Eram dois os funcionários da "biblioteca". Um conduzia a carrinha Citroên e o outro preenchia as fichas dos pequenos leitores interessados, apontando os livros requisitados para ler durante um mês.
Havia umas poucas centenas de livros, à escolha, mas quem escolhia, por vezes, era o funcionário que "impingia" literalmente tais leituras a quem hesitava na escolha. Um, dois ou três livros por mês ( havia um limite de cinco) , chegavam bem e muitos liam-nos. Outros, raríssimos, perdiam-nos e andavam meses para "entregar".Quem não "entregava" era penalizado pela não concessão de novos empréstimos ou pela exclusão do Cartão de Leitor, com um pequeno registo no verso onde se apontavam os empréstimos.
A par dos livros, a "biblioteca" oferecia um "Boletim" e era um maná de informação cultural.
Em 1963, a História, Literatura, Generalidades e outras matérias como Ciências aplicadas ou Belas Artes eram as obras que havia para ler.
Por mim comecei com a literatura infantil tipo História dos Três mosquitos ( Maria de Figueiredo) ou os Contos Tradicionais Portugueses ( Selecção de Branquinho da Fonseca). Passei para o Salgari de A esmeralda de Ceilão ou coisa assim.
A par dos livros, o Boletim , periódico, juntava-se ao lote. E foram esses boletins que ficaram.
O primeiro que arranjei, ainda da primeira série, era de 1963 e trazia um texto sobre as nossas viagens pelo mundo, no séc. XV- XVII e que hoje duvido que exista nos livros de leitura das nossas crianças na escola.
Em 1964 inaugurava-se a série II do Boletim com este número dedicado ao "Romance".
Em 1968 o Boletim tratava de temas históricos, no caso, medievais. Assim:
Em 1974, saiu o boletim dos primeiros meses e dedicado ao estudo das artes modernas, ou seja, ao Modernismo, português e universal. Fernando Pessoa, heterónomos, Almada, Mário Sá-Carneiro etc. Nas últimas páginas, impressas já depois do 25 de Abril de 1974, uma surpresa: a mudança da linguagem. Uma radical alteração na orientação editorial do "boletim produziu isto:
Nesta imagem pode ver-se a "carrinha da biblioteca"
Nos primeiros meses de 1975 surgiu uma "comissão de reestrutura" que produziu um documento redigido por Victor Sá Machado, um indivíduo de quem José Hermano Saraiva conta um conto no postal abaixo...
O que se torna interessante nisto é a completa claudicação de pessoas que foram funcionários e governantes no tempo de Marcello Caetano, peranto os novos poderes esquerdistas e comunistas. Completa claudicação, até na linguagem. Impressionante, este vira-casaquismo.