quarta-feira, setembro 16, 2015
AOS ainda e sempre
Salazar por Rui Ramos em 24 de Julho de 2010 no Expresso ( Actual). Uma análise muito interessante :
E no mesmo suplemento, a notícia de uma descoberta: 36 volumes, 15 mil páginas, com milhares de fotos e recortes de imprensa, sobre Salazar. As notas e apontamentos coligidos são de Frederico Abragão, antigo engenheiro da CP, falecido em 1960 e que se dedicou durante anos ( até meados dos anos 50) a recolher material escrito sobre Salazar, em modo quase hagiográfico.
Os volumes estão na Torre do Tombo e parece que ninguém lhes pega...o que é pena. Salazar é um dos esteios da nossa História contemporânea.
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104 comentários:
dava-lhe um badagaio se soubesse o que nos aconteceu depois de 25.iv
escondem-no debaixo do tapete
mas fica sempre à vista
ainda algum revolucionário de opereta tentará destruir o arquivo
há maluquinhos para todos os desgostos
Também foi logo isso que me ocorreu...
Para o que costuma havet, está muito bem esta análise. Pelo menos refere alguns factos.
Só que referir factos em relação a este assunto suscita dificuldades: faz cair em contradições, inevitáveis pela subserviência ao politicamente correcto.
Salazar ora nos é apresentado como ditador absoluto ora como alguém que concilia magistralmente tendências, correntes e facções; ora o apresentam como apegado ao poder, ora dizem que ia governando - o tal equívoco do Caetano; enfim, é uma no cravo e uma na ferradura. O que não é mau, porque normalmente são todas na ferradura.
Mas quero levar mais além a questão - até ao além-mar. O autor diz que Salazar "envolveu" o país no maior esforço militar de uma nação ocidental desde 1945. Descontando o exagero quase absurdo da proposição - basta lembrar o Vietname -, também não pode em boa verdade dizer-se que foi Salazar que "envolveu".
Diz depois "que explorou uma mística histórica", etc, e que era tudo um beco sem saída que reduziu o regime a um enorme castelo no ar.
Já aqui muito se discutiu isto e parece-me que nunca é demais fazê-lo. Até porque a vida continua e a história não deixa de se fazer.
Ora bem, eu perguntarei isto: Passam 40 anos desde que se abandonou o ultramar. Porque eram os ventos da mudança que a isso obrigavam, porque a solução era mesmo aquela, porque o mito, porque tudo e mais alguma coisa. Pois bem, 40 anos volvidos, outros ventos impelem toda aquela gente na direcção contrária, a abandonarem a terra e a morrerem pelo caminho (em barcos! a ironia...) que a presumível actualidade das ideias que se davam como inevitáveis preconizavam como sendo "deles" e só "deles" e roubada por "nós".
A minha pergunta é esta: afinal, quem é que preconizava o beco sem saída?
PS: diz-se lá que o regime terminou num grande fracasso. Veremos como acabará este...
PSS: "Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades" escreveu Camões. A vontade de Salazar nunca mudou.
"A vontade de Salazar nunca mudou."
Por acaso até mudou. E vem escrito no artigo. Para mim, Salazar envelheceu demasiado depressa e desistiu de algumas coisas demasiado cedo. No fim, nunca quis perguntar quem mandava, suspeitando que já não seria ele...
nas estafetas 4x400m barreiras
há sempre quem passe o testemunho
a partir talvez de 63 notava-se nele algum cansaço e desilusão
Não foi preciso passarem 40 anos.
Essas imigrações existem desde os anos 60 e tiveram grandes vagas nos anos 80 e 90. A generalidade nem sequer é fruto de qualquer descolonização. Foram os países e os regimes que criaram. Fogem para o dito progresso capitalista.
Até eles.
É um bocado patológico ter de enfiar sempre a culpa do homem branco como se o resto nem gente fosse.
Essa ideia de se conseguir manter numa redoma um mundo que nunca muda é que é esquisita.
Muda e é preciso tentar acertar na melhor defesa fase aos horizontes de mudança.
Também não estou a ver quem são os PALOPs que vêm para cá de barco ou precisam de morrer para isso.
Entra tudo e passado uns meses tem automaticamente a mesma nacionalidade que tinha antes.
Por muitas que vou conhecendo há um factor que me parece até bem interessante.
É gente que tem vontade, para quem vir é um enorme triunfo na vida e costumam dar graças a Deus em qualquer conversa.
Alguma coisa ficou, para lá da língua.
O Rui ramos apanha algumas questões pertinentes e um modo de olhar a História diferente da tradicional.
Tanto diz que o Estado social do salazarismo não foi um fenómeno socio-económico como também mostra como nem durante ele a dita democracia de agora era pensada como alternativa.
Não aconteceu num "fim da História"
«Em 1970, 75% da população já tinha nascido depois de Salazar subir ao poder: a comparação que para essa gente tinha sentido, não era com os regimes anteriores, mas com outros regimes europeus »
Pois é. Por isso é que não se controlam mudanças e só se fazem balanços com distância maior
Também não estou a ver quem são os PALOPs que vêm para cá de barco ou precisam de morrer para isso.
Bom, a questão transcende os portugueses. No fundo opunham-se duas ideias diferentes para o futuro daquele continente e mesmo do mundo em geral. Por vicissitudes e circunstâncias várias encontraram-se os portugueses como defensores praticamente únicos - em todo o caso únicos a dar-lhe expressão através da prática - de uma delas.
Entra tudo e passado uns meses tem automaticamente a mesma nacionalidade que tinha antes.
Mais uma evidência, por mais que se negue, de que a ideia nossa era a certa.
Mudar com as mudanças não tem dificuldade nenhuma. A dificuldade está reconhecer aquilo que é, e deve continuar a ser, permanente e o que é transitório.
