A propósito da vinda do Papa Bento XVI a Portugal, há uma certa tonalidade mediática que afina pelo diapasão do jacobinismo. No Público pode ler-se Paulo Moura, a escrever sobre o "enorme cálice de ouro"; sobre " as cores, o fausto dos paramentos e majestade do Papa, sentado na cadeira da presidência da celebração com a sua mitra a reluzir" e outras boutades do género que vêem algumas árvores na floresta da visita papal, num engano de crenças. O laicismo acredita na ausência de fé e por isso incomoda-se com a sua presença, repescando pormenores de fait-divers para emoldurar o discurso finalista.
Ao lado, pode ler-se António Marujo a registar a essência do acontecimento, sem recurso ao acessório e cita adereços estéticos para reforçar o principal: a mensagem do Papa, directa ao entendimento e à razão.
Entre estes dois polos, aparece um outro, descentrado e habitual no discurso politizado à esquerda: o do cronista Rui Tavares, na última página do jornal e que nada melhor encontrou no primeiro dia de visita do Papa, do que salientar uma referência ao discurso em que o Papa citou...o cardeal Cerejeira.
Uma referência que serve para levar uma água a um moinho velho e de mós carcomidas pelo reaccionarismo ao contrário.
Um discurso pautado por alusões ao salazarismo associado à Igreja Católica num Portugal envelhecido há mais de 40 anos, ainda serve os ruis tavares deste país, para salientarem a excelência de um mito: o da Igreja progressista que em vez de "sintonizar com a ditadura", afina pelo "catolicismo generosos, tolerante e pluralista" que, afiança Rui Tavares, "também existe", como se essa ideia não fosse mais antiga que a Sé de Braga e os tavares deste Portugal moderno tivessem fixado residência intelectual no tempo do Marquês de Pombal.
Tivesse Rui Tavares a devida atenção e oportunidade e a sua crónica poderia citar outro facto mais relevante do que ideias do tempo do marquês: a pedofilia. Na Igreja, conforme o Papa disse, o pecado está dentro e vem de dentro. E pede penitência, arrependimento e justiça.
E na política que Tavares defende, onde estará? E como é que lidam estes políticos de esquerda, com o caso Casa Pia e o pecado que vem de dentro dessa classe?
Terão os ruis tavares a mesma coragem que este Papa, para denunciar o que está podre por dentro, ou preferem fazer como as "cerejeiras em flor" que despontam na primavera da indignação hipócrita e definham logo a seguir perante factos concretos e acusações situadas e continuam a erigir cabalas em vez de espelhos que lhes mostrem a nua realidade?
Não haverá uma lição a tirar, neste caso, e muito mais interessante do que citar o Papa por citar Cerejeira?
PS. E afinal, qual foi a citação do cardeal Cerejeira, motivo da indignação do tovarich Tavares? Esta: " Não foi a Igreja que impôs Fátima, mas Fátima que se impôs à Igreja". Fátima, é o povo que lá vai. São os crentes que lá estiveram e estão e mostraram à hierarquia da Igreja que era um lugar importante, religioso e de culto.
Curioso, como sem citar a citação, aproveita o citando para desmerecer o citador que mostrou que o povo é quem mais ordena...
Reaccionarismo pior, seria difícil encontrar.