sábado, dezembro 02, 2017

It´s only rock n´roll ( but they like it..fake)

Morreu o músico "de rock" Zé Pedro, dos Xutos&Pontapés e vendo capas e artigos de jornais e revistas mais o complemente de informação televisiva parece que desapareceu uma das figuras maiores da nossa cultura musical nacional. Até o presidente da República já falou em "grande homenagem" a prestar num futuro próximo que se tema esteja perto do Panteão.
Enfim, o dito Zé Pedro, indivíduo da minha idade, parece que era um "gajo porreiro" e espero por iso que esteja em paz, junto de Quem aparentemente não acreditava que existisse. Ou então acreditava porque houve missa de corpo presente, nos Jerónimos (!).

O caso porém, é que o assunto já o transcende por via de um fenómeno cuja manifestação só compreendo através da análise de um Bourdieu que escreveu há 50 anos um livrinho sobre a sociedade do espectáculo, com teses de pendor marxista, aferidas a produtos, mercadorias e modos de produção, incluindo culturais.
Este espectáculo agora apresentado sobre o significado do que Zé Pedro fez nos últimos 40 anos legitima assim uma visão única, fruto de um pensamento único que é agora imposto aos leitores e espectadores através de opiniões que se revelam solidárias umas das outras, mantendo assim um ambiente deletério de falsidade e de história falsa, como acontece por exemplo com o relato das cheias de 1967 ou o que aconteceu no tempo de Salazar. 

Leia-se o que um salafrário intelectual, dependente do trostkismo escreve sobre o assunto no Público de hoje:


O músico Zé Pedro, coitado, é apresentado como o "inventor do Portugal moderno, que retirou do século passado"... nem mais!, continuando a aleivosia pelo escrito fora. É este tipo "conselheiro de Estado"!

Chegado a este ponto de confrangedora aleivosia importa perceber de onde veio o referido Zé Pedro e até onde chegou.

Em primeiro lugar deve dizer-se desde já que Zé Pedro dos Xutos & Pontapés não reinventou nada de nada de especial. A música dos Xutos é tão pobre e tão básica que nem ponta tem que se lhe pegue para análise musical séria. O músico Zé Pedro está para o rock cantado em português como o guitarrista dos Stones para os guitarristas de blues americanos que copiou escandalosamente. Com uma vantagem para este último: sabia tocar bem o que tocava e inventou o som de cinco cordas em vez de seis, afinado por ele para o efeito.
Ainda assim ouve-se muito bem a  musiqueta dos Xutos sobre " a minha casinha" e outras mas muito poucas. Não tenho nenhum disco dos Xutos e não conto vir a ter porque musicalmente são desinteressantes para dizer o mínimo, mesmo em relação ao rock de expressão anglo-saxónica que aprecio e que imitaram.
Não percebo os ditirambos expelidos por colegas de profissão nas páginas dos jornais de ontem. No Público, num bom artigo de seis páginas assinado por Mário Lopes, cita-se o "carisma" . Nunca o percebi muito bem mas também nunca vi o grupo ao vivo.

De resto, os Xutos & Pontapés são um produto mediático muito moderno e com alguns anos de vida em notoriedade. Os Xutos são mais que Zé Pedro e continuaram em grupos avatares como os Resistência ou Rio Grande, com maior participação de outros músicos, bem mais interessantes do que Zé Pedro. Foi nesse desenvolvimento que se ampliou a importância mediática dos Xutos e se assim não fosse, teriam o mesmo destino que outros antes deles e seus contemporâneos. Que é feito do Corpo Diplomático? E que importância se dá aos GNR que foram verdadeiramente os iniciadores da "onda", a seguir ao punk que se exprimia em inglês?

O grupo terá começado no ano de 1979 e seguindo a imprensa da época,  reduzida a um jornal de espectáculos semanal que tinha aparecido em meados de 1978, o Sete, praticamente não há notícia de actividade musical do grupo até esta referência a um single que  aparecia num "top" do jornal TvTop, de 26 de Janeiro de 1982: Sémen era o nome do single que fez nascer o grupo.



Verificando a companhia musical aparece outro grupo português, muito mais antigo- Go Graal Blues Band- e que merece referência no panorama do então chamado "rock português", epíteto inventado no início dos anos oitenta por qualquer radialista dos rocks em stocks e afins que eram apenas um espaço radiofónico que simplesmente não ouvia com regularidade porque existiam outros nessa época que lhe davam água pela barba, como por exemplo os programas de Jaime Fernandes e João David Nunes, no mesmo comprimento de onda em FM estéreo.
Sete de  14.5.1980 e 13.1.1982:




A Go Graal Blues Band era um dos grupos da segunda geração do "rock português" ( a primeira, dos anos sessenta é lendária e já foi estudada pelo ié-ié) , aparecido em 1976 e que tinha sido notícia na revista Música & Som de 2 de Junho de 1977: um grupo muito incipiente e cuja audição em programa de rádio antigo, me lembro de me provocar pena pela confrangedora mediocridade sonora que tresandava nas gravações que passaram no rádio.


