sexta-feira, dezembro 08, 2017

A histeria mediática condiciona o poder judicial?

O advogado Francisco Teixeira da Mota, no Público de hoje:


A ideia básica é a seguinte: foi muito bem feito que os juízes que subscreveram o acórdão da Relação do Porto sobre violência doméstica fossem agora sujeitos a processo disciplinar por afirmações que fizeram no acórdão e destoam do que deve ser o sentimento da "comunidade". Por "violarem deveres funcionais a que estão obrigados".

Veremos se será assim uma vez que estes processos disciplinares terão desenvolvimentos ulteriores mormente da parte de quem se vê agora envolvido neles, ou seja o poder jucidial

É disto que se trata na decisão do CSM em instaurar processos disciplinares por delito de opinião de um juiz.

Por outro lado é lamentável que um advogado que anda sempre a invocar jurisprudência do TEDH ( como agora o faz no escrito) não entenda que a sindicância ao que um juiz relator de um acórdão escreve no mesmo,  significa inevitavelmente a sindicância à decisão em si e à sua correcção. Ou se assim não fosse, nada teria relevância porque seria espúria a referência.

É neste lodo de águas sujas que este advogado decidiu mergulhar. Por um lado, afirma que este processo discplinar é uma novidade porque vai "debruçar-se sobre o conteúdo de decisões judiciais" e assim mergulha no lodo. Por outro, escreve logo a seguir  que afinal não se irá apreciar o sentido da decisão, batalhando para se livrar da sujidade  inquisitorial.

Portanto, a razão do processo disciplinar é apenas a de sindicar o teor de certas expressões vertidas no acórdão e não o sentido da decisão tomada.

Então se assim for, qual o fundamento do procedimento? Diz o advogado, sufragando a hipocrisia, que se trata de arrimar estes juízes ao que subjectivamente se entende por "especiais deveres em relação à comunidade".

Ou seja e em resumo, temos um órgão administrativo que gere a carreira dos juízes e a quem incumbe o exercício de um poder disciplinar por putativas infracções ao respectivo estatuto,  a usar este poder especial e a sindicar uma opinião vertida num acórdão que causou polémica mediática por não se conformar com o sentido politicamente correcto do conceito de adultério.  Será absurdo tal sentido vertido? Será horrenda a afirmação produzida? Será absolutamente inadmissível por violadora de princípios básicos das concepções vigentes na comunidade? Nem por isso. O que o juiz disse é que "o adultério da mulher é um gravíssimo atentado à honra e dignidade de um homem". E não será, uma vez que no caso concreto se tratava de adultério feminino, mas poderia bem ser masculino e portanto transgénero?
O que disse o juiz assim de tão horrendo que merece o vitupério do advogado Teixeira da Mota? Se dissesse que o atentado era ao cônjuge merecia o mesmo reparo?  E o sentido concreto não seria o mesmo?
Se houve este exagero e histerismo mediático que confundiu uma decisão judicial com uma opinião avulsa vertida num acórdão porque não se distinguiu logo e por que razão o advogado Teixeira da Mota nem sequer a refere, continuando a torquemadear os visados?

Temos um advogado citador de jurisprudência do TEDH sobre liberdade de expressão, a aplaudir de pé, tendo previamente defendido perante este órgão de gestão e disciplina( numa reunião recente onde leu publicamente extractos do acórdão tirados a preceito para defender a sua posição enviesada)  a justeza deste procedimento punitivo.Parece que foi muito aplaudido e influenciou o órgão de gestão, composto por uma maioria de juristas estranhos à judicatura.

E temos o dito advogado a afirmar com o topete conhecido, a  normalidade, sem consequências disciplinares, de juizes idiossincraticamente incorrectos e ao mesmo tempo afirmar que neste caso não. "Abusem, mas não se estendam..." parece ser o mote do recado.

Enfim, tudo lamentável, incluindo este escrito contraditório de Teixeira da Mota.

Mas para que tudo se coloque num patamar relativo também eu venho dar para este peditório do politicamente correcto com a apresentação de uma decisão que para mim é mais escandalosa, polémica e prenhe de consequências práticas negativas que aquele dos juízes do Porto.

Já falei no assunto mas vou explicar com maior detalhe:

Este excerto de um acórdão recente ( pouco mais de um mês) do STJ, subscrito pelos conselheiros Manuel Matos e José Luís Lopes da Mota, versa sobre a pena de prisão a aplicar a um assassino qualificado pelos psiquiatras como psicopata perigoso. Ou seja, alguém que perante determinaras circunstâncias pode matar outrém, sem qualquer rebuço.

