sexta-feira, setembro 25, 2015

A morte que saiu à rua

Um cartaz do PCTP/MRPP nesta campanha eleitoral suscitou uma certa indignação bem-pensante   e a CNE, chamada a pronunciar-se,  disse que a expressão era uma "metáfora",  que não havia crime e que além disso nenhum dos visados, putativos traidores, se tinha queixado...e por isso deixou passar.
Realmente não faria grande sentido proibir tal aleivosia , mas convém recordar de onde vem tal expressão e o contexto histórico da "metáfora".


Como se deu notícia,  o  antigo movimento reorganizativo do proletariado "suspendeu" a palavra de ordem "morte aos traidores" e diz que vai retirar  o tal cartaz do espaço público. O sítio do partido continua o mesmo de sempre, com a iconografia antiga e as velhas palavras de "morte" a isto e àquilo, sem significado maior que o que se pode ver em qualquer filme de Hollywood..

Esta excrescência radical na sociedade democrática aparentemente só tem actualmente um sentido: proporcionar visibilidade pública a um advogado.
Ninguém com dois dedos de testa e inteligência frugal acredita que o tal advogado também acredita naquelas balelas retóricas com mais de 40 anos e que já então eram ideias trágicas se postas em prática.
Essa excrescência radical fundou-se em 1970 tendo como principal mentor José Luís Saldanha Sanches, infelizmente já falecido ( e que fazia muita falta) e que era casado com Maria José Morgado, actual directora do DIAP.
Vale a pena lembrar o que os mesmos diziam sobre o assunto.

Reconstitua o momento em que saiu do MRPP.
S.S. – Um ser racional e não apaixonado, lúcido, sem teias afectivas, quando foi o 25 de Abril, tinha saído. Quando o MR diz que não houve revolução democrática, que ficou tudo na mesma…
M.J.M – Era um golpe social fascista…
S.S. – Um golpe burguês. Publicou um comunicado muito ridículo, que valia a pena ser lido agora, que dizia: “Quando os chacais e as hienas rivalizam…”
M.J.M. – Era hilariante! Nós não guardamos nada, mas se calhar [o comunicado] já está na Internet.
S.S. – Eu disse que era ridículo, mas não saí.

Porquê?
S.S. – As amarras eram fortes. Os afectos. O companheirismo. O orgulho de estarmos a fazer coisas engraçadíssimas. A eficácia da luta.
M.J.M. – Não ganhávamos nada por estar no MRPP – é bom que se diga. Não era daquela política que dá vantagens. Eram os nossos pais que nos alimentavam e vestiam e calçavam.
S.S. – E nos ajudaram mais tarde a acabar o curso. À medida que passava o tempo ia-se vendo com mais clareza que aquilo era uma fraude. O MR não conseguia manter nada de pé: tudo se esboroava. E havia dois pólos que se confrontavam: o pólo ligado à classe operária, unido e organizado à volta do PCP, e o pólo das pessoas que queriam a democracia, uma economia de mercado, que queriam o Mário Soares. Entre esses dois pólos, a posição do MRPP não era nenhuma! Não suportava nada que se parecesse com o PC, porque tinha a ideia peregrina de que a classe operária era nossa! Nas fábricas éramos odiados… Éramos da burguesia, da CIA…


 Portanto esta excrescência radical que não se deve levar a sério é um abuso democrático que vive do passado e da sua figura restante que é Garcia Pereira, o qual devia ter imensa vergonha destas figuras que lhe garantem aliás lugar frequente nas tv´s. Para quê? Só vejo um motivo...e não é político.

Em finais de 1974 o tal movimento levava-se muito a sério, segundo se lê nestes recortes da época e da revista O Tempo e o Modo que tinha sido um veículo da oposição ao regime anterior e que o MRPP tomou de assalto nesse tempo revolucionário em que lutava principalmente contra...o PCP.


De resto as palavras de ordem com a "morte" metafórica misturada com a real ( que se conta nesta pequena história de um crime impune porque poderá nem ter sido crime...)  foram usadas na propaganda dessa excrescência radical, como mostra o sítio da CNE.

 Agora que a morte regressa à rua, passados 40 anos é que a intelectualidade jornalística se alevanta...como mostram estas duas crónicas de jornal.

Esta de Francisco José Viegas no CM de hoje em que lamenta a impossibilidade nostálgica de ter sido revolucionário, em modo imbecil ( que me desculpe,  mas é mesmo isso).


E esta de Ferreira Fernandes no DN que põe os pontos nos ii e desmascara por reflexo o radicalismo pulha de Garcia Pereira:

 Os cartazes do MRPP gritando "Morte aos Traidores" não são mais do que uma metáfora, segundo a Comissão Nacional de Eleições. A CNE também disse que "os visados não se queixaram". De facto, é uma tradição antiga dos traidores não se queixarem quando os antepassados ideológicos do MRPP praticavam aquela frase para além da metáfora. É, já aconteceu "morte aos traidores" não ser só um convite para tomar chá, como dizia o camarada Mao, ou uma excursão à prisão de Lubianka, onde o camarada Beria recolhia confissões comovedoras. Morte era morte, bem física, como aquela factualmente causada por bala na nuca. O poeta Manuel Bandeira quando diz "pode a noite descer/ a noite com os seus sortilégios" está a fazer uma metáfora da morte. Mas eu estou a falar da morte feita por coisa, um tiro no crânio, com muito osso estilhaçado e cérebro espalhado nas paredes. E aconteceu, muitas vezes, a esses que sabiam que não seria a metáfora a calhar-lhes, mas bala mesmo, não se terem queixado. Os traidores são assim, uns fingidos. Nikolai Bukharine, por exemplo, nos processos de Moscovo (1938) acusou-se de tudo - olha, de traidor, também... O que não o livrou da bala e à família (pai, irmão, mulher, filhos...), dos campos de concentração. Já na minha vida adulta e na de Garcia Pereira, milhares de "traidores" chineses foram mortos sem se queixar. O que quero dizer é que de garotos admito a metáfora, em Garcia Pereira não suporto a leviandade com palavras.

Curiosamente, no devido tempo as palavras Beria, Estaline, ou processos de Moscovo, não apareciam nos escritos de Ferreira Fernandes. Nem no tempo in illo nem sequer no dos submarinos do Tal&Qual. Pena. Porém, mais vale tarde do que nunca.

6 comentários:

zazie disse...

Os traidores eram os traidores da classe operária.

Os psicopatas retiraram o resto.

zazie disse...

O marrano fantástico é outro imbecil.

Então por ter cumprimentado a mão notou que o outro tarado era um pacifista.

Então não era. As purgas dos traidores também eram tão pacifistas que até os mandavam armados para os irem buscar pela calada da noite.

O Saldanha Sanches ainda publicou um desses casos no jornal. Merecia uma pesquisa até para mostrar a estes palermas.

zazie disse...

http://www.tvi24.iol.pt/politica/legislativas2015/projeto-do-pctp-mrpp-passivel-de-apoios-ate-no-ps

eheheh

Floribundus disse...

a única metáfora que conheço é o meu velho Daewood

se eu disser precisavam de levar uns tiros nos ......
estou a usar a dita cuja ?

aguerreiro disse...

Não era nada disso! Os traidores eram aqueles que davam "negas" ás camaradas. Pois nesse tempo não havia partido operário que se prezasse, com paneleiros/as nas fileiras ao contrário de hoje em dia

Karocha disse...

O saldanha sanches faz muita falta ao Vieira , José !!!

O Público activista e relapso