domingo, novembro 17, 2013

Pinto Monteiro:" divulguem as cassetes"!

SIC-N:

Fernando Pinto Monteiro desafia os jornalistas que têm cópias das cassetes das escutas telefónicas dos processos “Face Oculta” e “Freeport” a revelar o conteúdo. O antigo Procurador- Geral da República disse que nada havia de ilícito no que consta nessas gravações. E acha inclusive, hoje, que foi um erro não terem sido tornadas públicas. Numa entrevista ao programa da SIC Notícias "A Propósito", depois de ter estado no lançamento do livro do ex-primeiro-ministro, José Sócrates, disse que não era da sua responsabilidade a decisão de mandar destruir as escrutas... e sobre eventuais polémicas insistiu que não há nada de que se arrependa.

Na entrevista televisiva na SIC-N, orientada por um sistémico António José Teixeira, sempre muito contido com os entrevistados, não vão zangar-se com o seu papel de segurança do sistema, diz Pinto Monteiro:

"O   Freeport, já o disse, ninguém contestou,  foi uma fraude...está lá! Consultem-no...estava em segredo...eu nunca vi o  Freeport...que eu nunca vi nenhum desses processos..."
"A Face Oculta é outra anedota porque...as cassetes- que não fui eu que as mandei destruir que a lei atribui ao presidente do Supremo...é preciso esclarecer que eu ouvi as cassetes, entendi que não havia ali nenhuma matéria crime, mas quer entendesse quer não entendesse, o presidente do Supremo é que tem a palavra final e ele mandou-os destruir. Se foram destruidas ou não...pois que terão sido. O que eu sei é que as cassetes existem hoje, já particulares têm as cassetes, há jornais que têm as cassetes...porque é que não as divulgam? Sabe porque é que não as divulgam? Porque não há lá nada...e não divulgam porque é a galinha dos ovos d´ouro. Sabe o que é que uma vez disse e mantenho? Eu acho que foi, enfim, acho que foi um erro político do primeiro-ministro não ter autorizado...se ele tivesse autorizado e os outros interlocutores, as cassetes podiam ter sido divulgadas e o apelo que eu faço a estes jornalistas é que as divulguem...porque aí morre a galinha dos ovos d´ouro. Divulguem as cassetes!"

O jornalista então refere-lhe que "Pode haver um crime de desobediência..." E Pinto Monteiro hesita uma facção de segundo, suficiente para se entender que não é destituido de todo e se deu  conta da gaffe, confirma: "pode haver um crime de desobediência, mas repare..eu...eu...as escutas, para mim, ouvi-as, não encontrei nada que (re) levasse qualquer tipo de ilícito crime. Ponto final." 

Esta parte da entrevista de Pinto Monteiro, com este tipo de entrevistador, mostra mais uma vez o seguinte:
Pinto Monteiro afirma sobre o Freeport que "foi uma fraude". Logo a seguir afirma que " eu nunca vi o Freeport". Ou seja, sem se dar conta da contradição, porque o é, esclarece que nunca consultou o processo integralmente. Mesmo assim, para Pinto Monteiro, o processo foi uma fraude. Esclarecedor e retumbante. Ouvir Pinto Monteiro sobre o Freeport é o mesmo que ouvir a defesa do principal suspeito que nunca foi arguido. É um argumento de cassete que começa logo no início do processo com uma carta anónima que é entendida como prova da fraude...
Pinto Monteiro foi PGR deste país no momento em que este processo se tornou assunto do dia mediático e é assim que o mesmo trata o caso: como se fosse testemunha de defesa daquele, sem distância alguma, sem pudor algum e sem atender ao que está no processo que nunca leu.

