Este livro, uma biografia de Salazar da autoria de Filipe Ribeiro de Meneses, merece uma leitura. É a primeira vez que uma biografia de Salazar não desaponta o leitor.
Disso dá conta, aliás, António-Pedro Vasconcelos que considero um indivíduo de cultura acima da média e cujas entrevistas nunca perco, porque se ganha sempre alguma sabedoria. Sobre livros, cinema, cultura popular e não só, A-P.V. é um poço de referências cuja audição vale todo o tempo de escuta.
Nesta pequena crónica hoje publicada no Sol, o autor refere-se em tom elogioso ao livro e acaba por lhe reparar num defeito: o livro não enfatiza suficientemente, " a devastação cultural de que o país ainda não se recompôs ( o apagamento da memória histórica, por exemplo), a perseguição à inteligência, a degradação moral dos portugueses que ele queria que "vivessem habitualmente", e a quem ensinou o medo, a delação e o conformismo. Sob a capa da aurea mediocritas é esse o legado sinistro de Salazar".
Discordo um pouco de A-P. Vasconcelos. Foi sob o regime de Salazar que A-P. aprendeu, se formou e cultivou. Leu tudo o que quis e não esperou certamente pelo advento do 25 de Abril para se inteirar de todos os fenómenos político-sociológicos que perpassaram o mundo, particularmente na década de sessenta.
Para quem quiser ver o que era o "obscurantismo" do tempo do Estado Novo e da ditadura de Salazar-Caetano, nada melhor que uma incursão em catálogos de livrarias desse tempo. As editoras tinham nome como Sá da Costa, Europa-América, Ulisseia, Civilização, Verbo, União Gráfica, d.quixote, Bertrand, Inova, etc etc. Os livros que publicavam iam dos clássicos que agora ninguém lê, aos romances em voga e a ensaios variados, com destaque para os que a d. quixote publicava e que não ficavam atrás do que em França era permitido publicar. Aliás, eram traduzidos desse país e lá, ao contrário do que alguns querem fazer crer, também havia censura nos media.
Tal como a Ulisseia tinha uma colecção de bolso ( Pelicano) semelhante à da Penguin e outras editoras copiavam o que lá de fora vinha, mormente em livros policiais ( onde se formou o "inspector" Varatojo?).
Desafio A-P. Vasconcelos a elencar as obras culturais então proibidas que foram causa desse terrível "obscurantismo" que assolou o nosso país durante o Estado Novo dos anos sessenta, por exemplo.
E desafio a mostrar o Século Ilustrado a Vida Mundial e a Flama dessa época, como prova do que disse...
Quando se escreve sobre História, convém atender aos factos ainda na memória viva de muitos. As inventadas, não interessam muito.