E não creio que fujam para o "progresso capitalista". Fogem da desordem para o que lhes parece a ordem.
Não é necessário progresso capitalista para haver ordem em que se possa viver ou não se teria vivido durante muitos milhares de anos. Mas viver na desordem nenhuma sociedade consegue nem nunca conseguiu.
Olhe o que eu acabo de ver apoiado por 120 artistas e sob o lema. "Salazar=Passos- 100 anos de miséria
https://gyazo.com/80ae132ee18e23dfc5a04e9db73345d4
Se fosse para viverem em ordem tinham Rússia mais perto, né?
Quanto ao resto, a ideia podia ser boa mas nem a prática foi sempre boa e muito menos alguém a retomou.
Nem irá retomar. Ou fazer algo idêntico. Precisamente porque o presente não assimila muita experiência anterior nem adivinha o que está para vir.
E isso é válido para todos. Não existem videntes a fecharem tudo em redomas. Porque nem esses projectos foram dados por atingidos. Eram todos eles a apontar para um futuro diferente.
Ah, a fotografia e a legenda serviu para um artista- que não é filho de imbecis- fazer uma limpeza aos "fachos".
Tem uns 20 e tal anos e foi acompanhado de 120 mais variados.
Dá que pensar?
No fim, nunca quis perguntar quem mandava, suspeitando que já não seria ele...
Franco Nogueira escreve isto no último volume da biografia:
«Ainda quando no governo com Marcello Caetano, e depois de haver obtido a minha exoneração, visitei frequentes vezes Oliveira Salazar. No meu espírito, não tive então nem tenho hoje a menor dúvida de que Salazar ignorava em absoluto que já não era presidente do Conselho. Não lhe ocorria mesmo que, por motivo de doença, pudesse deixar de o ser: não tinha consciência da gravidade da doença, não se dava conta de quanto tempo tinha estado e estava doente, não se apercebeu das diminuições mentais que tinha sofrido. Disse-me uma vez: "Calcule o senhor que as enfermeiras me obrigaram hoje a andar no parque, debaixo de chuva, e com uma pessoa atrás de chapéu de chuva aberto!" E a rir: "Já viu o que há de ridículo em o Presidente do Conselho andar a passear com chuva e de sombrinha aberta!?"
Depois diz que a mulher tinha opinião contrária.
Pessoalmente, duvido muito de que tivesse consciência de que já não tinha responsabilidades. Acho que nunca consentiria em desempenhar essa farsa.
Mais incrível é que o tenham visitado ministros, embaixadores, jornalistas e que ninguém ousasse dizer-lhe a verdade! O que só mostra que estavam convencidos de que ele não sabia.
Tinham a Rússia mas isso era se a Rússia os lá quisesse...
A ideia não era só boa. Era a única que não era um beco sem saída.
Era a única com futuro. E continua a ser. Pois no que conta não se avançou um milímetro. Telhados e telemóveis não são avanços por si só.
Dizem que não se volta atrás... Bem, um beco sem saída só tem uma...
Onde é que apanhou essa passagem? a de No fim, nunca quis perguntar quem mandava, suspeitando que já não seria ele...»
Não vi ainda.
Ah, foi o José
ehehehe
Mas isso de "fim" não é nesse sentido físico
":O))))
No final da governação.
Não há recuo porque tudo isto não aconteceu a semana passada. Esse é o efeito mediático que se está agora a dar, fingindo que é uma coisa absolutamente diferente do que sucede há décadas.
E, o que sucede há décadas, é imigração para o Estado Social, com papelada certa para se conseguir certidão de refugiado, mesmo sem o ser.
Quando até há motivo por muitos o serem, junta-se tudo e o caminho é o mesmo. Nunca foi para outro lado. Nem por atractivo diferente.
na Ucrânia morreram 20 milhões de camponeses à fome porque não puderam emigrar
os anões que se exibem com ostentação passam o tempo a gritar como o maluco
'também sei cantar de galo! cócóró-cócó'
Público
'Obviamente, voto Passos", de Maria de Fátima Bonifácio.
Franco Nogueira é apenas um biógrafo de Salazar.O que escrever é uma opinião que expende, baseada naturalmente em factos que também apresenta.
O que não pode apresentar, no entanto, são factos que obstem a uma ponderação diversa daquela que faz quando as hipóteses forem plausíveis.
Das duas uma: ou Salazar tinha consciência da sua enfermidade ou não e se tal enfermidade lhe afectava o raciocínio ou a memória.
O raciocínio talvez não...porque terá dito: "Calcule o senhor que as enfermeiras me obrigaram hoje a andar no parque, debaixo de chuva, e com uma pessoa atrás de chapéu de chuva aberto!" E a rir: "Já viu o que há de ridículo em o Presidente do Conselho andar a passear com chuva e de sombrinha aberta!?"
No entanto é preciso saber em que ocasião disse tal coisa. E é preciso saber se a memória não ficou seriamente afectada porque há registos de uma vez, ainda enquanto governante, ter repetido num espaço de dias, comunicações ao conselho de ministros sem aparentemente se dar conta disso. E se tal foi verdade, pode colocar-se o problema da memória ou até de demência em curso.
A questão de saber se Salazar se apercebeu realmente do seu estado quando estava já perto do fim, ou seja, em 1970, é relativamente importante porque por aí se pode fazer um retrato mais aprimorado do antigo presidente do Conselho.
Para mim, apercebeu-se e não quis perguntar para não contrariar nada que sabia ou perscrutava como o fim.
Colaborou em certo modo na farsa porque era assim que então se fazia com os velhinhos a quem se deve respeito e consideração e até amor.
E para compreender isso é preciso ter vivido de algum modo o tempo e os seus costumes. E Salazar era um português de gema mesmo. Admirável, nisso.