Sobre o Face Oculta, processo ainda pendente, actualmente em sede de julgamento, Pinto Monteiro que é magistrado do STJ, jubilado, sobre quem impende ainda um especial dever de reserva,  pronuncia-se abertamente sobre o caso mais sensível desse processo que está em curso e tem inclusivamente requerimentos de um dos arguidos, pelo menos, no sentido de as escutas não serem destruídas, se ainda o não tiverem sido, apesar da ordem do pSTJ.
Não é apenas o que diz Pinto Monteiro que deveria chocar a comunidade jurídica e em geral, mas a mensagem que pretende:  mais uma vez  branquear o seu amigo José Sócrates, que tem como advogado Proença de Carvalho, igualmente seu amigo , tudo "contactos" que   não divulgou nem tal lhe foi agora perguntado.

A questão que Pinto Monteiro devia equacionar quando lhe falam destas coisas não é apenas o caso particular das escutas que o mesmo  considerou, contra a opiniuão de vários magistrados que sabiam melhor que ele, não  indiciarem  matéria criminal. É mais grave. Pinto Monteiro, confessadamente não conhecia o processo, já com vários volumes e já com vários indícios daquilo que um dos advogados dos arguidos, Rodrigo Santiago, de Coimbra, um dos melhores advogados do "crime", disse publicamente numa entrevista, em Dezembro de 2009 ( já depois das eleições...)  "que o processo Face Oculta é apenas a ponta do iceberg da corrupção latente e que há altas figuras do Estado português envolvidas neste caso concreto. Disse-o porque é advogado do principal arguido e que naturalmente sabe tudo o que se passou e disse-o porque consultou o que pode consultar do processo.envolvidas no caso."

João Cravinho, pouco tempo depois referiu expressamente que  «Podemos fazer uma experiência, vão agora à Assembleia e ponham as coisas preto no branco, numa linguagem muito simples. Onde está o centro da corrupção grave em Portugal? Eu digo, está no sector político. Perguntem aos líderes políticos e vão ver se eles não assobiam para o ar».
 Pinto Monteiro e Cândida de Almeida, por várias vezes, contrariaram publicamente este entendimento de senso comum, apelando ao senso político. Freitas do Amaral acusou-o publicamente num pequeno artigo na Visão de ter sido ele mesmo quem transformou o processo Face Oculta em caso político.
Neste contexto, o que Pinto Monteiro continua a referir sobre as escutas é apenas patético. Triste mesmo porque revela o modo diletante como exerceu o cargo ( como aliás teria que ser porque não há carreira profissional de PGR)  e confessadamente não se inteirava dos processos em concreto. Mas tem o topete de andar sempre a referir, e agora mais uma vez, que as escutas não tinham nada de relevante criminalmente e até apela a que sejam divulgadas, incitando eventualmente à prática de um crime ( que aliás também é um crime em si mesmo...).

O problema principal que Pinto Monteiro continua a não entender porque estará eventualmente obnubilado ( sempre foi juiz do "cível", como aliás Noronha Nascimento) é que as escutas referidas são apenas um indício de outra coisa mais grave: o atentado ao Estado de Direito que agora se sabe estava mesmo em preparação nos media e ocorreu efectivamente noutros sectores ( banca, por exemplo) com actos políticos concretos da responsabilidade do então primeiro-ministro. É isto que Pinto Monteiro não equaciona: aparentemente nem sequer lhe passar pelo bestunto, como facto criminal,  aquilo que pelo menos três magistrados ( um juiz e dois do ministério público, incluindo o titular do processo) entenderam que se indiciaria. 
Pinto Monteiro desprezou a opinião pessoal e juridica de três magistrados que conheciam o processo e  só com a audição de umas escutas parciais que não lhe mostravam nada de especial ( nem sequer leu o resto do processo) entendeu logo ali atalhar e arquivar o assunto. Além disso, o entrevistador sistémico não lhe perguntou porque deixou passar o prazo de 48 horas para apresentar as escutas ao pSTJ, prazo peremptório e que implicaria sempre a nulidade absoluta de tais escutas...
Este comportamento, naquele contexto, não é normal num magistrado e o próprio Pinto Monteiro deveria reconhecer que o não é. E explicar melhor porque o não foi. 

