Joe Berardo teve uma prestação no Parlamento, esta tarde, deveras impressionante. Penosa, na medida em que mal sabe falar- diz-se disléxico-, mas sabe explicar-foi sempre o advogado que falou por ele, aconselhando-o em praticamente todas as respostas e mal sabe o que anda a fazer, excepto uma coisa: proteger-se e proteger outros que se desconfia bem quem sejam.
Para tal usou expedientes e argumentos incríveis. Ao mesmo tempo que se lembrava bem de umas coisas, assegurando "memória razoável", esquecia pormenores e pormaiores inacreditáveis para o senso comum.
Fundamentalmente, o empréstimo que a CGD lhe concedeu, no valor de 50 milhões, mais 300 milhões pouco tempo depois, foi na verdade concedido a pessoas colectivas de que o mesmo é o principal titular, por dominar em número de acções ou de votos. Primeiro a Metalgest, uma "holding" dos interesses do Joe e depois a Associação de Colecções, uma pessoa colectiva cujo estatuto juridico nem sequer foi bem explicado.
As explicações deste Joe para este imbroglio simples e fácil de desmontar desde que se conheçam os estatutos e contratos foi risível: " eu não tenho nada"; "quem manda na associação sou eu"; " defendo os interesses da associação".
O essencial do contrato celebrado entre a CGD e o mutuário Metalgest, ou seja o titular principal desta empresa, o nosso Joe, replicado depois, foi explicado devidamente: o empréstimo de 50 milhões de euros foi sugerido pela própria CGD. Por quem?, perguntaram vários deputados. Não se lembra, o nosso Joe, a não ser de um responsável pela concessão de crédito, um tal Cabral , ou Santos ou coisa que o valha. Já foi prestar depoimento, este manga de alpaca e disse nada aos costumes.
Qual o objectivo do empréstimo? Disse o Joe: investir em acções de empresas do PSI20. Investiu? Sim, numa única: o BCP. Por coincidência, na altura em que este banco passava por uma situação de rebuliço interno com vista a deposição da gestão de Jardim Gonçalves. O BCP era então o maior banco português e aparentemente, segundo vários depoimentos, incluindo o deste Joe, havia interessados, investidores desse banco, incluindo a Sonangol e outros, apostados em depôr o Jardim e colocar lá outro que já tinham escolhido. Quem? Precisamente o principal administrador da CGD, um socialista amigo de Eduardo Paz Ferreira e de outros socialistas de gema, como Vítor Constâncio.
A este propósito, o nosso Joe esclareceu sem problemas que teve várias conversas com o Vítor, que já suou estopinhas em comissões de inquérito parlamentares. E essas conversas, disse o Joe, foram de pé de orelha, só os dois e que juraram que o teor das mesmas não sairia daquela sala. Ipsis verbis.
Isto é incrível a vários títulos e devia colocar em causa o regime, como alvitrou alguém, antes desta audição.
O Vítor, Governador do Banco de Portugal, membro do PS de raiz, tal como Eduardo Paz Ferreira ou Carlos Santos Ferreira, souberam evidentemente tudo a propósito do empréstimo da CGD a Joe Berardo.
A prova directa não existe. Mas existe a prova indirecta que se traduz na completa ausência de garantias credíveis e sólidas para tais empréstimos e episódios que se seguiram e os pequenos episódios contados por este Joe, no dia de hoje.
Joe Berardo não quis explicar tudo e nem seria caso de a sua dislexia o impedir de tal. Mas os indícios estão todos aí: burla gigantesca ao património público da CGD, gestão danosa evidente e prejuízos dantescos.
A CGD emprestou várias centenas de milhões de euros, virtualmente sem garantias, para um indivíduo afecto concorrer à conquista de um banco privado que era presa apetecível de certa facção. E tal consumou-se com a emergência de prejuízos para o erário público.
Agora tomemos o caso singular de Duarte Lima, condenado e a cumprir cinco anos de prisão por burla, a um banco privado.
Duarte Lima viu um terreno que poderia ser usado para um empreendimento de interesse público e que se valorizaria por isso mesmo. Encetou negociações com os proprietários e adquiriu-o por uma quantia razoável. Não pessoalmente, mas através de uma empresa que criou. Pouco tempo depois, com base numa expectativa futura de um empreendimento de cariz público, a construção de uma unidade hospitalar, apresentou um projecto de financiamento da ordem de várias dezenas de milhões de euros a um banco, o BPN, cujo presidente conhecia bem. O banco analisou e indeferiu a pretensão por ausência de garantias suficientes e Duarte Lima conseguiu convencer o presidente do banco, Oliveira e Costa a autorizar o empréstimo. O empreendimento revelou-se um fracasso, porque não se concretizou. Falhou o essencial e o banco precisava de reembolso do empréstimo. Falência da tal empresa, Homeland. Processo crime por burla contra Duarte Lima, acusado, julgado e condenado por ter conseguido enganar, não o banco, mas Oliveira e Costa.
Resumidamente foi isto.
Compare-se a actuação de Duarte Lima com a deste Joe e dos que o ajudaram a conseguir o empréstimo da CGD.
Tirem-se as conclusões e pense-se se haverá justiça se aqueles- Joe e os dois Ferreiras mais um tal Vara e, claro, o Vítor- não forem condenados em penas de prisão efectiva por causa disto que agora se sabe.
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