Sendo Salazar inteligente em alto grau sabia certamente que o que lhe faziam derivava desse respeito e consideração e por isso aceitava que lhe dessem a primazia de o considerar ainda importante e com valor. Porém, não devia ignorar que tendo estado ausente durante dois anos, haveria certamente necessidade de encontrar um regente.
Saberia que era Marcello Caetano? Se calhar...sabia.
Sabe que pensei no mesmo?
Eu lido com uma familiar com alzheimer e é muito parecido. A questão do raciocínio ou da consciência são muito mais complexas do que se pensa.
O raciocínio pode funcionar naturalmente, pode haver memória do passado mas a instantânea é que vai desaparecendo.
A consciência do estado em que estão também é complexa e inicialmente intermitente.
Quanto ao que poderia saber só se houvesse relatório médico de que tipo de lesão ou doença afectou o cérebro.
Não sei. Sei apenas que se tende a imaginar comportamentos constantes quando são mais intermitentes.
Umas vezes têm consciência; outras não. O raciocínio pode funcionar juntamente com o non-sense e a lucidez também. O que se esvai mais depressa é a memória auto-reflexiva ou o sentimento acerca de si próprio.
Quando ele diz o veja lá a figura que as enfermeiras me obrigaram a fazer pode ser tudo. Essa perda de consciência consegue que se vejam fora deles próprios sem daí retirarem mais que o retrato.
Estou apenas a falar daquilo que conheço em relação a alzheimer. Mas pode ser mais genérico, até com AVC porque nada é a preto e branco.
Por exemplo- essa ideia temporária- dos 2 anos, é coisa que desaparece. A noção temporal desaparece. Seja AVC seja demência, seja fruto de lesão.
Não há "2 anos". Nem muito mais que agora ou 20 anos atrás, ou manhã e noite. Tudo isso se mistura, assim como se mistura o modo como se está.
Mas, os que conviviam de perto deviam saber. Deviam saber o que memorizava e tinha consciência.
Não dizer que já não mandava pode ter sido a atitude mais sensata de respeito pela inutilidade e até maldade de dizer.
Franco Nogueira dá a sua opinião, sim. E logo a seguir diz que sua mulher, que visitava Salazar também muitas vezes, tinha opinião diferente.
Portanto não creio que queira obstar a nada.
Mas dá mais exemplos: já depois de ser exonerado dos Estrangeiros, Salazar escreveu-lhe uma carta endereçada ao Ministro dos Negócios Estrangeiros, em que falava de negócios de Estado e até o admoestava por ter ido a Londres sem o comunicar - quando a viagem foi a título particular.
E assinava Presidente do Conselho.
Não acredito um segundo que Salazar se prestasse a semelhante papel. Seria um comportamento completamente incoerente com toda a sua vida.
Uma coisa é reter honras que são devidas - e nem isso acho que Salazar faria. Mas tratar por ministros pessoas que o não são já, conscientemente, é uma farsa demasiado ridícula. Ainda para mais quando se sabe que ele era extremamente escrupuloso em relação aos cargos. Isso até levantou problemas com Craveiro Lopes porque este tomou a deferência que Salazar lhe prestava, em função do cargo, como sinal de que este apoiava a sua recandidatura.
"Não acredito um segundo que Salazar se prestasse a semelhante papel. Seria um comportamento completamente incoerente com toda a sua vida."
Não se trata disso e é difícil explicar. E agora não posso.
Numa lesão cerebral ou na sua deterioração, como inícios de demência o que não existe é um continuo entre memórias e presente e muito menos qualquer projecção de futuro.
Tudo isso são recortes soltos que lá devem chegar à consciência mas sem arrumação cronológica.
«Mas dá mais exemplos: já depois de ser exonerado dos Estrangeiros, Salazar escreveu-lhe uma carta endereçada ao Ministro dos Negócios Estrangeiros, em que falava de negócios de Estado e até o admoestava por ter ido a Londres sem o comunicar - quando a viagem foi a título particular.
E assinava Presidente do Conselho.»
Isto é muito curioso. Isto foi em que data?
Assim de repente não sei exactamente, mas foi depois de ter sido exonerado. Logo posso dizer-lhe com exactidão porque vem lá na biografia e até tem a carta na íntegra.
Ok. Agradecida.
De todo o modo ele pediu a exoneração em 69. Essas cartas do Salazar estão disponíveis?
Se esse comportamento foi constante e as cartas são escritas de forma coerente mas paradas no tempo não precisa de ter consciência.
Porque ele teve logo consciência da lesão e escondeu do médico. Não quis mostrar que podia estar afectado e isso é um comportamento natural que não implica qualquer farsa.
É um distanciamento preservando a sua imagem na integridade do papel principal a que dedicou toda a vida. Não faria sentido largá-lo por incapacidade. Mas também não poderia impedir que fosse substituído e disso não imagino se a lesão permitiria.
Entendo o que o José pensou. Só não se sabe se foi mesmo assim, ainda com consciência ou apenas uma preservação de memória do passado que não desapareceu.
Ele era o Presidente do Conselho. Se há lesão na memória é isso que fica, nunca é o estado presente do qual não há capacidade de representação abstracta.
