segunda-feira, outubro 26, 2015

Freitas em 1976: " a maioria deste país é CDS"...

Interessante artigo no Observador, da autoria de Alexandre Homem Cristo:

Embora, no plano jurídico-formal, as eleições legislativas tenham apenas por objecto a designação de 230 deputados, a verdade é que uma análise substancial de ciência política mostra claramente que elas têm hoje dois outros grandes objectivos – revelar o peso proporcional dos vários partidos, e escolher um primeiro-ministro. Foi o que se passou com Sá Carneiro em 1979 e 1980, com Mário Soares em 1983, com Cavaco Silva em 1985, 1987 e 1991, com António Guterres em 1995 e 1999, e com Durão Barroso em 2002. Sendo as coisas assim, como são, temos de concluir que as chamadas eleições “legislativas” se transformaram numa escolha popular do primeiro-ministro. É por isso que Maurice Duverger chama democracias “directas” àquelas onde isso acontece, e “indirectas” àquelas onde o primeiro-ministro pode ser escolhido – sem eleições – por novos arranjos parlamentares ou por meras decisões das cúpulas partidárias. Não tenho dúvidas de que Portugal pertence, há pelo menos 25 anos, ao primeiro grupo; e seria muito mau, por várias razões, que deixasse de pertencer.”

A autoria do raciocínio não pertence a Passos, a Portas ou a qualquer dirigente da coligação “Portugal à Frente”. Estas palavras foram escritas, em 2004, por Diogo Freitas do Amaral. E foram-no com o propósito de convencer o então Presidente da República Jorge Sampaio da necessidade de, após a saída de Durão Barroso para Bruxelas, dissolver a Assembleia da República (onde PSD/CDS tinham uma maioria absoluta) e convocar eleições legislativas, em vez de indigitar um novo primeiro-ministro suportado pela mesma maioria parlamentar. Meses depois, Freitas viria a ser ministro de Estado do primeiro governo Sócrates. E, hoje, perante a ambição de António Costa em chegar a São Bento, o mesmo Freitas do Amaral considera legítimo que o líder do PS, vencido em eleições legislativas, venha a ser primeiro-ministro liderando um governo minoritário.

Confuso? Sem dúvida. Mas Freitas do Amaral não foi o único a mudar de opinião. No mesmo período de 2004, Ferro Rodrigues (então líder do PS) bradava por eleições legislativas, elencando “motivos nacionais, democráticos e institucionais” contra a substituição de Durão Barroso por Santana Lopes. Nem de propósito, tirando proveito da inversão que António Costa aplicou agora a esses motivos “democráticos e institucionais”, Ferro escalou há dias ao segundo lugar da hierarquia do Estado.

Não me perturbam as contradições de Freitas do Amaral e de Ferro Rodrigues. Julgo dispensável a hipocrisia de nos fingirmos surpreendidos com as incoerências dos nossos políticos (até porque elas são o único elo que os relaciona a todos, da esquerda à direita). Perturba-me a coerência. É que, vistas em conjunto, estas e outras contradições exibem, afinal, uma harmonia infalível: Freitas do Amaral e Ferro Rodrigues podem ser contraditórios, mas o seu objectivo em ambas as circunstâncias não varia – defendem os seus próprios interesses (através dos do PS), procurando limitar o acesso da direita ao poder. Nas suas cabeças, as questões constitucionais e eleitorais dispensam grandes discussões: se os beneficia, a regra está correcta; se os prejudica, aconselha-se a excepção. Numa adaptação livre do pensamento de Carl Schmitt, são soberanos: decidem quando a regra é válida, quando a excepção se impõe, quando a tradição se cumpre.

Ora, o país convive há anos com isto, aceitando a elasticidade argumentativa de uma longa lista de “soberanos”. Mas há limites – todos os elásticos se partem quando esticados em demasia. É fácil adivinhar que, a médio prazo, a submissão do regime a este calculismo de interesses políticos (que permite uma mesma regra/tradição ser interpretada assim ou assado) acarretará consequências severas para a confiança nas instituições – nos políticos, nas regras, nas normas constitucionais, nas leis eleitorais, nas leis não-escritas da democracia, nas praxes parlamentares. E é fácil decifrar que, se António Costa chegar a São Bento por esta via sinuosa, enterrará com ele o pouco que sobeja da credibilidade das instituições políticas.
Ninguém consegue antecipar com certeza o que advirá nos próximos dias. Mas, surja o que surgir, para trás ficou já assegurado um rasto de destruição. A previsibilidade eleitoral expirou, a excepção elevou-se a regra e as regras aplicam-se agora apenas excepcionalmente. Pela mão de Freitas do Amaral, Ferro Rodrigues, António Costa e os seus, a arbitrariedade reemergiu no cenário político – e para conveniência política dos próprios. Valha-nos a rede de segurança da UE. Porque é em momentos destes que os regimes acabam.



Freitas do Amaral é uma figura algo controversa no nosso país.   Em 1976, o fundador do CDS dava uma entrevista à revista Opção, ao nº4, de 20 de Maio de 1976."


Dizia então que o povo que votara na esquerda, no fundo era do CDS. "O voto no PS, nas circunstâncias actuais da sociedade portuguesa, é um voto no sentido da moderação, relativamente ao ritmo e à direcção erradas e excessivamente veloz do ano e meio ou dois anos de revolução." O entrevistador- Artur Portela Filho- perguntava-lhe então se votara no PS. Resposta:

" Eu não votei PS. Estou a procurar interpretar porque é que a maioria dos portugueses que são CDS votaram PS!...Porque a maioria deste país é CDS. Quando eles compreenderem o que o CDS é, quando tiverem a total liberdade interior para votar no CDS sem receio que isso possa trazer consequências".

No resto da entrevista de que aqui se deixam quatro páginas das seis Freitas fala do comunismo e o anti-comunismo e o socialismo original que afinal ainda não tinha sido encontrado em Portugal e o CDS de então procurava afanosamente.
Será isso que Freitas descobriu agora, de há uns anos a esta parte, no PS? O tal socialismo original que andava à procura?  E Basílio Horta também se transformou assim?

Lendo bem o que aqui vai não é de estranhar muito...



Questuber! Mais um escândalo!