terça-feira, junho 18, 2013

Crimes comuns contra o erário público

 Público-Economia:

O relatório da comissão de inquérito às parcerias público-privadas (PPP), entregue nesta segunda-feira no Parlamento e a que o PÚBLICO teve acesso, arrasa as decisões tomadas por membros do Governo de José Sócrates. A administração da Estradas de Portugal (EP) é acusada de ter sido “conivente com a opção política vigente” e o regulador dos transportes considerado “incapaz” de exercer as funções de supervisão destes contratos.

As conclusões do relatório de 500 páginas, que será divulgado publicamente na terça-feira, começam por apontar que “a utilização massiva de PPP em Portugal como forma de financiamento do Estado desvirtuou o seu objectivo fundamental: reduzir custos para o Estado e melhor satisfazer as necessidades públicas”.
Um dos principais problemas identificados pela comissão foi o facto de os estudos encomendados pelo Estado para suportar a celebração destes contratos assentarem “em cenários inflacionados e pouco realistas”. Mas a comissão vai mais longe e afirma que “o recurso excessivo às PPP teve por base a necessidade de os agentes políticos realizarem obra sem formalmente se endividarem”, por via de um “aproveitamento político pernicioso” que resultou do facto de este tipo de encargos não ter impacto na dívida pública, naquela altura.
As maiores críticas são direccionadas aos contratos feitos no sector rodoviário, com destaque para a Lusoponte, que a comissão classifica como “um dos piores exemplos”. Neste caso, o relatório indica que os acordos de reequilíbrio financeiro desta concessão já custaram aos contribuintes portugueses quase 847 milhões de euros.
É, porém, na parte destinada às antigas auto-estradas sem custos para o utilizador (SCUT) que surgem as mais duras acusações aos responsáveis políticos, especialmente no que diz respeito às renegociações ocorridas em 2010, durante o Governo de José Sócrates. “A comissão considera inaceitável que o Governo à época tenha assumido e aceite crescimentos elevados de tráfego que não eram de todo previsíveis” e que, não se concretizando, obrigaram à compensação financeira dos concessionários.
Neste campo, o relatório aponta especificamente o dedo aos ex-secretários de Estado dos Transportes, Paulo Campos, e das Finanças, Carlos Costa Pina. No que diz respeito a este último, a comissão escreve que o “repudia politicamente” pela “desresponsabilização que evidenciou” na renegociação destas PPP.
A anterior gestão da EP, liderada por Almerindo Marques, também não escapa às críticas. Além de acusar a empresa de conivência com as opções políticas na massificação das PPP, a comissão quer que os administradores sejam “chamados a assumir as responsabilidades” a par dos governantes da altura, especialmente no que toca à contratação de subconcessões rodoviárias, como a obra do Túnel do Marão, parada desde 2011. Isto porque foram assumidos encargos que puseram em causa a sustentabilidade da EP, apesar dos alertas do Tribunal de Contas e da Inspecção-Geral de Finanças. O relatório cita uma “carta de conforto” enviada à empresa por dois ex-ministros de Sócrates (Mário Lino e Teixeira dos Santos) assegurando o cumprimento dos compromissos financeiros.
Já em relação ao IMTT, que supervisiona o sector dos transportes, o relatório indica que “acusou incapacidade em exercer na plenitude a sua função de regulador”, nomeadamente no que se refere às PPP do sector ferroviário.
O relatório dá conta que, mesmo com a última renegociação (feita pelo actual Governo com uma poupança de 300 milhões de euros ao longo da vida dos contratos), os contribuintes vão ser onerados em mais de 12 mil milhões de euros por causa das PPP. E termina afirmando que “entende, por força dos pedidos feitos por autoridades judiciais, enviar o relatório ao Ministério Público”.

Espera-se que o DCIAP, agora dirigido por Amadeu Guerra, um magistrado que conhece este tipo de manigâncias e que é pessoa competente e séria,  consiga enquadrar estes procedimentos e estes responsáveis nos tipos de crime catalogados no Código Penal e legislação avulsa porque esta actuação desta gente é simplesmente criminosa porque objectivamente o pode ser em termos legais e subjectivamente o deve ser porque não se compreende que tenham agido apenas por negligência. Não pode haver negligência derivada da incompetência em casos que envolvem verbas públicas  desta ordem. Só por si, tal facto integra a figura do dolo eventual que permite o enquadramento subjectivo.
Noutros países foram julgadas e condenadas pessoas por factos como este, com regras penais idênticas, como por exemplo na Itália.
E por cá?
Esta é uma prova de fogo para o novo DCIAP.
Enquanto que o caso dos submarinos da Ferrostaal é um assunto menor ao pé deste, em termos de dinheiro envolvido, as semelhanças entre ambos pode ser aquilatada.
Nos submarinos, o que está em causa é descobrir quem recebeu- indevidamente- dinheiro "por baixo da mesa", no negócio que envolveu o Estado português que pagou. As suspeitas foram positivamente levantadas pela justiça alemã que considerou ter existido corrupção pura e simples, por ter descoberto a entrega e mais de duas dezenas de milhões de euros a alguém cujos serviços poderiam ter sido realizados por meia dúzia. Ou seja, sob uma capa legal, um acto de simples corrupção, com a conivência de pessoas importantes e firmas de advocacia importantes.
A chico-espertice habitual, no fim de contas. 
Neste caso das PPP´s houve positivamente uma entrega de muitos milhões- muitos e muitos mais que no caso dos submarinos- a alguém, difusamente espalhado por particulares e empresas, eventualmente bancos,  que viveram à custa do Estado, com gestores que foram até ministros do Estado e que aproveitaram as "benesses" que alguém do Estado lhes concedeu de mão beijada e baseadas em estudos fantasma ou em estudos com truques.  É esse o elemento da burla, do engano voluntariamente assumido pelo Estado que à partida assumiu tal efeito,  sem questionar a natureza da malfeitoria cujos responsáveis sabiam ou deviam saber perfeitamente o resultado dessa actuação e se conformaram com a mesma.
Os prejuízos directamente causados ao Estado e ao erário público são de tal ordem que condicionam políticas económicas actuais, ao contrário dos submarinos que podem ser um simples caso de corrupção de costumes porque sempre se trocaram luvas em negócios deste género e tal foi assumido pelas partes como efeito normal. Criminoso, mas normalíssimo, porque os partidos políticos  recebem as "sobras" e os responsáveis que contemporizam e pela calada são pagos, mesmo sem ficarem como directamente beneficiários, ficam sempre na sombra e resguardados da responsabilidade inerente. Nestes casos, só por sorte ou por grande descuido são descobertos com a mão " na massa".
E é por isso que a lógica e o senso comum mostram uma coisa e os mesmos se riem disso e mostram indignação postiça.