Zazie,
da biografia:
A título de exemplo, refiro uma carta de 1.III.70, que Salazar me dirige num envelope do seu punho, assim: «Ex.mº Senhor Ministro dos Negócios Estrangeiros, Dr. Franco Nogueira, Lisboa» Ora eu havia abandonado o governo em 6.X.69. Esta carta é toda ditada a Maria Teresa Múrias, sendo portanto manuscrita por esta senhora. É ainda a propósito do Livro Branco sobre Goa à Directora do Instituto de Odivelas. Salazar pede agora, no meio de explicações prolixas fora do seu hábito, que seja oferecido outro exemplar a uma estudante brasileira que frequenta aquele instituto. Salazar assina o manuscrito de Maria Teresa Múrias, e por seu punho acrescenta: «P.S. Esta carta foi ditada a Maria Teresa Múrias que a escreveu para poupar-lhe o trabalho que V. Ex.ª teria a decifrá-la. Na verdade, a minha letra tem-se tornado mais difícil de interpretar. Soube agora pelo jornal que chegou a Lisboa depois da reunião de Londres». Eu havia efectivamente ido a Inglaterra, a título privado, para uma reunião do Grupo de Bilderbergue; mas obviamente nada havia sido dito a Salazar. Julgando-me ainda ministro, a alusão tem de ser tomada como um remoque que quer fazer-me por me haver deslocado ao estrangeiro sem o informar»
Onde afinal vem referido o subscrever-se como Presidente do Conselho é numa nota de uma passagem anterior que diz assim: "Quer precisamente examinar com o presidente da República os resultados das eleições, e para o efeito escreve ao almirante Thomaz uma carta; e aí é mais acentuado o declínio das suas faculdades". A nota depois é esta:
«Senhor Presidente da República, Excelência: Da última vez que Vossa Excelência teve a amabilidade de visitar-me, esqueci-me de falar em dois pontos. Infelizmente, passou-se o tempo e fiquei admirado de não ter trocado com Vossa Excelência uma palavra sobre qualquer dos assuntos. Trata-se em primeiro lugar da vantagem que haveria em realizar um Conselho de Ministros sob a presidência de Vossa Excelência, talvez na próxima semana. Nesse Conselho deveriam trocar-se impressões sobre as últimas eleições. Deveria dar-se também ao M.tº do Ultramar e ao Eng.º Arantes e Oliveira a oportunidade de informarem o Conselho sobre a posição dos vários problemas nos territórios africanos. Ambos estão prevenidos do interesse que teria a exposição para que pudessem habilitar-se com os últimos desenvolvimentos. Com os mais respeitosos cumprimentos, Ol. Salazar. 19.XI.969». Além do mais, há na carta uma confusão: Arantes e Oliveira já não era ministro e portanto não poderia participar no Conselho; mas a confusão explica-se pelo facto de aquele engenheiro ter passado para o Ministério do Ultramar onde dirigia o gabinete técnico sobre Cabora-Bassa. Caligrafia incerta, com linhas tortuosas. Assinatura firme, quase normal. O envelope está sobrescritado para o presidente da República e tem por baixo «Do Presidente do Conselho».
Obrigadíssima mujah.
Mas é incrível porque a carta dirigida ao Franco Nogueira foi escrita 4 meses antes de morrer!
A outra ainda é anterior- de Novembro de 69 mas ainda escrevia à mão.
A morte nem se deveu a AVC. Nunca entendi que infecção foi.
É estranho mas tudo o que se passa com esses problemas do cérebro são mais que estranhos e intermitentes.
Mas não desligou das preocupações de governo.
Ninguém pega neste espólio da Torre do Tombo
Na biografia também vêm alguns elementos sobre a doença, já lhos escrevo para aqui.
Olhe se calhar é pelo melhor. Ainda não chegou a altura de lhes pegar, penso eu. Talvez daqui por dez ou vinte anos.
Entretanto, o melhor era lá ficassem esquecidos por causa do que o Floribundos disse.
Pois é, é.
Não sei se reparou que disse uma coisa muito interessante que vai precisamente ao encontro do tal "tempo histórico" de que se falava.
Segundo o boletim médico redigido pelos cirurgiões e demais clínicos, o que eles encontraram foi um "hematoma intracraniano subdural crónico", no hemisfério esquerdo. Isto da primeira operação a dia 7 de Setembro.
A 17, novo acidente. Boletim médico: "a evolução favorável do estado do Sr. Presidente do Conselho, que no passado dia 7 fora operado por hematoma subdural pós-traumático à esquerda, foi hoje, às 13,45h, alterada por brusco e grave acidente vascular no hemisfério cerebral direito." Assinam o boletim Eduardo Coelho, Vasconcelos Marques, Almeida Lima, Miranda Rodrigues.
Em fins de Outubro sai do coma.
Está aqui também um episódio engraçado que acho que vai gostar. Em inícios de 69, vai visitá-lo o embaixador do Brasil:
---
Recebe uma tarde o embaixador do Brasil Ouro Preto, que sabe que vai ser transferido para a Venezuela mas não quer partir sem ver Salazar mais uma vez, e deseja além disso pedir-lhe uma fotografia autografada. Diz Salazar ao embaixador: «Temos muita pena pela sua partida, senhor embaixador. Durante a sua missão em Lisboa sempre o considerámos um grande amigo que, sem prejuízo do cumprimento rigoroso das suas instruções, sabia explicar com fidelidade ao seu governo a política portuguesa. E lamentamos que a sociedade portuguesa fique privada da excelsa presença da senhora embaixatriz. Mas ao mesmo tempo quero felicitá-lo. A Venezuela é um para o Brasil um posto de grande importância, e a sua transferência, senhor embaixador, é portanto uma promoção. Decerto, será importante que V. Ex.ª melhore as relações entre os dois países. Mas o que é verdadeiramente fundamental na sua nova missão, senhor embaixador, é averiguar bem qual a política dos Estados Unidos na Venezuela: este é que é o factor decisivo para o Brasil». Exprime-se com fluência Salazar, e Ouro Preto está atónito. Depois sobre uma pasta dura de cartão, Salazar prepara-se para assinar a fotografia que lhe traz a governanta. Mas vira o retrato de costas. Diz a governanta: «Senhor Presidente, tem de assinar no outro lado, onde está a fotografia». Responde Salazar brusco: «Sei muito bem o que estou a fazer». E escreve nas costas brancas do retrato: «Esta fotografia pertence ao Sr. Embaixador do Brasil Ouro Preto». E explica: é que já uma vez oferecera uma fotografia a Santos Costa, roubaram-lha, e depois outra pessoa exibiu-a, autografada, como se lhe houvesse sido oferecida. Depois, volta então a fotografia do lado da imagem, e assina-a com mão firme.
