domingo, setembro 12, 2010

O fundo ao tacho

Fernanda Palma, a professora catedrática de Direito Penal que todas as semanas lecciona alguma coisa numa coluna do Correio da Manhã, ensina hoje como deve ser a fundamentação de uma sentença judicial. Assim:

O dever de fundamentar não é contrário à livre convicção do juiz. A livre apreciação da prova constitui um corolário da independência dos tribunais e pressupõe critérios objectivos. É, como disse Castanheira Neves, uma liberdade para a objectividade. A fundamentação da sentença constrói-se através da indicação e do exame crítico das provas. Não basta, por exemplo, indicar as provas testemunhais. É necessário analisar a veracidade dos depoimentos.

A sentença penal tem sempre a estrutura lógica de um silogismo prático, em que o relatório corresponde à premissa maior, a fundamentação à premissa menor e a decisão à conclusão. O relatório descreve os factos e os trâmites do processo. A fundamentação enuncia as razões de facto e de direito que justificam a decisão tomada. Por fim, a decisão propriamente dita indica as disposições legais aplicáveis e fixa os termos da absolvição ou condenação do arguido.

Por exemplo, o depoimento de várias testemunhas, sobre factos vividos por todas elas e coincidentes na apresentação desses factos que implicam a responsabilização de dois sujeitos.

Se os motivos dessa responsabilização, a título de culpa, forem comuns, mas implicarem um efeito catastrófico numa rede clientelar de um certo partido político, a enunciação das "razões de facto e direito que justificam uma decisão tomada" de não pronúncia penal, pode muito bem consistir em algo que uma professora catedrática de direito penal logrará objectivar para justificar o afastamento do "silogismo prático". Ou pelo menos conseguirá sempre obter um silêncio sobre o assunto em causa, por causa do melindre duma "livre apreciação".

Isso significará, além do mais, a suprema riqueza do Direito que temos e cuja essência ultrapassa a própria noção da "liberdade para a objectividade", transformando-a numa objectivação da liberdade de observar o fundo ao tacho.

1 comentário:

lusitânea disse...

Lá lata não falta aos branqueadores de serviço.Branqueiam numas coisas e enegrecem noutras...com os mesmos sempre a pagar.Governa quem pode, obedece quem deve...

O Público activista e relapso