terça-feira, fevereiro 13, 2018

Quem tem razão na questão dos exames de acesso ao ensino Superior?

Artigo de Nuno Crato ( seguidor do novo Acordo Ortográfico, hélas!) no Observador:
(...)
"Pela mesma altura, e com a presença também de responsáveis da OCDE, houve uma discussão sobre o ensino que se revelou um ataque concertado à avaliação dos conhecimentos. Sobre o pretexto de atualizar o sistema de acesso ao ensino superior, retomaram-se os velhos e caducos argumentos contra a avaliação dos estudantes.
É claro que pode fazer sentido atualizar o sistema de acesso ao ensino superior, e aí é preciso que se diga claramente como, para se perceber se aparecem propostas novas, justas, equilibradas e que permitam igualmente uma admissão com base no mérito. Mas só por ingenuidade se pode acreditar que é isso que está em causa nas intervenções dos últimos dias. Para a conclusão do Secundário montou-se ao longo dos anos um sistema de avaliação externa e uniforme que é o melhor que existe no país. Foi esse sistema que incentivou um rigor que depois se transmitiu ao Básico, onde finalmente, em 2005, foram introduzidos exames, e permitiu que Portugal começasse a subir nas avaliações internacionais. A pressão tem sido sempre de cima para baixo: para os alunos virem mais bem preparados, sempre mais bem preparados. Não sejamos ingénuos: há quem não goste!
Fala-se também no “dilema” de “ensinar para o mundo de amanhã ou para o exame nacional” O que volta a ser absurdo. Como se o conhecimento fosse inimigo da preparação para a vida!
Critica-se a existência de uma via facilitada para alunos do ensino profissional, como antigamente existia e como parece que se pretende voltar a fazer, mas será mais justo destruir todo o sistema? Claro que o processo de admissão deve ser flexível, sem um modelo igual para todos ­– mas as entradas em medicina não exigem já exames diferentes dos de filosofia? Até onde deve ir a flexibilização? Até cada um saber apenas aquilo que ele próprio acha que deve saber?
A pressão para acabar com os exames aparece ainda justificada com a pretensa flexibilização curricular. Mas a flexibilização curricular não é nova. Ela apareceu em 2014 exatamente com os 25% de que agora se fala. Só que a flexibilização original preservava as disciplinas essenciais, as metas e a avaliação: cada escola podia seguir o caminho que pretendesse, desde que os seus alunos alcançassem mínimos comuns, avaliados externamente. Só uma flexibilização inimiga da exigência pode querer destruir essa avaliação externa. E desmantelar a avaliação independente seria desonrar um esforço de décadas para melhorar o ensino."

 Este artigo segue-se a um outro de Homem-Cristo ( que não segue o novo Acordo Ortográfico, eh bien!), a defender o contrário...

Explique-se: o que está em causa não é acabar com os exames nacionais. É, apenas, cortar a sua ligação com o acesso a cursos superiores, tornando autónomos o ensino secundário e o ensino superior. Assim, os exames manter-se-iam para validar a conclusão da escolaridade obrigatória, e para aceder à universidade um outro modelo de acesso seria implementado. Ou seja, o ponto está em substituir o triplamente esgotado modelo de acesso ao ensino superior.
Primeiro, porque o peso que os exames nacionais têm no acesso ao ensino superior (onde cada décima conta) condiciona o ensino secundário e amarra-o a um guião uniformizado – limita a autonomia nas escolas e impede o sistema de gerar a diversidade pedagógica que os alunos precisam. Segundo, porque o actual modelo se sustenta em desigualdades na avaliação, o que é injusto para os alunos – por um lado, há alunos que ficam fora do curso que desejam por 0,05 valores, por outro lado há escolas que sobrevalorizam (ou subvalorizam) as classificações dos alunos, resultando na injustiça de os alunos não concorrerem pelas vagas dos cursos em igualdade de circunstâncias. Terceiro, porque o actual modelo não foi gerado para abranger outras vias escolares e, hoje, está em colisão com a consolidação do ensino profissional – que, com cerca de 50% dos alunos do secundário, criou uma espécie de modelo paralelo de acesso ao ensino superior (muitíssimo mais acessível e comparativamente injusto).
Mas há mais. Para além de esgotado, o modelo português de acesso ao ensino superior constitui ainda uma raridade na paisagem da UE: existente em Portugal, a relação directa entre exames nacionais do secundário e acesso ao ensino superior é excepcional nos sistemas europeus. Note-se que, em vários países europeus (Dinamarca, Holanda, Irlanda, Reino Unido), os critérios de acesso aos cursos do ensino superior são definidos pelas próprias universidades e diferenciados por curso – e, quando as características das formações assim o exigem, aplicam-se restrições no número de vagas (numerus clausus). Noutros países (Bélgica, França), o acesso ao ensino superior é considerado livre – isto é, basta ter o diploma do ensino secundário para entrar, sendo a selecção dos alunos feita posteriormente, na passagem do 1.º para o 2.º ano dos cursos (com excepção de cursos específicos, como cursos via ensino ou medicina, para os quais o Estado fixa critérios de entrada). E mesmo quando se opta por um modelo centralizado, existe a possibilidade de desligar o acesso ao superior do ensino secundário, como se fez em Espanha – o ministério introduziu uma espécie de Prova Geral de Acesso, exclusiva para filtrar quem pretende prosseguir estudos no ensino superior.

Quem tem razão?

Questuber! Mais um escândalo!