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Não reparei. Quem disse? O Floribundus?
Não. Foi v. que disse
aahhahahaha
hehehhe Essa história da fotografia é deliciosa
Mas é mesmo muito estranho porque é tudo lúcido excepto já não ser ele a governar.
Não faço a menor ideia como se pode entender.
Mas pode ter sido uma forma de alheamento dócil de tudo.
Mas qual foi a coisa que eu disse?
O José também disse ali uma que depois me esqueceu de lhe perguntar. Sobre o Salazar ter desistido de certas coisas demasiado cedo. Queria saber que coisas seriam essas.
Disse isto: «Olhe se calhar é pelo melhor. Ainda não chegou a altura de lhes pegar, penso eu. Talvez daqui por dez ou vinte anos.»
Não é a altura porque é preciso deixar assentar a poeira.
Ah pois. Embora o meu receio é que os destruam. Se estivessem a salvo escusava de se esperar! Era "dar-lhes agora", já!
ahaha!
Assim como assim para isso também não são precisos esses papéis, por isso que fiquem lá para quem queira e saiba pegar-lhes. O que há publicado chega e sobra. Só há é que trazê-lo para a claridade.
Salazar desistiu demasiado cedo de certas coisas porque foi ele mesmo quem o afirmou na biografia.
Em 1959 sentia-se velho e dizia tal coisa. Foi nessa altura que encomendou ao canteiro Ilídio a pedra das sepulturas que se encontram no Vimieiro. Foi nessa altura que começou a desistir das colheitas que acompanhava pessoalmente, porque as irmas não ligavam a essas coisas.
Essa atitude pessoal teve reflexos políticos, a meu ver.
Mas não era velho para isso.
«Salazar desistiu demasiado cedo de certas coisas porque foi ele mesmo quem o afirmou na biografia.
Em 1959 sentia-se velho e dizia tal coisa. Foi nessa altura que encomendou ao canteiro Ilídio a pedra das sepulturas que se encontram no Vimieiro. Foi nessa altura que começou a desistir das colheitas que acompanhava pessoalmente, porque as irmas não ligavam a essas coisas.
Essa atitude pessoal teve reflexos políticos, a meu ver.»
Desistiu de que coisas?
Quando alguém se sente velho desiste de quê?
Por outro lado parecia ainda muito loquaz para isso. E a resistir aos médicos. Quando desistem da vida tendem logo para se fecharem em todas as doenças possíveis e imaginárias e deixam de comunicar.
Mas cansado e sem pachorra estava porque é ele próprio que o diz.
Não é desistir da vida. O biógrafo é que diz que desistiu de algumas coisas porque se sentia velho e sozinho e que os seus amigos chegados tinham desaparecido.
Isso é mais ou menos natural mas creio que não chega para explicar o comportamento depois da queda.
Penso que o José quer dizer que, ao longo do tempo, Salazar se foi aparente e progressivamente afastando e desinteressando das suas origens e do quotidiano daquelas.
Admito que tal possa ter tido consequências políticas, embora não ache que fosse o caso.
Sim, é isso. Mas não basta para se perceber se tinha consciência que já não mandava ou se tinha e o afastamento justificou isso.
"aparente e progressivamente afastando e desinteressando das suas origens e do quotidiano daquelas. "
Também não é bem isso o que penso. Acho que Salazar deu a entender a Franco Nogueira ( porque este o escreve) que o tempo dele, em 1959, já tinha quase passado.
Era outra época e os anos sessenta encarregaram-se de o demonstrar à saciedade.
É a isso que chamo ventos da História e que alguns se amofinam e desdenham como "ventosidades", o que também percebo muito bem.
Só que por exemplo um Bob Dylan, tal como este se apresentou a cantar "the times they are a changin´" era impossível nos anos cinquenta e foi possível nos sessenta.
Os Beatles do LSD e de Sergeat Peppers eram impossíveis nos anos cinquenta e tornaram-se mainstream na década seguinte.
Em França demorou mais algum tempo a substituir Charles Aznavour por Françoise Hardy mas lá chegaram e nunca passaram muito disse. Mas aparecer a "rive gauche" e o cinema de Godard e afins e os intelectuais que desembocaram em Maio de 1968. Boris Vian não era dessa época, tal como Camus, mas prepararam-na. Foram percursores.
É a isso que chamo os tais ventos, correntes, ideias que se espalham e influenciam muitas pessoas.
A tv tornou-se muito popular nos anos sessenta, com as séries que se produziram. A publicidade mudou e a série Madmen ajuda a compreender.
Fellini na Itália é dos anos sessenta e setenta. O cinema italiano foi importante nos anos sessenta.
Por cá ficamos sempre nos anos 40...
Salazar como disse dele Eduardo Lourenço era um campónio letrado( Eduardo Lourenço, pelo contrário é um letrado campónio...) mas foi uma das figuras lídimas de Portugal, de sempre e dos séculos que dura a nossa História comum.
O maior do séc. XX sem qualquer espécie de dúvida.
Quando cheguei ao cemitério do Vimieiro e soube a história daquelas pedras tumulares percebi isso que ainda não tinha entendido.
Álvaro Cunhal que é quase da mesma geração nem por sombras se lhe aparenta. Nem em sombras muito estudadas.
( Eduardo Lourenço, pelo contrário é um letrado campónio...)
AHHAHAHAHAHA
José, eu percebo o que quer dizer e creio que toda a gente percebe.
Porém, torno ao que comecei por dizer: é preciso distinguir o permanente do transitório.
Por exemplo, ainda alguém sabe quem foi Bob Dylan ou o que dizia? Ainda. Mas daqui por dez ou vinte anos? O mesmo se aplica a quase todos os outros.
