O Expresso de hoje, à semelhança de outros jornais nos últimos dias, dá relevância à notícia acerca de um alegado "lapso" ou "erro" na sentença do Casa Pia, que poderá anular o julgamento efectuado e que poderá "atrasar um ano" o mesmo processo.
O "lapso" é explicado pelos esforçados jornalistas - Micael Pereira e Rui Gustavo-que ouviram a "opinião generalizada de juristas", como "a alteração de uma data crucial para a condenação por um crime de Carlos Cruz e Hugo Marçal".
O facto, segundo o jornal, é este: uma das vítimas disse em inquérito que tinha sido abusado num Sábado e foi assim que ficou na acusação que fixou o objecto do processo ( esta expressão importantíssima não consta no artigo do Expresso). No julgamento, disse que tinha sido num dia de semana porque tinha faltado às aulas. O tribunal acabou por condenar os arguidos pelo facto ocorrido "num dia indeterminado". Quer dizer, alterou de modo não substancial ( esta expressão importantíssima não consta do artigo do Expresso) o facto acusado.
É sobre esta questão concreta que se levanta o problema: o jornal, citando os tais juristas unânimes, incluindo eventualmente o procurador do processo, adianta que o tribunal deveria ter comunicado esta alteração ( a tal que não é substancial) aos arguidos para que estes pudessem exercer o seu direito de defesa. Que como todos sabemos já, era o de negação pura e simples. Nem em Sábado nem em dia de semana algum e portanto em nenhum dia indeterminado que afinal inclui Sábados, como é lógico. Mas poderia adiantar aos mesmos porque em abstracto estes poderiam indicar um alibi para o tal "dia indeterminado" que inclui sábados e restantes dias da semana...
Absurdo, tudo isto? Não, não é nada absurdo porque é a lei processual que temos, gizada pela comissão presidida por Figueiredo Dias e continuado depois em outras comissões que a reviram ao longo dos anos, e que já vai em duas dezenas de vezes, contando com alterações pontuais da lei.
O problema do Direito português é este e sempre foi: não tem válvulas escapatórias para o absurdo. Porquê? Porque a teia de renda das dissertações doutorais dos mestres de Coimbra vivem disso, desses pormenores fatais, dessa complexidade neuronal nos interstícios da letra dos artigos e da sistematização conceptual que os alimenta há décadas.
O senso comum, em casos destes, é um mero acaso.
A acrescer a tudo isso temos o Direito tratado pelos jornais. Em nenhum lado do artigo se explica esta subtileza processual e que apesar da relativa complexidade é possível explicar de modo simples e directo, contribuindo para a consciencialização das pessoas do modo absurdo como a lei foi aprovada por aqueles mestres em alguns casos concretos.
Para além disso e para comprovar a falta e carência grave de conhecimento de coisas básicas do Direito e orgânica judiciárias, a entrevista flash, na badana do jornal, ao juiz Bravo Serra, vice-presidente do STJ e versado nestas matérias do Direito Penal, é um exemplo do que não deve ser uma entrevista destas. Ao longo da meia dúzia de questões, o juiz Bravo Serra ( que deve ter respondido por escrito porque se calhar não pode falar directamente) diz o que deveria ser simples de entender para qualquer cidadão: não há lapso evidente, ainda, porque tal não foi decidido pelo tribunal superior a quem cabe a apreciação do recurso. O CSM não pode pronunciar-se sobre matéria jurisdicional porque não é superior hierárquico de qualquer tribunal ( não diz exactamente isto que deveria dizer mas diz o equivalente nas entrelinhas). E ainda procura explicar o óbvio: se houver anulação é preciso repetir o julgamento mesmo parcialmente.
Com jornalismo destes não ficamos melhor esclarecidos, continuando na cepa torta dos equívocos e da ignorância. Pena que assim seja. Talvez por isso mesmo, o jornal dê acolhimento semanal ás baboseiras jurídicas escritas por um colunista como Sousa Tavares. Já aqui foi apontado a dedo e por isso repito: baboseiras, para além de bacoquices.
Entretanto é notícia hoje mesmo que a condenação de outro arguido por crimes sexuais, Pedro Inverno, desceu de 19 anos para...10, por efeito de decisão de tribunal superior. Descrédito jurisdicional?
