Público de hoje:
Quando leio artigos destes fico logo com a pulga atrás da orelha e vou procurar saber quem é o autor que o escreveu.
Jorge Wemans é um jornalista que foi opositor ao regime anterior à manhã de Abril ( foi preso por causa dos acontecimentos na capela do Rato).
Andou no jornalismo de esquerda, naturalmente e aterrou no Público, na co-direcção e na provedoria do leitor. Em 2006 foi designado pelo governo de Sócrates director da RTP2. Agora anda a dar lições de deontologia e até sobre o que é o bom e o mau jornalismo e o poder do público. Debalde. Se virem a comunicação sobre tal, no youtube, verificarão que é um pouco pedante, apenas. Para o moralista jornalista "o desinvestimento nas redacções é seguramente um dos problemas graves da democracia". Ou seja, dinheiro para cima delas e ficaria o problema resolvido.
Por outro lado acha que a opinião que critica os jornalistas têm efeito nos mesmos porque lhes permite ver outro lado das questões e apresentou o seu exemplo enquanto provedor do leitor do Público que criticou um editor de uma notícia sobre uma autarquia, perto do período eleitoral e depois o editor saiu do jornal. E depois citou um antigo editor do The Telegraph inglês ( têm sempre que vir com exemplos estrangeiros...) que depois de sair do jornal escreveu um livro a contar como os editores tratavam mal as notícias e outros que eram incapazes de noticiar contra os investidores ( como o Público o faz no caso da Sonae, patrocinadora desde sempre do jornal e verdadeira entidade empregadora dos seus jornalistas).
Agora, neste escrito, o que é um pouco estranho é a preocupação sobre-reactiva acerca da passagem dos filmes de interrogatório na "operação Marquês". Wemans acha tal coisa "hedionda" e portanto um atentado ao jornalismo "bom".
Será que é ainda essa preocupação deontológica que leva este antigo jornalista que agora dá lições a escrever o que escreve? Não quero crer.
Em primeiro lugar a questão dos "filmes do senhor procurador"...é semiótica duvidosa e suspeita. O realizador dos filmes é personagem da trama, agora? E os personagens principais são apenas vítimas? A quem aproveita mais estes filmes assim vistos? Aos filmados ou aos que realizam o filme?
Wemans não se interroga porque dá por assente que no caso "os acusados defendem-se das acusações por ela [SIC] lidas e ilustradas a partir do texto da acusação através ...do próprio interrogatório a que foram submetidos".
Tal afirmação é falsa e denota logo o enviesamento de Wemans. O texto da SIC é baseado em factos da acusação e não apenas na acusação. E a ilustração que foi realizada na SIC avança mais em termos informativos do que o próprio conteúdo da acusação. Toda a gente ficou a perceber o "esquema" gerado no sistema de transferências bancárias inter alias. BES-offshores-beneficiários-transferências-testas de ferro-beneficiários e interligação entre todos com os factos a suportar tal explicação noticiosa, aliás muito bem feita. De tal modo que poderá ser aproveitada em julgamento real, judicial e não apenas mediático.
Sobre isto, Wemans, moita carrasco. Suspeito, mais uma vez.
A divulgação das imagens do interrogatório é no contexto aludido perfeitamente dispensável e apenas fruto do que o jornalismo clássico que Wemans defende, plantou: o jornalismo informativo carece de apanhar o espectador médio no interesse imediato. Daí a notícia do homem que morde o cão.
Neste contexto, as imagens são legítimas, não ferem qualquer susceptibilidade, mesmo exacerbada e concorrem como qualquer foto em texto impresso para dar o panorama semiótico do acontecimento.
O texto de Wemans concentra-se depois no outro aspecto que o torna ainda mais suspeito: o segredo de justiça. Sabendo que não é disso que se trata no caso concreto porque trata em concreto deste assunto neste escrito?
Curioso é que escreva: "sabemos quanto a corrupção de altos responsáveis políticos, empresariais, financeiros, académicos e culturais é um dos principais cancros da sociedade portuguesa e da nossa vida democrática".
Sabemos?! Sabemos mesmo, sem ser em retórica? O que fez Wemans em concreto e enquanto jornalista para debelar esse mal entranhado? Para já e agora, combate por escrito quem procura denunciar precisamente esses corruptos. Ou será que Wemans acredita no princípio da presunção de inocência aplicado nos tribunais como se fosse princípio de senso comum e validade cívica para todos, fora dos tribunais? Nas redacções não pode existir tal princípio aplicável genericamente desde o momento em que um editor conclua, com as provas que reuniu em investigação jornalística e que se lhe afiguram credíveis e sustentáveis.
O princípio da presunção de inocência judicial vale para evitar que se condenem inocentes em penas judiciais, mas é restrito ao campo judicial.
O princípio da presunção de inocência seja de quem for vale até ao momento em que alguém perceba cabalmente que outrém não é de todo inocente e carece de exposição pública da suprema hipocrisia que alimenta precisamente a corrupção na vida democrática. A difamação enquanto crime só existe na forma dolosa, ou seja, na vontade em prejudicar outrém, imputando-lhe factos que sabe serem falsos ou para desvirtuar a honra de alguém, podendo e devendo saber que podem ser falsos os factos imputados.
Não é esse o caso em que o jornalista investiga, sabe os factos confirma e publica de boa fé, por ter interesse público tal divulgação.
O caso Marquês não se define pelos "filmes do senhor procurador". Define-se pela extensa teia de interesses privados, ilegítimos e criminosos que tomaram conta de um Estado que deveria ser de todos nós. E para isto não é preciso torcer qualquer presunção de inocência sob pena de passarmos por néscios, em atestado do senso comum.
Sobre isso, Wemans tem apenas aquela tirada retórica. E nada mais. Mas por isso mesmo suscita suspeitas para se saber quem é e de onde veio.
Por mim basto-me com uma pergunta: como foi nomeado director da RTP2 em 2006? Concretamente, quero dizer. Quem deu o nome dele, como se movimentaram as pessoas nos bastidores, etc etc.
Basta isso para saber se Wemans é um jornalista decente ou apenas mais uma puta do jornalismo caseiro, cheio delas, aliás. Principalmente nos cabeçalhos e nas chefias de redacção de tv. E os provedores não escapam ao estatuto miserável de quem se presta a serviços avulsos e pouco dignos a troco de dinheirinho.
Até lá, porém, presumo-lhe a inocência.
Sobre esta presunção de inocência aferida ao jornalismo e ao judicial publica-se um artigo de Helena Garrido, no Expresso de hoje ( a caricatura é um atentado à presunção de inocência. Ninguém fuma notas pelo nariz...mas há quem snife outras coisas, de facto) :
Neste artigo conta-se como o jornalismo andou à frente do judicial. O que fez o "judicial" em 2010 quando saíram estas notícias? Nada. Presumiu-se inocente, este inocentinho que continua inocente presumido mas agora nos tribunais onde a inocência tem muito que se lhe diga.
Tal como Wemans parece gostar...
Sobre o judicial, alguma vez actuou em relação a este facto já com dez anos em cima? Não.
Outra presunta violadora de inocências é esta Ana Gomes no Expresso de hoje:
Os apaniguados do PS e do bloco central não lhe perdoam...esta violação da inocência dos inocentinhos.