Aliás, não faltariam hoje razões, motivos e estado de espírito para os condenar a todos de qualquer coisa, como eles condenavam na altura. Racismo, homofobia, machismo, todos podem ser condenados de um momento para o outro.
A caixa de Pandora da mudança pela mudança tem uma voracidade infinita.
Essas pessoas pensarão - algumas, ainda, pelo menos - que influenciaram o mundo. Cuidariam, alguns, outros se calhar não, que estavam a expressar as suas ideias quando, na realidade, não faziam senão espalhar as ideias de quem os promovia. Como hoje é. A diferença é que na altura era preciso ainda um elemento de talento porque os espíritos e sensibilidades estavam habituados a outra coisa. Mas essa dificuldade foi entretanto ultrapassada e qualquer bacoco tatuado ou perua siliconada eclipsa em popularidade todos esses "grandes" dos ventos das mudanças. Cumpriram o seu papel e assim que deixaram de servir foram deitados fora.
Toda essa gente, geralmente falando, é nada.
Agora, vejamos: Dylan, os Beatles, tutti quanti, já foram. Pela maior parte já ninguém sabe quem eles são ou o que disseram ou que ideias protagonizaram. Não faltará muito para o esquecimento total, falando de uma forma geral. Já não interessam a ninguém.
"Estrelas" dessas são hoje fabricadas em massa, em todos os sabores, cores e variedades para todos os gostos e mensagens políticas. São nada. Quanto muito são para a "cultura" o que o Ford T é para os carros.
Mas Portugal, Goa, Angola, Moçambique, Timor, a Guiné ou o Brasil e respectivas gentes ainda existem. Ainda estão onde sempre estiveram. E nenhum deles melhorou por deixar de estar ligado aos outros. E, em boa verdade, não se desligaram completamente. Afinal, a única coisa que mudou foi que deixámos viesse quem nos não é nada ditar qual a maneira por que havíamos de estar ligados uns aos outros - e passámos a estar ligados da forma que convém a outros com os quais não temos ligação nenhuma e não da que nos convinha a nós - todos.
Porquê? Porque o Bob Dylan anunciou que era assim. - Mas - perguntará o eventual leitor daqui a poucos anos - quem é o Bob Dylan e quem tem que ver com Portugal, com África, conosco? Boa pergunta...
Portanto, eu diria que não foi o tempo de Salazar que passou. Salazar é que, nessa altura, já tinha passado além da fugacidade do presente, e vivia, pensava e perscrutava através da plenitude temporal - passado, presente e futuro.
"Agora, vejamos: Dylan, os Beatles, tutti quanti, já foram. Pela maior parte já ninguém sabe quem eles são ou o que disseram ou que ideias protagonizaram."
A questão é que depois deles vieram outros e os tempos nunca mais foram os mesmos. Por isso é que os tais ventos modificaram a História.
Eles foram percursores das mudanças sociais e é isso que importa reter.
Eu diria que o que importa reter é outra coisa: é que as mudanças sociais ainda não cessaram. Nem sequer abrandaram.
Portanto, a minha conclusão é esta: qualquer esforço de contemporização não adiantava de nada, como não adianta agora. O progressismo daqueles dias é lento para hoje.
É impossível adaptarmo-nos ao que está constantemente a mudar.
É o tal plano inclinado...
Para dar um exemplo do presente: alguém acredita que o casamento gay é o fim da picada? Evidentemente que não é. A seguir virá outra coisa. E cada cedência se torna o pretexto para a próxima. Sempre sob a capa da suposta mudança que os tempos trazem...
A mim o que mais me custa é ver o que sucedeu no ano a seguir ao 25de Abril de 1974. Foi certamente o ano pior que tivemos nos últimos 50 anos. E com consequências que irão estender-se por gerações.
A esquerda comunista arruinou a economia que tínhamos e o que veio a seguir arruinou o espírito liberal que apesar de tudo ainda existia.
"Salazar como disse dele Eduardo Lourenço era um campónio letrado( Eduardo Lourenço, pelo contrário é um letrado campónio...) mas foi uma das figuras lídimas de Portugal, de sempre e dos séculos que dura a nossa História comum.
O maior do séc. XX sem qualquer espécie de dúvida." José
Completamente d'acordo. Num comentário lateral, diria que Eduardo Lourenço é a cara chapada de Salazar..., até podia ter sido seu irmão gémeo. Com uma diferença de peso, enquanto que Salazar tinha uma figura distinta, era um homem bonito e (nas palavras de quem o conheceu pessoalmente) era um conversador brilhante e, no dizer das mulheres que com ele contactaram, encantador. Era intelectualmente superior, além de que como Governante foi um génio. Pelo contrário - e E. Lourenço que me desculpe - este sempre foi/é uma figura vulgar de camponês, um conversador titubeante, intelectualmente assim, assim... e fisionòmicamente muito, mas mesmo muito feiínho.
É de crer que justamente por causa das parecenças físicas entre estas duas personagens, a esquerda hipócrita e cínica nunca troçou muito de Salazar..., salvo numa ou noutra caricatura mais ou menos acintosa e isto pela inveja patológica e indisfarçavel que aquela sempre nutriu pelo Estadista. Fizesse a esquerda pouco das feições de Salazar e estaria automàticamente a gozar com as de Eduardo Lourenço. E isso eles NUNCA fazem. Como se sabe de sobejo, eles gozam o mais que podem com todos os direitistas, mas como bons e fiéis 'irmãos' protegem-se mùtuamente à outrance. Vão ao ponto de até sobre os criminosos e corruptos (já formalmente acusados pela Justiça) da sua cor política e/ou correligionários, eles calarem-se que nem ratos. É sobretudo nestes pormenores que se vê a massa de que são feitos.