No caso concreto que versa a decisão, o homicida,  então quase sexagenário e fiscal de obras, seduziu uma jovem empregada de limpeza em supermercado que quase poderia ser sua filha e com promessas de vida mais atractiva,  vieram passar uma espécie de lua de mel em diversas localidades, ficando hospedados em pensões, durante cerca de um mês, passeando, namorando, divertindo-se. Em tudo pareciam namorados e tudo isto se deu como facto provado.
 Em dado momento e por razões cuja razão não se conhece ( o  assassino é psicopata, não precisa de apresentar razões...) a moça desaparece mas durante meses continua a enviar mensagens de telemóvel à família dizendo-se no estrangeiro e tendo abandonado o referido indivíduo, trocando-o por um antigo conhecimento não especificado com apelido, apenas com nome.

Como o diabo tapa com uma mão e descobre com as duas, foi descoberto o cadáver da vítima, meio escondido numa mata,  já apenas em ossadas que levaram tempo a determinar a identidade e quando o Correio da Manhá anunciou a descoberta as mensagens terminaram magicamente .
A investigação policial logrou fazer a ligação do cadáver ao referido assassino e este foi julgado por  homicídio qualificado em função de um artigo do Código Penal que diz, além do mais e no caso concreto era apenas isso,  ser assim quando houver entre o homicida e a vítima uma relação de proximidade pessoal "análoga à dos cônjuges" . O namoro, actualmente, configura tal situação?

É este o ponto do caso concreto que o STJ decidiu, escrevendo sobre tal para denegar tal situação e baixando automaticamente a pena aplicada pela primeira instância e confirmada pela Relação, de 21 para 16 anos de prisão:



 O que esta decisão implica explicitamente e com influência decisiva na determinação da medida de pena concreta, baixando-a em cinco anos, para um assassino psicopata,  é que a relação que homicida e vítima mantiveram durante algumas semanas de convívio intenso e íntimo não era afinal um "namoro" e tal permitiu desqualificar o crime, passando-o para a moldura penal do tipo de homicídio simples.


Para definir o que entendiam por namoro, os conselheiros aludidos escreveram aqueles dois parágrafos. É analisar e komentar, de preferência  pelo advogado Teixeira da Mota que deveria também ir ao CSM e apresentar este caso concreto, tal como outros que existem, no seio do STJ...

Comparando este escrito, com importância decisiva na condenação,  com o que os juízes do Porto fizeram, sem importância decisiva na condenação ( porque assim aconteceu)  a diferença é evidente.

Quem ensinou a estes conselheiros o que é uma "relação de namoro"? Ninguém, a não ser umas vagas leituras avulsas de sociologia que duvido terem sequer existido, para além da alusão sem fundamentação.

Portanto a noção de namoro que aqui os conselheiros do STJ aplicam,  está eivada de subjectividade e de idiossincrasia que os juízes se fartam de usar e abusar, sem consequências de sindicância do CSM e muito bem, aliás.

A pergunta que se coloca será portanto esta: porquê esta decisão do CSM sobre os juizes do Porto? A resposta surge cristalina e evidente: por causa da histeria mediática a que o advogado Teixeira da Mota também aderiu.

O TEDH nisto tudo? Um nada, uma irrelevância daqui para a frente, para mim e nos escritos deste advogado.



5 comentários:

zazie disse...

Boa, José!

lusitânea disse...

Enquanto a malta não disser que uma testa sem cornos é a mesma coisa que um jardim sem flores rasgando todo o tipo de contratos a luta vai continuar.Até porque a paneleiragem nessas coisas gosta muito de variar de ninho de amor...

joserui disse...

Acho que transgénero não é utilizado habitualmente neste sentido :) . Temos que nos actualizar nestas minudências da linguagem correcta.

josé disse...

Neologismos, como torquemadear, que aliás me agrada, no caso concreto deste advogado hipócrita e de má-fé.

Floribundus disse...

rebolei-me a rir com a notícia de terem atacado por explosão o multibanco do prédio onde mora o MAI

não é politicamente correcto

esta imposição social-fascista é para quem está disponível para conviver com ela

por estou farto de berrar contra paneleiros e fufas

só eles é que estão 'fu dildos'

A obscenidade do jornalismo televisivo