segunda-feira, novembro 11, 2019

Os reis vão nus, no nosso processo penal

CM de hoje, uma pequena crónica que diz muito sobre a natureza do nosso direito penal actual mormente o de processo penal:


A Itália já tem um sistema de justiça penal que funciona melhor que o nosso em casos de mega-processos.
Conseguiram combater com eficácia a mafia siciliana dos totós e provenzanos e fizeram-no num ambiente social e processual muito mais complexo do que as trafulhices bancárias do senhor que mandava no BES.

Quanto ao Banco Monte dei Paschi di Siena, os responsáveis foram condenados em penas de prisão, em primeira instância.

Por cá, segundo um causídico demasiado cor de rosa, Rui Patrício de seu nome, o caso BES levará 50 anos a resolver....( "temos processo para 50 anos", disse em entrevista à Visão da semana passada) .

Haverá gente que não sabe, mas o processo penal português, pelo qual nos regemos, vem do CPP de 1987 entrado em vigor em 1988 e muitas das suas soluções adoptadas pelo padrinho da comissão de revisão, autor dos textos principais (Figueiredo Dias, da escola de Coimbra) , foram inspiradas pelo então código de processo penal italiano ainda em gestação e que só entrou em vigor depois do nosso.

Na altura e depois disso as loas ao nosso código atingiram quase o paroxismo. Leia-se, daqui ( página 9 de 38) :

O Código de Processo Penal de 1987, uma referência a nível europeu e internacional Como realça Faria Costa, o Código de Processo Penal Português de 1987 veio, a justo título, a ser considerado, logo após a sua publicação, em diversos meios universitários internacionais, como um Código de referência e exemplar29 . Isto mesmo é sublinhado, com a autoridade que lhe é reconhecida, por Mireille Delmas-Marthy, segundo a qual o Código de Processo Penal Português de 1987 prefigura, nas suas grandes linhas, o processo penal europeu do futuro, tendo sabido quebrar a oposição – quase se poderia dizer, esta maldição para a Europa – ao instaurar um sistema que afirma o princípio do acusatório, mas que não é puramente acusatório e que também se distanciou da tradição inquisitória, tendo retido o melhor de cada tradição.


Enfim, este sentido auto-laudatório torna-se ridículo perante crónicas como aquela e entrevistas daquele teor...principalmente tento em conta que esta obra-prima do direito europeu inspirou-se em boa parte numa obra que dá os frutos que dá...na Itália. 

Aqui estiolam. Porque será? Será que é por causa das 42 versões e revisões que já leva o texto primitivo?  A perfeição continua a ser aquela ridiculamente proclamada? 

Enfim, haja alguém que diga a estes Farias Costas que vão nus. De senso, de inteligência e de humildade, principalmente. 

Sem comentários:

A obscenidade do jornalismo televisivo