Porém, estes Go Graal que integravam o músico Paulo Gonzo, futuro autor de musiquetas de banda sonora de telenovela ,sempre com o mesmo compasso musicado, consideravam-se os filósofos da música desse tempo, como denotam aqui numa entrevista de 25 de Novembro de 1981 ao Sete.



Até o Rui Veloso, o efectivo e putativo "pai do rock português" era mencionado como um coitado que gostaria de saber tocar blues...como eles. Enfim.


Em 1980 aliás, a novidade era Rui Veloso, mas antes dele apareceram outros grupos de "rock", particularmente no Norte, como os Trabalhadores do Comércio e Arte e Ofício e principalmente os Jáfumega que tinham aparecido na infância dos Mini-Pop e se desenvolveram no Porto, terra dos Psico e outros Pop Five.

Sete 15.10.1980 e 23.2.1982.


Sete 10.3.1981, com Rui Veloso e Carlos Tê, por ocasião do segundo disco daquele.




E a opinião dos Jáfumega sobre o "rock português"...em 5.8.1981:




No sul do país quem mandava no rock e na atitude "rock n´roll", agora atribuída ao falecido Zé Pedro, mas muito antes dos Xutos, eram os GNR de António Ribeiro que agora também diz que o Zé Pedro é o maior.  Humilde (sans blague), este António Ribeiro. E não parece.

Sete 15.4.1981:






Perante este panorama apareceram outros grupos a tentar a sorte, em mini-festivais, alguns promovidos pelo jornal.

Sete, 13.1.1982:









Em Coimbra, no Jardim da Sereia, junto à praça da República, em Maio de 1981 apareciam grupos cujos nomes fariam inveja aos Xutos e Pontapés ( portanto a historieta do Louçã sobre o nome do grupo é no mínimo risível e denota que este indivíduo vive de memórias deturpadas...)

Lembro-me bem disto porque vi alguns destes grupos e ouvi uma das melhores aparelhagens de som PA ( public address) que tenho memória. Foi então que o Sultans of Swing dos Dire Straits me soaram como nunca tinha ouvido...)

Sete 6.5.1981:


 Quanto aos Xutos, nem em 1983 eram ainda "gente"...ao contrário de outros hoje esquecidos.



E de resto como reagiam os velhos dinossáurios da cantiga de amigo e panfletária, como José Mário Branco e Luís Cília, os verdadeiros mentores culturais da música de Louçã? Muito mal...

Sete, 13.1.1982:


Sete 18.11.1981:
E a intelectualidade crítica?

Sete, 17.10.1979:


Sete 17.11.1982:



E os próprios músicos não levavam muito a sério isso do "rock português"...

O maior deles todos ( sim, deixemo-nos de peneiras porque é mesmo e o único que merece o panteão...), Rui Veloso, em 21 de Janeiro de 1981 ainda tinha a reticência do pai que até o achava um "parasita", antes do sucesso musical. Tal mostra bem a importância do nosso "rock n´roll" que agora é entusiasticamente elevado á categoria de obra-prima por personagens como o próprio presidente da República! Onde Portugal chegou...

E no entanto era assim o Portugal do início dos anos oitenta, quando os Xutos e Pontapés começaram. Nada que se pareça com o Portugal que nos querem impingir agora como se tivesse sido assim como dizem que foi.

Não foi! Tal como antes de 25 de Abril de 1974 não foi como nos andam a contar...mas como a memória das gentes é curta aqui ficam as lembranças da praxe que não mentem porque são da época.



Em 1981 o panorama musical em Portugal, da música portuguesa era relativamente pobre.

Sete 23.9.1981:



A mim o que me valia eram as revistas estrangeiras ( Rock & Folk, Rolling Stone, New Musical Express, entre outras. A mim e a quem fazia o Sete, mas julgo que nem esses as liam...)

E quanto ao rádio que escutava, julgo que nunca mais foi melhor que esta grelha que aqui se apresenta, em 12.10.1983, simplesmente fabulosa.



Entretanto sobre os Xutos & Pontapés topei mais duas imagens de época. O Sete descobriu o grupo em 3.8.1983, assim:


Portanto os Xutos, em 1983 ainda tocavam em part-time. Zé Pedro era empregado de escritório. Escreve o Sete: "foi há cerca de um ano que os Xutos publicaram o seu primeiro álbum. De então para cá pouco se ouviu falar do grupo, tendo mesmo corrido a notícia de que iria acabar".

Por outro lado, na época definiam-se como "filhos ilegítimos do punk". Ou seja, bastardos de uma música estranha vinda de algures. Eram pela "raiva e revolta"...

Dois anos depois, em 1985 o jornal que então se publicava ( já ia no segundo ano) chamado Êxito, do grupo do Correio da Manhã fazia uma notícia sobre o grupo em Espanha, em 19.9.1985.


Questuber! Mais um escândalo!