Ater-se a umas escutas banais entre amigalhaços nas quais se referem coisas que depois se verificam ter um sentido que Pinto Monteiro nem alcançou ( disse uma vez que as escutas posteriores, divulgadas,  provam a irrrelevância das primeiras...) é agora apenas patético.
Apelar à divulgação de tais escutas, agora,  é mais que isso: significa que não entendeu a essência do assunto, o que revela pouca sensibilidade, digamos assim, para se ser caridoso...

Entrevistar Pinto Monteiro e não lhe colocar estas questões é apenas o frete do costume, da SIC-N. 

E outra coisa que me esquecia:
Pinto Monteiro e Noronha Nascimento já se desdobraram várias vezes em entrevistas nas quais referem estes assuntos ( porque lhos perguntam, claro) e não se coibem de falar sobre os mesmos sabendo de antemão que os restantes protagonistas o não farão. Sempre que falam é para se defenderem dos factos objectivos que apontam para o arquivamento desses processos em que intervieram e para justificarem porque o fizeram. É sempre esta perspectiva que sobressai nestas entrevistas, sempre sem qualquer contraditório que em direito é essencial.
Porém, nunca falaram sobre isto os dois procuradores do Freeport e os investigadores da Judiciária que não consideraram o tal processo uma "fraude", como Pinto Monteiro considera, sem conhecer os autos; nunca falaram sobre isto os procuradores do Face Oculta, pelo menos três ( Marques Vidal e o procurador que o ajudou; o PGD de Coimbra, Braga Themido, que se afastou e a quem ninguém perguntou porquê e está na mesma situação que Pinto Monteiro) e o juiz de instrução de Aveiro, António Gomes. Isso para além de Teófilo Santiago, o inspector prestigidado da PJ que invesrtigou o processo. Estes nunca falara, publicamente sobre as suas opções jurídicas igualmente fundamentadas. O que sobressai sempre é a desvalorização sistemática destas posições jurídicas para fazer passar a ideia de que aquilo que ocorreu nesses dois processos foram cabalas. Isso mesmo, cabalas! Onde é que já se ouviu isto?
Sendo assim, por que não se callam?

8 comentários:

Karocha disse...

José

Assisti à entrevista de boca aberta,fiquei na dúvida se era eu que estava parva ou se era por ter sido"pequenina" ontem.
No final disse, amanhã vais levar com um post do José !!!

josé disse...

POis eu não assisti nem sabia que iria haver entrevista. Só hoje de manhã fui alertado por um comentário e pus-me a ouvir a parte que comentei.

Incrível. Faz lembrar os casos de inimputabilidade.

foca disse...

José
Se apenas viu uma parte então procure o resto, eu vi e fiquei aterrorizado.
É tudo coincidências, não há corrupção, os juízes e Procuradores são uns pavões e tratam mal o cidadão, etc.

O homem foi o Procurador Geral, valha-nos Deus!

Carlos Faria disse...

Infelizmente temos um conjunto de cumplicidades que fazem Portugal cada vez mais parecer um País onde a corrupção na política é protegida pela justiça, enquanto o jornalismo cala e divulga a defesa dos que estão ativos nestas cumplicidades.

Portas e Travessas.sa disse...

Estamos no caminho certo.

Não apaga nada,está feito está feito.

Tó Bidé

Lura do Grilo disse...

O homem sabe da poda

Green Lantern disse...

Não é o Omo que lava mais branco, esse epiteto pertence a este ex-procurador e ao amigo Noronha.

Socrates tal como Lula tem azar estão sempre junto de pessoas pouco recomendaveis com praticas ilicitas. Mas os rapazes não obstante o poder que possuiam são incorruptiveis e honestos.

Agora vou só ali tirar a areia dos olhos, cumprimentos.

S.T. disse...


«Divulguem as cassetes!» : no princípio da entrevista esclarece o próprio que já não caça , prefere agora a pesca...

:P

A obscenidade do jornalismo televisivo