Jorge Lacão está confiante que os esclarecimentos previstos para hoje do PGR sobre as escutas entre José Sócrates e Armando Vara vão encerrar as suspeitas em torno do primeiro-ministro", segundo escreve Leonete Botelho, no Público de hoje em prefácio à entrevista de Lacão- Público, 21.11.09
Como se pode ler, para o ministro Lacão, um permanente aparatchick deste poder situado, "o problema mais sério da justiça é a violação do seu segredo".
Então que segredo é esse e para que serve?
Os especialistas, consensualmente, apontam a principal função do segredo de justiça: proteger a eficácia da investigação criminal, em primeiro lugar. Depois, pode também servir para proteger os suspeitos da devassa pública e de julgamentos sumários, em público, sobre factos que apenas os tribunais podem e devem apreciar, em termos criminais. Para evitar fogueiras simbólicas do carácter e honra pessoal dos visados. O que outro princípio fundamental procura resolver: a presunção processual de inocência.
Mas a questão, por isso mesmo, redunda num problema que aqueles defensores de um segredo de justiça guardado a sete chaves e numa torre de marfim, não enunciam: o de se conhecerem publicamente os factos que envolvem personalidades públicas e alguns desses factos serem de inquestionável relevância pública e política, marginais a uma eventual responsabilidade criminal. Nessas matérias a presunção de inocência processual não opera na mesma modulação nem pode operar.
Ora é isto que os preocupados tipo Lacão não querem a todo o custo: que se saibam publicamente os factos que os podem prejudicar politicamente. Parece-me isto tão evidente e indesmentível que pouca gente terá dúvidas que assim seja. Então porque continuam a tentar ludibriar as pessoas, com proclamações grandiosas que não passam de puras hipocrisias que nem o senso comum poderia autorizar como socialmente aceitáveis?
Uma prova disso mesmo?
Vem no Expresso de hoje, sobre a manchete que cobre a primeira página. No artigo interior escreve-se que " O Expresso confirmou que o arguido mais mediático do caso e os seus advogados não encontraram nenhuma conversa directa entre Vara e Godinho sobre os 10 mil euros nas 15 escutas que lhes foram dadas a ouvir durante o interrogatório. É verdade que o ex-ministro socialista e amigo pessoal de José Sócrates tem pela frente outras 15 escutas à sua espera na próxima inquirição, prevista na quarta-feira da semana que vem, mas para já a única intercepção telefónica conhecida pela defesa que faz alusão a esse valor é uma conversa em que Godinho-dois dias antes de ir ao encontro de Vara no BCP- pede a uma funcionária das suas empresas, Maribel Rodrigues, que lhe levante o dinheiro em notas, o que veio a acontecer na véspera de o sucateiro ir à sede do banco."
E o jornal continua a noticiar factos que porventura existem nos termos do processo e que estão em segredo de justiça, como sejam as fotos existentes, os documentos diversos e que apontam os indícios sobre a responsabilidade penal do visado.
Pergunta-se: quem terá fornecido esta informação ao jornal? Foram as fontes de investigação? Ou seja, a Judiciária, os magistrados, os funcionários respectivos ou poderiam ser os advogados, os acompanhantes, os próprios arguidos, no seu próprio interesse?
O jornal o saberá, claro. Mas até isso será incerto se a informação circular por vias travessas e a fonte não for directa e inconfundível.
Melhor ainda: que adianta esta fuga de informação e violação de segredo de justiça? Compromete agora qualquer investigação? Não poderia ser divulgada publicamente, sem prejuizo da defesa dos visados?
Corolário: é isto então que constitui o problema mais sério da Justiça em Portugal? Não, não é, senhor Lacão e o senhor está farto de saber que assim não é.
É um problema sim, de quem está entalado e pertence a um grupo político ou com ele tem relações directas e inequívocas. É ainda um problema dos grupos, esses sim secretos, como a Maçonaria e é um problema de todos nós que devemos saber publicamente o que os governantes fazem em nosso nome e para que não estão mandatados, ou seja, para praticarem actos de corrupção ou desmandos sindicáveis pelos órgãos de supervisão. A corrupção, por exemplo, é um crime mas é também o exemplo de um facto que mancha irremediavelmente a imagem pública de um político. Queima-o. Acaba com a sua importância e função, logo que exposta.
