sábado, março 07, 2015

VPV e o sentido da vida política em Portugal

Vasco Pulido Valente escreve hoje no Público sobre o caso Passos Coelho colocando-o no sítio certo: no contexto socio-político em que nos encontramos. Não sendo um caso criminal, como o do recluso 44 ( de quem aliás VPV se recusa a falar e suspeito que será por não ver qualquer necessidade suplementar ao que já se sabe) o caso de Passos Coelho explica-se assim:


E com este acrescento, de uma outra crónica do mesmo VPV, de 26 de Setembro de 2014, aquando o assunto Tecnoforma já por aqui aflorado, na história da lebre e do coelho.


VPV explicita melhor a sua ideia sobre o assunto nesta entrevista que o jornal i publica hoje mesmo e da qual passo a primeira página porque é suficiente para entender tudo:



Essencialmente, a explicação de VPV tem a ver com o regime político que temos e a sua génese, a partir de 1976 (" a classe política portuguesa tem vindo a piorar de 1976 para cá", diz ).
 Até então, quem estava "na política" tinha sido caldeado pelas lutas de oposição ao regime anterior  e segundo VPV "precisavam de ter qualidades"e  supostamente tinham-nas.

Ora, tanto quanto me parece, aqui é que VPV se engana redondamente. As tais qualidades que putativamente inculca a tais personagens- e está-se mesmo a ver a quem se refere: Mário Soares, Sá Carneiro, Salgado Zenha, Álvaro Cunhal, e tutti quanti moldaram o regime que temos- afinal que qualidades tinham?

Para abreviar razões, não se devem incluir aqui qualidades pessoais e intransmissíveis. Caso contrário teríamos de questionar como enriqueceu ( relativamente)  Mário Soares logo a seguir ao 25 de Abril, de saber como adquiriu as obras de arte e o estatuto que tem, ele que era apenas um remediado opositor político que vivendo supostamente de uns rendimentos faraminosos de um colégio, precisou de apoio monetário quando no exílio...
Passando à frente desses fenómenos que incluem "dívidas à banca de Sá Carneiro" e outros "casos Dopa" para além de obscuros assuntos de um fundo de defesa militar do Ultramar ( que se diz ser a explicação para um eventual atentado ao avião em que seguia Sá Carneiro) ou a constituição de empresas de material militar pelos rosas coutinhos vermelhos ou as histórias que envolvem Almeida Santos e companhias orientais, etc etc. temos que o cerne da questão é a "política".

Que raio de qualidades se podem assacar a estas personagens miticamente apresentadas por VPV?
As de terem pensado e realizado a Constituição de 1976, precisamente o ano de mudança das tais qualidades que daí para a frente começaram a murchar como os cravos?
Não, VPV está redondamente enganado, neste aspecto: as qualidades de quem gizou ideologicamente o actual regime nem se recomendam nem se devem apresentar como tal por uma simples razão: foram precisamente esses qualificados políticos quem nos desgraçou colectivamente. Foram eles quem fizeram e apoiaram o PREC; foram eles quem apoiou a destruição do tecido económico português de base que poderia ser muito diverso do que é ( e nunca permitir as tecnoformas que apoiam políticos na reserva) e principalmente foram eles quem formou este sistema de ensino que temos e que tem sido uma das causas principais dos nossos males maiores.

A prova do que acabo de escrever está neste blog, nos postais que tenho por aqui colocado e que não se limitam a enunciar opiniões, mas se acompanham de factos e mais factos consultáveis pelos "recortes" de imprensa da época que nos mostram todas as "qualidades" excelsas desses indivíduos agora mitificados.

O que temos actualmente na política como expoentes da tal degenerescência é apenas um reflexo do sistema que aqueles criaram, apoiam ( veja-se o decrépito Mário Soares) e apadrinham.

Nada mais. Mitificar um passado corrupto é apenas uma lavagem de mãos sujas em que uma lava a outra.

Finalmente, se algumas qualidades míticas havia nesse passado, vinham já do outro passado e da educação recebida. A noção de honra ou de honestidade ou mesmo de ética que então se chamava simplesmente moral era um pouco diversa da actual e tinha sido inculcada por quem? Pelos educadores ( pais, professores e costumes em geral) que viveram nos anos de Salazar e Caetano...

Logo, seria melhor indagar as qualidades que nessa altura existiam para repensarmos as que temos hoje...em vez de se dizer que antes de 1976 as qualidades apareceram por geração espontânea, particularmente nos dois anos anteriores.

Aliás e mesmo para terminar, há uma passagem na entrevista que é muito curiosa: perguntam a VPV o que lhe faz falta e ele responde assim:


A comida, como se diz agora, é um acto cultural. VPV viu desaparecer restaurantes onde se comia muito bem  e barato, subsituidos por casas de fast-food ou restaurantes de "chef" que não são melhores que os tais tradicionais e sem pretensões.
Deveria perguntar-se porquê e acho que será capaz de responder com um pouco de reflexão: sinais dos tempos e da sociedade que os tais indivíduos de "qualidade" nos legaram.  Pergunte ao decrépito Mário Soares como comeu durante estes anos todos de boa vidinha...

Questuber! Mais um escândalo!