Para não variar:), gostei muitíssimo dos comentários de Muja. Sobretudo os das 16.16 e 16.36 Extremamente inteligentes, assertivos e direitinhos ao alvo, como é seu hábito.
Não podia estar mais certo quando refere que o tempo dos Beatles e dos Bob Dylan's e quejandos foi aquele e passou, isto é, aconteceu porque (por uma série de circunstâncias e motivos diversos que se aglutinaram para, em simultâneo, brotarem do nada... e muito haveria para dizer sobre as ditas circunstâncias e os verdadeiros motivos que o antecederam) tinha que acontecer, mas já está há muito esquecido, até mesmo para alguns dos seus principais protagonistas que tempos depois já o abominavam, vendo-o paradoxalmente como uma época malquista que não queriam nem por nada recordar... Como afirmou peremptòriamente há uns anos a celebérrima Joan Baez, uma das principais intérpretes/contestatárias/revolucionárias desses tempos, baladeira e letrista e amiga do peito de Dylan, numa entrevista que deu a uma televisão norte-americana e à pergunta se gostaria de voltar a cantar num concerto com os seus colegas dos tempos antigos para relembrar essa época áurea..., a resposta, inacreditàvelmente, veio rápida e certeira "Não, não gostaria! Que horror! Esses tempos já lá vão e nem sequer quero recordá-los!".
O José já respondeu a tudo isso com duas frases que ninguém leu ou entende ou refuta:
«A questão é que depois deles vieram outros e os tempos nunca mais foram os mesmos. Por isso é que os tais ventos modificaram a História. »
Não respondeu assim muito bem. Mas nessas frases não há que refutar. O tempos modificaram-se e ninguém bom da cabeça questiona isso.
Mas as questões existem e são outras. Quem modificou verdadeiramente as História terão sido mesmo os ventos?
Desde logo há a refutar a inevitabilidade de tal coisa. Porque ninguém nos obrigou a seguir o caminho que se seguiu. E mais: ninguém estava em posição de nos obrigar a fazer fosse o que fosse.
Portanto, bem vistas as coisas, muitas das mudanças dadas como inevitáveis e "dos tempos" e "pelos ventos", no fundo só se estabeleceram verdadeiramente porque Portugal abdicou da sua posição que era de pedra de toque de toda a África Austral e aguentava todos os países ali à volta: África do Sul, Rodésia, Malawi, Zâmbia.
Hoje tal coisa só se considera impensável porque na altura se fez o que fez e hoje se pinta como se não houvesse mais nada a fazer. Mas havia. Não foram os cantores nem os saltimbancos que mudaram a História. O que mudou a história foi ceder, em coisas históricas, às tretas que eles preconizavam. Mas a pressão efectiva para ceder não vinha dos saltimbancos...
Um bloco civilizacional na África Austral teria mais tarde ou mais cedo que ser aceite. E teria profundas consequências em todos os planos: demonstrava que África não tem de estar condenada para sempre à miséria e ao caos, seria elemento moderador do pseudo-anti-racismo xuxa e esquerdalho, contrapondo-o a um verdadeiro de ordem prática, e seria um apoio importante para que a Europa se não visse esmagada entre duas super-potências. Uma presença portuguesa influenciaria como estava a influenciar os países vizinhos para uma atitude de moderação e cooperação. Tanto a Zâmbia se moderaria no seu racismo anti-branco como era de esperar que os sul-africanos se convencessem de que poderiam retirar o apartheid sem necessidade do que veio a passar-se.
Era isto ir contra os ventos? Era. Mas ventos há muitos, estão sempre a mudar e nós podemos escolher os que nos convêm e até podemos também soprar um bocadinho nós próprios às vezes. E nada disto era sonhar alto porque era o que estava a acontecer. Estava perfeitamente ao nosso alcance e estava a alcançar-se. O que não quer dizer que não tivesse custos ou não envolvesse sacrifícios.
Só requeria uma coisa: vontade.
O que não era possível era outra coisa: era manter os territórios - ou os "interesses" - sem desagradar a quem nos queria de lá para fora, ou agradar-lhes sem perder os territórios e interesses.
Ninguém está a falar de aragens portuguesas.
As aragens portuguesas provêm de ventos maiores. E isso aplica-se a tudo.
Há modas, mas também há mudanças estruturais. Quando umas passam a outras ou quando nelas existe um sentido comum é a questão.
A questão até é fácil de entender. Chama-se História. Perceber porque não se regressa ao passado é entender onde há um sentido evolutivo mais abrangente que esses detalhes de que fala.
V. só pode entender as mudanças face ao colonialsimo (e não importa agora dizer que o nosso foi diferente) se fizer a História do Colonialismo.
E para isso tem de recuar séculos. E nesse recuar e nessas mudanças vai encontrar denominadores comuns que abrangeram e se alargaram a outros campos e acerca dos quais nunca houve retrocesso.
A pena de morte também foi abolida. O que se passou no colonialismo espanhol nunca se poderia manter no século XX.
Há toda uma História a entender para se chegar a um único país que não vive nem nunca existiu fora da História.
Estou eu a falar das portuguesas.
No que respeita à História, para já, não é só a História de determina o comportamento dos intervenientes. O reverso também ocorre. Portanto rejeito esse argumento de que a História é determinante. É determinante, quanto muito, tanto quanto determinada. Além disso, e pelas mesma razão, essa posição pressupõe a possibilidade de descortinar uma direcção precisa a essa História, coisa em que eu também não acredito.
Regressar ao passado é expressão carregada de sentido político, que indica uma perspectiva neste plano ainda que disfarçada de observação neutra ou exterior. Por exemplo, no continente europeu já houve impérios, deixou de haver, voltou a haver. Andou-se para trás muitas vezes. E mais outras tantas, dependendo da perspectiva.
