes. Há banqueiros metidos nisto e é preciso enunciar os apelidos. Há outros políticos e para-políticos comparsas e cúmplices desta gigantesca patifaria e não são os mais evidentes.
Portugal precisa de uma barrela, como o Brasil e não vejo que a possa fazer.