É por isso perfeitamente compreensível que os políticos de função e os que a ela pretendem aceder, não aceitem bem um sistema jurídico-penal que seja eficaz nesse aspecto e funcione como aqueles onde estes problemas são menores. Portugal está a meio da tabela dos países corruptos. E parece que os políticos estão satisfeitos com o score.
Tudo têm feito para limitar, prejudicar, dificultar a investigação criminal nestes assuntos e isso é já evidente para todos os que utilizam os instrumentos penais de investigação.
A questão de fundo, portanto, reconduz-se sempre a uma outra que Jorge Coelho enunciou na entrevista ao Sol de 18 de Setembro, ontem aqui citada:
"Muito do que se passa na política, por detrás de coisas que são feitas…se os portugueses soubessem, ficavam com ainda menos respeito pela vida política.” Os jornalistas quiseram saber se ele se referia a todas as alas políticas, ao que ripostou: “Tudo, tudo, tudo”, Interrogado sobre quando é que tudo isso se ia saber, a resposta foi curta: “Nunca”.
Por isso que fique assente que é esse o verdadeiro problema da Justiça portuguesa. Não é a violação do segredo de justiça, certamente. E este problema deve equacionar-se com outro mais sensível, porque mais concreto e enunciado por Rodrigo Santiago, advogado do principal arguido, Godinho: isto é apenas a ponta do iceberg da corrupção ambiente e há altas figuras da hierarquia do Estado envolvidas no assunto. Quem lho disse? O arguido, naturalmente. Viola algum segredo, o advogado Santiago, ao dizer isto ? Quer ele lá saber...se foi o mesmo quem no processo Casa Pia contou com pormenores o interrogatório judicial do seu cliente Ritto, e parece que nada lhe sucedeu...
No entanto, estas declarações de Santiago, servem como aviso de espadeirada nos mouros se tal se justificar. E daí as preocupações dos preocupados, muitos mais do que parece.
Ainda assim, o líder parlamentar do PS, Assis, já fez saber que esta "disfuncionalidade grave do sistema de justiça", tem de ser resolvida rapidamente e a solução encontrada parece ser a de aumentar a moldura penal do crime. Para quanto? Cinco anos e assim permitir a escuta telefónica de suspeitos? E se estes forem magistrados quem vai autorizar? O presidente do STJ?
Enfim, em cada cavadela jurídica que o PS dá no CPP, aparece uma minhoca de interesses pessoalizados nos políticos envolvidos. Não aprenderam com a "revisão Casa Pia " e voltam ao mesmo erro de fundo e de forma, uma revisão apressada que parirá outro cachorro cego.
Em cereja no topo do bolo desta problemática, aparece o artigo de José Miguel Júdice no Expresso de hoje.
Para o causídico da PLMJ que defendeu em tempos, seriamente, serem apenas consultáveis pelo Estado as três maiores sociedade de advogados em assuntos de teor negocial relevante ( leiam-se de milhões), as escutas pura e simplesmente são um mal a extirpar do processo penal.
Nada do que se passou neste caso deveria ser admissível legalmente. Nem as escutas ao PM nem a certidão extraída nem a polémica à sua volta. E apresenta uma solução de gritos para o problema de se tomar conhecimento fortuito de um crime, eventualmente praticado por um primeiro-ministro: as escutas nada valem, segundo o causídico. Mas deviam ser analisadas pelas autoridades judiciárias e a partir daí, instaurado um inquérito para se efectuar uma escuta, mas sem qualquer certidão! Espantemo-nos! Mais uma vez: espantemo-nos!
Obviamente que o que JMJ pretende dizer, não tem a ver com a validade de escutas em processo penal, como meio de obtenção de prova. Tem tudo a ver com a preocupação que as escutas apanhem os "grandes" os responsáveis políticos de topo, em negociatas, em manobras de grande corrupção. Tem a ver com o facto de as escutas apanharem os escritórios de grandes causídicos em negociatas que Jorge Coelho citou. Nem mais nem menos e isso é que é preocupante para o defensor dos direitos liberdades e garantias dos pares.
Se lhe perguntarem o mesmo em relação a crimes de fundo de catálogo como tráfico de droga da arraia miúda nem hesitará um segundo para reconhecer que são obrigatórias e quem as não fizer, será negligente e incompetente na investigação criminal. Sem qualquer problema de direitos, liberdades ou garantias.
