sexta-feira, julho 30, 2010

O golpe no Ministério Público

Os jornais de hoje relatam o insólito que atingiu o Ministério Público em Portugal: o procurador-geral da República, cabeça desse mesmo MP, desmente os magistrados do caso Freeport e anuncia um procedimento de inquérito para apurar a actuação processual dos mesmos, nesse processo.
Tudo por causa de uma parte do despacho de encerramento do processo em que se refere a ocorrência de uma "ordem" ou "instrução" ou mesmo "recomendação", ou até "aviso de atenção", no sentido de o processo estar concluído até 25 de Julho.
Tal "instrução" teria partido, segundo o Público de ontem e o Sol de hoje, do próprio vice-procurador geral da República, Mário Gomes Dias que assim teria assinado um despacho com data de 4 de Junho. Incidentalmente, este magistrado do topo da hierarquia do MP estará em situação de ilegalidade, no exercício de funções, desde o momento em que perfez 70 anos ( em 15 de Junho último) e segundo o Sol, um administrativista de prestígio como Vieira de Andrade, não tem dúvidas: "está ilegal. Não vejo que haja outra interpretação."

Não obstante, o essencial desta questão com o Freeport é apresentada por escrito no editorial do jornal i de hoje que assinala na primeira página que há "guerra aberta no MP". E há, de facto, uma guerra em curso, com batalhas que começaram há muitos meses atrás e se prolongam para um desfecho que tem apenas uma saída: ou a demissão de Pinto Monteiro ou a destruição do Ministério Público tal como o conhecemos.
Uma guerra que tem como protagonistas o próprio PGR ( e o seu vice, Mário Dias e ainda eventualmente Proença de Carvalho, amigo de Pinto Monteiro) e a restante magistratura com destaque para o sindicato que ontem emitiu um comunicado a referir um ponto essencial:
"São conhecidas e não são de hoje, nem de ontem, as críticas e as reservas que o SMMP faz relativamente à gestão e coordenação do Departamento Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP), que depende directamente do procurador geral da República", declarou à agência Lusa João Palma, presidente do SMMP."

Estas circunstâncias extraordinárias permitem o tal editorial do i, assinado por Carlos Ferreira Madeira que diz assim, no ponto fulcral:

"É evidente que o despacho de acusação deixa no ar a suspeita de que alguém na hierarquia do MP impediu a investigação. E tudo isto tem consequências terríveis. Desde logo, a guerra entre o MP e os políticos que desejam, de facto, amordaçar a autonomia do Ministério Público-uma ideia muito perigosa".

É este o nó górdio de todas estas questões. A suspeita, agora abertamente levantada pelo sindicato da magistratura do Ministério Público de que no DCIAP não se pratica o princípio constitucional da igualdade dos cidadãos perante a lei, tem expressão já anterior, aquando do episódio Lopes da Mota, apresentado publicamente como um bode expiatório para salvar a face de outros mais comprometidos ( o advogado de Lopes da Mota, conhecedor destes meandros, disse-o explicitamente).

O editorial do i, coloca por isso a questão no tema da autonomia do MP. Sabemos, por declarações recentes- de António Vitorino e Ricardo Rodrigues que seguem na senda de Proença de Carvalho e mesmo o juiz conselheiro Noronha do Nascimento- que algumas figuras do universo político-jurídico nacional, pretendem alterar o paradigma da investigação criminal em Portugal. Uma das formas de tal conseguir, seria retirar poderes ao MºPº e concretamente colocá-lo debaixo da alçada directa de um qualquer ministro da Justiça, como acontece na maior parte dos países europeus. A tentação é forte, para esses políticos e mesmo com um PGR como o que existe, não há garantias suficientes de se "responsabilizar" como gostam de referir, a investigação criminal em Portugal.

Este episódio da "guerra" entre o PGR e a magistratura do MP em geral, mostra à saciedade os argumentos de que precisam esses defensores do vínculo governamental: o PGR não manda nos magistrados que dirige...é a mensagem implícita e que a partir de hoje irão apresentar ao país, para que as anas lourenços repliquem de modo atento e obrigado e se estabeleça o clima geral para o golpe palaciano em curso no Ministério Público: a retirada da autonomia ao MP para que os seus magistrados ainda investiguem menos do que já o podem fazer com as leis processuais penais capadas que impingiram democraticamente.

Esta é a essência do problema e o PGR Pinto Monteiro faz parte do mesmo. Por isso deve sair, quanto antes, embora como o disse há meses um antigo magistrado que foi sindicalista do MP, Guilherme da Fonseca, não o vá fazer de livre vontade...

2 comentários:

Unknown disse...

“1.É impressionante como as coisas realmente graves desaparecem do radar da sociedade portuguesa. Vamos lá fazer um exercício de memória: o Conselho Superior do Ministério Público considerou como provadas as pressões de Lopes da Mota sobre os procuradores do caso Freeport. A pena proposta foi de 30 dias de suspensão. Este caso começa a não fazer sentido logo aqui: se Lopes da Mota pressionou dois procuradores, a pena de 30 dias de suspensão é ridícula. Se Lopes da Mota pressionou dois procuradores no sentido de beneficiar José Sócrates, então a pena certa devia ser a suspensão definitiva.
2. O caso começa a fazer ainda menos sentido quando o advogado de Lopes da Mota dá a entender que as pressões vieram do próprio procurador-geral da República e da directora do DCIAP, Cândida Almeida. Como salientou um editorial deste jornal, uma coisa é certa no meio desta confusão: existiram pressões no sentido de beneficiar o primeiro-ministro.
3. Eu não sei se há gente corrupta ou corrompida nesta história. Mas sei que o Ministério Público está institucionalmente desfeito. É bom lembrar que Cândida Almeida fez parte da comissão de honra de Mário Soares em 2006. É aceitável este tipo de comportamento por parte de uma procuradora? Não, não é. E as regras internas do Ministério Público deviam ser claras a esse respeito. O procurador-peral da República devia ter o poder para impedir que um procurador crie, através dos seus actos, um clima de promiscuidade entre justiça e partidos.
4. O caso Lopes da Mota podia ser o mote para uma discussão alargada sobre as mudanças institucionais que é preciso introduzir no Ministério Público. Mas isso não está a acontecer, nem vai acontecer. A elite portuguesa nunca discute regras e instituições; só discute pessoas. “
http://aeiou.expresso.pt/e-o-caso-lopes-da-mota=f560360

A cabeça do MP finou-se, pim, pá, pum. Não serve para coisa alguma. Pobres dos restantes delegados (sou velho e não quero saber de modernices) sérios que combatem o crime e são barrados, vilipendiados e apodados de incompetentes. Pobre instituição gerida por sedento de entrevistas e servida pela criatura Cândida e Morgado.

josé disse...

Vou colocar na página da frente este comentário anónimo mas de um conhecedor.

O Público activista e relapso