Portanto, é desprovida de significado a afirmação. Se Portugal viesse a unir-se novamente com todos ou alguns outros países de cultura portuguesa nem por isso era "voltar a trás" - a não ser de perspectivas políticas particulares, a que haveria a opor os que então falariam em "evolução" possivelmente "natural".
Procurou-se até avançar nesse aspecto com o Brasil, através da Comunidade Luso-Brasileira e nem por isso se disse que tal era voltar atrás.
Quanto ao colonialismo, importa salientar que o nosso caso era de facto diferente e isso tinha importância capital. Porque a alternativa ao colonialismo não tem necessariamente de ser o anti-colonialismo - e a nossa política demonstrava que era possível um caminho alternativo. De certa forma, era esse um dos principais engulhos que causava por esse mundo fora.
Portanto, não tem particular relevância a história do colonialismo conforme a Zazie a refere. Já tínhamos ultrapassado esse ponto. A História que estávamos a fazer era já pós-colonial, sem ser anti-colonial. Do colonialismo do séc. anterior pouco ou nada já subsistia nos anos 70.
De resto a minha perspectiva é a de que nos não devemos enredar muito nessas noções de dentro e fora da História. Ninguém está fora nem consegue estar. Mas também ninguém consegue apontar qual será a História antes dela acontecer. Está sujeita ao princípio de Eisenberg, ehehe: não pode aferir-lhe a direcção sem a influenciar.
Nas mais das vezes é palavreado cujo o único propósito é justificar os acontecimentos e imprimir-lhes legitimidade pintando-os de inevitáveis.
*princípio da incerteza de Heisenberg
:)
Mas v. acha minimamente lógico, ou sequer racional, falar de um único caso de colonialismo e do que aconteceu, sem ter toda a História do Colonialismo por trás?
Portugal foi viveu numa redoma estruturalista?
Ninguém consegue apontar qual vai ser a História, quando não existem séculos a mostrarem que é assim.
Foi assim. Teve séculos a anteceder esse caminho.
Nunca seria um único caso a reverter esse passado ou a mudar o seu sentido.
Fomos apanhados por essas mudanças que incluíam outras e é por isso que se pode falar em mudanças históricas, ou sociais, ou civilizacoionais. Ponto.
Olhe, princípio da incerteza vive-se agora com a invasão da Europa e do que tencionam fazer.
Quem for catastrofista, tem o Michael Haneke e o tempo do Lobo para visionar o que falta vir.
Quem for realista, tem que travar se tiver força para isso.
Quem for lírico incentiva porque adora utopias.
E isto significa que há extremos que podem ficar de fora.
Porque existem antecedentes que já sopraram a mudança.
Por exemplo- imaginar-se que não vai haver intervenção europeia ou abrir portas, é impossível.
Do mesmo modo que imaginar-se que se vai atacar a finança para resolver o bom do trabalho e da economia também é.
Uma coisa e outra dependem do efeito matrix. O virtual e a velocidade já fabricam realidades.
A finança e as bolhas são precisas para alimentar os humanismos e auto-destruições de regalias sociais com fronteiras.
A nossa história nunca foi pos-colonial porque nunca houve portugueses suficientes para a miscigenação em África.
Pode dar-lhe o nome que quiser mas nunca existiu um Brasil ou uma América em África.
Não se exterminou tudo; não se misturou tudo.
Mas não foram séculos. A ideia anti-colonialista tinha vinte anos. Só teve espressão no pós-guerra e nem podia ser de outra forma porque foi fruto de circunstâncias políticas de potências que apenas afirmaram o seu poder após esse acontecimento.
Não há qualquer tendência de séculos nesse sentido. E embora a origem da commonwealth lhe seja anterior, o objectivo que a presidia originalmente era uma integração de base imperial que foi depois sujeita às influências anti-colonialistas por cedência da política inglesa.
E se por virtude da participação na guerra era difícil aos ingleses resistirem-lhe, nem por isso se aplicavam a nós as mesmas circunstâncias.
Não diga disparates. Começou com o romantismo do século XIX e teve antecedentes com independentismos.
Por acaso até estou agora com esse assunto em mãos por causa da literatura que o acompanhou.
Foi um movimento cultural, antes de ter resultados políticos. E começou até sem negar o colonialismo mas para o humanizar.
A ideia de colonialismo existia desde as disputas coloniais e depois dentro do Império Colonial Inglês torna-se querela por causa da escravatura.
E antes disso até tem o Padre António Vieira a falar do mesmo. O Brasil é um bom case study. Não serve para comparar com África porque resultou. Mas o sentido já era esse. As lutas independentistas desenvolveram-se até em mitos às avessas do sebastianismo.
Sobre o Pe António Vieira foi agora publicada a obra Clavis Prophetarum. Versa o assunto da sua defesa perante um Santo Ofício e tem uma tese interessante, já por aqui citada. A ideia do Mito do Império aparece aí. E como Vieira refere não é um Império do Céu, mas de cá, na Terra e nós seríamos os detentores do Segredo...
Nas Esperanças de Portugal defende essa ideia que era perfeitamente herética. E estava a par das profecias do Bandarra e outras.
O Bandarra é o seu inspirador e reinterpreta a ideia do Império português que é retomada nos anos 40.
Pois é. Mas andava em querelas contra os sebastianistas. Há uma tradição muito típica nas nossas profecias. Já o D. Manuel com "esfera/espera" profética e nome de eleito. É curioso porque se torna tudo mais terreno por comparação com outros milenaristas como o Joachim de Fiore
A base é cabalística. Os jesuítas eram assim.
Não há segredo nenhum.
Cada um é como cada qual; e nós somos duma maneira diferente da dos outros.
É tão simples como isto.
Mas há uma coisa: para sermos desta nossa maneira qualquer um o pode ser. Não é preciso nascer desta ou daquela mãe.
Não há Segredo? Quando alguém fala e escreve seriamente sobre a ressurreição de um morto?
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