Como se pode ler, para o ministro Lacão, um permanente aparatchick deste poder situado, "o problema mais sério da justiça é a violação do seu segredo".
Então que segredo é esse e para que serve?
Os especialistas, consensualmente, apontam a principal função do segredo de justiça: proteger a eficácia da investigação criminal, em primeiro lugar. Depois, pode também servir para proteger os suspeitos da devassa pública e de julgamentos sumários, em público, sobre factos que apenas os tribunais podem e devem apreciar, em termos criminais. Para evitar fogueiras simbólicas do carácter e honra pessoal dos visados. O que outro princípio fundamental procura resolver: a presunção processual de inocência.
Mas a questão, por isso mesmo, redunda num problema que aqueles defensores de um segredo de justiça guardado a sete chaves e numa torre de marfim, não enunciam: o de se conhecerem publicamente os factos que envolvem personalidades públicas e alguns desses factos serem de inquestionável relevância pública e política, marginais a uma eventual responsabilidade criminal. Nessas matérias a presunção de inocência processual não opera na mesma modulação nem pode operar.
Ora é isto que os preocupados tipo Lacão não querem a todo o custo: que se saibam publicamente os factos que os podem prejudicar politicamente. Parece-me isto tão evidente e indesmentível que pouca gente terá dúvidas que assim seja. Então porque continuam a tentar ludibriar as pessoas, com proclamações grandiosas que não passam de puras hipocrisias que nem o senso comum poderia autorizar como socialmente aceitáveis?
Uma prova disso mesmo?
Vem no Expresso de hoje, sobre a manchete que cobre a primeira página. No artigo interior escreve-se que " O Expresso confirmou que o arguido mais mediático do caso e os seus advogados não encontraram nenhuma conversa directa entre Vara e Godinho sobre os 10 mil euros nas 15 escutas que lhes foram dadas a ouvir durante o interrogatório. É verdade que o ex-ministro socialista e amigo pessoal de José Sócrates tem pela frente outras 15 escutas à sua espera na próxima inquirição, prevista na quarta-feira da semana que vem, mas para já a única intercepção telefónica conhecida pela defesa que faz alusão a esse valor é uma conversa em que Godinho-dois dias antes de ir ao encontro de Vara no BCP- pede a uma funcionária das suas empresas, Maribel Rodrigues, que lhe levante o dinheiro em notas, o que veio a acontecer na véspera de o sucateiro ir à sede do banco."
E o jornal continua a noticiar factos que porventura existem nos termos do processo e que estão em segredo de justiça, como sejam as fotos existentes, os documentos diversos e que apontam os indícios sobre a responsabilidade penal do visado.
Pergunta-se: quem terá fornecido esta informação ao jornal? Foram as fontes de investigação? Ou seja, a Judiciária, os magistrados, os funcionários respectivos ou poderiam ser os advogados, os acompanhantes, os próprios arguidos, no seu próprio interesse?
O jornal o saberá, claro. Mas até isso será incerto se a informação circular por vias travessas e a fonte não for directa e inconfundível.
Melhor ainda: que adianta esta fuga de informação e violação de segredo de justiça? Compromete agora qualquer investigação? Não poderia ser divulgada publicamente, sem prejuizo da defesa dos visados?
Corolário: é isto então que constitui o problema mais sério da Justiça em Portugal? Não, não é, senhor Lacão e o senhor está farto de saber que assim não é.
É um problema sim, de quem está entalado e pertence a um grupo político ou com ele tem relações directas e inequívocas. É ainda um problema dos grupos, esses sim secretos, como a Maçonaria e é um problema de todos nós que devemos saber publicamente o que os governantes fazem em nosso nome e para que não estão mandatados, ou seja, para praticarem actos de corrupção ou desmandos sindicáveis pelos órgãos de supervisão. A corrupção, por exemplo, é um crime mas é também o exemplo de um facto que mancha irremediavelmente a imagem pública de um político. Queima-o. Acaba com a sua importância e função, logo que exposta.
É por isso perfeitamente compreensível que os políticos de função e os que a ela pretendem aceder, não aceitem bem um sistema jurídico-penal que seja eficaz nesse aspecto e funcione como aqueles onde estes problemas são menores. Portugal está a meio da tabela dos países corruptos. E parece que os políticos estão satisfeitos com o score.
