O caso Sarkozy, em França, torna-se exemplar do funcionamento das instituições judiciárias, pelo menos nesta fase inicial de inquérito.
Segundo se noticiava há meses, Sarkozy foi interceptado nas conversas telefónicas que manteve com um seu advogado, Thierry Herzog, a propósito de suspeitas que já existiam acerca de financiamento ilícito da sua campanha presidencial.
As suspeitas recaiam nas ajudas monetárias que teriam sido dadas pelo então presidente líbio, Kadhafi e também nas recebidas da milionária Lilianne Bettencourt.
O ex-presidente Sarkozy foi colocado sob escuta com a autorização de um juiz de instrução, no âmbito de um processo.
Em Março deste ano o site Mediapart revelou o conteúdo destas escutas que envolviam um nome falso ( Paul Bismuth) que seria do próprio Sarkozy e que mostravam fortes suspeitas de ambos ( Sarkpzy e advogado) terem manobrado nos bastidores para influenciar decisões jurisdicionais. Assim, o magistrado Gilbert Azibert da "cour de Cassation" ( o tribunal de Relação francês) teria tentado influenciar a decisão de três juizes conselheiros encarregados de examinar a validade dos actos de instrução do processo relativo àquela Bettencourt. Em troca, Sarkozy prometera ao Gilbert um apoio importante para um lugar ao sol, no Mónaco.
Tudo correu mal quando o magistrado Gilbert não obteve o efeito desejado no tráfico de influências que pôs em marcha: a apreensão das agendas de Sarkhozy foi julgada válida pelo juízes e ainda por cima resultou na abertura de um inquérito contra este e outros precisamente por tráfico de influência.
Na sequência deste inquérito, Sarkhozy foi hoje detido para interrogatório. Ontem, foram detidos igualmente os magistrados Gilbert Azibert e Patrick Sassoust, e também o advogado Herzog.
Há mais de uma década, por cá, um certo António Costa, ex-ministro de um governo PS, entreteve-se a telefonar a um PGR no sentido de obter um jeito. Não obteve. Mesmo assim, nada lhe aconteceu e anda agora a pugnar para ser primeiro-ministro.
De então para cá, reviram-se as leis processuais penais para que não acontecesse o mesmo que a Sarkozy. Um dos beneficiários directos de tais revisões foi...José Sócrates.
Recordar 14.3.2007 é viver...
Com a revisão do CPP, pela Unidade de Missão de Rui Pereira,
restringe-se o número e qualidade de pessoas que podem ser válida e
directamente escutadas e consagra-se a excepcionalidade deste meio de
prova. Para quê? Para evitar que se apanhem em escutas, conversas tipo
aquela, daquele que falava despreocupadamente com um assessor do PR,
propondo uma “chupeta” para o PGR ir à vidinha, lá para fora e deixar os
“boys” em sossego.
Este pequeno texto é do blog Gande Loja do Queijo Limiano de há uns anos. Tal como este...
E este de Agosto de 2004:
"o agora eurodeputado António Costa telefonou a Souto Moura na manhã da
detenção de Paulo Pedroso (Maio de 2003), tendo o PGR dito depois que
não sentira essa chamada como uma pressão; no entanto, o procurador
responsável pelo processo Casa Pia, João Guerra, argumentou com a
“intolerável pressão” desse telefonema para justificar a prisão
preventiva."
O que queria António Costa, de Souto Moura? Pressioná-lo, evidentemente, mas mais do que isso: obter um favor se fosse possível: o de não dizimar o PS.
Isso torna-se claro nesta notícia do Público de 17 de Outubro de 2003:
O juiz Rui Teixeira considerou as escutas em causa como uma tentativa de
perturbação do inquérito ao caso de pedofilia que envolve a instituição
casapiana, tendo a partir destas decidiu ordenar a prisão preventiva de
Paulo Pedroso.
Numa conversa telefónica entre António Costa e
Paulo Pedroso na manhã do mesmo dia, o líder parlamentar do PS diz ao
deputado "já fiz o contacto", ao que Pedroso respondeu "sim".
E
António Costa continuou: "disse que ia falar imediatamente com o...
procurador do processo... portanto, o Guerra... o receio que tem... é
que a coisa já tenha... já esteja na mão do juiz... visto que é o juiz
que tem de se dirigir à Assembleia... pá, talvez o teu irmão seja altura
de procurar o Guerra...".
Já perto das 11h00, João Barroso
contacta o irmão para lhe dizer que "o João Guerra está
incontactável...". Paulo Pedroso responde: "O procurador-geral disse ao
António que achava que já tinha ido tudo para o TIC...".
António
Costa e Paulo Pedroso voltam a falar ao telefone, afirmando o líder
parlamentar do PS: "[O procurador-geral] falou com o magistrado do
Ministério Público... porque lá o dito Guerra tá lá com ele. E
disse-lhe, Eh pá! O problema é que isso já está nas mãos do juiz".
Ao
início da tarde, a alguns minutos da conferência de imprensa de Paulo
Pedroso na Assembleia da República, numa conversa entre Ferro Rodrigues e
Jorge Coelho, o secretário-geral do PS diz que "o almoço não serve para
nada".
Segundo a SIC, que cita o Ministério Público, o almoço em
causa é entre o Presidente da República e o procurador-geral da
República.
António Costa e Ferro Rodrigues voltam a falar ao
telefone perto das 19h30, tendo o primeiro indicado que estava a chegar
"a casa do Júdice" e que sabe que há "uma testemunha da judiciária não é
fiável".
Já no final do dia, Ferro Rodrigues diz a António Costa: "tou-me cagando para o segredo de justiça".
O
Ministério Público suspeitar ainda que nos dias seguintes à detenção,
houve um esforço concertado do PS para fazer passar a teoria da "cabala"
entre algumas personalidades influentes da sociedade portuguesa. O
Ministério Público acredita terem sido feitas chamadas para dirigentes
do PSD como Pedro Santana Lopes, e Morais Sarmaento, para Souto Moura e
ainda para o ex-presidente do PSD Marcelo Rebelo de Sousa.
António Costa nunca respondeu civica, política e muito menos criminalmente por esta vergonha, esta ignomínia da democracia, esta farsa, este tráfico de influência.
Em consequência destas notícias, ao longo dos anos seguintes, o PS de António Costa conseguiu alterar o CPP de molde a evitar estas coisas.
Sarkozy, por muito menos, tem a polícia à perna...