Qual quê! Normalidade pura e simples. Isto não tem conserto.
O "lapso" é explicado pelos esforçados jornalistas - Micael Pereira e Rui Gustavo-que ouviram a "opinião generalizada de juristas", como "a alteração de uma data crucial para a condenação por um crime de Carlos Cruz e Hugo Marçal".
O facto, segundo o jornal, é este: uma das vítimas disse em inquérito que tinha sido abusado num Sábado e foi assim que ficou na acusação que fixou o objecto do processo ( esta expressão importantíssima não consta no artigo do Expresso). No julgamento, disse que tinha sido num dia de semana porque tinha faltado às aulas. O tribunal acabou por condenar os arguidos pelo facto ocorrido "num dia indeterminado". Quer dizer, alterou de modo não substancial ( esta expressão importantíssima não consta do artigo do Expresso) o facto acusado.
É sobre esta questão concreta que se levanta o problema: o jornal, citando os tais juristas unânimes, incluindo eventualmente o procurador do processo, adianta que o tribunal deveria ter comunicado esta alteração ( a tal que não é substancial) aos arguidos para que estes pudessem exercer o seu direito de defesa. Que como todos sabemos já, era o de negação pura e simples. Nem em Sábado nem em dia de semana algum e portanto em nenhum dia indeterminado que afinal inclui Sábados, como é lógico. Mas poderia adiantar aos mesmos porque em abstracto estes poderiam indicar um alibi para o tal "dia indeterminado" que inclui sábados e restantes dias da semana...
Absurdo, tudo isto? Não, não é nada absurdo porque é a lei processual que temos, gizada pela comissão presidida por Figueiredo Dias e continuado depois em outras comissões que a reviram ao longo dos anos, e que já vai em duas dezenas de vezes, contando com alterações pontuais da lei.
O problema do Direito português é este e sempre foi: não tem válvulas escapatórias para o absurdo. Porquê? Porque a teia de renda das dissertações doutorais dos mestres de Coimbra vivem disso, desses pormenores fatais, dessa complexidade neuronal nos interstícios da letra dos artigos e da sistematização conceptual que os alimenta há décadas.
O senso comum, em casos destes, é um mero acaso.
A acrescer a tudo isso temos o Direito tratado pelos jornais. Em nenhum lado do artigo se explica esta subtileza processual e que apesar da relativa complexidade é possível explicar de modo simples e directo, contribuindo para a consciencialização das pessoas do modo absurdo como a lei foi aprovada por aqueles mestres em alguns casos concretos.
Para além disso e para comprovar a falta e carência grave de conhecimento de coisas básicas do Direito e orgânica judiciárias, a entrevista flash, na badana do jornal, ao juiz Bravo Serra, vice-presidente do STJ e versado nestas matérias do Direito Penal, é um exemplo do que não deve ser uma entrevista destas. Ao longo da meia dúzia de questões, o juiz Bravo Serra ( que deve ter respondido por escrito porque se calhar não pode falar directamente) diz o que deveria ser simples de entender para qualquer cidadão: não há lapso evidente, ainda, porque tal não foi decidido pelo tribunal superior a quem cabe a apreciação do recurso. O CSM não pode pronunciar-se sobre matéria jurisdicional porque não é superior hierárquico de qualquer tribunal ( não diz exactamente isto que deveria dizer mas diz o equivalente nas entrelinhas). E ainda procura explicar o óbvio: se houver anulação é preciso repetir o julgamento mesmo parcialmente.
Com jornalismo destes não ficamos melhor esclarecidos, continuando na cepa torta dos equívocos e da ignorância. Pena que assim seja. Talvez por isso mesmo, o jornal dê acolhimento semanal ás baboseiras jurídicas escritas por um colunista como Sousa Tavares. Já aqui foi apontado a dedo e por isso repito: baboseiras, para além de bacoquices.
Entretanto é notícia hoje mesmo que a condenação de outro arguido por crimes sexuais, Pedro Inverno, desceu de 19 anos para...10, por efeito de decisão de tribunal superior. Descrédito jurisdicional?
Qual quê! Normalidade pura e simples. Isto não tem conserto.