Tudo têm feito para limitar, prejudicar, dificultar a investigação criminal nestes assuntos e isso é já evidente para todos os que utilizam os instrumentos penais de investigação.
A questão de fundo, portanto, reconduz-se sempre a uma outra que Jorge Coelho enunciou na entrevista ao Sol de 18 de Setembro, ontem aqui citada:
"Muito do que se passa na política, por detrás de coisas que são feitas…se os portugueses soubessem, ficavam com ainda menos respeito pela vida política.” Os jornalistas quiseram saber se ele se referia a todas as alas políticas, ao que ripostou: “Tudo, tudo, tudo”, Interrogado sobre quando é que tudo isso se ia saber, a resposta foi curta: “Nunca”.
Por isso que fique assente que é esse o verdadeiro problema da Justiça portuguesa. Não é a violação do segredo de justiça, certamente. E este problema deve equacionar-se com outro mais sensível, porque mais concreto e enunciado por Rodrigo Santiago, advogado do principal arguido, Godinho: isto é apenas a ponta do iceberg da corrupção ambiente e há altas figuras da hierarquia do Estado envolvidas no assunto. Quem lho disse? O arguido, naturalmente. Viola algum segredo, o advogado Santiago, ao dizer isto ? Quer ele lá saber...se foi o mesmo quem no processo Casa Pia contou com pormenores o interrogatório judicial do seu cliente Ritto, e parece que nada lhe sucedeu...
No entanto, estas declarações de Santiago, servem como aviso de espadeirada nos mouros se tal se justificar. E daí as preocupações dos preocupados, muitos mais do que parece.
Ainda assim, o líder parlamentar do PS, Assis, já fez saber que esta "disfuncionalidade grave do sistema de justiça", tem de ser resolvida rapidamente e a solução encontrada parece ser a de aumentar a moldura penal do crime. Para quanto? Cinco anos e assim permitir a escuta telefónica de suspeitos? E se estes forem magistrados quem vai autorizar? O presidente do STJ?
Enfim, em cada cavadela jurídica que o PS dá no CPP, aparece uma minhoca de interesses pessoalizados nos políticos envolvidos. Não aprenderam com a "revisão Casa Pia " e voltam ao mesmo erro de fundo e de forma, uma revisão apressada que parirá outro cachorro cego.
Em cereja no topo do bolo desta problemática, aparece o artigo de José Miguel Júdice no Expresso de hoje.
Para o causídico da PLMJ que defendeu em tempos, seriamente, serem apenas consultáveis pelo Estado as três maiores sociedade de advogados em assuntos de teor negocial relevante ( leiam-se de milhões), as escutas pura e simplesmente são um mal a extirpar do processo penal.
Nada do que se passou neste caso deveria ser admissível legalmente. Nem as escutas ao PM nem a certidão extraída nem a polémica à sua volta. E apresenta uma solução de gritos para o problema de se tomar conhecimento fortuito de um crime, eventualmente praticado por um primeiro-ministro: as escutas nada valem, segundo o causídico. Mas deviam ser analisadas pelas autoridades judiciárias e a partir daí, instaurado um inquérito para se efectuar uma escuta, mas sem qualquer certidão! Espantemo-nos! Mais uma vez: espantemo-nos!
Obviamente que o que JMJ pretende dizer, não tem a ver com a validade de escutas em processo penal, como meio de obtenção de prova. Tem tudo a ver com a preocupação que as escutas apanhem os "grandes" os responsáveis políticos de topo, em negociatas, em manobras de grande corrupção. Tem a ver com o facto de as escutas apanharem os escritórios de grandes causídicos em negociatas que Jorge Coelho citou. Nem mais nem menos e isso é que é preocupante para o defensor dos direitos liberdades e garantias dos pares.
Se lhe perguntarem o mesmo em relação a crimes de fundo de catálogo como tráfico de droga da arraia miúda nem hesitará um segundo para reconhecer que são obrigatórias e quem as não fizer, será negligente e incompetente na investigação criminal. Sem qualquer problema de direitos, liberdades ou garantias.
2 comentários:
Nem mais
O texto foi entretanto corrigido porque a anterior correcção não saiu e esfumou-se no éter.
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